Introdução:

Embora cada vez mais reconhecida e investigada a problemática da violência contra a mulher e suas diferentes expressões, entre elas a violência conjugal, tem muito a ser debatida; os estudos referentes a esta questão, de forma geral, têm seguido vieses que abordam a violência tendo como principal interlocutora a mulher e suas trajetórias.

Objetivamos aqui discutir a problemática da violência conjugal através uma perspectiva relacional de gênero. A questão que nos instigou a realizar este estudo foi 'desvendar quais os motivos que levam os homens a cometer violência contra suas companheiras', assim, procuramos analisar como os homens vivenciam a violência no âmbito da conjugalidade e conhecer os núcleos desencadeantes verbalizados por eles. Destarte, com uma perspectiva ampla procuramos como afirma Meyer (1996, p.44): "dar ênfase na centralidade da linguagem como constituidora dos sistemas de significação, representação e organização que os sujeitos têm da vida e do mundo".

Acreditamos ser fundamental ter uma percepção ampla sobre todo o processo de extensão da violência, considerando tanto os homens como as mulheres, atores e protagonistas não só das relações violentas, mas também das possibilidades de enfrentamento e superação.

As diferentes expressões da violência e as contribuições do feminismo

A violência é um fenômeno constante nas relações entre os seres humanos. Não se pode dizer a quanto tempo se constata sua existência. Está presente em praticamente todas as culturas, sociedades, nacionalidades e classes sociais. Ao descrever a violência alguns autores afirmam que, quando tentamos entendê-la, nos deparamos com um 'conjunto de fenômenos', que chamamos de violência. No entanto, nem sempre foi assim, muitos desses fenômenos, em outras épocas da história não teriam sido catalogados como tal. Bitencourt (2001, p. 39) escreve que:

O sentido da palavra violência tem acompanhado as mudanças da sociedade na história. Muitos fenômenos que não eram considerados como violência, passaram a sê-lo. O termo veio tomando novas e mais amplas conotações com o desenrolar da história. Mais do que nunca, na atualidade, com o desenvolvimento democrático da sociedade e com o crescimento da sensibilidade social, os sujeitos sociais passam a alargar seu conceito de violência.

Alguns tipos de comportamento podem ou não ser considerados como violência. Isso pode depender de sua herança cultural, o mesmo ato pode ser considerado violência para algumas pessoas e para outras não. É muito importante lembrar que para estudar e discutir o fenômeno da violência devemos particularizá-la. Violência em si é uma generalidade. O que existe são as violências concretas, visíveis ou não, e elas têm formas e nomes: violência física, psicológica, sexual, violência institucional, estrutural, racial, de gênero, familiar, doméstica, contra a mulher, entre tantas outras.

Segundo Saffioti (2004) há no Brasil certa confusão sobre os tipos de violência. Segundo a autora confundem-se frequentemente as categorias: violência de gênero, violência doméstica e violência intrafamiliar. Procuramos aqui sintetizar a discussão[1]:

Gênero é uma categoria mais geral que tem sido normalmente usada para descrever as relações homem – mulher, onde são naturalizadas as atribuições sociais, baseando-se nas diferenças sexuais. Todavia há que se esclarecer que o conceito de gênero, não regula apenas as relações homem-mulher, mas também de homem-homem, e mulher-mulher, ou seja, a construção social do masculino e do feminino.

Saffioti (2004) afirma que a Violência familiar, também conhecida como intra-familiar, é aquela que envolve membros de uma mesma família extensa ou nuclear, levando em conta a consangüinidade e a afinidade. Pode ocorrer no interior do domicílio ou fora dele, embora seja mais freqüente o primeiro caso.

Já a violência doméstica apresenta pontos de coincidência com a violência familiar, (pode ocorrer com os membros da família), entretanto atinge também pessoas que, não pertencendo à família, vivem parcial ou integralmente, no domicílio do agressor como é o caso de agregados, hospedes e empregadas domésticas. A violência doméstica tem lugar predominantemente, no interior do domicílio.

Outra expressão da violência é denominada violência conjugal. Segundo Teles e Melo (2002, p.22) "ocorre nas relações entre o casal e manifesta-se tanto no espaço doméstico como fora dele. Pode ocorrer entre ex-cônjuges, ou ex-conviventes, incluindo as outras relações afetivas como noivo ou namorados".

Basicamente as relações entre homens e mulheres começaram a ser polemizadas e discutidas a partir da trajetória teórica política e intelectual que algumas mulheres vem construindo especialmente a partir dos anos 70 com o chamado movimento feminista. Tais estudos trazem discussões e problematizam as desigualdades sociais, políticas, econômicas e jurídicas vivenciadas por homens e mulheres. Segundo Meyer (1996, p.41):

O feminismo procurou articular modos de resistência ao questionamento de "verdades" estabelecidas que permeiam a produção e a reprodução das relações sociais entre homens e mulheres, de forma hierárquica e desigual.

