O PAPEL DO JUIZ E O SIGNIFICADO DA DECISÃO JURÍDICA NO PROCESSO DE DEMOCRATIZAÇÃO DO DIREITO[1] 

Everton Carvalho Rodrigues[2]

Guilherme Frederico Rodrigues Silva[3]

RESUMO

Tende-se a abordar no presente estudo, as considerações que enfrentam as diretrizes dos direitos e deveres inerentes ao poder do juiz diante da legitimidade jurídica atual e historicamente relevante, e as conseqüências das escolhas do judiciário para decidir litígios dentro da tríplice função estatal no qual se encontram a sociedade complexa, o Estado e o papel do poder judiciário. Trazendo aspectos dentro do âmbito jurídicos que envolvem os poderes e limitações inerentes ao papel do juiz, como também a sua obediência a Constituição que garante a aplicação de direitos fundamentais que alcance o efetivo Estado Democrático de Direito objetivando condutas exigíveis às sociedades complexas. 

PALAVRAS-CHAVE:

Decisão. Direitos constitucionais. Juiz. Judiciário. Princípios. 

 INTRODUÇÃO

O tema a ser abordado, bem como a sua importância, é retratar uma abrangente análise da atuação do juiz, trazendo aspectos pelos quais tratem os benefícios alcançados e as preocupações que devemos ter para que direitos alternativos não possam refletir decisões conflituosas que atinjam bens jurídicos relevantes numa sociedade rotulada como complexa e que vive em constante diversidade.

É preciso também trazer aspectos relevantes que compõe e que se relacionem com o presente estudo, como os procedimentos da atuação judicial num contexto histórico, e de que forma isso influenciou o papel de “decisionismo” do juiz nos dias atuais em agir conforme a legitimidade constitucional dos seus atos e sua participação como intérprete da Lei.

Apresentar também, a importância dos princípios constitucionais como meio de controle na atividade judicial e também da participação da sociedade, pela qual essa sociedade como essência venha colaborar com o funcionamento estrutural do Poder Judiciário, sendo tal concepção uma diretriz para a legitimação democrática de qualquer Estado.

Assim, com o decorrer dessa apresentação inicial dos fatos, é que se objetiva compreender que tal abordagem é de grande valia para os aspectos funcionais de cada sociedade com a pretensão principal também de analisar a política intervencionista no papel do juiz no processo de decisões.

 

1 ASPECTOS HISTÓRICOS E A ATUAÇÃO JURISDICIONAL DO JUIZ COMO INTÉRPRETE DA LEI

Primordialmente na historicidade das escolas que estudavam os comportamentos naturais do homem, procurava saber e entender as vertentes do conhecimento humano, que também abordasse um estudo científico que defendesse os interesses da sociedade e que complementasse uma forma de conhecimento, pelo qual se ligam valores éticos, culturais, princípios morais que possam valorar uma existência de justiça, daí criou-se a ciência do Direito.

Preocupava-se então o poder estatal da modernidade existente em construir direitos naturais humanos assegurados, e então surge a figura do “contratualismo”, que segundo Noberto Bobbio (1997) de acordo com contratualismo de Locke, diz que a razão pelo qual foi criado o figurativo “pacto social”, que segundo este autor, o homem diante do estado de guerra no estado de natureza foge de seu estado natural para se incorporar diante de uma autoridade soberana para que este garanta a sua segurança, impondo regras de conduta, ou seja, ocorre a celebração do contrato entre o homem e o Estado, dando origem a uma organização societária.

Com o passar do tempo, ainda na estruturação política da modernidade, com o estudo da Dogmática Jurídica que segundo Vera Regina Andrade (1996), tal instituto foi diretamente responsável para a aplicação do direito na decisão de conflitos, proteção de direitos e produzir a ilusão de uma segurança jurídica, dando uma contribuição para o surgimento do Poder Judiciário.

E continuando a explanação sobre o contexto histórico, teoricamente a dogmática jurídica alcança a maturação de um estado soberano, ou seja, o paradigma jurídico se consolida em uma identidade estrutural, que é a relação do saber (epistemologia positiva) e do poder (estado político) como resultado da práxis jurídica moderna.

