Luciana Machado Prazeres**
Mariana Barros de Lima**

SUMÁRIO: Introdução; 1 Administração gerencial; 2 Aplicação da administração gerencial no Brasil; Conclusão.

RESUMO
Considera-se a administração gerencial enquanto modelo de administração pública baseado na desburocratização da atividade administrativa bem como na sua descentralização, priorizando os resultados e seu controle. Aborda-se a administração gerencial, de maneira geral, quando de seu surgimento, - em que contexto e como este modelo se manifesta - bem como os motivos que levaram a tal. Analisa-se, por fim, a aplicação desse modelo de administração publica na realidade brasileira.

Palavras-chave: Administração Gerencial. Descentralização. Resultados. Brasil.


INTRODUÇÃO

A administração pública moderna que se caracteriza pela descentralização, que direciona-se aos resultados e para seu controle, é a chamada administração pública gerencial, que põe em plano secundário os processos.
A partir da Segunda Guerra mundial, a tendência observada, universalmente, vem sendo a substituição do modelo da administração burocrática ? que se baseia, prioritariamente, no controle dos processos ? pelo modelo da administração gerencial, que será caracterizado ao longo do trabalho.
Tratando-se desse modelo de administração ? administração gerencial ? no contexto da realidade brasileira, tem-se que o Brasil desde meados dos anos 60 também se voltou para a adoção desse modelo, ao conceder autonomia administrativa e financeira às autarquias e fundações públicas e ao propiciar a contratação de funcionários pelo regime trabalhista.


1 ADMINISTRAÇÃO GERENCIAL

A administração pública gerencial surgiu na segunda metade do século XX, com objetivo de buscar meios aptos a enfrentar a crise fiscal do Estado; como estratégia para reduzir custos e tornar aqueles serviços a cargo do Estado mais eficientes; atuar de maneira a proteger o patrimônio público; e descontentamento com a administração pública burocrática.
Assim Bresser Pereira (p.5, 1996) faz a seguinte análise:

Após a II Guerra Mundial há uma reafirmação dos valores burocráticos, mas, ao mesmo tempo, a influência da administração de empresas começa a se fazer sentir na administração pública. As idéias de descentralização e de flexibilização administrativa ganham espaço em todos os governos. Entretanto a reforma da administração pública só ganhará força a partir dos anos 70, quando tem início a crise do Estado, que levará à crise também a sua burocracia. Em conseqüência, nos anos de 1980 inicia-se uma grande revolução na administração pública dos países centrais em direção a uma administração pública gerencial.
Os países em que essa revolução foi mais profunda foram o Reino Unido, a Nova Zelândia e a Austrália. Nos Estados Unidos essa revolução irá ocorrer principalmente a nível dos municípios e condados - revolução que o livro de Osborne e Gaebler, Reinventando o Governo (1992) descreverá de forma tão expressiva. É a administração pública gerencial que está surgindo, inspirada nos avanços realizados pela administração de empresas.
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O aspecto gerencial da administração pública manifestou-se, primeiramente, na Grã-Bretanha (1979) e nos EUA (1980). Na Grã-Bretanha, a administração gerencial foi aplicada ao serviço público, logo após a posse do novo governo, com a implantação de uma reforma administrativa intensa e bem-sucedida, inspirando reformas ocorridas também na Nova Zelândia, Austrália e Suécia - governos sociais democratas.
Em 1922, nos EUA, durante a gestão do Presidente Clinton, foi promovida a reforma da administração pública federal por critérios gerenciais, reinventar o governo passou a ser programa do Governo. Na França, 1989, no Governo do Primeiro-Ministro Michel Roccard. Todos esses governos de enfoque democrata.
Dessa forma, a administração pública gerencial surge como resposta à expansão das funções econômicas e sociais do Estado, como também, ao desenvolvimento tecnológico e à globalização da economia mundial, uma vez que ambos deixaram à mostra os problemas associados à adoção do modelo anterior.
Sendo assim, a administração gerencial surgiu quando a burocrática já não se mostrava apta a atender anseios democráticos surgidos na sociedade. Essa nova modalidade de administração baseia-se em descentralizações política e administrativo, como exemplo das mudanças adotadas, pode-se citar: a flexibilização na organização da organização, o controle dos resultados ? características inversas àquelas que valorizavam os processos administrativos ? além de uma administração voltada para o atendimento do cidadão/usuário e aberta ao controle social.
Ainda com Bresser Pereira (p.6, 1996), tem-se características da administração gerencial quando do seu surgimento:
Aos poucos foram-se delineando os contornos da nova administração pública: (1) descentralização do ponto de vista político, transferindo recursos e atribuições para os níveis políticos regionais e locais; (2) descentralização administrativa, através da delegação de autoridade para os administradores públicos transformados em gerentes crescentemente autônomos; (3) organizações com poucos níveis hierárquicos ao invés de piramidal, (4) pressuposto da confiança limitada e não da desconfiança total; (5) controle por resultados, a posteriori, ao invés do controle rígido, passo a passo, dos processos administrativos; e (6) administração voltada para o atendimento do cidadão, ao invés de auto-referida.