Além da publicização das relações entre homens e mulheres, outra grande contribuição do feminismo tem sido a desconstrução dos estereótipos onde as mulheres são percebidas socialmente com seus papéis e suas identidades sexuais mais ligadas ao corpo e as funções reprodutivas, (como a maternidade, a beleza, a delicadeza). Por sua vez os homens são mais associados à esfera pública, (o trabalho, a força, o poder).

Desta maneira temos assistido nas últimas décadas uma relativa mudança nas relações entre homens e mulheres, apesar de serem recentes presenciamos as significativas conquistas especialmente no que diz respeito aos direitos das mulheres, inclusive internacionalmente reconhecidos. Assim, graças as constantes lutas dos movimentos de mulheres há um processo crescente de preocupação tanto por parte das comunidades acadêmicas, quanto por parte da sociedade, e ainda que mais lenta também por parte do Estado.

 

A "dominação masculina" e os papéis atribuídos aos homens

Quando discutimos as questões de gênero, inevitavelmente vem à tona a dominação masculina. Em sua obra, Pierre Bourdieu (1995, p.137), afirma que "a dominação masculina está suficientemente assegurada de modo que não precisa de justificação", pois manifesta-se na divisão sexual do trabalho, nos discursos, ditados, provérbios, enigmas, cantos, poemas etc. Assim, as virtudes, as qualidades, as capacidades e os deveres atribuídos a homens e mulheres 'parecem' estar na ordem das coisas, como se diz algumas vezes para falar daquilo que é "normal e natural". Todavia, a dominação masculina é produzida não só no mundo social, mas também no estado incorporado, no hábitus, como define Bourdieu, onde ela funciona como um princípio de visão e de divisão, como um sistema de categorias de percepção. Ou seja, apreende o mundo social e suas divisões arbitrárias, começando pela divisão socialmente construída entre os sexos, como naturais, evidentes e inelutáveis.

Vivemos em uma sociedade que define e impõe de diversas maneiras o que são características de homens e mulheres, tanto no plano sociológico quanto no psicológico. Assim, as exigências de desempenho dos papéis femininos e masculinos impõem certas "performances" ou "comportamentos" para ambos os sexos. Ao longo da vida, homens e mulheres passarão por experiências que definirão o que é ser homem e o que é ser mulher.

Os padrões de comportamento influenciam os indivíduos nas suas percepções, preferências, atitudes e comportamentos, fazendo-os assim concordar com as expectativas sociais. Nessa perspectiva é necessário analisar as relações entre homens e mulheres considerando ambos como constituidores desse processo. Deste modo tanto os homens quanto as mulheres constroem, estabelecem e mantêm formas de relacionar e de perceber o outro. Com essa interpretação concluímos que, a submissão feminina traz uma forma de reconhecimento da dominação masculina (ainda que inconscientemente), justificando aquele que faz dela o objeto de existir como existe.

A questão do poder e as relações de violência

Alguns estudos sobre as relações de poder entre homens e mulheres apresentam a questão da dominação sob o ponto de vista único da dominação homem-mulher. Segundo Coutinho (1994, p. 21)

Foucault afirma que não existe, na verdade, o Poder enquanto objeto natural. Mas sim relações de poder como praticas sociais construídas historicamente. As relações de poder são ações que não agem diretamente sobre as pessoas, mas sim sobre as ações, já existentes ou por existir, destas pessoas (Grifo nosso).

Meyer (1996) afirma que algumas análises apresentam uma concepção de poder como sendo uno, centralizado, coerente, externo e repressor. Entretanto a autora baseada nos estudos de Foucault dá ênfase nas relações, pois estas supõem um fluxo contínuo de e entre poderes. A autora segue fazendo uma diferenciação entre as relações de poder e de dominação. A dominação seria caracterizada por um conjunto de relações de poder fixas e assimétricas onde não existe a possibilidade de resistência. Já as relações de poder são relacionais e segundo Foucault "onde há poder, há resistência". Desta maneira o poder não seria algo intrínseco e imutável pertencente somente a um dos sexos que o usaria em detrimento do outro. O poder deve ser considerado como elemento que circula nas relações, e que pode ser exercido de diferentes modos, maneiras, amplitudes e intensidades.

Entendemos assim que, tanto o homem quanto a mulher são componentes e sujeitos nas relações. Deste modo as relações de poder são estratégias e não privilégios de um e submissão de outro.Desta forma, falar em violência de gênero implica o entendimento de que homens e mulheres têm uma participação, ainda que não igualitária em função de sua condição sexual e fazem parte de um universo que legitima esta desigualdade.

Nas relações conjugais a violência tem sido comumente abordada por um paradigma que considera impreterivelmente as mulheres como vítimas. Não pretendemos negar a realidade no sentido que no âmbito das relações conjugais as mulheres são majoritariamente às pessoas contra quem as violências são cometidas, entretanto pretendemos discutir e ampliar essa condição de vítima, no sentido de serem indefesas, incapazes e passivas.