Mas como toda e em qualquer sociedade complexa, as leis têm sua eficiência em questão, pois as leis devem estar em perfeita sintonia com a sociedade, ou seja, o conteúdo das normas sofre mutações com o passar do tempo e com a mudança da sociedade, dando um aspecto de insegurança, e aqui vem o papel do juiz sendo assim fundamental, já que o conhecimento das normas depende de interpretação, pois o objetivo deste juiz é conhecer as leis, interpretá-las e aplicá-las a casos concretos.

É de grande valia a colocação de Lênio Streck quando defende:

que a tensão no Estado Democrático se volta para o Poder Judiciário, amparado pela inércia do Poder Executivo e falta de atuação do Legislativo, surgindo, assim, a expectativa de que essas falhas possam ser supridas pelo Poder julgador, justamente mediante a utilização de mecanismo previstos na Constituição que estabeleceu o Estado Democrático de Direito (STRECK apud  BARROSO, s.d.)

Tal citação expressa, que a equidade atinja a um bem comum a ser encontrado é que a missão e o objetivo do juiz além de se adequar a um comportamento judicial aceitável à Constituição, no seu papel de garantia aos direitos fundamentais, também tenham como fim, a necessidade de defender o regime democrático.

É importante o pensamento no que Roger Spode Brutti aborda e diz assim:

Um juiz que aplica estritamente o direito, que é extremamente formalista e segue rigorosamente a lei pode, muitas vezes, causar danos à justiça ou agir com injustiça. Por isso, é necessário abrandar o texto legal através da equidade que é segundo Miguel Reale, “a justiça amoldada à especificidade de uma situação real” (BRUTTI, s.d)

De fato vale ressaltar com esse pensamento que a sociedade indiretamente exige uma postura mais participativa do Poder Judiciário em todos os seus aspectos, onde este magistrado assume um papel de participante e contribua debatendo os problemas sociais para um processo de evolução que alcance o bem comum e a defesa de bens jurídicos dentro de um Regime Democrático de Direito.

Entretanto, o comportamento adequado ao juiz, não corresponde só ao que o juiz de processo produz diante aos meios de controle que lhe são oferecidos, mas também de forma a garantir que os princípios inerentes a responsabilidade do juiz lhe são impostos e resguardados, sendo tal legitimação abordada a seguir junto com a exposição dos mitos da neutralidade na composição do juiz decisional.

2 PRINCÍPIOS INERENTES À COMPOSIÇÃO DO JUIZ DECISIONAL E SUAS LIMITAÇÕES

Como forma de compreensão do tema proposto, o papel do juiz ao atender às necessidades de controle da norma positiva, mostra que a sua competência passa por implementações de princípios que o Estado lhe impôs, ou seja, o magistrado tem poderes e deveres inerentes ao seu cargo, sendo que essa conduta do juiz abordada se retrata como um escopo de contribuição para a formação e o aperfeiçoamento do magistrado que tratem a priori de fundamentação das suas decisões judiciais bem como de tratar dos limites que o cercam.

Como abordado anteriormente, o juiz tem como função primordial a se orientar para o grau de adequação do comportamento judicial em relação à sociedade como também aos princípios e valores que a soberania nacional considera como fundamentais. Assim, diante de um processo que envolve a dirimir a solução de um litígio, não somente o juiz deve intervir para que os princípios fundamentais processuais como meio de controle devem ser resguardados, mas também ao alcance de que haja uma eficiência social, ou seja, atinja-se o devido processo legal e um ordenamento jurídico funcional a satisfazer a solução de conflitos.

Outro fator importante é o posicionamento das considerações sobre a neutralidade e a imparcialidade do juiz onde citamos a passagem de J.E. Carreira Alvim que relata que:

A neutralidade do juiz, antes do que um princípio, não passa de um mito que não encontra mais eco no moderno direito processual. O processo atual, ao contrário, é campo fértil ao ativismo judicial, enquanto atividade de um julgador atuante e consciente de que a administração da justiça não se compraz com a inércia do juiz. (ALVIM, s.d.)

É de se perceber que o estudo da imparcialidade a da neutralidade do juiz se complementa com o que foi abordado no item interior no que tange a atuação do juiz como intérprete e sua contribuição, ou seja, o juiz em primazia a ele inerente deve ser imparcial, mas isso não significa que deva ser neutro.

Assim, o juiz tem uma atuação essencial diante da sociedade, pela qual ele deve interagir e está conforme ao que lhe é imposto, não podendo ignorar a realidade que o cerca. E porventura, o juiz deve observar suas obrigações dogmáticas e os limites legais de interpretação aplicando ao caso concreto.

