O PAPEL MEDIADOR DO DOCENTE PARA ALÉM DOS CONTEÚDOS FORMAIS: PROMOVENDO A INTELIGÊNCIA EMOCIONAL.

Lissandra Zanon

Com o presente trabalho, pretendo questionar a ênfase dada ao quesito racional, relegando a um segundo plano o lado emocional; aportar aos educadores uma visão mais ampla acerca da importância de contemplarmos o quesito emocional em nossas práticas pedagógicas e, conseqüentemente, na formação dos educandos. Enfim, demonstrar a urgência em (re) introduzirmos sua tematização no horizonte de nossas preocupações teórico-práticas.
Uma vez que aumentam cada vez mais os sinais de um déficit emocional no mundo social, onde as pessoas enfrentam dificuldades em estabelecer relações sociais adequadas, harmônicas e estáveis. O tecido social parece esgarçar-se com uma rapidez cada vez maior, em que o egoísmo, a violência e a mesquinhez de espírito estão banindo a bondade das relações com o outro.
Frente às constantes mudanças, os avanços tecnológicos e científicos, a velocidade das informações, a crescente competitividade e a globalização, a escola precisa repensar a sua função, pois essa reflete a sociedade em que vivemos, a qual se caracteriza, muitas vezes, pela falta de valores, egoísmo, individualismo e competitividade acentuados. Neste contexto social não basta só competência intelectual, é preciso também as competências intrapessoal e interpessoal, ou seja, faz-se necessário lidar com os sentimentos para poder compreender, respeitar e conviver com o outro de forma harmoniosa.
O mundo mudou e a instituição escola, como está? Será que se preparou para essas mudanças? E os profissionais da área educacional estão sabendo lidar com os novos desafios, em especial com o quesito emocional/relacional?
Não é raro ouvir relatos de educadores com dificuldades para solucionar e/ou amenizar os conflitos em sala de aula, que emergem cada vez com mais freqüência e intensidade, devido ao comportamento mais irritado, agressivo, rebelde, impulsivo das crianças que parece estar banindo a harmonia nas relações interpessoais.
Parece-me que a escola está com dificuldades em atender às reais necessidades da sociedade na qual está inserida. Há certo clima de insatisfação em relação à educação e uma busca constante por mais "qualidade" no ensino. Essa insatisfação justifica-se, na maioria das vezes, devido ao modelo de escola tradicional e conservador, direcionado para a massificação de conteúdos, com acentuado racionalismo científico, no qual as emoções ficam despercebidas.
Dentro do contexto social contemporâneo, o sistema educativo deve deixar de incidir essencialmente no intelecto, na lógica, no raciocínio e na organização visual-espacial, mas também e, sobretudo, nos fatores emocionais, de modo que se promova a formação para a vida e não para o mero acúmulo de informações. Afinal, quantas coisas se aprendem na escola e não terão mais serventia pela vida afora? Do contrário, quantas pessoas devem enfrentar suas próprias emoções e as dos outros?
A Inteligência Emocional (IE) é a capacidade de relacionar-se consigo mesmo e com os demais, para compreender os sentimentos próprios e alheios.
É uma forma de interagir com o mundo, que tem em conta as emoções, os sentimentos e algumas habilidades como a autoconsciência, a motivação, o controle dos impulsos, o entusiasmo, a perseverança, a empatia, e outras mais, indispensáveis para uma boa e criativa adaptação e interação social.
Essa destreza permite conhecer e manejar sentimentos pessoais, interpretar e enfrentar os sentimentos dos demais, sentir-se satisfeito e ser eficaz na vida, uma vez que cria hábitos mentais que favorecem a produtividade pessoal. É uma classe de "inteligência empírica" que pode ser desenvolvida muito mais que a capacidade intelectual e tem mais relação com o êxito profissional, social, familiar e com o bem estar da pessoa, que o próprio Cociente Intelectual.
Goleman (1995) afirma que o termo Inteligência Emocional (IE) abarca cinco pilares:
A autoconsciência: conhecimento que o ser humano tem de si próprio, de seus sentimentos ou intuição e que ajuda a superar o medo ou a culpa, para seguir adiante.
O controle emocional: habilidade de lidar com os próprios sentimentos, adequando-os a cada situação vivida; importante para evitar atitudes que prejudicam a moral do grupo.
A auto-motivação e a perseverança: capacidades de dirigir as emoções a serviço de um objetivo ou realização pessoal; primordial, já que a soma de pequenos esforços diários é que levará ao êxito.
A empatia: saber se colocar no lugar do outro, perceber e captar o sentimento do outro; necessária para manter relações harmônicas.
As habilidades sociais: capacidade para lidar com emoções do grupo; induz nos outros, as respostas desejadas , criando sinergia para trabalhar em prol das metas coletivas.
O mercado global cada vez mais competitivo exige uma docência mais comprometida na formação de pessoas emocionalmente inteligentes, criativas e produtivas, que se adaptem com rapidez aos avanços da ciência e da tecnologia. Portanto, o docente deve dispor de ferramentas acadêmicas que lhes permitam ter um manejo assertivo da linguagem, trabalhar em equipe, resolver conflitos, desenvolver relações empáticas, entre outras.