Temos percebido a partir dos estudos e das discussões (especialmente do meio acadêmico) que a violência tem sido utilizada como uma forma de resolver os conflitos entre as pessoas, um meio de afirmar vontades, interesses, opiniões e desejos. Nesse sentido considerar a questão da violência ligada às relações de poder, significa necessariamente compreender a 'dimensão relacional e circulatória do poder'. A violência não é algo natural do ser humano, é um fenômeno que acontece nas relações inter-pessoais e portanto, pode ser cometida tanto pelo homem quanto pela mulher.

O masculino enquanto verdade e modelo vem sofrendo sucessivas relativizações. Os novos traços do perfil masculino colocam em cheque a tradicional dominação do macho. Entretanto, vale lembrar que essa mudança ainda é restrita a alguns grupos de homens, e para a grande maioria os tradicionais papéis ainda são norteadores de seus comportamentos.

Se realmente desejamos novos padrões de relacionamentos entre homens e mulheres, torna-se imprescindível a desconstrução das funções e significações tradicionais. Novos sentidos para as relações de gênero que considerem o respeito próprio, o respeito ao outro e especialmente as diferenças.

Metodologia utilizada

Realizamos a pesquisa durante o período do Estágio Curricular Obrigatório, que foi desenvolvido no período de Abril a Agosto de 2006, na cidade de Salto do Lontra, Estado do Paraná. Finalizamos o processo de coleta de dados com 10 entrevistas realizadas com moradores da cidade, com idade entre 20 e 50 anos, em situação de conjugalidade e que foram intimados para depor no Juizado Especial Criminal.

Iniciamos o trabalho acreditando que a pesquisa qualitativa fosse a melhor forma de trazer as concepções dos sujeitos, como pensam suas problemáticas, quais os significados que atribuem as suas experiências, como vivem suas vidas etc. Segundo Minayo (2001, p.21):

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos a operacionalização de variáveis.

Constatamos, pois, que procurávamos obter dados tanto subjetivos quanto objetivos, sendo assim utilizamos a pesquisa quanti-qualitativa. Este trabalho é portanto o resultado de uma pesquisa exploratória cuja finalidade é socializar o produto das investigações produzindo reflexões e discussões de papéis, imagens e opiniões. Deste modo depois de realizadas as entrevistas, procedemos com a análise temática de conteúdo das mesmas buscando um "denominador comum". Nossa pesquisa utilizou basicamente as técnicas de entrevista e observação participante.

 

As entrevistas

Por meio de uma conversa inicial procuramos construir um diálogo franco e aberto procurando esclarecer os homens sobre a importância e os objetivos da pesquisa e o sigilo dos dados pessoais.

Realizamos as entrevistas com base em um roteiro previamente elaborado e semi-estruturado, que combinava questões abertas e fechadas, em que cada entrevistado teve a liberdade de falar sobre o tema proposto, podendo assim variar conforme as experiências de cada um. Segundo Minayo (2001, p.58):

As entrevistas podem ser estruturadas ou não estruturadas, correspondendo ao fato de serem mais ou menos rígidas. Assim torna-se possível trabalhar com a entrevista aberta ou não estruturada, onde o informante aborda livremente o tema proposto; bem como com as estruturadas que pressupõem perguntas previamente elaboradas. Há formas, no entanto, que se articulam essas duas modalidades, caracterizando-se como semi-estruturadas.

Todas as respostas foram consideradas elementos importantes. Finalmente, combinamos as técnicas de entrevistas e de observação participante para realização deste trabalho.

A Observação Participante

Durante nossa pesquisa utilizamos também da técnica da observação participante. Registramos no diário de campo todas as observações e informações que julgávamos importantes. Assim pudemos captar uma série de detalhes que não conseguiríamos somente com as entrevistas. Dados importantes, que não foram captados com as entrevistas, como as expressões faciais de aprovação ou desaprovação diante de alguma frase ou comentário, olhares que falaram mais do que palavras, gestos que parecem expressar sentimentos e pensamentos. Consideramos deste modo, todas as observações importantes, pois, através delas tivemos noções que poderiam não ser reveladas apenas com as entrevistas.

Dificuldades da Pesquisa

Estudar a violência em qualquer de suas expressões é sempre um grande desafio. Estudar a violência conjugal a partir da visão dos homens é um duplo desafio: o primeiro está relacionado com a dimensão da violência, fenômeno ainda restringido ao universo privado do lar e das relações (afetivas, sentimentais, sexuais, econômicas etc), entre homens e mulheres, relações estas que ultrapassam as dimensões sociais e econômicas, envolvendo também a dimensão psicológica. O segundo desafio está relacionado com o próprio objeto, pois os homens na grande maioria têm dificuldades de expressar seus sentimentos e experiências, certas dificuldades e resistências nem sempre são facilmente superáveis.

