O papel da educação na sociedade contemporânea: a construção de uma prática da práxis social
Eliane Marques Daher Chedier* RESUMO: Este artigo busca definir o papel que a educação desempenha na sociedade contemporânea por meio da concepção da prática como práxis social. Neste trabalho a sociedade foi definida pela ideia de projeto moderno e pós-moderno, cujas definições apresentam implicações em relação ao papel desempenhado pela educação. Partindo da ideia de uma educação que possa ser desempenhada pelo papel da práxis social, ele aborda questões relacionadas ao contexto educativo em relação à construção da prática social, usando o termo do agir comunicativo, que tem o diálogo e o consenso como os grandes definidores da ação educativa. Pensa a influência da sociedade sobre a educação e sua valorização pelo desenvolvimento de uma prática que visa garantir a participação, o compromisso e a responsabilidade dos atores envolvidos no saber-fazer da educação. E cumpre, pela práxis social em educação, a legitimidade das ações concernentes à realidade social de toda a comunidade escolar envolvida nesse processo. Palavras-chave: Educação. Sociedade. Prática Social. Práxis Social.
* Formação em Psicologia, UCP, 2000. Pós-graduação em Teoria Psicanalítica, IBMR, 2004. Professora da rede municipal de Petrópolis, 2005. Orientadora escolar da rede municipal de Petrópolis, 2014.
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O papel da educação na sociedade contemporânea: a construção de uma prática da práxis social Eliane Marques Daher Chedier A educação sempre foi um assunto presente na vida das pessoas. Para nós, educadores, pensar sobre educação é, sem sombra de dúvida, uma questão sine qua non. Devemos sempre nos questionar como a educação praticada no espaço acadêmico pode se desenvolver tão distante da vida social, comum e cotidiana das pessoas. A discussão entre o distanciamento da educação praticada no espaço escolar e a educação vivida fora dele, deu margem a pensar sobre qual o papel que a educação desempenha na sociedade atualmente. Indagamos se, na atualidade, o papel desempenhado pela educação, leva realmente, as pessoas a acreditarem que, por meio dela, possa haver a melhoria da qualidade de vida, ou se por ela, de algum modo, possa haver crescimento pessoal e desenvolvimento social. Também podemos nos indagar se há um compromisso da atuação educativa com o contexto social.
Começamos, então, a pensar na sociedade contemporânea, entendida como “projeto pós-moderno”, como salienta Pedro Goergen, em seu texto Pós-modernidade, ética e educação. Ele pressupõe que a história, como um relato além do propriamente dito, e o desenvolvimento do homem e da sociedade, foi finalizada e destituída de importância significativa. Para ele, nesse projeto, a busca deve ser a construção de uma sociedade melhor, “mais justa e humana” (2005, p. 52), defendida por uma lógica não apenas racional, mas por uma que parta de uma relação intersubjetiva, onde ações, comportamentos e atitudes possam ser legitimados em decorrência de um “agir comunicativo”1. As normas éticas e os valores morais tão aclamados pelo “projeto moderno” (Ibid, p. 8) a favor de um mundo melhor, baseado na razão instrumental, que traria uma boa-venturança a todos, saiu de cena. Agora temos uma nova proposta: “construir um mundo social mais humano e responsável” (Ibid, p. 12), com um investimento no saber e na educação, privilegiando um espaço de troca, e legitimando saberes e ações importantes à comunidade. O investimento deve ser tanto na escola quanto nas famílias e comunidades. Nenhuma mudança no cenário educativo se faz sem a garantia de investimento também nas famílias e nas comunidades.
1HABERMAS, 1989 apud GOERGEN, 2005, p. 1002.
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Pensando no mundo a partir de uma visão pós-moderna, voltamo-nos para a questão de considerar os elementos deste mundo, na sua maioria, ou totalidade, como efêmero, obsoleto e descartável, e seu modo de produção organizado para que o produto seja trocado simultaneamente. Sendo assim, não pensamos numa forma de produção permanente e perene. Ao contrário, o valor atribuído a ela é relativo e transitório. Apresenta-nos, assim, outra questão ligada à primeira, a relação entre a educação, que também se tornaria um produto de mercado, e as leis deste, as quais imporiam à política educacional a busca por melhores resultados. É notório lembrar que obter bons resultados é o que devemos buscar sempre. A questão não deve ser apenas pensar em escalonar bons ou maus resultados. Deve-se ter em mente o resultado que, pautado por uma política de melhoria da educação, indique, porventura, mudanças substanciais à prática educativa. Mas, de acordo com a política do mercado apresentada anteriormente, teríamos apenas o produto final, o resultado, ter ou não bons resultados, sem pensar no processo de crescimento e criação da pessoa humana, e sem considerar o desenvolvimento social. Encontra-se, desse jeito, uma política educacional articulada com um modo de produção, que se baseia em processos de trabalho ligados à conquista de amplos resultados de produtividade. Identificada apenas com o produto acabado.