A abundante bibliografia encontrada sobre a IE demonstra que os sentimentos e as habilidades humanas, são elementos chaves para um bom desenvolvimento nas organizações laborais e educativas, como também, na vida cotidiana de qualquer ser humano, visto que é impossível desvincular-se das emoções, sendo conveniente criar consciência acerca do papel que cumprem na vida diária.
Querendo ou não, as emoções são inertes ao ser humano. São um universo no interior do qual gravitamos a todo o instante e todos os dias da nossa vida, para não dizer a cada minuto e mesmo a cada segundo. Elas exercem um papel central e capital no desempenho, equilíbrio e saúde das pessoas. Por conseguinte, precisam ser bem conduzidas e não relegadas a um segundo plano. Mas para isso, é primordial que a escola oportunize a formação continuada para todos os seus membros, sejam especialistas, professores e funcionários, respeitando seus preceitos e valores.
Está comprovado que as pessoas que manejam adequadamente suas emoções e sabem interpretar as emoções alheias, possuem um rendimento melhor em suas funções porque incluem "coração" e "cabeça" na tomada de decisões; quer dizer, harmonizam adequadamente a IE com a inteligência racional ou cognoscitiva. Obter tal harmonia é muito importante, já que o cérebro humano funciona em dois níveis totalmente diferentes entre si: o do mundo racional e analítico, representado pelo lóbulo esquerdo ou neocórtex; e o mundo intuitivo, holístico e emocional do lóbulo direito, representado pelo sistema límbico. Como afirmou Goleman (1995) temos duas mentes, uma que pensa e outra que sente e ambas interatuam para construir nossa vida mental.
Para sobreviver, o ser humano necessita estabelecer uma relação estável com os demais. Essa relação, onde determinados padrões afetivos são desenvolvidos, fornece a base a partir da qual podem ocorrer transformações no comportamento intelectual, emocional e social. Como somos um todo, não pode haver divisão entre desenvolvimento cognitivo, desenvolvimento afetivo e desenvolvimento social
Em toda e qualquer profissão, nos relacionamos com diferentes tipos de pessoas. Não importa o ambiente, a cidade ou país, sempre existirão pessoas dentro das organizações, todas elas diferentes em sua essência. O educador, mais do que qualquer outro profissional, deve ter a consciência que o capital humano é o pilar mestre de sua atividade. Preocupada com a formação desse capital humano e, principalmente com aqueles que o formam, é que delineio esse estudo, visando acrescentar nesses uma visão crítica das relações humanas, da arte de saber lidar com suas emoções e com as emoções do outro.
É preciso promover relações harmoniosas, uma vez que cada indivíduo vai formando sua personalidade conforme suas vivências, sua auto-imagem, seu autoconceito e, conseqüentemente, sua auto-estima. O modo como alguém aprende, a construção de suas relações com o meio influenciam tanto na parte individual quanto nas relações que estabelece, ou seja, a maneira como ele representa internamente tanto a si mesmo como aos outros e aos vínculos existentes em sua vida, irão determinar, em grande parte suas possibilidades de vincular-se e desenvolver-se plenamente ao longo de sua existência.
É primordial olhar o educando por inteiro, não apenas como uma cabeça que se desenvolve lingüística e matematicamente. Quando existe um padrão único e preestabelecido de competência, é inevitável que muitas crianças acabem se sentindo incompetentes, especialmente porque esse padrão costuma supervalorizar os aspectos lingüísticos e lógico-matemático.
Portanto, justifica-se a preocupação com o educar e o educar-se emocionalmente, de modo que se possam ampliar os referenciais de mundo, conhecer melhor as emoções, controlar os impulsos e reconhecer as limitações e possibilidades de cada um, quer seja discente ou docente. Nesse sentido, busca-se em Goleman, Salovey e Mayer, Gardner, Wallon, Krisnamurti e outros, enfatizar que a emotividade está subjacente a todo o processo e que a inteligência não deve ser identificada pura e simplesmente com o seu lado racional. Para Goleman (1995), a crise de valores que a humanidade atravessa é resultado de uma sociedade que só apostou no intelecto, relegando ao esquecimento o lado emocional do indivíduo.
Desde os primórdios a escola exalta os objetivos da cognição. No século XIX, por exemplo, com o pensamento newtoniano-cartesiano, o ser humano acreditou que podia dominar totalmente o saber, fragmentando em áreas os conhecimentos. Esse processo reducionista influenciou a maior parte das idéias e tinha como foco o conhecimento.
Com essa fragmentação do saber, o homem passou a preocupar-se mais com a razão e a lógica, deixando de lado um importante componente do ser humano: o seu lado afetivo. Nesse sentido esclarece Weil:
Uma separatividade fundamental impregna a educação: o intelecto é confiado às escolas e o caráter, incluindo sentimentos e valores, supostamente ainda está nas mãos da família. Pela força da escolaridade, disso resulta uma visão unilateral do mundo, puramente intelectual, onde sentimentos e valores são relegados a segundo plano ou simplesmente ignorados (Weil apud Brandão & Crema, 1991, p. 18).