O Estado gerencial tem uma administração baseada em concepção democrática e plural, que busca desburocratizar toda a estrutura administrativa, busca amoldar as organizações públicas aos seus objetivos prioritários, que são os resultados, aceitando, dessa forma, uma maior participação dos agentes privados e/ou das organizações da sociedade civil.
Sendo assim, Estado batizado com administração gerencial apresenta como objetivos principais atender a duas exigências do mundo atual: adequar-se à revisão nas formas de atuação do Estado, que variam de acordo com a realidade do país; e atender às exigências das democracias de massa contemporâneas.
2 APLICAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO GERENCIAL NO BRASIL

A idealização pela implantação de uma administração pública gerencial já é bastante antiga em nosso país. Em 1936, através do DASP ? Departamento Administrativo do Serviço Público ? foram introduzidos no Brasil os princípios da administração burocrática clássica, tal Departamento representou os primeiros passos por uma mudança e reforma administrativa no país.
Por outro lado, em 1938, com a criação da primeira autarquia, surgi os primeiros sinais por uma implantação de uma administração pública gerencial. Dessa forma, começa a surgir a idéia de que os serviços públicos que tinham a funções executivas e não formuladoras de políticas ? administração indireta ? deveriam ser descentralizados e não seguir a todos os requisitos burocráticos da administração direta.
Nesse contexto, vale dizer que no Brasil, a primeira tentativa por uma implantação de administração pública gerencial, aconteceu por volta do final dos anos 60, através da criação do Decreto-Lei 200/1967. Tal Decreto deu partida as primeiras reformas administrativas no país, quebrando a idéia do sistema burocrático e fazendo brotar as primeiras idéias por uma reforma administrativas, esgalgada em uma administração pública menos burocrática e mais eficiente.
Ainda vale frisar que o Decreto-Lei 200, acima citado, promoveu a transferência das atividades de produção de bens e serviços para as autarquias, fundações, sociedade de economia mista e empresas públicas. O decreto em comento baseou-se nos princípios da racionalidade administrativa, o planejamento, o orçamento, a descentralização e o controle de resultados, dando impulso à descentralização através da autonomia da administração indireta, proporcionando maior eficiência e melhor resultado da administração descentralizada.
É importante ressaltar que com o Decreto-Lei 200, as unidades descentralizadoras passaram a contratar empregados, submetendo-se ao regime privado de contratação de trabalho. Buscava-se uma maior eficiência nos serviços e nas atividades econômicas do Estado, através da flexibilização de sua administração. Por outro lado, ainda vale mencionar, que tal decreto trouxe conseqüências inesperadas, a devido ao fato destas terem promovido contratação de empregados sem concurso público, facilitando práticas patrimonialistas.
Todavia, no início dos anos 80, através da criação do Ministério da Desburocratização e do Programa Nacional de Desburocratização, ocorreu uma nova tentativa na busca por uma reforma na burocracia e pela implantação na direção da administração pública gerencial, objetivando-se a revitalização, agilização das organizações do Estado, a descentralização da autoridade, melhoria e simplificação dos processos administrativos e resultados mais eficientes.
No início dos anos 90, a reforma administrativa tornou-se a ser discutida no meio a uma crise econômica (aumento inflacionário). Porém, foi governo de Fernando Henrique Cardoso que tal reforma passou a ser tema central em nosso país. Nesse governo, ficou evidente para a sociedade brasileira que essa reforma apresenta-se como condição de reajuste fiscal do Estado, implantação de um serviço público atualizado, profissional e eficiente, voltado para atender os cidadãos de forma mais eficiente e menos burocrática.
Nessa esteira de pensamento trago à tona o que reza Alexandrino (p.83, 2007)
a partir da década de 90, tem-se observado, no Brasil, uma significativa mudança de mentalidade, ao menos por parte dos detentores do poder político e de importante autores, sobretudo nas áreas econômicas e jurídica, no que se concerne às relações entre o Estado, especialmente a Administração Pública, e os diversos setores da sociedade.

