O PAPEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL BRASILEIRO À LUZ DO PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

 

Danilo Raimundo Lisboa Mamede[1]

 

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2. Características do Estado Democrático de Direito; 3. A atuação do Ministério Público Federal no quadro da atual Constituição Federal; 4 Conclusão; Referências.

 

RESUMO

Pretende-se mostrar a importância atribuída pela Constituição Federal de 88 ao Ministério Público, dando-se ênfase à atuação do Ministério Público Federal, no que tange à efetivação do Estado Democrático de Direito no Brasil, cujos princípios encontram-se igualmente insculpidos no referido diploma magno.

 

Palavras-chave:

Estado Democrático de Direito. Ministério Público Federal; Direitos Fundamentais. Efetividade.

 

1 INTRODUÇÃO

Num primeiro momento, realizamos algumas considerações importantes para a caracterização do Estado Democrático de Direito, mostrando um pouco da sua importância para a melhoria da sociedade brasileira.

A seguir, destacamos a grande importância atribuída pela Constituição Federal de 88 ao Ministério Público, transformando-o numa das principais instituições estatais de defesa do regime democrático no país, bem como do ordenamento jurídico nele inspirado, dando especial atenção à atuação do Ministério Público Federal, que integra a estrutura do Ministério Público da União.

Por fim, concluímos que o Ministério Público Federal, assim como todo o Ministério Público, tornou-se uma instituição indispensável para a manutenção e o aperfeiçoamento da ordem democrática no país, não podendo mais ser extinto sem prejuízo para tal regime de governo.

2 CARACTERÍSTICAS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

O Estado Democrático de Direito é um Estado no qual a legitimidade do poder político está amplamente ancorada nas leis que constituem o seu ordenamento jurídico, ao mesmo tempo em que essas leis devem ser criadas e interpretadas sob a influência de valores democráticos, os quais, por seu turno, asseguram maior participação social na tomada de decisões políticas relevantes, possuindo, portanto, um grande potencial transformador.

A configuração do Estado Democrático de Direito não significa apenas unir formalmente os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito. Consiste, na verdade, na criação de um conceito novo, que leva em conta os conceitos dos elementos componentes, mas os supera na medida em que incorpora um componente revolucionário de transformação do status quo. [2]

 O Estado democrático de direito é assim, uma configuração Estatal que preza pelo domínio da Lei, mas não de qualquer lei e sim da lei que contemple com maior efetividade os segmentos sociais de que sejam destinatárias.

O princípio da legalidade é também um princípio basilar do Estado Democrático de Direito. É da essência do seu conceito subordinar-se à Constituição e fundar-se na legalidade democrática. Sujeita-se, como todo Estado de Direito, ao império da Lei, mas da Lei que realize o princípio da igualdade e da justiça não pela sua generalidade, mas pela busca da igualização das condições dos socialmente desiguais.[3]

Ainda segundo José Afonso da Silva, fazendo uma síntese dos dispositivos constitucionais relacionados ao Estado Democrático de Direito (expresso no art. 1º da nossa Constituição Federal), temos que:

A democracia que o Estado Democrático de Direito realiza há de ser um processo de convivência social numa sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I), em que o poder emana do povo, e deve ser exercido em proveito do povo, diretamente ou por seus representantes eleitos (art. 1º, parágrafo único); participativa, porque envolve a participação crescente do povo no processo decisório e na formação dos atos de governo; pluralista, porque respeita a pluralidade de ideias, culturas e etnias e pressupõe assim o diálogo entre opiniões e pensamentos divergentes e a possibilidade de convivência de formas de organização e interesses diferentes da sociedade; há de ser um processo de liberação da pessoa humana das formas de opressão que não depende apenas do reconhecimento formal de certos direitos individuais, políticos e sociais, mas especialmente da vigência de condições econômicas suscetíveis de favorecer o seu pleno exercício.[4]

A Constituição federal de 88 criou, assim, as condições jurídico-políticas para a fundação e a gradual instauração de um Estado Democrático de Direito no Brasil, entretanto, para pôr em prática a realização desse projeto é necessária uma ampla e contínua participação da sociedade civil e do Estado no sentido de preservar todo esse arcabouço jurídico, velando pela sua correta aplicação, seja na elaboração da legislação (incluíndo as emendas constitucionais) ou de políticas públicas seja na interpretação que lhe seja dada nos mais variados âmbitos de sua aplicação em que a vida acontece.

