O papel do profissional enfermeiro na Estratégia de Saúde da família e sua contribuição para a consolidação do SUS – Revisão da Literatura

The professional nurse´s role in the Health Strategy Family and its contribution to the consolidation of SUS – Literature Review

O papel do enfermeiro na ESF e contribuição no SUS

Roberta Narcizo Soares1, Xisto Sena Passos ²,Ayanne Cris Machado³.

1Aluna do curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Paulista – UNIP. 2Doutor em Medicina Tropical pela Universidade Federal de Goiás. Professor Titular do Curso de Enfermagem da Universidade Paulista - UNIP. 3Professora Mestre em Terapia Intensiva, Professora do Curso de Enfermagem da Universidade Paulista, Campus Goiânia – Flamboyant.

Endereço para correspondência: Ayanne Cris Machado: Rua Parintins, Ed. Residencial Cabo Blanco, apto 606, Parque Amazônia, Goiânia – GO. CEP: 74.840-670. Cel.: (62) 8407-8160. E-mail: [email protected]

Área temática: Saúde Pública

Declaração de conflitos de interesse: Declaramos que não existem conflitos de interesse entre os autores, quanto à publicação deste artigo.

Resumo

A Estratégia Saúde da Família (ESF) é uma estratégia proposta pelo Ministério da Saúde, criada em 1994, que visa à busca da reorientação do modelo da atenção básica, baseada nos princípios do SUS. E o trabalho do profissional enfermeiro tem contribuído em larga escala para a consolidação desse sistema. Podemos avaliar que a Estratégia de Saúde da Família abre novas portas para que o enfermeiro possa mostrar de forma bem ampla o seu papel. O presente estudo teve como objetivo revisar a literatura acerca do papel profissional do enfermeiro dentro da ESF, visando à contribuição na consolidação no SUS. Trata-se de uma revisão bibliográfica com análise qualitativa, sendo realizada revisão narrativa de literaturas publicadas entre 2008 a 2014, utilizando-se artigos das bases de dados SCIELO e bibliotecas convencionais. Destacam-se nos artigos os diversos papéis assumidos pelo profissional enfermeiro dentro da atenção primária. Nota-se que sua força de trabalho tem contribuído em massa para a consolidação do SUS, mais ainda existe uma lacuna na formação desses profissionais e uma grande dificuldade estrutural e de engajamento social.

Descritores: Estratégia de Saúde da família, Enfermagem da família e Saúde Pública.

Abstract

The Health Strategy Family (FHS) is a strategy proposed by the Ministry of Health, created in 1994, which aims to search the reorientation model of primary care, based on the principles of the SUS. And the work of the professional nurse has contributed largely to the consolidation of this system. We evaluate the Strategy Family Health opens new doors for nurses can show quite widely their role. This study aimed to review the literature on the professional role of the nurse within the FHS, aiming at contribution in consolidating the SUS. This is a literature review qualitative analysis, narrative review of literature published from 2008 to 2014 being held, using articles of base SCIELO and conventional libraries. Stand out in the articles the different roles assumed by professional nurses in primary care. Note that if your workforce has contributed to the mass consolidation of SUS, there is still a gap in the training of these professionals and a wide structural hardship and social engagement.

Descriptors: Health Strategy Family, Family Nursing and Public Health.

Introdução

Desde sua criação o modelo assistencial do SUS (Sistema Único de Saúde), através dos seus princípios doutrinários de universalidade, equidade e integralidade e suas diretrizes organizativas: Descentralização, hierarquização, participação e controle social(1) veio tentando criar um programa que se aproximasse mais da humanização e da integralidade de forma a abranger a prevenção, promoção e recuperação dos agravos.

Um modelo que mudasse a forma de pensamento social do processo saúde doença e que estivesse mais próximo da população e dos seus referidos agravos comuns. Dos diversos programas alternativos e estratégicos que foram criados em prol desta consolidação do Sistema Único de Saúde, surge o Programa Saúde da família (PSF), hoje conhecido como Estratégia de Saúde da Família.

