Não é novidade a preocupação com o respeito ao relacionamento entre homens e animais domésticos, principalmente nos espaços urbanos. O convívio entre homens e animais existe há pelo menos 12 mil anos, tendo se iniciado quando o homem trocou sua vida nômade pela vida sedentária baseada na agricultura. Provavelmente com a domesticação de animais para uso próprio, o homem formou rebanhos, inicialmente com cabras, carneiros e depois com outros animais. Posteriormente, foi introduzido o cão para auxiliar no cuidado do rebanho e proteger contra eventuais ladrões de animais e outros predadores.

A domesticação do gato ocorreu por volta do ano 2.000 a.C., no Egito Antigo, por sua capacidade de proteger os depósitos de grãos dos roedores e também por seus atributos místicos, tendo merecido um lugar de destaque na vida religiosa daquele povo, conforme se observa pelo templo de Bastet, a deusa felina da fertilidade[1]. No decorrer da história, outros animais foram sendo domesticados para as mais diversas utilidades, seja para trabalho, para companhia ou para fins de exibição e ornamentação. Este processo de domesticação foi marcado por contradições, oscilando entre sentimentos de crueldade e brutalidade e sentimentos de compaixão e afeto[2]. A interação entre homens e animais configura uma relação polarizada, governada pelo ser humano que, por sua vez, deve atentar-se para as necessidades de estabelecer essa posse sem prejuízo para o convívio social, com respeito ao meio ambiente equilibrado e às diretrizes de Saúde Pública.

Compete ao Poder Público estabelecer as normas para a posse responsável de animais, traçando estratégias para a contenção da população de animais errantes, o controle de natalidade de animais nas zonas urbanas, os deveres atribuídos aos proprietários, possuidores e guardiões de animais e as proibições tendentes a organizar o espaço urbano e a prevenção e controle de zoonoses. Sem esse balizamento legal, o Poder Público torna vulnerável o equilíbrio do meio ambiente e a prevenção de zoonoses, colocando em risco a Saúde Pública.

Dourados - MS conta hoje com dois cursos universitários de medicina veterinária, um curso de medicina, 2 cursos de enfermagem, 2 cursos de biologia além de ampla estrutura municipal de programa de saúde da família e agente de combate a endemias, sendo por tanto um bom exemplo. Promover a atualização, o debate e a integração desses setores para juntos melhorem a padronização das ações e com isso possa executar um combate mais efetivo das zoonoses em nossa cidade deve ser uma premissa dos entes envolvidos.

A integração de setores internos nos municípios, e destes com a sociedade e com outros municípios são de fundamental importância para a saúde pública. Considerando-se o grande fluxo migratório dos tempos atuais, manter as ações de controle e prevenção de doenças de forma isolada pode ser considerado um equivoco, já que nenhuma região do mundo pode ser considerada completamente isolada. Quando pensamos em desenvolver ações de promoção da saúde, elas não podem respeitar fronteiras, sendo, portanto o estreitamento das relações externas e o desenvolvimento de ações constantes de vigilância e de prevenção o caminho para se evitar o surgimento de novos surtos, epidemias e pandemias.

[1] Zasloff, R. L. Cats and their people: a (nearly) perfect relationship. Journal of American Veterinary Medical Association 208(4):512-516, 1996.
[2] Thomas, K. O homem e o mundo natural: mudanças de atitude em relação às plantas e aos animais, 1500-1800. São Paulo, Companhia das Letras, 1996.