Tal concepção faz com que o juiz, a priori, esteja aplicando os grandes princípios que norteiam o sistema jurídico brasileiro, tratados expressamente nos arts. 1º, 3º e 4º da Constituição Federal. E isto vai dar ao magistrado uma compreensão do raciocínio jurídico e, necessariamente, o conhecimento que deve ter para o enfoque dos diversos temas jurídicos.  

Porém, como alertam os positivistas, a falta de neutralidade do juiz faz com que profira as decisões judiciais de acordo com o seu pensamento, podendo extrapolar o que é de competência de seu cargo, gerando a insegurança jurídica.

Adiante será verificado quando a missão do juiz está inerente ao seu papel de juiz político, e quais as conseqüências positivas e negativas para a resolução de problemas sociais ligadas ao seu decisionismo.

 

3 JUÍZES POLÍTICOS: A POSSÍVEL SUBJETIVIDADE DECISÓRIA NO DIREITO

O que se percebe é que nos dias atuais, como já abordado, o juiz não deve se limitar somente aos princípios inerentes ao seu cargo ou está a quem de uma atividade mais próxima da sociedade, mas o juiz para entender melhor as necessidades da sociedade, ele deve exercer uma atividade política.

Diante de todos os acontecimentos que definem o papel do juiz, este muitas vezes não percebe que as autoridades devem agir de forma exemplar perante a sociedade, porém algumas posturas adotadas por estes em suas decisões podem ser consideradas reprováveis, devido ao fato que muitas decisões judiciais não apresentam a legitimidade popular, pois o fato de integrar um dos poderes do Estado significa que tem atividade social de pacificação dos conflitos e apesar de ter um cargo distinto de qualquer órgão político, este exerce, essencialmente, uma atividade política.

É bastante relevante a opinião de Régis Fernandes de Oliveira ao dizer que :

a busca permanente do justo é uma questão de consciência. Para assim ser, não pode o magistrado ater-se ao texto frio da lei. Deve saber que há vida além das páginas do processo. O juiz, neste sentido, tem que ser político, não no sentido negativo da palavra, de imiscuir-se com decisões que não lhe cabe. Mas, político no sentido de ser sensível aos problemas sociais e de saber que os pratos da balança não são e não estão equilibrados. (OLIVEIRA, s.d.)

Deste seu pensamento é importante ressaltar a importância desse juiz ter um aspecto político, o seu agir positivo diante da sociedade, devendo ser adequado a situação social e com grave responsabilidade na condução de todos os negócios públicos, como revisor tanto dos atos legislativos como dos atos administrativos.

Sobre a atuação do juiz Roberto Dromi acrescenta as seguintes palavras:

a administração da justiça eficaz requer um direito idôneo. A neutralidade e complexidade jurídicas em nada favorecem o papel institucional do Poder Judiciário. Na verdade, a justiça reclama uma politização jurídica, já que o direito é uma ordenação imposta pela razão prática, não pela razão pura. Todo direito está inspirado em uma ideologia política a qual serve como ferramenta jurídica do sistema. (DROMI apud BARROSO, s.d.)

Então, como já exposto, é independente de qualquer situação em que se encontre a sociedade sobre seu aspecto desigual, errônea ou conflituosa, o juiz deve ser humilde em saber onde errou e tentar concertar. É uma dimensão humana que faz parte de qualquer natureza humana, e que muitas vezes é “bom” que tentemos influenciar em qualquer situação, política ou não, a sua participação diante da sociedade quando tratamos de um regime democrático de direito aplicável.

 

4 O VALOR DA DECISÃO JUDICIAL E O PAPEL DO STF PARA A DEMOCRATIZAÇÃO DO DIREITO

 

A decisão judicial representa a principal ferramenta jurídica de efetivação das leis através da interpretação das normas pelos juízes, imbuídos de seus valores morais como já abordado, na tentativa de buscar adequar as normas à realidade em que vive a sociedade.

O Decidir estabelece uma relação efetiva do juiz com o mundo real e é mais do que a simples obediência às normas jurídicas, é em verdade a produção judicial do próprio Direito, ou seja, é o fazimento do Direito. É a expressão profunda da intimidade do agente da decisão, o qual julga no cumprimento de um dever de Estado e igualmente experimenta uma parte maleável de suas próprias obrigações e limites no afastamento de sua personalidade e sob a influência de procedimentos que oscilam entre o conteúdo da decisão e sua exteriorização formal, a sentença (SAMPAIO, 2009).