Assim, com o foco na formação do intelecto, o professor tinha um papel de autoridade máxima, agindo como centralizador do processo. Nesse paradigma a educação tinha como pressuposto as certezas absolutas. Com isso, o docente deveria comprovar o domínio pleno do saber, ensinando sem levar ao questionamento.
O professor não expressava o seu lado emocional, muito menos reconhecia nos alunos as suas emoções. Tendo que ser severo e rigoroso limitava-se a transmitir o conteúdo para uma platéia estática, caracterizando sua prática como um monólogo com pouca possibilidade de interação com os alunos.
Criado em um ambiente semelhante, esse professor reproduz o modelo em que fora escolarizado; sem reconhecer seus próprios sentimentos e considerando que externar ou manifestar as emoções era uma fraqueza de caráter. Com isso, abafaram-se as reações emocionais. Manifestar medo e insegurança era atitude de fracos.
Desse modo o ser humano passou a usar a razão em detrimento das emoções para dirigir suas vidas. Com isso, fez calar a intuição, a sensibilidade e a solidariedade. Agindo assim, perdeu muitos de seus valores, colocando esse problema em evidência. A contribuição de Libâneo (1998, p.16) esclarece:
No campo ético, também ocorreram mudanças preocupantes. A padronização de hábitos de consumo e de gostos vai levando a uma vida moral também descartável. O individualismo e o egoísmo estão se acentuando. Valem mais os interesses pragmáticos e imediatos dos indivíduos do que princípios, valores, atitudes voltados para a vida coletiva, para a solidariedade, para o respeito à vida.