Durante a primeira aproximação (explicação dos objetivos e métodos) todos pareciam num primeiro momento concordar achar interessante e importante.Por outro lado, na hora de realizar as entrevistas a maioria dos homens que havia se disposto a concedê-la parecia estar numa situação extremamente desconfortável, visível não só com as respostas superficiais sem se expandir muito, mas também com as 'fugas' dos temas das perguntas, com os longos silêncios, com frases pequenas e aparentemente sem significado e especialmente com os elementos não verbais através dos gestos, olhar sempre para baixo, mãos suadas e que se esfregavam o tempo todo, o estalar dos dedos, as posturas corporais, as expressões faciais, as vacriações nas entonações de voz, todos esses elementos se manifestaram de forma mais ou menos explicita, todavia são componentes que escondem significados que somente o investigador pode desvendar.

Entre tantas observações que pudemos fazer uma delas diz respeito às diferentes percepções dos entrevistados sobre a pesquisa. Cremos que muitos deles interpretaram as entrevistas como uma 'oportunidade': alguns, como o momento oportuno para 'desabafar', onde alguém se dispôs a ouvi-los sem antes julgá-los ou condená-los. Outros como uma forma de alegar inocência, negando veementemente serem culpados, ou ainda justificando suas atitudes 'explicando' seus motivos e razões.

Entre perguntas quase não respondidas e expressões de desconforto ouvimos discursos emocionantes de arrependimento e lágrimas. Outros nos deixaram perplexas com a noção de homem e mulher que apresentavam em pleno séc. XXI.

A dinâmica das relações conjugais e os conflitos

Na medida em que a família tem sido historicamente considerada como espaço de proteção, de socialização, de estabilidade e de afetividade vários estudos parecem apontar a instituição familiar como também, surpreendentemente, uma das mais violentas."Afetividade e violência podem coexistir no seio das relações familiares, nomeadamente na relação conjugal" (Casimiro, 2002, p.604).

Foi a partir do exemplo concreto de suas vidas, da confissão constrangedora e da narração às vezes incômoda dos episódios dramáticos que vivenciaram é que nossos entrevistados elaboraram suas respostas.

Os relatos dos entrevistados apresentaram algumas semelhanças, mas, sobretudo diferenças quanto à dinâmica das relações conjugais e aos modos de vida. Essas diferenças provavelmente decorrem de valores distintos, acerca desses aspectos e da visão de mundo, no contexto social, econômico, histórico e cultural no qual as famílias estão inseridas.

Há uma considerável lista de fatores que contribuem para as dificuldades conjugais. Todavia não há uma regra universal para determinar quais são os fatores que levam aos conflitos, a separação, e mesmo a violência entre casais. A convivência do dia-dia, somada com as transformações ocorridas na dinâmica da sociedade podem trazer significativas dificuldades para os relacionamentos. As novas configurações sociais passam a exigir negociações de reciprocidade. Amor, amizade, carinho, compreensão e respeito, dividem espaço diariamente com as expectativas do outro, as diferenças, os problemas financeiros, as tensões, o ciúme etc.

A partir das entrevistas verificamos que, para nossos entrevistados nos relacionamentos conjugais, as divergências e os conflitos podem ser resultados da diversidade de pensamentos, da união de dois seres singulares que tem cada qual, pontos de vista diferentes, valores, razões e atitudes. Ou seja, à medida que duas pessoas com diferentes paixões, hábitos, sonhos, crenças, manias e costumes se relacionam, o conflito pode ser uma manifestação dessa relação um e outro. É difícil pensar uma relação sem conflitos.

Para os entrevistados os conflitos nos relacionamentos são acontecimentos normais, onde a mulher é tão participante quanto eles, elas são sujeitos ativos, participantes e até desencadeadoras do processo. Assim o conflito pode ter sido gerado por uma idéia não compartilhada, uma 'ordem' não cumprida, divergência de pensamentos e outras tensões. Assim:

[...] Nessa perspectiva teórica, gênero se constrói com e nelas. Lida-se aqui com a idéia de múltiplas dominações que se atravessam, reforçam ou fragilizam um poder mais plural, por isso menos centralizado. Mais, ainda visualiza-se o poder como sendo o essencialmente relacional, como exercício entre o que permite pensar a dominação de forma complexa e não mais estabelecida de forma exclusivamente unilateral, pelo pólo dominante sobre o dominado.(Meyer, 1996, p.43).

Ainda que com outras palavras os homens apontam os conflitos conjugais como uma extensão das diferenças entre homens e mulheres e também como extensão das tensões e expectativa social a que o relacionamento está exposto e o casal não consegue resolver.

Surpreendentemente não citaram o uso da força física como meio para resolver os conflitos, evidentemente que esse dado tem um por que. Para os entrevistados conflito e a violência são essencialmente diferentes.

Os conflitos entre os casais aparecem como desencadeantes da violência. Desta forma a violência se constituiu num mecanismo de regulação dos conflitos existentes. Assim as diferenças, são transformadas em símbolos de poder e dão espaço à violência, que aparece como uma manifestação de um dos sexos, na tentativa de excluir o outro sexo da luta pelo poder.