Voltando a pensar mediante uma visão pós-modernista, se se define, mediante padrões tradicionalistas, a educação “como um agente de mudança social e basicamente mecanismo de transmissão cultural, perpetuando representações e valores” (AZEVEDO, 2010, p. 108) o papel da educação na sociedade contemporânea não deve mais restringir-se somente a tarefa de ensinar o passado no presente com a intenção de melhorar o futuro. Aliás, se pensássemos na filosofia da educação tradicionalista, como John Dewey afirma no texto Educação tradicional versus Educação progressista, teríamos um esquema impositivo de baixo para cima e de fora para dentro, onde “matérias de estudo e métodos desenvolvidos por adultos abririam um abismo perante a capacidade dos mais jovens aprenderem” (2011, p.21).
Relacionando a realidade descrita pelo “projeto moderno”, que tinha um caráter fixo, pré-determinado e concepções bem estruturadas em termos de ensinar e aprender, com a de hoje, que conta com uma realidade em constante mudança e em busca de melhores resultados, a fim de garantir uma educação de qualidade, vislumbramos outro modo de pensar e agir em educação.
Podemos pensar que a adaptação sempre inacabada do homem e da realidade nos leva intermitentemente em busca do novo, de novas formas de conceber o mundo e
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o outro, logo uma nova forma de fazer que, em última instância, traz a baila uma nova forma de ensinar, uma reflexão constante da prática educativa e um novo jeito de aprender, cujo aprendizado deva versar pela autonomia, responsabilidade social e crescimento pessoal, pensado mais sobre o processo a ser desenvolvido do que no produto final. Os ideais do mundo pós-moderno garantiriam uma maior “responsabilidade para com uma educação cidadã comprometida com [a proposta] democrática” (GOERGEN, 2005, p. 1006).
A partir das questões levantadas anteriormente, o que se pretende desenvolver nesse trabalho tem, por um aspecto, a questão do papel da educação na sociedade contemporânea, que pode vir a ser desempenhado por meio do desenvolvimento de uma práxis social. Algo que deva ser buscado no processo de construção de uma prática que se pretende dialógica. Como afirma Goergen, a “educação é compreendida como um modo de práxis social que, mediante a comunicação, promova à assunção de convicções e práticas comprometidas com a superação da desumanidade e barbárie2, que marcam a sociedade contemporânea” (Ibid., 2005, p. 1001). Já, na visão de Dewey, ao rejeitarmos ou negarmos a educação tradicionalista, devemos observar que o desenvolvimento construtivo e positivo dos princípios que poderão nortear e orientar uma nova prática educativa se apresenta como condição necessária ao seu fundamento. No caso de Dewey, ele apresenta a ideia de uma educação baseada na experiência.
O outro aspecto a ser abordado nesse trabalho, vai tentar pensar a influência da sociedade contemporânea nos dias atuais sobre o modo como a educação é praticada, que traz no seu processo de formação histórica uma tendência a pensar a escola sobre o prisma da desvalorização da importância da educação. Esta escola estaria esvaziada de sentido justamente por ter sofrido um desgaste abundante na forma como a educação foi concebida e transmitida durante séculos pela manutenção do Estado. Pela ideia de concepção social de educação, buscaremos entender a influência da sociedade contemporânea, construindo um saber que esteja vinculado a uma nova ideia de fazer a prática, logo a um projeto de educação, que busque timidamente “pequenas utopias”,
2 No Seminário de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes realizado no município de Petrópolis em 7 de junho de 2014, foi apresentado o abuso e à exploração sexual como um fenômeno social existente nas periferias da cidade. Esse fenômeno foi definido como uma barbárie social que denuncia um modo cruel como crianças e adolescentes são “usados” indevidamente pelo adulto na satisfação de suas necessidades sexuais. Seu enfrentamento depende da criação de programas e conselhos locais que se articulem em favor de uma política de combate, intervenção e tratamento, buscando nas áreas de conhecimento, como na educação, psicologia, assistência social, aliados na busca de resolução desse mal social.
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como nos fala Antônio Nóvoa (1994, p. 14). Podemos pensar, então, que a participação das pessoas no papel que a educação desempenha é fundamental. Pois, a escola só tem valor se o papel da educação perpetue às crianças e aos jovens uma nova oportunidade de serem nesse mundo atual. Já que inúmeras vezes somos portadores do discurso dessas crianças e jovens que nos falam que não gostam de estudar, que não sabem para que estudar, etc. Buscaremos entender, do ponto de vista da educação, como uma prática educativa pode vir a contribuir para a melhoria do ensino e da educação, sendo a escola um ponto de apoio, de uma possível, mudança da social. Podemos, de fato, afirmar que as ações que, atualmente, são conduzidas na prática escolar nos remetem verdadeiramente à práxis social na educação. E, se esta afirmação for positiva, que atuação temos tido para que tal práxis aconteça. Estas são algumas questões que vamos desenvolver neste trabalho.
O papel da educação na sociedade contemporânea
A educação, desde tempos mais remotos, sempre foi concebida como um fazer que partisse de uma prática. Podemos usar o exemplo de Platão, que nos mostra e defende a figura de Sócrates, como o ideal de educador. Para ele a educação, sobretudo a moral e o ensinamento da virtude, não podia ser ensinada. Para que a moral e a virtude fossem conhecidas, alguém, o mestre, deveria estimular o discípulo até que ele partejasse a ideia referente a elas. Os socráticos acreditavam que, por meio da reflexão autônoma, a pessoa devia tomar decisões de ordens práticas e assim ser um verdadeiro cidadão da Pólis. Nesta mesma época, Platão nos apresenta os Sofistas, que também tinham uma concepção sobre como ensinar a moral e a virtude, pois eles acreditavam que os princípios norteadores da conduta humana podiam ser ensinados, através do convencimento e da manipulação de conceitos. Se os Sofistas manipulam o saber da virtude e o vende aos jovens, Platão usa a figura de Sócrates para incorporar os ensinamentos e o ideal de educador. Vê-se com Platão uma reverência pelo conhecimento prático que orienta o agir da relação entre educador e educando, tornando assim a educação um efetivo fenômeno social e democrático.