A Estratégia de Saúde da Família (ESF) é uma estratégia proposta pelo Ministério da Saúde, criada em 1994, que visa à busca da reorientação do modelo de assistência da atenção básica, baseada nos princípios do SUS. É um modelo assistencial voltado para a promoção da saúde, superando as expectativas de um simples modelo biomédico, para um olhar mais horizontal à comunidade e à família, tendo como foco, não só a prevenção da saúde, que individualiza a prevenção da doença propriamente dita, mas também a promoção da saúde que é uma forma de ampliar o olhar para todos os fatores biopsicossociais envolvidos no processo de saúde-doença(2).

Embasado nas diretrizes do SUS e em específico na Estratégia de Saúde da Família, o profissional enfermeiro tem contribuído em larga escala para a consolidação dos mesmos. Sabemos que o SUS continua sendo um desafio político, exigindo um engajamento contínuo da sociedade brasileira como um todo, para assegurar o direito para a saúde a todos os brasileiros e a enfermagem possui um grande compromisso político, possuindo mais de 1 milhão de trabalhadores no cenário de força de trabalho da saúde em todo país, tem um poder de vínculo direto com a comunidade e em específico à família dentro dessa nova estratégia de saúde comunitária(1).

Sabemos que a atuação profissional do enfermeiro “Se expressa na competência humana para o cuidar em suas múltiplas dimensões teórico-científica, social, política e sobretudo ética”(3). Diante desta afirmação, podemos avaliar que a Estratégia de Saúde da família abre novas portas para que o enfermeiro possa mostrar de forma bem ampla essas competências. Na Saúde da Família este profissional tem maior chance de obter autonomia de seus serviços prestados, tanto gerenciais, assistenciais e principalmente educativos, contribuindo assim, para a consolidação das diretrizes do SUS, que tem a atenção primária como porta de entrada desse sistema.

O presente estudo teve como objetivo fazer uma análise das produções científicas do período de 2008 a 2014, acerca do perfil profissional do Enfermeiro na Estratégia da Família e sua contribuição para a consolidação do SUS.

Revisão da Literatura

O presente trabalho trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada por meio de um levantamento bibliográfico, obtido de artigos científicos, provenientes de bibliotecas virtuais, na base de dados Scielo Scientific Electronic Library Online, uma revisão narrativa da literatura. Os artigos foram priorizados conforme o assunto priorizado no período de 2008 a 2014. Foram usados como descritores: Estratégia de Saúde da Família, enfermagem da família e saúde pública. A revisão foi feita em duas categorias: O que é a ESF e qual o perfil do enfermeiro neste programa e sua contribuição na consolidação do SUS.

Contribuição do Enfermeiro na consolidação do SUS

 

A implementação do SUS teve início na década de 90, logo após a Lei Orgânica de Saúde e das normas e portarias do Ministério da Saúde como forma de regulamentar o sistema. Mas para que o novo modelo de assistência defendido pelo Sistema Único de Saúde funcionasse de forma plena, era preciso sanar alguns problemas como: a forma de financiamentos das ações de saúde, definições de funções do governo tripartite, organizar os serviços e articulações do sistema público privado e a resistência do antigo modelo que até então era adotado(4).

Todo um processo de mudança era preciso para que essa implementação trouxesse verdadeiras mudanças à saúde, partindo além de todos os problemas citados, também das mudanças de postura dos profissionais, gestores e usuários e que equivalessem à postura holística, resolutiva e humanizada proposta pelo novo modelo de assistência(4).

O SUS através dos princípios da universalidade, integralidade, equidade, nos revela uma nova forma de intervenção e participação social, principalmente com a criação da ESF(5). O mesmo representa para o profissional enfermeiro e todos os profissionais que compõe o programa, uma conquista, pelas novas oportunidades de atuação e visibilidade na educação e promoção da saúde(5).

Como já vimos, o modelo de assistência do SUS que é de integralidade, humanização e promoção da saúde é dependente do perfil do profissional Enfermeiro, juntamente da equipe multiprofissional e de suas práticas em saúde(6).

E é dentro deste contexto onde vários programas foram formulados como proposta de melhorias na saúde e viabilidade das diretrizes do SUS e sua plena consolidação surgem então o Programa saúde da Família- PSF, hoje chamado de Estratégia, instituído a nível federal, em várias regiões do país, com o intuito de reorganizar os serviços de saúde, descentralizar, tornando acessível o controle e a participação social, a atenção básica e a municipalização de saúde. Também com o intuito de fortalecer os princípios e diretrizes do SUS(7).