Perguntamos aos nossos entrevistados se no entender deles, eles haviam praticado algum tipo de violência. Surpreendentemente dos dez entrevistados, 09 deles assumem o fato de terem violentado suas companheiras e consideraram como violência os atos que praticaram. Como já escrevemos, os homens, quase que unanimemente, relataram que a violência começou com um conflito, uma vez que não houve uma 'solução' que os agradasse, a violência física foi o meio encontrado para dar fim ao impasse, um meio de regulação dos conflitos.

Tentando tipificar as agressões, perguntamos quais foram os atos cometidos. Utilizamos o conceito de violência física proposto por Teles e Melo (2002, p. 23) "violência física diz respeito a qualquer ação ou omissão que coloca em risco a integridade física de uma pessoa". As autoras definem ainda a violência psicológica como: "as ações ou omissões que visam degradar, dominar, humilhar outra pessoa, controlando seus atos, comportamentos, crenças e decisões".

A violência física é uma das expressões mais extremas das contradições de gênero.Revela a crueldade e a profundidade do problema. Uma forma de manter o controle, ter e afirmar o poder. Nota-se que essa prática visa o domínio do outro enquanto afirmação da virilidade, mas também como uma atitude de existência, uma maneira de ser homem em relação a si. As mulheres parecem assim, experimentar a força física dos homens como uma afirmação da sua primazia no poder e como uma punição para seus comportamentos.

Para os homens o uso da violência contra as mulheres, insere-se numa compreensão da violência, como um modo legítimo e culturalmente aceito de resolução de conflitos, como um mecanismo de manutenção e reforço do poder masculino nas relações conjugais.

Outra constatação relevante foi que os homens concebem a violência conjugal como um acontecimento que surge de forma quase que casual, sem que haja uma intenção explicita e uma premeditação por parte do cônjuge em magoar o outro. Dos nossos entrevistados 90% deles relataram que foi um "ato impensado", que foi "com a cabeça quente", agiram movidos por um impulso incontrolável e que só depois das agressões perceberam a gravidade dos fatos. Para os homens a violência é resultado de um momento de descontrole, de raiva, de desequilíbrio emocional, muitas vezes provocado pelas próprias mulheres.

O não controle sobre as emoções e "instintos" masculinossurgem como uma maneira de justificar, desculpabilizar e até mesmo de manter controle sobre as mulheres, o que, em algumas situações levaria diretamente às ações violentas.

Principais motivos que desencadeiam a violência

Para os nossos entrevistados problemas como, dificuldades financeiras, o ciúme, o consumo de álcool, questões ligadas aos filhos, o comportamento (segundo eles inadequado) da vítima, algumas frustrações pessoais e outras tensões são fatores usados para justificar e principalmente para desculpabilizar a violência cometida.

Dos nossos entrevistados 06 relataram que a violência foi conseqüência do comportamento da vítima, essa alternativa está intrinsecamente ligada a alternativa do ciúme, motivo pelo qual 05 homens confessaram ter agredido suas companheiras.

Apesar de toda essa discussão sobre a participação das mulheres nos conflitos, que supostamente desencadeariam a violência, contudo o que vai realmente estabelecer o que é tido como violência ou não é o 'bater', a ação em si. Ainda que implicitamente os homens concluem, que as mulheres são tão "participantes", quanto os homens durante os conflitos, porém na ação, no ato da violência elas acabam se tornando vítimas, especialmente no que diz respeito à violência física.

A partir da análise das entrevistas, elencamos as principais razões que, segundo nossos entrevistados levam à violência. De maneira geral os entrevistados verbalizaram como principais motivos: o não cumprimento por parte das mulheres das tarefas que lhes são tradicionalmente designadas, algum acontecimento relacionado com o comportamento da vítima, o enfrentamento do comportamento masculino; questões relacionadas aos filhos e a frustração das 'expectativas do outro'. O nascimento dos filhos implica fortes mudanças em termos de relacionamento familiar, talvez um afastamento entre os cônjuges, uma mudança da visão homem e mulher e as implicações de pai e mãe, com suas responsabilidades fiscalizadas pelo sexo oposto.

Outra constatação que tivemos com as entrevistas reside no fato de que a violência às vezes pode residir no fato de algumas expectativas não serem cumpridas. O fato de que os papéis e condutas tradicionais começarem a serem questionados e a sofrerem algumas modificações, cria inevitavelmente, alterações também na vida do casal, em termos de saber quem detém o poder, e a autoridade. À medida que alguns homens não conseguem cumprir o papel socialmente reservado a eles pode também, ser um fator na compreensão da violência conjugal.

A violência, portanto, cumpriria o papel de reafirmar a dinâmica do relacionamento ameaçada pelas atitudes e comportamentos das mulheres. A violência estaria assim duplamente legitimada: pela provocação das mulheres e pela pressão social para que o homem responde. O medo da fraqueza e a agressividade (reprimida ou liberada) também devem ser considerados, pois a grande maioria dos homens não aprendeu a falar e a trabalhar com o que sentem.

