Segundo Touraine, desenvolvimento seria a passagem de um tipo de sociedade a um outro, o que supõe que cada um desses tipos seja definido não por um nível de modernização, mas por um conjunto de características especificas.

As sociedades dependentes são submetidas a uma dominação mais econômica do que política. É, pois, nestes países que existe a mais forte separação entre a economia e a política, e onde os atores sócio-políticos ou mesmo ideológicos desempenham o papel mais central.

A América Latina pode ser considerada como o principal conjunto de sociedades dependentes no mundo atual. Portanto, é o modo de desenvolvimento dependente que deve ocupar um lugar central em sua análise. Entretanto, ela é formada por países diversos o suficiente para que não se possa encontrar em todos um modo único de desenvolvimento. Se a referência aos modelos central e jacobino é, sobretudo, ideológica, salvo, em certa medida, os países do Prata no início do século XX, se o modelo pós revolucionário permaneceu relativamente marginal em um continente onde as tradições estatizantes e autocráticas eram fracas, o modo dependente pode transformar-se em modo pós-colonial ou, de forma oposta, em modo bismarckiano de desenvolvimento. A primeira tendência é mais visível na América Central e no
Caribe, zonas de forte penetração do sistema colonial; a segunda é visível no México e, sobretudo, no Brasil, país em que desde o início da era pós-colonial, existe um Estado nacional forte.       

Os países da América Latina, ao adquirirem autonomia política, não superaram a condição originária da economia colonial: a dependência. Tornaram-se países de economia extremamente dependente e limitada, sem a infra-estrutura necessária para produção de capital para investimento interno, e com a maioria da produção voltada para o exterior em detrimento da produção voltada para o mercado interno. Neste sistema capitalista dependente a categoria dominante é o setor financista, os trabalhadores assalariados
tornam-se a principal categoria popular e os trabalhadores do setor informal se tornam os excluídos.

Um modo de desenvolvimento pode ser diretamente transformado em sistema de formas de ação coletiva. A cada uma das dimensões principais do modo de desenvolvimento corresponde uma característica da ação social e política.

A segmentação das categorias tem efeitos políticos e sociais diretos: as confederações sindicais são freqüentemente mais fracas que as federações e, sobretudo, que os sindicatos de grandes empresas. O mesmo se dá no interior das profissões independentes. No Chile é necessário definir a posição da cada grupo profissional em vez de falar em geral das
classes médias. As grandes categorias sócio-profissionais são dualizadas. Esta segmentação das classes sociais se traduz pela ausência de correspondência entre situação objetiva e capacidade de ação, isto é, pela fragilidade das classes sociais. Estas têm uma fraca capacidade política, não se organizam politicamente através de um sistema representativo, e esta conclusão se aplica tanto aos dirigentes de empresa estudados no Chile, Argentina ou Brasil, quanto às classes populares.

Uma conseqüência da heterogeneidade social e da ausência de correspondência entre situações e condutas é a simultaneidade das etapas sucessivas da evolução, o que torna difícil caracterizar de uma única maneira os países latino-americanos. Jamais as categorias que definem um tipo de sociedade são suficientes para descrever as condutas dos atores, pois
estes se compreendem melhor através do processo de desenvolvimento de que eles são os atores que através das situações sociais e do nível de modernidade que representariam. É impossível separar estrutura social e processo de desenvolvimento na América Latina, de modo que as categorias de análise da ação social devem ser sempre mistas, combinar as referências a uma estrutura social e a um processo de mudança histórica.

Existe um modo latino-americano de ação social, definido por uma interdependência estrutural das categorias ligadas à industrialização, à dependência e à modernização. Neste contexto, atores e modos de ação pertencem sempre, ao mesmo tempo, a um tipo de sociedade e a um processo de desenvolvimento. Não existe, em geral, relação de representatividade entre grupos sociais, forças políticas e expressões ideológicas, mas, antes,
uma fusão entre essas diversas ordens e uma conseqüente desarticulação, destruindo toda uma correspondência direta entre elas.

Na América Latina não existe uma nítida separação entre a sociedade civil e o Estado. O
Estado intervém constantemente como ator político, cultural, social e econômico, e, de sua parte, os atores sociais respondem mais diretamente às intervenções do Estado do que às iniciativas de outros atores políticos.

O modo de desenvolvimento latino-americano não tem princípio central ou ator hegemônico; ele combina, sem integrá-las completamente, várias dimensões e componentes da ação social. Por esta razão, ele é frágil, dando toda liberdade a uma dualização que tende a opor núcleos
modernos e zonas cada vez mais marginalizadas, empobrecidas e em crise. Para não se decompor, ele supõe a existência de forças poderosas: a intervenção do Estado, que possui uma grande capacidade de mobilização de setores populares, é a principal destas forças. A história da América Latina é a do confronto entre forças de integração político-sociais e forças que, de um lado, representam a manutenção de um importante setor marginalizado e excluído, e de outro, a existência de uma categoria privilegiada, associada a um capitalismo dependente e limitado.

Seja na Argentina, no Brasil ou no Chile, o nível de vida dos trabalhadores tem sofrido grandes desgastes. Este fato acarreta o fortalecimento dos sindicatos, dando a estes, grande influência
política. Assim se deu, não só o desenvolvimento do sindicalismo, mas também a formação de um movimento operário revolucionário, isto é, a associação das reivindicações sindicais e da vontade política e ideológica de modificar um antigo regime dominado pelas oligarquias e pelo capital estrangeiro e caracterizado por grandes desigualdades econômicas e sociais.

O nível elevado de participação sócio-cultural, pelo menos nas cidades, tem como principal conseqüência a predominância das categorias políticas sobre as categorias sociais. Militantes
sindicais definem-se primeiro pelo partido a que pertencem antes de se referirem à sua filiação sindical. No Chile, os sindicatos são autônomos possibilitando um dinamismo social também autônomo. Já na Argentina e no Brasil, o sindicalismo está acoplado ao Estado. É o chamado sindicalismo coorporativo, um sindicalismo vertical, estruturado sobre um grupo de agentes permanentes que asseguram a transação das demandas sociais. Na Argentina este
recebeu o nome de sindicalismo falangista, e era acoplado ao partido justicialista, domínio político do peronismo.

Referências Bibliográficas:

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Teoria de Política Comparada
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. Rio de Janeiro. 1989.

KARL, Terry Lynn. Dilemas de la democratizacion en
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América Latina A Fines de Siglo. Fondo de Cultura Económica. México.
1995.

TOURAINE, Alain. Palavra e
Sangue
. Editora da Unicamp. São Paulo, 1989.