O SUS ampliou as oportunidades de atuação dos enfermeiros e demais profissionais da área da saúde, representando uma grande conquista para os mesmos, principalmente em promoção da saúde e educação, que é o foco do PSF. É notório que nessa forma de estratégia, o enfermeiro vai além do nível técnico, este profissional desenvolve habilidades interpessoais, levando à integração e fortalecimento das relações entre o profissional enfermeiro, sua equipe e também com o usuário(8).

O perfil do profissional Enfermeiro na ESF

A Estratégia de Saúde da família (ESF) o principal modelo assistencial que atualmente estrutura a atenção primária à saúde (APS) no Brasil, foi criada pelo Ministério da saúde em 1994, reorganizando o modelo antigo de assistência à saúde, um modelo que focasse a saúde da família(9).

O enfermeiro tem como perfil e essência o cuidar para com o ser humano, em todas as suas totalidades e dimensões, individual, coletiva e de forma integral e holística, características estas alvo do SUS e da Estratégia Saúde da família. Sua formação deve ser feita para atuar em todas as esferas sociais: Na atenção, na gestão, no ensino, pesquisa, controle da sociedade e em ações educativas que tenham como foco a promoção da saúde, tanto da comunidade, quanto das famílias e indivíduos(5).

Desde a aprovação da portaria 648/2006, o enfermeiro vem se destacando dentro da atenção primária, hoje o mesmo já realiza consultas de enfermagem, solicita exames, prescreve medicações, embasado no protocolo de cada município(10).

Um dos papéis do enfermeiro dentro desse modelo é o cuidado longitudinal, o que contribui na consolidação da integralidade. O Enfermeiro é dos profissionais dessa estratégia quem tem o perfil fundamental para a prestação de um cuidado longitudinal, pois suas ações são baseadas, principalmente, na realização de uma assistência integral aos indivíduos e famílias na USF e, quando solicitado sua presença, no domicílio e/ou nos demais espaços da comunidade, em todas as fases do desenvolvimento humano: infância, adolescência, idade adulta e terceira idade(11).

Para que haja essa interação entre enfermeiro e família, e uma verdadeira participação social da comunidade proposta pelo SUS, um dos perfis caracterizados é o do diálogo: Esse diálogo permite ao profissional que, ao interagir com o cliente, compreenda como a família convive não tão somente em relação à cura da doença propriamente dita, mas também as questões sociais e culturais para ampliar seu espaço de conhecimento e não reduzir o papel da família junto aos serviços prestados na unidade, que ele não fique apenas como um receptor de informação sobre determinada patologia.  Deve-se considerar o contexto cultural em que a família está inserida e facilitar as relações com a comunidade(12).

O Ministério da Saúde em conjunto com o Ministério da Educação vem atuando no sentido de fortalecer a ESF e com isso dar resolutividade nos serviços dos SUS, tendo como foco principal a reorientação e ampliação da formação desses profissionais, e a partir dessas iniciativas, o enfermeiro tem direcionado seu perfil para a educação, promoção e proteção da saúde. Dessa forma, a atuação do enfermeiro se concentra em saberes que levam em consideração as inter-relações e a dinâmica da coletividade social de todos os protagonistas desse processo(5).

Esse novo modelo de cuidado, nos instiga a importância e a preocupação com a competência ética deste profissional, ter ética e competência é o mesmo que saber lidar com a demanda de forma crítica, reflexiva e resolutiva(13).

O profissional enfermeiro tem um ambiente propício dentro da Estratégia de saúde da família, e deve fortalecê-la para a consolidação do SUS, mais para isso é essencial compreender o contexto sócio- histórico e o leque das relações de poder perante o social da sua profissão, procurando se aperfeiçoar crítica, coletiva e criativamente(14).

Discussão

Após analisar os estudos, conclui-se que se destacam nos artigos revisados a importância da atuação do profissional enfermeiro para o funcionamento da Saúde da Família e como sua força de trabalho tem refletido de forma benéfica e produtiva para a consolidação do SUS.

Nota-se também que ainda persiste no programa uma lacuna na formação dos profissionais de saúde em se tratando da nova visão holística da saúde pública. Para tanto, tornam-se necessários maiores investimentos em cursos de capacitação, e uma maior abordagem desse tema na formação acadêmica, principalmente do curso de graduação em enfermagem.