Ser 'homem' implica poderes e privilégios, mas também em deveres, e todas as obrigações inscritas na masculinidade. Assim como afirma Bourdieu (1995, p.158) o "dominante é também dominado, mas por sua dominação". A necessidade dos homens se mostrarem sempre fortes e capazes, de viverem em campos competitivos, de serem permanentemente provedores, de limitarem a expressão dos seus sentimentos, de não poderem revelar suas angústias, fraquezas e medos, além de reproduzir a ideologia masculina tem situado os homens cotidianamente em jogos de poder, desvalorizando e oprimindo o feminino e convertendo-os em seus próprios opressores.

A partir da discussão acima nota-se que os estereótipos (enquanto expectativas, enquanto características de homens e de mulheres) exercem influência na percepção de modelo conjugal, no comportamento e na relação entre os sexos. As percepções, preferências, atitudes e comportamentos tanto masculinos quanto femininos tendem a concordar com as expectativas sociais.

Finalmente perguntamos para nossos entrevistados se em algum momento eles se arrependeram das violências praticadas. Dos 10 entrevistados 08 manifestaram-se como arrependidos. Segundo os depoimentos os principais sentimentos gerados nos próprios homens com a violência foram à culpa e a vergonha. As declarações de arrependimento dos entrevistados, alegando sentimentos como o medo e a vergonha estão associados como já citamos, com o medo de não poder ver os filhos, ou ainda com o desejo de voltar à antiga vida conjugal. Contudo, nenhum dos entrevistados citou diretamente, uma preocupação com a mulher, com sua saúde, com os problemas que poderia ter causado, enfim, todos estavam mais preocupados com as consequências que a violência poderia trazer para eles mesmos.

A simetria nas relações conjugais

A violência conjugal não raramente tem sido entendida como uma espécie de destino, uma fatalidade, que tanto os homens quanto as mulheres exercem um papel naturalizado de agressor e vítima, respectivamente. Assim tanto homens se julgam superiores como também as mulheres se julgam subalternas. O que facilita o surgimento das categorias vítima e agressor.

Analisando os dados das entrevistas, acreditamos ser imprescindível mencionar que para nossos entrevistados parece não haver um consenso de que seja o homem o único responsável pela prática da violência nas relações conjugais. No entender dos homens a mulher contribui categoricamente para a violência conjugal. Assim uma das dimensões dessa violência, naturalmente trazida pelos homens é a participação feminina.

Deste modo para os homens, a violência masculina é uma reação, e não uma ação. Uma reação às atitudes das companheiras. Agem motivados por um impulso incontrolável, um momento de irracionalidade desencadeado pelas mulheres e, há sempre uma razão legítima para bater nas companheiras.

Entretanto, segundo Olívia Rangel: "insistir no vitimismo implica 'naturalizar' a violência contra a mulher, o que equivale a considerá-lo como um problema insolúvel: vitimizadas, incapazes de enxergar uma saída e, sobretudo, de lutar por elas as mulheres estariam eternamente condenadas ao suplício".

No entanto, com a contribuição de alguns estudos como o de Cláudia Casimiro (2002), é possível verificar como as próprias mulheres reconhecem que podem ser violentas. A violência feminina raramente utiliza a força física, entretanto recorre a outros meios tais como: agressões verbais e psicológicas, chantagens emocionais e com os filhos, o silêncio, a recusa a praticar relações sexuais entre outras. Alguns autores denominam como micropoderes.[2] Independentemente da questão quantitativa de quem no casal agride mais ou menos, vários trabalhos científicos apontam no sentido de se poder falar de uma violência familiar ou conjugal, praticada tanto por homens como por mulheres.

As pessoas parecem encontrar na violência, em qualquer de suas expressões um meio de subjugar o outro a seus planos e projetos, que muitas vezes sequer são explicitados. O controle nas relações significa ter o poder de decidir quando, como e o quê deve ser feito, ou seja, o poder de decidir sobre como os conflitos devem ou não ser resolvidos pelo casal.

Com base nas entrevistas podemos afirmar que, a violência conjugal reside onde as diferenças, os conflitos, as dificuldades, enfim onde as relações interpessoais ainda não conhecem o limite, não respeita a individualidade do outro, mas a submete ao jogo dos estereótipos e dos papéis socialmente construídos.

A violência conjugal como questão jurídico-social e a Impunidade

No que diz respeito à violência contra a mulher, especialmente a cometida pelos companheiros, notamos que as principais críticas dos movimentos de mulheres, do meio acadêmico e diria até que as principais queixas das vítimas dizem respeito à falta de políticas públicas voltadas à problemática e a impunidade dos agressores. A inoperância de medidas legislativas tem contribuído com a perpetuação da violência contra a mulher. Há uma tendência de banalização e de omissão, uma vez que a violência tem sido considerada como "elemento natural" nas relações conjugais.