Muitos outros filósofos também acreditavam na ideia da prática educativa e da sua função em transformar o ser humano pelo conhecimento. Não existe educação sem teoria assim como não podemos falar de uma prática sem teoria. As duas estão em constante ligação e devem pautar o saber-fazer da educação. Em Paulo Freire,
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encontramos a seguinte afirmação, “os homens se fazem na ação [prática]-reflexão” (2005, p. 90).
Podemos então pensar em duas vertentes para o pensamento teórico prático da educação. Uma vertente que se refere a questões individuais, que se compromete com a ideia de liberdade, levando o educando na busca de autonomia, senso crítico e responsabilidade pelos seus atos, que estaria mais relacionada, por exemplo, ao partejamento da ideia como defendia Platão. E outra vertente, que se refere ao contexto social, e defende a ideia do ser humano ser educado para ação, porque ele busca a satisfação de suas necessidades, instintos e desejos, necessitando da inter-relação para atingir a satisfação.
Podemos, assim, pensar na ideia de que a educação transpassa todas as ações humanas e tende a fornecer ao ser humano uma melhor maneira, talvez mais econômica, de satisfazer suas necessidades, seja em aspectos individuais, seja em aspectos sociais. Para Vera Werneck, em Educação e Sensibilidade, ao conceituar educação, diz: “a educação procura sempre tornar mais pessoa o homem incompleto” (1996, p. 14). É pela falta que o homem toma responsabilidade e encara uma possível resposta a educar-se. E esta resposta preencheria uma lacuna não só no modo de pensar e sentir como também no modo de agir.
No entanto, pensar a educação a partir destas vertentes, é uma tarefa árdua. Tanto a vertente individualista como a social visariam completar o espaço das necessidades do homem no intuito de satisfazê-las. Em uma visão reducionista, preencher a lacuna existente entre o homem e sua incompletude, talvez possa ser uma possibilidade do homem se tornar melhor enquanto pessoa e como ser social. Pois o homem se completa a partir da relação que mantém com o outro, o qual, por meio de uma leitura de suas necessidades, interpreta às que precisam ser satisfeitas e mediadas. E a educação seria o viés a costurar esta relação intersubjetiva: homem-ambiente; homem-necessidade; eu-homem-outro-homem. Enfim, uma relação dialética, na qual aconteceria a verdadeira educação.
Quando pensamos em uma concepção de educação, como interpretação das necessidades e imposição ao ser humano dos valores e normas vigentes na sociedade, afirmamos também que o papel desempenhado pela educação, na perspectiva de uma práxis social, não estaria buscando mediar nenhuma relação entre sujeito e objeto; ou educador e educando, e nem preocupado com algo a ser estimulado e retirado do sujeito a fim de torná-lo autor de sua própria história. Na visão de Durkheim, essa concepção
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nos revela que a educação traz como princípio a autoridade, defendendo-a apenas como transmissão conhecimento e de “valores fixos” (DURKHEIM, 2003 apud GOERGEN, 2005, p. 995), sendo a sociedade o único sujeito a direcionar a ação educativa. Nesse contexto, o papel desempenhado pela educação visaria apenas instruir o sujeito, permitindo apenas o aprimoramento das ideias e o desenvolvimento das capacidades cognitivas. E a razão é que decidiria que valores seriam ajustados às necessidades das pessoas (Ibid.,p. 11).
Hoje, ao pensarmos na educação em relação à proposta de Durkheim, não perceberíamos uma diferenciação tão evidente assim entre interpretação e imposição ou mediação e estimulação. Muitas das vezes, apesar de tentarmos defender um modelo de educação que busque uma prática social, que se ligue aos interesses da comunidade e um fazer comprometido com desenvolvimento psico-afetivo dos alunos, tentando satisfazer suas necessidades, sem que a negação ou rejeição pelo tradicional seja apenas um modismo, o que vemos são verdadeiros grilhões de autoridade e disciplina, mascarados, verdadeiramente, por um agir em conformidade às regras externas. O papel da educação sob este enfoque parte da submissão do educando, que deve respeitar as normas e as regras, e tem o educador apenas como modelo de conduta, aquele que somente ensina e exige disciplina.
A discussão que nos é pertinente fazer, mediante as considerações anteriores, mostra que temos desenvolvido apenas uma concepção de educação que objetiva o desenvolvimento de organizações psíquicas e cognitivas, e privilegia somente o conhecimento lógico racional. Pensamos que, de algum modo, a configuração da organização escolar fundamentada sobre este plano, sistematizada por um saber previamente estabelecido, e praticada por meio de conteúdos pré-determinados e dispostos em livros didáticos estaria opostamente relacionada ao “projeto pós-moderno”. E, evidentemente, sem considerar a prática social da educação como foco de atenção e atuação.