Entretanto, foi através da criação do "Plano Diretor da Reforma do Estado" que a proposta da Administração Pública Gerencial teve sua linha traçada. Esta apresentou-se como uma nova forma de gestão pública, mais eficiente, célere, descentralizada, moderna e mais voltada para o controle de resultados do que para o controle de procedimentos. Voltada ainda para a democratização, que exige a participação, cada vez mais no pólo ativo, dos cidadãos na gestão pública.
Por outro lado, a Ementa n°19/1998, foi a mais importante ferramenta legitimadora da tão desejada reforma administrativa, por esse motivo ficou conhecida como "Reforma Administrativa". Com a elaboração da Emenda em comento, foi autorizado ao Poder Executivo qualificar como agência executiva a autarquia ou fundação que houvesse celebrado contrato de gestão com o respectivo ministério supervisor, para o fim de cumprir objetivos e atingir metas, com estes acertados.
Ainda é oportuno frisar, sobre as modificações oriundas da criação da Ementa supramencionada, o que reza Alexandrino (p.64, 2007):

as modificações nas relações Estado-agentes públicos, Estado-entidades privadas e Estado-entidades empresarias têm sido gradualmente implementadas desde então, por meio da edição de leis e atos infralegais regulamentadores das diretrizes inseridas na Constituição pela Ementa.

Por fim, ainda vale enumerar as principais modificações oriundas da "Reforma Administrativa", baseada no modelo de administração gerencial. Segundo o ilustre doutrinador, já citado, Marcelo Alexandrino (p.65-66, 2007), as principais alterações dela decorrentes dessa reforma foram:
1- flexibilização das relações jurídicas funcionais entre a Administração e seus agentes públicos: abolição da exigência de regime jurídico único (o que possibilitou, na esfera federal, a contratação de empregados públicos regidos pela CLT, pela Administração Direta, autarquias e fundações públicas federais), flexibilização da estabilidade dos servidores estatuários, redução de direitos e vantagens legais dos servidores públicos; 2- possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos da Administração Direta, mediante a celebração de contratos de gestão; 3- previsão de ampliação da autonomia administrativa de autarquias e fundações públicas, que podem ser qualificadas como agência executiva mediante celebração de contrato de gestão com o respectivo ministério supervisor, para o fim de cumprir objetivos e metas com estes acertados; 4- parcerias com as pessoas jurídicas privadas, sem fins lucrativos, não integrantes da Administração, para a prestação de serviços de utilidade pública e assistenciais, visando à futura transferência ao setor privado dessas atividades, com estímulo (repasse de recursos públicos) e fiscalização do Estado (celebração de contratos de gestão, possibilidade de desqualificação); 5- previsão de um novo estatuto próprio para as empresas públicas e sociedades de economia mista exploradoras de atividades econômicas, integrantes da Administração Indireta, que poderá prever, entre outras coisas, regras mais flexíveis para licitações e contratações; 6- alterações na forma de criação das entidades da Administração Indireta que passa a ser feita diretamente por lei específica apenas nos casos das autarquias e por ato próprio do Poder Executivo no caso das demais entidades, após autorização e lei específica; 7- acréscimo, ao caput do art. 37, CF, do princípio da eficiência que passa a ser princípio expresso, informador de toda a atividade administrativa.


CONCLUSÃO

Assim, conclui-se que a administração pública gerencial surge na segunda metade do século XX, como resposta, de um lado, à expansão das funções econômicas e sociais do Estado, e, de outro, ao desenvolvimento tecnológico e à globalização da economia mundial, uma vez que ambos deixaram à mostra os problemas associados à adoção do modelo anterior, administração pública burocrática.
Tem-se, por conseguinte, que o modelo gerencial tornou-se realidade no mundo desenvolvido quando, através da definição clara de objetivos para cada unidade da administração, da descentralização, da mudança de estruturas organizacionais e da adoção de postura moderna no interior do Estado, se revelou mais capaz de promover o aumento da qualidade e da eficiência dos serviços sociais oferecidos pelo setor público. Em suma, afirma-se que a administração pública deve ser aberta à maior participação dos agentes privados e/ou das organizações da sociedade civil e desviar o foco dos procedimentos para os resultados.
Ademais, na administração pública gerencial a estratégia é direcionada para a definição precisa dos objetivos que o administrador público deverá atingir em sua unidade, para a garantia de autonomia do administrador na gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros que lhe forem colocados à disposição para que possa atingir os objetivos contratados, e para o controle dos resultados.
Por fim, observas-se que a necessidade de tornar a administração pública mais ágil e flexível para responder aos novos desafios impostos, principalmente, pela redução de receitas públicas dos estados nacionais e a uma maior cobrança de resultados, pela sociedade, motivou a implantação da administração publica gerencial em vários países, dentre eles o Brasil.


REFERÊNCIAS

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. Da administração pública burocrática à gerencial. Revista do Serviço Público, 47, (1) janeiro-abril 1996. Disponível em: <http://bresserpereira.org.br/papers/1996/95.AdmPublicaBurocraticaAGerencial.pdf>. Acesso em: 20 maio 2009.

ALEXANDRINO, Marcelo; DE PAULO, Vicente. Direito Administrativo. 13ªed. ver. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2007.