3 A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO QUADRO DA ATUAL     CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Com o objetivo de garantir a aplicação e o cumprimento da lei que realize uma política democrática, de valorização dos diversos segmentos sociais, foi dedicada especial atenção ao Ministério Público brasileiro no texto da Constituição Federal. A Carta Magna assegurou autonomia funcional e administrativa a essa instituição (CF, art. 127, § 2º), ampliando, inclusive, seus poderes de atuação (CF, art. 129), passando a considerá-la, conforme dispõe o art. 127, caput, uma instituição “[...] essencial à função jurisdicional do Estado, [...]” que deve realizar a “[...] defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”. (grifo nosso).

O Ministério Público vem ocupando lugar cada vez mais destacado na organização do Estado, dado o alargamento de suas funções de proteção dos direitos indisponíveis e de interesses coletivos. A Constituição de 1891 não o mencionou, senão para dizer que um dos membros do Supremo Tribunal Federal seria designado Procurador-Geral da República, mas a Lei 1.030, de 1890, já o organizava como instituição. A Constituição de 1934 o considerou como órgão de cooperação nas atividades governamentais. A de 1946 reservou-lhe um título autônomo, enquanto a de 1967 o incluiu numa seção do capítulo do Poder Judiciário e a sua Emenda 1/69 o situou entre os órgãos do Poder Executivo. Agora, a Constituição lhe dá o relevo de instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.[5] (grifos do autor)

No mesmo sentido:

O Ministério Público tem autonomia na estrutura do Estado: não pode ser extinto ou ter atribuições repassadas a outra instituição. Seus membros (procuradores e promotores) têm liberdade para atuar segundo suas convicções, com base na lei. São as chamadas autonomia institucional e independência funcional do Ministério Público, asseguradas pela Constituição. As atribuições e os instrumentos de atuação do Ministério Público estão previstos no artigo 129 da Constituição Federal, dentro do capítulo "Das funções essenciais à Justiça". [6]

Segundo o art. 128, incisos I e II da Carta Magna, o Ministério Público brasileiro abrange o Ministério Público da União (MPU, cuja regulamentação está na Lei Complementar nº 75/93) e os Ministérios Públicos dos Estados (MPEs), sendo aquele formado pelo Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Militar (MPM) e pelo Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT). Nos limites deste trabalho, interessa-nos a atuação do MPF.

Pois bem. No sítio do MPF, podemos encontrar um panorama geral de sua atuação, ideal para os objetivos deste trabalho, o qual, por essa razão, reproduzimos abaixo e comentamos a seguir:

 O Ministério Público Federal atua por iniciativa própria ou mediante provocação, em todo o Brasil e em cooperação com outros países, nas áreas constitucional, cível (especialmente na tutela coletiva), criminal e eleitoral.

A instituição ingressa com ações em nome da sociedade, oferece denúncias criminais e deve ser ouvida em todos os processos em andamento na Justiça Federal que envolvam interesse público relevante, mesmo que não seja parte na ação.

A atuação do MPF ocorre perante o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça, o Tribunal Superior Eleitoral, os tribunais regionais federais, os juízes federais e os juízes eleitorais, nos casos regulamentados pela Constituição e pelas leis federais.

Também atua fora da esfera judicial, sobretudo na defesa de direitos difusos, como meio ambiente e segurança pública, por meio de instrumentos como inquéritos civis públicos, recomendações, termos de ajustamento de conduta e audiências públicas.

O MPF pode intervir em todas as fases do processo eleitoral. Nessa área, age com os ministérios públicos estaduais, que oficiam perante a justiça eleitoral de primeira instância.[7]

 O Ministério Público brasileiro deve atuar por iniciativa própria na defesa da democracia brasileira e do ordenamento jurídico atual que a sustenta, visto que essa é sua atribuição constitucional, mas, no cumprimento de seu dever, também funciona como um importante canal de comunicação para a sociedade civil, que pode sempre provocá-lo a exercer seu papel, apresentando denúncias relacionadas a qualquer fato que importe em prejuízo ao interesse público e à ordem democrática, tais como o desrespeito aos direitos humanos, aos direitos de comunidades autóctones (indígenas), de minorias étnicas, da criança e do adolescente, dos idosos, dos deficientes e do consumidor, a degradação do meio ambiente, a utilização ilegal e/ou imoral de recursos e do patrimônio públicos, atentados contra a ordem econômica, o desrespeito às regras do processo eleitoral (por captação ilícita de sufrágio, por exemplo), etc.