 

E como diz Ferraz Junior (2003, p.19), “a decisão está ligada aos processos deliberativos que levam à aplicação do Direito. A aplicação exige o poder para decidir um conflito, isto é, a capacidade de lhes pôr um fim, não no sentido de eliminá-los, mas no sentido de impedir sua continuação”. Como visto, a decisão jurídica é o meio utilizado pelos juízes para a aplicação das normas abstratas em um caso concreto, ou seja, o direito sai do mundo do “dever ser” e se concretiza no mundo “ser”.  

O Supremo Tribunal Federal, a maior instância do Poder Judiciário brasileiro, local no qual são proferidas as decisões judiciais que servem de base para resolver conflitos mais polêmicos existentes na sociedade. O STF tem como principal função, o dever de proteger a Constituição. Consequentemente, passa ter a função de garantir a aplicação das normas constitucionais, principalmente quando relacionado a assuntos sociais. Através da proteção dos direitos individuais, o STF garante a possibilidade de todas as pessoas exercerem livremente os seus direitos, respeitando os limites impostos pela lei

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Depois das informações supramencionadas, fica-se clara a importância do juiz no processo de democratização. O juiz tem o importante papel através da decisão jurídica de interpretar e adequar as normas ao momento em que se encontra a sociedade, pois como a sociedade está em constante processo de mudança, as normas poderiam não ter mais aplicação aos casos que fossem surgindo.

Como visto anteriormente, o juiz não é um indivíduo neutro de valores morais existentes na sociedade, pois o próprio juiz é um dos indivíduos que compõem a sociedade, por isso mesmo que o juiz procure ser imparcial, ele tomará suas decisões de acordo com os valores que ele possui, pois estes valores na aplicação do direito são inerentes à vontade do juiz por lhe serem transmitidos durante toda à sua vida. Porém, isso não é tão ruim, pois permite que o juiz adapte as normas de acordo com os conflitos existentes na sociedade.

Por fim, como é possível aferir com base em Ferraz Junior (2003), o juiz para democratizar o direito, deve aplicar as normas de maneira que impeça o prolongamento dos conflitos, seja ou não influenciado de valores.

    

REFERÊNCIAS

 

 

ALVIM, J.E. Carreira. Neutralidade do juiz e o ativismo judicial. [s. d.]. Disponível em: <http://www.direitoprocessual.org.br/dados/File/enciclopedia/artigos/processo_civil/28%20J%20E%20Carreira%20Alvim%20-%20NEUTRALIDADE%20DO%20JUIZ.doc >. Acesso em: 20 de maio 2010

ANDRADE, Vera Regina de. Dogmática Jurídica: escorço de sua configuração e identidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996.

BARROSO, Ricardo Cavalcante. Considerações sobre o papel criativo-político do juiz na sociedade plural. [s. d.]. Disponível em: <http://www.escola.agu.gov.br/revista/2008/Ano_VIII_junho_2008/Considera%C3%A7%C3%B5es%20sobre%20o%20Papel%20-%20Ricardo.pdf>. Acesso em:  18 de maio 2010

 

BOBBIO, Noberto. Locke e o Direito Natural. Trad. Sérgio Bath. Brasília: UnB, 1997.

BRUTTI, Roger Spode. Arma de Fogo Desmuniciada. [s. d.]. Disponível em: <http://www.datavenia.net/opiniao/armadefogodesmuniciada.htm> Acesso em: 18 de maio 2010

OLIVEIRA, Régis Fernandes de. O magistrado e a atividade política. [s. d.]. Disponível em: < http://r2direito.uol.com.br/_site/artigos/artigo_default.asp?ID=27 > Acesso em: 18 de maio de 2010

FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2003. 

SAMPAIO, Tadeu Cincurá de Andrade Silva. Decisão judicial: um simples ato do juiz que constitui “a linha da vida” dos cidadãos. Revista Jus Vigilantibus,16 de junho de 2009. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/40489/1>. Acesso em: 4 de junho de 2010.



[1] Paper elaborado para a disciplina de Introdução ao Estudo do Direito II, ministrada pela profª. Luiza de Oliveira

[2]  Graduando do 2º período de direito vespertino na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB. 

[3]  Graduando do 2º período de direito vespertino na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.