Podemos abrir um parêntese e pensar a prática educativa organizada unicamente com base no livro didático. Demerval Saviani, em Educação e pós-modernidade (1991), faz uma reflexão bem interessante sobre o livro didático e a pós-modernidade. Se esta incorpora algo de novo, recente, inovador, contra normas, padrões, clichês e regras, aquele, opostamente, enquadra, enfaixa, sugere o já visto, encerra o arcaico. Para ele, o ponto a ser abordado em relação à função do livro didático, diz respeito ao papel que gestores, orientadores escolares e professores
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desempenham na escola atualmente. Os autores da educação ficam mais voltados a modismos e “fetiche” do que a compreender o conjunto organizacional da escola, seu funcionamento e processos relacionados à prática social da ação educativa. A busca deveria ser refletir constantemente sobre o que devem fazer para mediar uma prática, que privilegia os principais interesses das famílias e comunidades, favorecendo um espaço de discussão, oportunizando o consenso entre ideias, tendo o diálogo como o mediador da práxis social da educação. É claro que não devemos fazer nenhuma apologia ao não uso dos livros. O livro didático ainda é um excelente apoio às aulas. É bom lembrar que, o que queremos pontuar, é o uso exclusivo do livro no desenvolvimento da prática educativa. O questionamento que devemos constantemente fazer, refere-se ao programa ou conteúdo da educação: “doado?”, “imposto?” ou “organizado?”, “estruturado?” por elementos que estavam ali – desestruturados –, para serem trabalhados (FREIRE, 2005, p 97). Paulo Freire nos presenteia com um ótimo exemplo para pensarmos a elaboração de conteúdo programático da educação:
“simplesmente, não podemos chegar aos operários, urbanos ou camponeses, estes, de modo geral, imersos num contexto colonial quase umbilicalmente ligados ao mundo da natureza de que se sentem mais partes do que transformadores, para, à maneira da concepção “bancária”, entregar-lhes “conhecimento” ou impor-lhes um modelo de bom homem, contido no programa cujo conteúdo nós mesmos organizamos” (2005, p. 96).
Podemos, assim, voltar ao conceito do “agir comunicativo”, visto no texto de Goergen, Educação e valores no mundo contemporâneo (2005), mas definido por Habermas (HABERMAS, 1989 apud GOERGEN, 2005, p. 1002) como uma possibilidade de legitimar a participação de todos os envolvidos no processo educativo. A relação estabelecida entre os atores não estaria relacionada aos interesses individuais e particulares, mas estaria relacionada a uma prática que levasse em consideração os interesses de todos. Ele defende o diálogo como o meio pelo qual as normas, as regras e os valores podem ser debatidos e colocados em questão. Defendendo uma política de descentralização de poder e de legitimidade de ação, que promove uma prática que se desenvolva pelo diálogo e se fortaleça pelo ambiente inerente à comunidade, ele defende:
“uma nova forma de legitimação de normas e valores que passa não pela autoridade externa, nem simplesmente pela autoridade das
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práticas objetiva e positivamente existentes, mas pelo agir comunicativo das pessoas que, mediante discurso, buscam consensos a respeito daquilo que, do ponto de vista do comportamento moral, é melhor para cada um e para todos.” (Idem, p. 1002)
Pensar o papel da educação, na perspectiva do agir comunicativo e do diálogo, na busca do desenvolvimento e amadurecimento de uma práxis social, tem como implicação a defesa da ideia de uma prática que privilegia uma participação coletiva. Todos os envolvidos no processo seriam convidados a participar das ações inerentes ao fazer educativo da escola. Juntos, equipe gestora, professores e alunos, mais comunidade, pais e responsáveis, tomariam responsabilidade pelo processo inerente à educação. Assim, o abismo ou distanciamento entre a realidade de vida comum das pessoas, do ponto da hegemonia social, e a realidade acadêmica e escolar, fosse, talvez, amenizado e transformado numa nova forma de fundamentação intersubjetiva, que buscaria um novo jeito de manejar a prática educativa, produzindo uma educação de qualidade que, de certa forma, daria conta dos anseios da comunidade, e estimularia o crescimento pessoal e social.
Desempenhar o papel de prática social leva à educação o compromisso além da aquisição de conhecimentos e informações, e desenvolvimento de habilidades. Visa uma dimensão mais ampla de sujeito, adaptada as condições necessárias “ao meio que [ele] deve viver” (Ibid., 2005, p. 1006). Pensa-se numa adaptação relativa e otimizante, cuja realidade possa vir a se transformar mediante a atividade crítica, autônoma e reflexiva. A concepção da educação com objetivo de desempenhar este papel garantiria a ela um compromisso com a cidadania, a democracia e a descentralização de poder. Além de garantir ao ser humano um desenvolvimento pleno de suas necessidades físicas, psíquicas, afetivas e sociais, levando-o à educação como um valor a ser desenvolvido.