O paradigma tradicional contribuiu para a formação do ser humano mais voltado para si mesmo, mais individualista. As inteligências intrapessoal e interpessoal de Gardner não eram reconhecidas, o bem-estar de si mesmo, dos outros e do mundo não eram temas ou atitudes a serem desenvolvidas. Os alunos eram incentivados a ser melhores que os outros, mesmo que para isso fosse necessário deixar alguém para trás. Com tudo isso, o que podemos ver é que os seres humanos tornaram-se frios e distantes de si mesmos, do próximo e do mundo.
Cabe aqui apontar a história contada por Goleman, o qual efetuou ampla pesquisa sobre a Inteligência Emocional. Em seu livro Inteligência Emocional (1995), escreve um capítulo com o título "Quando ser esperto é ser burro", em que relata a história de um aluno espetacular, esforçado, que sonha fazer medicina em Harvard e que tirava sempre nota A, mas este quando recebe uma nota B, perde a cabeça e vai para a escola com uma faca e esfaqueia o professor. Mesmo depois de resolvida a questão criminal nunca pediu sequer desculpas ao professor. Goleman (1995, p. 46) analisa esse caso e comenta o seguinte:
A questão é: como alguém com uma inteligência tão óbvia faz uma coisa tão irracional ? tão burra mesmo? Resposta: a inteligência acadêmica pouco tem a ver com a vida emocional. Os mais brilhantes entre nós podem afundar nos recifes de paixões desenfreadas e impulsos desgovernados; pessoas com alto nível de QI são às vezes pilotos incompetentes de suas vidas particulares.

Analisando o caso citado, o que se percebe é que a educação tradicional não valorizava a dimensão emocional, deixando as emoções de lado como uma segunda categoria ou algo sem importância. Do contrário, os testes de QI eram levados a sério e responsáveis por posicionar a pessoa em certo grau de inteligência (Gardner, 2002). Cabe alertar que em seu tempo a educação tradicional foi importante e teve sua relevância.
O que se observou nas pesquisas feitas por Goleman no decorrer do tempo é que a grande maioria das pessoas com um alto QI não conseguiram se sair bem na vida afetiva e social, em comparação com pessoas que apresentavam QI mais baixo e, por conseqüência, obtinham notas mais baixas na escola. Dessa forma, as pesquisas demonstram que:
O QI pouco oferece para explicar os diferentes destinos de pessoas com mais ou menos iguais promessas, escolaridade e oportunidade (1995, p. 47).

Considerando essas pesquisas e os resultados obtidos pelas escolas nessa época, estudiosos notaram que algo necessitava ser repensado em matéria de educação, pois a sociedade estava mudando e a educação precisava acompanhar tal mudança.
No final do século XX e início do século XXI, com o advento do paradigma da complexidade na ciência, uma questão foi levantada, como afirma Morin (2003, p.35):
Para articular e organizar os conhecimentos e assim reconhecer e conhecer os problemas do mundo é necessário a reforma do pensamento.

Nesse paradigma, a educação precisa buscar o reconhecimento que "o ser humano é, ao mesmo tempo, biológico, psíquico, social, afetivo e racional" (Morin, 2003, p.38).
Entre os cientistas que contribuíram para a mudança de paradigma na educação, encontramos Gardner (2002) cientista, neurologista, que estuda o cérebro humano e seu desenvolvimento, com a proposição da teoria sobre a inteligência. Suas pesquisas alertaram para o fato de que a inteligência não pode ser medida e, muito mais do que isso, ao contrário do que se acreditava anteriormente, é composta por várias inteligências, às quais o autor denominou de inteligências múltiplas. Antunes (2000), também vem dar sua contribuição, ao escrever um livro baseado nos estudos de Gardner, no qual menciona oito tipos de inteligências, a saber:
Inteligência lingüística ou verbal, a lógico-matemática, a espacial, a musical, a cinestésica-corporal, a naturalista e as inteligências pessoais, isto é, a intrapessoal e interpessoal (p. 25).

