Esperamos pela luz, mas contemplamos a escuridão.

Isaías, 59:9

Extraído de "A República" de Platão. 6° ed. Ed. Atena, 1956, p. 287-291

O diálogo entre Sócrates e Glauco, escrito a mais de dois mil anos pelo filósofo Platão, demonstra a relação entre a ciência e à ignorância. De forma alegórica, mostra como os seres humanos acorrentados desde a infância no interior de uma caverna, apenas conseguem contemplar sombras projetadas na parede, tendo essas visões como a mais fiel e única realidade.

Entretanto, um deles consegue se libertar segue o caminho que leva para fora da caverna, e se depara com outra realidade, a realidade das idéias puras. Retorna para o interior da caverna a fim de mostrar aos outros o verdadeiro caminho, as sombras não são tudo que existe. No entanto, os demais, acostumados às sombras e acreditando que elas são toda a realidade, não dão ouvidos e nem se motivam a conhecer essa outra realidade, tal mito também mostra que nossa percepção da realidade é muitas vezes limitada pelos nossos sentidos.

Essa metáfora demonstra a condição humana perante o mundo em termos de conhecimento, educação, ética, política, a fuga do senso comum para uma visão mais organizada, lógica e verdadeira do Universo que nos cerca.

Muitas pessoas consideram que a época em vivíamos em cavernas, onde nossa percepção de mundo era limitada, e nossos pensamentos eram adubados por mitos esta nas páginas dos livros de história, porém tal realidade Platônica acontece hoje em dia e de uma forma meramente simples que poucos conseguem perceber.

No dia a dia, no interior de nossas casas, não temos correntes que nos envolvem e nos impedem de irmos em direção a luz, mas criamos um meio moderno de amordaça feito com material mais resistente que o aço das correntes, seu efeito é mais devastador.

Na alegoria da caverna as correntes prendiam somente a matéria, ou seja, o corpo, esse novo tipo de grilhão sufoca a mente e o corpo essa nova amordaça nos tira a vontade de conhecer a realidade, nos torna alienados e acomodados. Essa amordaça necessita de eletricidade, que a nossa televisão nos mostra por vezes é como se fosse a única verdade a revelação absoluta, constrói e destrói ao seu bel prazer, nos vestimos, nos comportamos como a tela mostra.

Eis aí o comportamento da sociedade atual, as sombras (informações fornecidas pela mídia) são fortemente controladas. Vivemos numa moderna caverna social, somos os prisioneiros modernos, meros reprodutores da versão oficial estabelecida pelos órgãos de comunicação sem perceber que se trata na verdade de um círculo vicioso.

Na opinião de Peter Winterhoff-Spurk, a televisão atual é uma espécie de "sociedade de encenação". Está a criar-se "um caráter social, que facilmente se excita, é superficial, teatral, e tem uma mentalidade egocêntrica e pouco estruturada". Podemos dizer que é como a sociedade do pão e circo, mas os tempos são piores a caixa(televisão) apenas nos oferece o circo, e é capaz de exercer efeitos negativos sobre qualquer indivíduo se usada como única ponte para o mundo.

É fato que a televisão é presente no dia a dia de grande parte da população mundial, produzindo costumes, gostos, hábitos, maneiras diferentes de se portar diante da sociedade, que não são nossas e nem se assemelham a nós. E pior, vamos adotando como referência os donos dessas imagens, permitindo que eles se tornem tutores da nossa cidadania. Desde o berço somos acostumados a idolatrar as coisas de fora, principalmente dos EUA, e vamos absorvendo como se fosse nossa a cultura deles. Como conseqüência, vamos deixando de lado a nossa própria forma de pensar. E não há nessa afirmação nenhum caráter xenofobico, mas uma simples constatação, boa parte dos desenhos que as gerações que cresceram nos anos 70 e 80 assistiam foram fortemente influenciados ideologicamente a uma determinada cultura.

Outra razão para a overdose de TV está no fato dos pais não terem muito tempo ou recursos para dedicar-se aos filhos, que usam a TV como "babá eletrônica".

Qualquer professor sabe o quanto é difícil dialogar e transmitir valores a alunos superexpostos à caixa (televisão), muitas das nossas crianças não lêem livros em hora alguma e boa parte não brincam com amigos.

"A televisão deforma o caráter" e tem "graves consequências para a família, a vida profissional e a política", afirma o psicólogo alemão Peter Winterhoff-Spurk. Na obra, intitulada "Corações frios - como a televisão molda o nosso caráter".

Não devemos poupar esforços para divulgar os conhecimentos científicos de forma correta e clara, atacar o vírus do analfabetismo científico, da mesma forma o declínio da compreensão dos métodos da ciência prejudicam a capacidade de escolha política e põem em risco os valores da democracia.