Na discussão do papel que a educação desempenha na sociedade atual, podemos apontar que, a fugacidade inerente ao “projeto pós-moderno”, só teria outro sentido se conseguíssemos, de fato, desenvolver um espaço educativo que levasse a sério a proposta definida acima. Quando propomos um fazer, como descreveu Bauman, em uma entrevista a Revista ISTO É, “capaz de fazer o que o conhecimento nos diz ser necessário fazer” (s/d), percebemos que, o que nos falta, não é o conhecimento, e sim o agente capaz de fazer do conhecimento algo digno de prática. Imediatamente, pensamos na prática diária da educação, ao observarmos crianças, jovens e adultos, sentados
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diante do quadro e do conteúdo a ser estudado, o quanto eles, provavelmente, esperam um fazer que se revele na prática de vida diária deles. No entanto, esse dever-ser de um saber-fazer constitui-se um desafio e, provavelmente, uma possibilidade quando, idealizado, nos impulsiona a perceber o contexto social inerente a cada realidade presente em sala de aula e nos leva a pensar na parcela de responsabilidade que cada um de nós tem a cumprir.
A mudança social que devemos favorecer na e para sociedade, transitória ou permanente, não importa, é a possibilidade de fazer da educação um diferencial na vida das pessoas, onde necessidades possam ser suplantadas, amenizadas ou re-direcionadas e, acima de tudo, pessoas possam crescer com dignidade e fortalecidas em si mesmas. Só assim poderemos garantir o direito de uma educação de qualidade a todos.
A influência da sociedade na educação
Pensarmos a influência, de um modo geral, da sociedade sobre a educação é pensar a relação estabelecida entre elas, pelo menos, durante o século XX. Durante este século, a educação esteve sob a égide do Estado. No texto de Fernando Azevedo, um grande pensador da educação no Brasil no século XX, encontramos a importância dada “ao sistema educacional brasileiro [que pretendia] uniformizar, [e] homogeneizar o saber, imposta pelo Estado e pelas classes dominantes”. (1987, p. XIV). Para ele a escola somente seria um fator de mudança social se mantivesse uma inter-relação com a sociedade onde pudesse apreender dela os elementos de transmissão. A escola, na ideia de Azevedo, seria receptora e a sociedade emissora, cabendo ao Estado estabelecer a “gramática do ensino” (Nóvoa, 1994, p. 3).
A sociedade, nesta época, pensava o ensino estruturado por uma via única de fazer escola. A “gramática do ensino”, como definida por Nóvoa, pretende garantir um sistema de ensino centrado em alunos agrupados de forma homogênea, professores generalistas, ação educativa focada somente na sala de aula, horários rígidos e tempo determinado e saberes disciplinares (Id., 1994, p. 3). Podemos pensar que a força deste modelo ainda pode ser vista, mesmo que tênue, na concepção de educação articuladas nas escolas atuais. A racionalização do saber defendida desde o século XVIII até meados do século XX foi o princípio primordial de fundamentação das escolas e das sociedades modernas. Para garantir o controle social, pensou-se nas escolas das massas,
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pois garantiriam, por meio da razão e da tecnologia, o progresso nos diversos setores sociais. Daí sua força ser tão impregnante!
No entanto, este tipo de escola subserviente à ordem estatal, apenas criou injustiças sociais e a reprodução de desigualdades sociais. Não que hoje não temos injustiças e desigualdades. Dependendo de como a escola é dirigida, continuamos no mesmo processo de uma escola mantenedora de fracassos e insucessos. O que nos leva a pensar unilateralmente, mediante a ideia de uma escola organizada e construída somente pela ordem do estado, é a ideia de uma política educacional centrada apenas na defesa da objetividade do ensino. O ensino estava vinculado, única e exclusivamente, pela ideia de unificação, homogeneização e reprodução da ordem social vigente. O progresso da sociedade era medido apenas pela relação de causa e efeito: quem sabe progride e quem não sabe é excluído. O controle externo da educação, centrado na racionalização do ensino e objetivado por técnicas e práticas administrativas, exclui da educação sua capacidade de desempenhar um papel reflexivo sobre a sua própria prática. E, de certo modo, levava à educação a desempenhar o papel de reprodução da hegemonia social, cuja exclusão dos menos favorecidos economicamente mantinha a escola somente como uma máquina reprodutora do saber e mantenedora do fracasso social.
A educação-moral-estatal de uma sociedade levou à educação a um desgaste e crise generalizados. Além da desvalorização do seu papel como proposta de desempenho e crescimento e transformação social. O saber-fazer da educação não deve ser determinado unicamente por uma ordem externa. Apesar da lei do sistema educacional garantir o cumprimento do direito à educação e legitimar as diretrizes fundamentais de estruturação, organização e execução, não deve ser entendida como um fim em si mesmo. A legislação, sozinha, não pode e nem deve garantir a moralização da educação e da sociedade. A garantia de sucesso nesta relação deve partir de um projeto que busque repensar a ação educativa de forma a contribuir para diminuir, de algum modo, as desigualdades sociais. Segundo Antônio Nóvoa, atualmente:
“é impossível imaginar qualquer projeto de inovação e de mudança que não passe pelo investimento positivo dos poderes das famílias e das comunidades, por uma democratização de sucesso (e não apenas de acesso a escola), por uma participação efetiva de todos os atores sociais na vida das escolas.” (1994, p. 12).