Com o entendimento das inteligências múltiplas, a educação está tentando superar a visão reducionista, buscando um modo mais amplo de se ver o conhecimento, o homem e o universo. Mas para que a educação alcance essa superação, um dos desafios é a formação dos professores.
A UNESCO, em 1996, propôs por meio do relatório: "Educação: um tesouro a descobrir", elaborado para a educação do século XXI, uma declaração que tem como foco principal a formação do ser humano ao longo da vida. Nesse contexto, desafia a educação a alcançar essas dimensões. Delors et al. (2003) recomenda ampliar as aprendizagens na escola, apontando quatro pilares:
Aprender a conhecer, isto é, adquirir os instrumentos da compreensão; aprender a fazer para poder agir sobre o meio envolvente; aprender a viver juntos, a fim de participar e cooperar com os outros em todas as atividades humanas; e aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes (Delors et al., 2003, p. 90).

Com essa preocupação de contemplar todos os aspectos da formação do ser humano, a LDB, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, promulgada em 20 de dezembro de 1996, Lei 9.394, em seu Art. 1º estabelece:
A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais, e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.

Mostrando que a educação também deve educar o ser humano para a convivência social e humana. A mesma lei destaca a importância da Educação Emocional do ser humano para poder vivenciar com integridade e satisfação a sua vida, esteja ele onde estiver. A análise dessa lei (Lei nº 9.394/96) afirma também que a Educação Emocional precisa ser desenvolvida desde os primeiros anos de vida da criança.
Na lei referida, no Art. 32º, Inciso II, sobre a educação fundamental, aponta:
O desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores (...).

Assim, nessa especificação, envolve a necessidade da aprendizagem emocional. Para o ensino médio, a Lei recomenda em seu Artigo 35º, inciso III, que a escola precisa oferecer ambientes que propiciem o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.
Seguindo esse norte, para a educação superior a Lei nº 9.394/96 estabelece no seu Art. 43º, Inciso VI, que a educação deve "estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente (...)", o que supõe a ideia de que o educando nesse nível deve saber e conhecer formas de relacionar-se consigo mesmo e com os outros, sabendo como "ser" e como "conviver" na sociedade.
A lei 9.394/96 e as diretrizes da educação se complementam com projetos ditando as recomendações da educação em geral. As diretrizes curriculares para a educação mencionam a necessidade de ações intra e intersubjetivas, levando os educandos ao conhecimento emocional de seu próprio ser. Recomendam o reconhecimento do lado emocional do colega e parceiro na construção do conhecimento. A descoberta do seu modo de ser e de se relacionar com os demais facilita o diálogo, meio pelo qual a sociedade terá um ganho com a convivência mais pacífica entre os cidadãos.
A construção de uma prática de desenvolvimento da Inteligência Emocional nos educandos deve ocorrer desde a mais tenra idade, mas necessita que os professores estejam preparados para trabalhar com tal dimensão. O desafio de aplicar metodologias visando o aspecto emocional nas salas de aula, assim como desenvolver e utilizar a Educação Emocional em sua vida cotidiana, requer uma formação dos educadores na dimensão emocional, o que corresponde aos objetivos dos Parâmetros Curriculares da educação no Brasil:
Desenvolver o conhecimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social, para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania.