A formação profissional e de recursos humanos é de suma importância para a estruturação do sistema, isso irá garantir a continuidade da assistência integral e racionalidade no gasto de recursos existentes(15).

Esses profissionais ainda se deparam com barreiras e uma forte resistência às mudanças e a dificuldade de aceitação social, dificultando a concretização do mesmo, como por exemplo, em relação à cultura curativista da população embasado no modelo anterior de assistência à saúde, onde os mesmos não assimilaram por completo a questão da educação e promoção da saúde e os verdadeiros objetivos do PSF(2).

Outros desafios ainda maiores impedem a consolidação do SUS e consequentemente o bom desempenho do profissional enfermeiro na saúde pública, como por exemplo, o financiamento insuficiente do sistema de saúde, uma discussão que se arrasta por mais de 10 anos com repasses financeiros desiguais entre as três esferas do governo, federal, estadual e municipal(16).

Também foram identificadas como desafios sobre os diferentes níveis de implantação do PSF, as realizações de visitas domiciliares que deveriam ser feitas não somente com o ACS, e sim com outros membros da equipe, como o enfermeiro da família, e que muitas vezes se ausenta das mesmas. A contra referência do atendimento aos usuários para outros níveis de atenção, indo contra ao princípio de integralidade proposto pelo SUS; falta de treinamento e capacitação dos profissionais e recursos; dificuldade em compor os membros da equipe, principalmente de médicos(17).

Conclusão

Percebeu-se na revisão de literatura, que o modelo biomédico ainda possui raízes profundas nas ações coletivas e individuais da ESF. Ainda opera a predominância dos saberes tradicionais clínicos, tanto da parte dos profissionais enfermeiros, quanto da comunidade em si. Para que haja uma verdadeira contribuição na consolidação do SUS, ainda se fazem necessárias várias mudanças, como por exemplo, o foco na promoção e educação em saúde. Faz-se também necessária uma reorganização na distribuição e repasses de verbas e estrutura econômica do sistema. Conclui-se, no entanto, que a Enfermagem já tem um papel profissional bem definido e embasado nos princípios da ESF e tem contribuído em grande escala para a consolidação do SUS, mais precisa ser reformulado e concretizado na íntegra todos estes problemas citados acima. Não deixando de ressaltar que além de todos os entraves questionados, há uma grande lacuna na formação educacional desses enfermeiros, o que dificulta o entendimento da política do programa e a realização das práticas adotadas no ESF. A Enfermagem tem uma grande missão frente à atenção primária, que é a porta de entrada do SUS, e sua força de trabalho deve ser em prol do bom funcionamento do mesmo e para que ele seja efetivo e de qualidade, sendo motivo de transformação da saúde pública do Brasil.

Referências:

1.       Sena RR, Silva KL. A enfermagem como parceira solidária do Sistema Único de Saúde . Rev Esc Enferm USP. 2011;45(2):1792–6.

2.       Roecker S, Budó MLD, Marcon SS. Trabalho educativo do enfermeiro na Estratégia Saúde da Família: dificuldades e perspectivas de mudanças . Rev Esc Enferm USP. 2012;46(3):641–9.

3.       Maria L, Villas FM, Barros M, Ara S, Pessoa R, Tim S. A prática gerencial do enfermeiro no PSF na perspectiva da sua ação pedagógica educativa : uma breve reflexão. Cien Saude Colet. 2008;13(4):1355–60.

4.       Santos EP dos. Consolidação do modelo assistencial preconizado Elenice Pinheiro dos Santos. Rev Univ Fed Minas Gerais. 2011;

5.       Backes DS et al. O papel profissional do enfermeiro no Sistema Único de Saúde : da saúde comunitária à estratégia de saúde da família. Cien Saude Colet. 2012;17(1):223–30.

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7.       Varela GC, Fernandes SCA, Queiroz JC, Vieira AN, Azevedo VRC, et al. Sistematização da assistência de enfermagem na estratégia saúde da família: limites e possibilidades. Rev Rene. 2012;13(4):816–24.

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15.     Lavras C. Atenção primária à Saúde e a organização de Redes regionais de Atenção à Saúde no Brasil. Saúde e Soc. 2011;20(4867-874).

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17.     Marsiglia RMG. Atenção Básica à Saúde em São Paulo: profissionais, instituições parceiras, usuários. Rev Cealag. 2012;2:23–9.