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Pensar a escola (considerando também os espaços destinados, de um modo geral, à educação), desempenhando o papel da práxis social em educação, é ter em mente uma nova forma de atuação dos atores educacionais envolvidos. É um novo saber-fazer também da escola. O acesso à escola garantido por lei não significa realmente democratização e participação de todos no projeto educativo. O que vai legitimar a discussão e a participação de todos os envolvidos no processo educativo são seus planos de ação (plano institucional e de formação) e o projeto político pedagógico. Estes dois planos deverão articular-se e se desenvolver numa ação conjunta de equipe gestora, professores, alunos, famílias e comunidades. Após o era do Estado, estamos agora a ver uma nova forma de configuração da educação, cuja ideia de participação, nos leva a “pensar em novos moldes [de] relações entre [educação] e a sociedade” (Ibid., p. 13). As sociedades atuais, configuradas pela velocidade na comunicação e pelo avanço tecnológico, e definidas como “projeto pós-moderno”, são retratadas pelo modo como o processo na produção leva ao aumento dos resultados. Esse enfoque tem propiciado às escolas uma forma de pensar a educação também pelo aumento na obtenção dos resultados. Devemos prestar atenção, mais uma vez, aos modismos que a sociedade de hoje nos força a consumir e que nos administra docilmente. Talvez, o Estado trouxesse, com sua força bruta e impositiva, uma maneira mais evidente de irmos contra seu poder. Atualmente, as novidades chegam sutilmente ao campo educativo, e pela facilidade com que elas nos seduzem, nos tornamos presas fáceis.
Pacotes curriculares pré-desenhados, avaliações institucionais3, objetivos a serem alcançados, ensino reflexivo e crítico, recursos audiovisuais, computadores são exemplos de como podemos continuar a reproduzir os elementos da sociedade contemporânea, do mesmo modo como eram reproduzidos e determinados pelo Estado no início do século XX. Sem que façamos uma reflexão sobre o que eles vêm determinar e ajudar a melhorar o processo educativo e a prática, temos uma tendência em educação, apesar da vontade de querermos mudar, de fazermos o novo para que tudo acabe na mesma. A virtude seria o caminho a ser seguido para que a escola de compromisso social fosse desenvolvida, mas foi à lembrança de uma escola que
3 As avaliações institucionais são importantes aos sistemas de ensino. Seu objetivo é avaliar o como as instituições de ensino, escolas, estão minimamente ensinando. No entanto, o que queremos ressaltar neste trabalho é uma avaliação institucional usada apenas para escalonar resultados, sem que estes sejam considerados em seu contexto. A melhoria da qualidade do ensino só acontece pelo agenciamento da interpretação dos resultados obtidos nas avaliações e no redirecionamento da prática educativa. Caso contrário, é mais uma inovação sem sentido.
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desvaloriza a educação, que se torna medíocre na sua relação de como se ensina e se faz aprender, que nos levou a enfrentar e a defender uma prática como mediadora de uma práxis social da educação. E pensar a influência da sociedade pelo prisma da democratização, participação e compromisso social tornou-se então uma tarefa essencial.
No Conto da Escola, de Machado de Assis (s/d), podemos dizer que encontramos, em síntese, o modelo de escola que tanto queremos esquecer e que tanto desvalorizou o papel da educação. Ele descreve a escola do silêncio, das lições de leitura (silenciosas!), escrita e cálculo. Do ensino e aprendizagem distante da realidade cotidiana. Também fala da relação autoritária e coercitiva do professor em relação aos alunos. Descreve o pavor dos alunos pela palmatória. Ela era a grande vilã e sustentava a ordem, a disciplina e o silêncio. O mestre passava as lições e vigiava os alunos na obtenção da disciplina e, é óbvio, punia os que tentassem burlar a ordem. Os alunos eram aqueles que imaginavam e davam asas a seus próprios desejos, ou aqueles que manipulavam a troca do saber, ou também aqueles que controlavam e vigiavam o comportamento uns dos outros. No final, a maior lição aprendida por “seu Pilar”, personagem principal do conto, foi a corrupção e a deleção, e para nós, leitores, a imagem de uma escola que educa pelos espaços em aberto, onde o vazio é preenchido pelas motivações inconscientes4 dos atores envolvidos. Usar este conto incita-nos a pensar o quanto tivemos que vencer de preconceito, angústia e ódio para chegarmos a defender uma educação que privilegia ou, pelo menos, tenta defender outro tipo de prática. A grande contribuição que podemos trazer à prática educativa é a possibilidade de fazermos algo diferente pela educação. E essa contribuição se faz também pela influência da sociedade que, atualmente, propícia a ela maior oportunidade de participação, diálogo, compromisso, ética, formação, responsabilidade e, antes da concretude do querer fazer, o desejo de fazer da prática algo que valorize a educação.
Como já dissemos anteriormente, o valor dedicado à educação, como algo que valha e que desperte interesse nos que nela buscam, deve partir da relação existente e estabelecida entre os sujeitos que participam do processo educativo. Não se tem educação sem que haja uma relação mútua e afetiva, no sentido de ser afetado, entre as
4 Denominam-se aqui motivações inconscientes apenas conteúdos que ainda não estão em nível de uma tomada de consciência. Não se tratariam de conteúdos inconscientes que estariam envolvidos pela dinâmica de um sistema inconsciente cujas ideias o formariam.
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pessoas do processo educativo. Podemos pensar nas diversas relações estabelecidas no contexto educativo que, na maioria das vezes, são verticalizadas. Porém, nessas relações sempre tem alguém que dirige a ação do outro. Todavia, essa direção deve ser mediada pelo diálogo.