Mesmo que o fenômeno da violência esteja previsto na legislação enquanto crime, o que se nota é o reinado da tolerância. Isso se tem percebido no sentido de que as práticas ainda que não intencionais de desmobilização da mulher - tanto no que se refere aos constrangimentos a que tem sido submetida e a culpabilização pela violência vivenciada quanto à falta de possibilidades de enfrentamento jurídico-social da violência - dificultam quando não impedem o enfrentamento do problema.

É indiscutível o fato de que as mulheres têm se deparado com a ineficiência do sistema jurídico e com a ausência de políticas públicas eficazes que coíbam e previnam a violência e a discriminação. Elas continuam sendo o principal alvo de seus parceiros, que quase sempre acabam impunes, ou, se condenados a pena aplicada tem um caráter meramente punitivo e não trabalha com as origens do problema.

De maneira simplificada a função do Estado é garantir a segurança de seus cidadãos, como também assegurar a paz social, tendo como norte a Constituição Federal. Uma vez que alguns dos cidadãos cometem um crime, um delito ou uma infração o Estado aplica-lhe uma pena. Em sua obra "Dos Delitos e das Penas" Cesare Beccaria (1998, p.85) afirma que a intervenção do Estado tem por finalidade: "impedir o réu de fazer novos danos aos seus concidadãos e de dissuadir os outros de fazer o mesmo". Deste modo as penas tem por objetivo primordial afastar o infrator da sociedade como forma de punição e prevenir novos crimes. Assim a pena imposta ao condenado visa, ao mesmo tempo puni-lo pelo ato que cometeu e servir também de exemplo para que os outros cidadãos não cometam tais atos.

Ao longo da história o papel, a finalidade e as formas de punição vêm sido discutidas, chegou-se à conclusão de que "enjaular" um indivíduo, açoitá-lo e submetê-lo a penas extremamente severas não são suficientes para reduzir e inibir os delitos.

Sabemos que a pena privativa de liberdade, ou seja, a prisão historicamente faliu, problemas como: a superlotação carcerária, a ociosidade dos presos, o elevado custo do sistema, a reincidência, e outros problemas têm mostrado sua ineficiência. A humanidade aprendeu a conviver com ela, mas também conheceu as suas conseqüências.

Valendo-se das experiências nacionais com os sistemas prisionais (Carandiru, Bangu I e II etc), acreditamos que devemos tentar outras formas de punição que não somente a privativa de liberdade.

Nosso trabalho procura mostrar como se estabelece e se legitima a violência na dinâmica das relações, bem como a influência dos papéis socialmente atribuídos a homens e mulheres. Vale lembrar que não temos intenção de justificar e desculpabilizar as práticas violentas, mas sim refletir que, uma vez que a própria sociedade contribui de diversas formas com a violência, seja pela imposição de papéis, pela omissão na prevenção, pela falta de possibilidades de enfrentamento, então como podemos culpabilizar os indivíduos? E ainda se a nossa luta é pelo fim da violência e principalmente pelo reconhecimento das diferenças, não podemos acreditar que um sistema de punição violento possa ser um meio para isso.

É certo que nenhuma das propostas de punição (nem a privativa de liberdade, nem as penas alternativas), podem dar garantias de que não haja reincidência. Certamente o sistema punitivo deve remodelar as formas, o controle, e execução das penas, pois da maneira como estão sendo aplicadas atualmente, tem se mostrado ineficientes.

Trouxemos o debate da aplicação das penas privativas ou alternativas, procurando refletir o que comumente temos chamado de impunidade. O debate sobre a função, aplicação e a efetividade das penas não se esgota com essa breve discussão. Todavia torna-se indispensável refletir o que realmente queremos como punição para os agressores, especialmente nos casos de violência contra a mulher. Será que a tão denunciada impunidade, não revela na verdade o desejo por penas vingativas comprovadamente inadequadas como a privativa de liberdade?

O Serviço Social e Propostas de Políticas Públicas

O Serviço Social é uma profissão que tem como característica principal, a intervenção nas relações sociais. As práticas sociais constituem o campo mais específico de sua intervenção. Segundo Iamamoto (2004, p.26): "Os assistentes sociais trabalham com as mais diversas expressões da questão social, esclarecendo a população seus direitos sociais e os meios de ter acesso aos mesmos". A violência e suas diversas expressões, sem dúvida, fazem parte das novas interfaces da questão social. Desta forma, o Assistente Social desempenha papel fundamental junto à esta problemática e sua intervenção ocorre junto à identificação do problema, na correta informação e orientação em relação aos direitos, e especialmente nas possíveis formas de enfrentamento da questão.

Como 'operador de direitos' o profissional do Serviço Social deve desempenhar suas competências e atribuições, quais sejam: conscientizar homens e mulheres em relação a seus direitos contribuindo no seu processo de emancipação; orientá-los na perspectiva de capacitá-los como sujeitos políticos a enfrentar os embates no processo de correlação de forças intrínseco à lógica do sistema capitalista. Para tanto como afirmam Lisboa e Pinheiro (2005) é necessário conhecer a realidade para poder intervir. No caso da violência, ter uma visão ampla sobre todo o processo: as origens, os atores, as formas de enfrentamento tanto no plano individual como no coletivo são imprescindíveis.