Esse objetivo também deixa evidenciada a necessidade da Educação Emocional ser uma parte necessária à formação do cidadão. Assim, ele será capaz de saber como agir emocionalmente, aceitar-se, ter uma boa auto-estima, relacionar-se com os outros de maneira sadia, na qual os valores de companheirismo, solidariedade e empatia facilitam a comunicação pelo diálogo.
A educação atual deve se adequar e buscar agir de acordo com o novo paradigma, buscando formar o ser humano em sua totalidade. Sabemos que o conhecimento organizado, científico, global é fundamental, mas parecem estar latentes os objetivos da emoção, os valores subjetivos, a afetividade, a auto-estima.
A sociedade tem posto em cena a importância dos componentes emocionais da personalidade dos indivíduos na resolução das questões da vida cotidiana, não mais negando a influência poderosa que as emoções exercem sobre o pensamento, a memória e a percepção.
O professor, diante desse desafio, necessita desenvolver suas inteligências intra e interpessoais, conhecer em si mesmo o seu aspecto emocional, seus valores, suas intuições. Precisa aprender a viver e conviver em sociedade, dando exemplo para seus educandos.
A proposição de uma prática pedagógica que atenda ao novo paradigma exige a conexão de várias abordagens que se tornam indispensáveis para educar o homem em sua totalidade. Assim, o professor precisa ser um mediador, um articulador do saber, uma pessoa dinâmica, com espírito de investigação, criativo e que leve o aluno a ter uma visão do todo, possibilitando-lhe o uso dos dois lados do cérebro, de modo a poder desenvolver suas potencialidades e inteligências. Enfim, é imprescindível que o educador alie ao conhecimento o crescimento emocional de cada um no processo educativo.
Mas, afinal, será que os docentes estão contemplando os aspectos emocionais e de que forma isso está ocorrendo? Estão percebendo, entendendo e trabalhando o quesito emoção tanto em si mesmos, quanto nos educandos?
Almeida (2007), em seu livro: "A emoção na sala de aula", sustenta a ausência de uma educação da emoção nas salas de aulas brasileiras, o que traz prejuízos irremediáveis à ação pedagógica. Frisa a importância do docente em conhecer-se a si próprio e conhecer seus alunos no aspecto não somente cognitivo, mas também emocional, pois assim fica mais fácil garantir a otimização das interações, das trocas e de qualquer outra experiência vivida na escola que exerça sensível influência na estrutura da personalidade da criança. Portanto, o educador tem uma participação ímpar nesse processo. Precisa estar em sintonia com os sentimentos daqueles que o cercam, sentir seus estados emocionais e interagir eficazmente com eles.
Goleman (1995) reconhece os louváveis esforços que visam melhorar o desempenho acadêmico, porém chama a atenção para esse novo tipo de deficiência que ainda não ganhou espaço no currículo escolar. São urgentes os ensinamentos que objetivam o controle das emoções, as resoluções de desentendimentos de forma pacífica e a boa convivência entre as pessoas.
O novo caminho, segundo Goleman está em inserir as emoções e a vida social nos currículos escolares. Para ele não se trata de criar uma nova classe, uma nova disciplina, mas fundir lições sobre sentimentos e relacionamentos com as outras matérias. Não é mais admissível ensinar apenas matérias acadêmicas, diante dos problemas que essas crianças enfrentam simplesmente vivendo. Mas como a escola e o professor podem proporcionar isso?
Não precisa fazer malabarismos, mas é preciso estar atento, para ver o que precisa ser trabalhado. Com quais emoções estamos lidando? Como fazer o aluno reconhecer seus sentimentos? A criança está de luto, está triste, deprimida, agitada, ansiosa, enfim? É preciso muita atenção e paciência para perceber o estado emocional de cada um e estimulá-lo a dizer o que sente, estando sempre disposto a ouvir e compreender. Ou seja, abrir o caminho para o diálogo, por exemplo:
- Quantos de vocês algumas vezes se sentem frustrados?
- Como vocês se sentem quando estão frustrados?
- E quando estão ofendidos?
- O que fazem?
Quando o educando não possui estímulo para expressar sua carência, seus problemas, aos poucos começa a agredir os demais. Precisa, pois, encontrar a compreensão e a amizade do professor que, por sua vez, deve trabalhar muito para que quando esteja com raiva, não desconte nos outros, e aprenda a falar o que sente. Também é pertinente lançar mão de histórias que deem abertura para discutir tais questões.
Perceber o que o aluno sente, sem que ele o diga, constitui a essência da empatia, uma das características fundamentais da inteligência emocional. A criança e o adolescente, dificilmente, dizem em palavras aquilo que sentem, mas revelam seus sentimentos por seu tom de voz, pela expressão facial ou por outras maneiras não verbais. Se o professor conhecer bem esse aluno, certamente terá mais facilidade em identificar essas manifestações emocionais.
Conhecer os alunos é um processo que se inicia desde os primeiros dias de aula. Quanto maior for esse conhecimento, maior será a eficácia da ação pedagógica, pois podemos mobilizar interesses, curiosidades, conhecimentos prévios, aspectos das histórias de vida, articulando com os conhecimentos.
A partir do momento em que o professor reconhece as emoções do aluno (medo, raiva, ciúme, alegria, tristeza, vergonha), cria uma enorme chance de aumentar a intimidade e de compartilhar experiências, dificuldades e conquistas.
O aluno passa a se sentir valorizado, legitimado em seus sentimentos (mesmo que negativos) e, conseqüentemente, fortalece sua autoestima. Ele descobre novas estratégias para lidar com os conflitos, diminui a agressividade em suas relações com o outro, aprende a conviver de uma maneira confortável com os sentimentos negativos, enfim, ele transforma um sentimento que o assusta em algo que faz parte da vida, não censurando a si mesmo por seus sentimentos, mas sim, julgando a decisão do que fazer com estes mesmos sentimentos.
Ensinar os alunos a reconhecer suas emoções, saber categorizá-las e comunicá-las, fazendo-se entender, ajuda-os a serem os responsáveis por suas próprias necessidades emocionais. Pois, como afirma Goleman:
O velho paradigma defendia um ideal de razão livre do peso da emoção. O novo nos exorta a harmonizar cabeça e coração. Fazer isso bem em nossas vidas implica que precisamos primeiro entender com mais exatidão o que significa usar inteligentemente a emoção (1995, p.42).