A princípio, devemos pensar como esse diálogo tem acontecido nas escolas e nos espaços destinados à educação. Quando estamos na prática educativa, docente, estamos em diálogo com os alunos, professores, pais, responsáveis e comunidade. Esse diálogo versa sempre sobre algum saber. Esse saber pode ser inerente à prática da disciplina a ser ministrada em sala de aula ou pode estar relacionado à prática diária do próprio fazer como, por exemplo, quando fazemos grupos de formação, ou reuniões de professores e pais, ou quando recebemos pais e responsáveis para uma conversa individual. Em qualquer situação, o diálogo está presente nas relações dos pares da ação educativa e é parte fundamental do fazer em educação. Sem diálogo não se tem educação. Ademais, a práxis social da educação só se faz pelo diálogo. Aliás, os elementos que formam o diálogo são ação e reflexão que se encerram na práxis da palavra cuja essência está na educação como prática de liberdade. O saber que advém dessa inter-relação deve ser considerado como fundamental no fazer prático, e sustentaria a práxis social em educação. Nele a inter-relação não só legitima a ação da práxis como faz ecoar uma palavra que conjuga ação e reflexão (FREIRE, 2005, p. 89).
Sendo o diálogo uma ação e reflexão da prática em educação, temos que nos convencer que o diálogo só é válido se tiver o propósito de mudança social ao fornecer elementos de crítica sobre o conhecimento em questão. O que se torna uma tarefa de extrema complexidade já que somos frutos de uma concepção de educação que silencia a crítica e o pensamento reflexivo. A busca deve ser entender os anseios, os interesses e as necessidades das pessoas para que possamos perceber como dialogar com elas, estabelecendo consensos e, a partir destes, fazendo-as comprometidas como o processo educativo. As implicações do fazer prático, segundo Habermas, seriam: “existência de participantes dotados de autoridade epistêmica [e] sujeitos que procurassem acordos racionais aceitáveis” (apud GOERGEN, 2005, p. 1003).
Podemos pensar que o compromisso estabelecido na relação intersubjetiva é o que deve garantir às ações de uma práxis social em educação legitimidade. Pode-se pensar que sem esse compromisso, efetivado pelo diálogo participativo, pela troca de conhecimentos e pelo consenso de entendimentos, a prática fica forjada ou mascarada por uma ação cujo objetivo acaba sendo apenas o de transmissão de conhecimentos.
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Equacionar participação e compromisso social simplifica, pelo menos em parte, o problema do distanciamento das realidades marginalizadas pela hegemonia social, que considera apenas o saber científico como verdadeiro e absoluto. Como, também, implica pensar em novos modelos de atuação em educação, cuja influência do contexto social é, sem sombra de dúvida, primordial.
A legitimidade dos novos modelos de atuação acontece através dos projetos, que são desenvolvidos e articulados nos espaços destinados à educação. Chamamos de espaços destinados à educação, as escolas de educação básica e os centros de educação infantil. Estes espaços têm como plano geral de organização da instituição a gestão de projetos. Como já falamos anteriormente, os projetos podem ser institucional, de formação ou político pedagógico. Também tem os projetos didáticos. Cada projeto tem uma função específica e objetivos próprios de ação. O que queremos encaminhar nesse trabalho, com base a novos modelos de atuação em educação, é o compromisso da equipe gestora com a elaboração dos projetos que trariam em seu bojo a intencionalidade das ações. Se o contexto social propícia e influencia um novo fazer em educação, cabe agora a participação e o compromisso de todos os envolvidos no processo educativo, como forma de reconfiguração do campo educativo, por meio desses projetos.
A discussão que podemos fazer em relação à nova configuração do campo educativo elucida, mais uma vez, a reflexão sobre que concepção de educação queremos desenvolver, que alunos queremos formar e que prática queremos desempenhar. Novamente, nos deparamos com a práxis social da educação porque não alcançaremos nenhuma destas intenções se concebermos como teoria e prática de educação uma que aja de maneira dogmática e arbitrária. Devemos nos interrogar quais seriam os princípios fundamentais que garantem a realização desse novo modelo de atuação, que deve acontecer pelas ações construídas pelo coletivo da escola. Podemos pensar estes princípios da seguinte maneira: (a) participação de todos os envolvidos no processo educativo; (b) diálogo permanente e constante, sendo retroalimentado pela reflexão das ações, focado na discussão dos interesses da coletividade, levando em consideração algo que seja importante para todos; (c) e registro das ações que são possíveis de serem postas em jogo – registrar a elaboração dos projetos.
Numa entrevista feita sobre a elaboração de um Projeto Político Pedagógico no município de Congonhas, em Minas Gerais, a ser perguntada, sobre o que achava da importância da escola na vida das pessoas, uma moradora, em sua
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simplicidade, respondeu: “aquela que atende a comunidade, que dá uma resposta a seus anseios e que mostra o caminho.” (s/ referência).