Nas ações judiciais que envolvam interesse público relevante, faz-se mister a presença do Ministério Público, que poderá atuar tanto como parte quanto como fiscal da lei (custos legis). O MPF tem a competência específica para ações constitucionais, cíveis, criminais e eleitorais (arts. 37, 38 e 39 da LC nº 75/93). Nas ações constitucionais o parquet defende entre outras questões, direitos fundamentais como a vida, a liberdade, etc., a estrutura federativa do Estado e o regime democrático; Nas cíveis, o direito de propriedade (um direito fundamental) e sua função social, a defesa do consumidor no mercado, em face da manifesta situação de desigualdade em que esse se encontra perante o empresariado e nas ações relacionadas ao direito de família, por exemplo; Nas ações criminais, o MPF deve zelar para que os direitos fundamentais do acusado sejam respeitados e ao mesmo tempo deve promover a persecução penal e a aplicação das penas previstas no ordenamento jurídico àqueles que, por seus atos, tenham causado algum dano à coletividade, enfraquecendo também a imagem das instituições públicas. Ademais, o MPF realiza o controle externo da atividade policial (CF, art. 129, VII), impedindo que investigações sejam conduzidas por agentes corruptos;

Por fim, o MPF atua também nas ações eleitorais, assegurando a legitimidade do processo eleitoral na escolha de nossos governantes (executivo e legislativo) e ainda estando presente em todas as demais fases do processo eleitoral, acompanhando procedimentos como os de alistamento eleitoral, duplicidades de filiação partidária, registro de candidaturas, propaganda eleitoral, votação, apuração, etc., ressaltando-se que na Justiça Eleitoral, os promotores eleitorais são membros dos MPEs e não do MPF, que têm como representantes apenas o Procurador-Geral Eleitoral, que atua perante o TSE e os Procuradores Regionais Eleitorais, que atuam perante os TREs (LC nº 75/93).

A EC nº 45/04, trouxe importante inovação para a defesa dos direitos humanos, ao autorizar, no art. 109, § 5º da CF/88, o Procurador-Geral da República (Chefe do MPF),

[...] nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte a suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal.

4 CONCLUSÃO

Os resultados da atuação do MPF nas diversas áreas mencionadas são, dentre outros, uma melhor distribuição de renda, uma melhor utilização de recursos e do patrimônio públicos, uma redução das desigualdades sociais, o respeito aos direitos humanos e às diferenças culturais, um meio ambiente mais saudável, uma ordem econômica mais equilibrada, uma sociedade mais tolerante, um combate mais intensivo à corrupção e ao crime em geral, um processo eleitoral mais legítimo, o fortalecimento da imagem das instituições públicas e, em última instância, uma melhoria na qualidade de vida dos cidadãos. É desse modo que o Ministério Público Federal, como parte do Ministério Público brasileiro, contribui diretamente para a efetivação do paradigma do Estado Democrático de Direito, plasmado na atual Constituição Federal, no país.

REFERÊNCIAS

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Atuação geral. Disponível em: <http://www.pgr.mpf.gov.br/conheca-o-mpf/sobre-a-instituicao/atuacao-geral>. Acesso em: 27 maio 2013;

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Sobre a Instituição. Disponível em: <http://www.pgr.mpf.gov.br/conheca-o-mpf/sobre-a-instituicao>. Acesso em: 27 maio 2013;

 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35 ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

 


[1]Acadêmico do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB. e-mail: [email protected].

[2]SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35 ed. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 119.

[3]Ibidem. p. 121.

[4]Ibidem. p.120.

[5]Ibidem. pp. 597-598.

[6]MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Sobre a Instituição. Disponível em: <http://www.pgr.mpf.gov.br/conheca-o-mpf/sobre-a-instituicao> Acesso em: 27 maio 2013.

[7]MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Atuação geral. Disponível em: <http://www.pgr.mpf.gov.br/conheca-o-mpf/sobre-a-instituicao/atuacao-geral>. Acesso em: 27 maio 2013.