Para tanto, o assistente social pode contar com diversos instrumentos, dentre eles destacamos as ações sócio-educativas trazidas por Lima (2004, p.6):

Estas ações se caracterizam como um processo de ensino-aprendizagem na relação dialética entre profissional e usuário cuja finalidade é contribuir para que as condições geradoras dos problemas sociais sejam superadas [...]. Podem, portanto, ser operacionalizadas através de duas abordagens: a individual e a grupal, sendo que esta última pode ser realizada sob diferentes modalidades [...].

Nesse sentido, as ações sócio-educativas são realizadas em situações nas quais se pretende a transformação da atitude do usuário no contexto das relações sociais, de acordo com o compromisso ético-político proposto para a profissão na perspectiva da defesa, garantia e efetivação de direitos, com a finalidade de emancipação dos indivíduos enquanto sujeitos.

Considerando toda a discussão proposta neste trabalho, sugerimos, como propostas de políticas públicas a construção e implementação de grupos reflexivos, oficinas, palestras, cursos, e atividades de formação que contemplem a questão de "gênero" em seu sentido mais amplo, que trabalhem tanto com homens autores de violência quanto com as mulheres em situação de violência, potencializando não só as mulheres, principal alvo, mas os próprios homens para que sejam multiplicadores da "nova cultura", e que assim cada vez mais homens façam parte dos grupos de debates e que estejam preparados para combater todas as formas de violência no seu dia-dia.

Pretendemos, portanto afirmar a importância de se propor, apoiar e realizar discussões, reflexões e debates no âmbito da prevenção, ou seja, a desconstrução dos papéis, o reconhecimento e o respeito pelas diferenças entre homens e mulheres.

Essa transformação deve ultrapassar as salas das universidades, dos núcleos de estudos e pesquisas, enfim, os debates teóricos. Uma mudança de paradigmas no âmbito acadêmico, buscando efetivamente socializar o conhecimento produzido através de intervenções orientadas pela aplicação social do conhecimento (Extensão- Universitária). Precisa promover uma possibilidade verdadeira de igualdade entre homens e mulheres. Existem no Brasil algumas iniciativas como as dos Institutos NOSS, PRÓMUNDO e PAPAI, além de Campanhas como a do LAÇO BRANCO e outras que, apesar de serem poucas em relação à demanda existente, são exemplos de como.

As denúncias de falta de políticas públicas para mulheres em situação de violência, normalmente estão ligadas ao atendimento emergencial, ou seja, aquele que se faz necessário logo após o sofrimento da violência como as delegacias especializadas, os abrigos, as casas lar, os centros de atendimento[3] entre outros. Urge a necessidade do Estado como principal ator, das Ongs, Instituições e Organizações, reconhecerem a violência doméstica como um problema social e que demanda urgentemente o seu enfrentamento.

Lamentavelmente é raro encontrarmos no país um Estado que tenha uma rede de proteção capaz de atender toda demanda. Em muitos Estados não existem casas Lar, abrigos e as delegacias especiais quando existem têm se concentrado nos grandes centros, dificultando o acesso da grande maioria. Poderíamos nos alongar e muito na lista das limitações das políticas públicas, no entanto, não é essa nossa intenção. Desejamos apenas refletir que, ainda que insuficientes em termos da relação demanda – oferta e precisando urgentemente de investimentos as políticas públicas não devem dedicar-se exclusivamente ao emergencial. Estas sim têm sua singular importância, todavia acreditamos que não são suficientes para extinguir com a violência em nossas sociedades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho procurou demonstrar, como as diferenças entre homens e mulheres são socialmente construídas e como a violência nas relações conjugais acontece. Deste modo, procuramos contribuir para o debate da violência contra a mulher, através da transformação da cultura patriarcal buscando o alcance da eqüidade de direitos entre homens e mulheres. Uma educação para o Gênero no sentido de que assim como os papéis que até hoje são atribuídos a homens e mulheres foram culturalmente criados, que eles possam ser descontruídos, como afirma Saffioti (1994, p. 227): "A construção da ideologia de gênero, procede através da naturalização das diferenças que foram socialmente construídas, podendo, por conseguinte, ser transformadas." Acreditamos que a sociedade pode ser transformada, basta que reconheçamos que a mudança é necessária.

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[1] Para maiores informações, consultar SAFFIOTI (2004, p.69 e seguintes).

[2] VerSAFFIOTI (2004, p. 80).

[3] Para maiores informações consultar: BIELLA, Janize Luzia. Mulheres em Situação de Violência – Políticas Públicas, processo de Empoderamento e a Intervenção do Assistente Social. TCC/DSS/UFSC, 2005.