Cada espaço educativo tem sua realidade, e sua atuação deve estar direcionada à comunidade que atende. Por isso, os planos devem atuar de modo dinâmico, porque as ações devem traçar o caminho de acordo com o diagnóstico da realidade atendida. E, não serem apenas um produto do mercado pronto e acabado. E para isso, devem ser um planejamento de troca, novamente, dialógico, num movimento ascendente, sendo a prática objeto de reflexão constante e de redimensionamento de acordo com a dimensão social. Na verdade, numa ação conjunta tanto a dimensão social quanto a individual devem estar presentes. Em qualquer trabalho educativo tanto as características individuais quanto coletivas devem ser articuladas a fim de ampliar as potencialidades dos membros envolvidos. O planejamento coletivo é que vai garantir legitimidade e maior comprometimento do grupo.
Devemos entender que, na busca de um novo modelo de atuação em educação, que vise edificar uma prática social, comprometida com a melhoria do ensino e uma educação de qualidade, a descentralização, a autonomia e a participação são processos e elementos fundamentais inerentes à concepção de educação que desempenha um papel social. Viver uma educação democrática não é tarefa fácil, mas devemos tê-la como um processo a ser buscado e vivido pelo grupo envolvido nesse processo. Montar seu próprio plano de trabalho, ter compromisso com os projetos que elaborou, e participar democrática e intencionalmente das ações educativas são objetivos que construirão, indubitavelmente, uma prática social em educação.
Considerações finais
“A verdade é que só a educação cria forças vivas, a instrução não serve senão para dirigi-las.”
Fernando Azevedo, 1987, p. 81.
Pensar a educação sobre outro prisma foi o grande desafio desse trabalho. Acreditar que é possível ir além do campo da instrução e de transmissão do conhecimento, garantindo uma nova possibilidade de atuação e uma perspectiva que avança intimamente com o momento que estamos vivendo pela sociedade pós-moderna,
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como algo ainda a ser posto, nos fez caminhar na orientação da construção de uma educação melhor e mais justa, e quem sabe, com igualdade de oportunidades para todos.
Sabemos que uma mudança, seja no âmbito individual, seja na dimensão social, não é tarefa nem simples e, nem muito menos, fácil. Mas, a garantia de que ela possa vir a acontecer, só nos é possível pela capacidade de tentar fazer da educação um impulso para uma ação formatada pelo desejo de mudança. Foi pelo desejo de educar-nos pela ação conjunta entre todos os envolvidos em educação e acreditar que pela educação podemos nos transformar e transformar o outro, que a ideia desse trabalho começou a ser pensada. Nenhuma ideia é totalmente livre do contexto social do qual vivemos.
Vivemos, atualmente, um mundo ou um momento em que estamos descobrindo a possibilidade de se fazer algo diferente do que estávamos acostumados a fazer, sobretudo em se tratando de educação. Nos espaços educativos, de educação infantil e de educação básica, estamos vivenciando uma renovação em relação a muitas concepções, ideias e valores, assim como de reconfiguração da prática educativa. Estamos sempre pondo em interrogação nossa atuação e buscando algo que possa torná-la mais leve, ou talvez, menos tensa. No caso, a busca é por um fazer que trouxesse uma valorização ao próprio fazer prático. Não um fazer vazio de espaços ociosos e fragmentados! Mas um que esteja comprometido com algo a mais. E, esse a mais, nesse trabalho, garante um trabalho árduo, contudo grandioso, por se tratar da possibilidade de construir uma prática relacionada ao contexto social no qual ela se faz mediadora.
A participação e o compromisso de todos os envolvidos na atuação educativa trazem a garantia de um novo fazer em educação, o qual antes de ser tão-somente determinado e condicionado, pode ser organizado por uma lógica de investimento na inter-relação. As pessoas envolvidas nesse processo teriam a oportunidade, por meio do diálogo, de encontrarem pontos de intercessão entre os interesses individuais e coletivos, um consenso entre diferentes opiniões, buscando no “agir comunicativo” o que é o melhor para o grupo. As normas e os valores seriam o dever-ser e o saber-fazer que pudessem garantir a melhoria da educação, o direito de todos a uma educação de qualidade e a construção de uma prática educativa contextualizada pelos aspectos sociais. Não se esquecendo de garantir por meio desse investimento o crescimento pessoal e social.
Hoje temos uma realidade em constante mudança, cuja determinação de valores, regras de convivência e respeito ao próximo estão ameaçados pela falência da
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moralidade e dos costumes instituídos outrora. Precisamos garantir, agora, através da educação desempenhada pela práxis social, uma relação que, por meio da convivência, legitima o consenso e o entendimento. Assim, a força viva da educação estreitaria o encontro da vida social, cotidiana e diária das pessoas com a vida escolar particularizada e circunscrita no espaço acadêmico. E esse encontro só nos seria possível pela construção de uma prática social em educação, pelo viés responsável e comprometido dos envolvidos no processo educativo. Caso contrário, continuaríamos a desempenhar na educação o papel de meros instrutores e burocráticos do saber. E perpetuadores de uma moralidade falida!
Cabe às escolas e aos espaços de educação infantil realizar uma articulação entre “o instituinte [o pessoalmente desejável] e o instituído [o socialmente justo]”; entre a “vida concreta vivida no dia a dia com as condições sociais e materiais” necessárias a cada comunidade. E tais articulações se dariam numa “continuidade das ações numa forma conjunturalmente possível”, as quais seriam permitidas pelos atores desse processo (MARQUES, s/d, p. 144).
Então, vamos nos permitir?
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