Para que isso ocorra, os professores precisam aceitar e compreender suas emoções e seus sentimentos, em outras palavras precisam ser alfabetizados emocionalmente, para então ao estarem em contato com os alunos, poderem respeitar e compreendê-los emocionalmente. Já que o respeito ao emocional do aluno constrói bases sólidas para uma boa autoestima pessoal, tornando possível o bom desenvolvimento intelectual, físico e espiritual da pessoa.
A escola é um lugar, senão o principal e único, que pode proporcionar ensinamentos sobre as questões emocionais, básicos para a vida. Para tanto,
essa tarefa exige duas grandes mudanças: que os professores vão além de sua missão tradicional e que as pessoas na comunidade se envolvam mais com as escolas (Goleman, 1995, p. 293).

Por fim, acredita-se que a administração das emoções é fator essencial para o desenvolvimento da inteligência do indivíduo e que o educador desempenha importante papel nessa relação, pois quando as emoções esmagam a vida do indivíduo o raciocínio também é esmagado. Assim como toda a capacidade mental, a memória funcional ou seletiva deixa de fluir normalmente. Portanto, urge qualificar os professores para que atuem de maneira mais preventiva e eficaz na alfabetização emocional. Já que pouca coisa ou nada na educação padrão dos professores os prepara para esse tipo de ensinamento.
Urge buscar novos paradigmas para a educação, aquele baseado exclusivamente nos aspectos cognitivos e racionais do educando, está esgotado, enquanto parâmetro único. É preciso uma educação voltada para as emoções, mas para que seja bem sucedida, em primeiro lugar, há de se intervir no quadro docente, dando apoio adequado e promovendo cursos que os capacite para trabalhar de forma mais segura, consciente e eficaz, pois serão agentes multiplicadores junto aos alunos. E, em segundo lugar, que as pessoas na família e na comunidade se envolvam mais com a escola.
Como parte da humanidade e de um sistema muito maior, deve-se buscar perceber, entender e trabalhar as manifestações emocionais em cada indivíduo, a começar por si próprio. Acredita-se que haverá mais êxito se for pensado na complexidade e no valor da vida íntima de cada um. Assim, o sujeito pode chegar próximo da inteireza do Ser e ser, certamente, mais justo, solidário, fraterno e feliz.
Nas palavras de Paulo Freire é que se busca algo que mobilize para novas conexões e outras sínteses.
Como prática estritamente humana, jamais pude entender a educação como experiência fria, sem alma, em que os sentimentos e as emoções, os desejos, os sonhos, devessem ser reprimidos por uma espécie de ditadura racionalista. (Freire, 1996, p. 145).

Espera-se que o presente trabalho motive inúmeros educadores para que possam se juntar e colaborar no desenvolvimento dos trabalhos com a Educação Emocional, a fim de possibilitar aos professores e alunos a iniciação na alfabetização emocional e com essa iniciativa melhorar a sua condição pessoal e relacional.


BIBLIOGRAFIAS

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