O LIVRAMENTO CONDICIONAL

No Processo Penal brasileiro[1], o livramento condicional é a liberdade provisória outorgada ao apenado possuidor de certas condições objetivas e subjetivas, como a ausência de periculosidade, e o cumprimento de parte da pena. Assim, encontramos no Código Penal o seguinte regramento:

Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:

I - cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

II - cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;

III - comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto;

IV - tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;

V - cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Ainda que o livramento condicional seja efetivamente a última etapa dentro do cumprimento da pena[2], o mesmo visa à reintegração do apenado dentro do contexto social, como uma forma de estimulo a sua regeneração.

O LIVRAMENTO CONDICIONAL NOS CRIMES HEDIONDOS

A lei 8.072/90 previa no § 1º do seu art. 2º que o condenado por qualquer crime hediondo ou assemelhado estaria sujeito ao cumprimento da pena no regime integralmente fechado[3], ao passo que, igualmente perdurava a previsão legal do livramento condicional com o cumprimento de 2/3 da pena por crimes desta espécie, respeitando os limites da reincidência, onde tal benefício não era cabível, dando forma ao inciso V do artigo 83 do Código Penal.

No ano de 2006 o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do cumprimento integralmente fechado para condenados por crimes hediondos, razão pela qual, foi possibilitada a progressão de regime para sentenciados por estes delitos, sem que houvesse, qualquer menção ou alteração do livramento condicional dentro deste contexto, haja vista a sua previsão legal anterior.

Preceitua o inciso V do artigo 83 do Código Penal, o que segue:

Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:

(...)

V - cumprido mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza

No que tange ao termo “reincidente específico”, importante suscitar que tal terminologia[4] refere-se ao agente que, tendo sido condenado de maneira irrecorrível por quaisquer dos delitos expressos no rol de crimes hediondos e assemelhados, novamente comete um deles, devendo ser atentado o artigo 64, inciso I do Código Penal, ou seja, se o sujeito é condenado por latrocínio e depois novamente por tráfico de drogas, a sua pena deverá ser cumprida sem direito ao livramento condicional.

Acompanhando o diploma legal, a jurisprudência do TJ/RS é clara neste sentido:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. REINCIDENTE ESPECÍFICO. 1. O agravante mostra inconformidade com a negativa de concessão ao livramento condicional, dizendo haver violação aos princípios da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana a negativa aos reincidentes específicos. 2. Segundo o teor do art. 83, V, do CP, reforçado em entendimento jurisprudencial do STJ, é vedada a concessão do livramento condicional ao réu reincidente específico em crime hediondo ou a ele equiparado. Precedentes. AGRAVO NÃO PROVIDO. (Agravo Nº 70054001920, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em 19/06/2013)

AGRAVO EM EXECUÇÃO (ARTIGO 197, DA LEP). LIVRAMENTO CONDICIONAL. INCONFORMISMO DEFENSIVO. Condenado que cumpre pena pela prática dos delitos de homicídio qualificado e de tráfico de entorpecentes. A constatação da reincidência específica do réu em delitos de natureza hedionda, pela prática de homicídio qualificado e tráfico de drogas, obsta a possibilidade da concessão do benefício, conforme artigo 83-V, do CP. Manutenção da decisão que indeferiu o benefício. AGRAVO IMPROVIDO. (Agravo Nº 70050811751, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em 22/11/2012)

A REVOGAÇÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL

A revogação do livramento condicional encontra amparo nos termos do artigo 86 do Código Penal, que menciona:

Art. 86 - Revoga-se o livramento, se o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível:

I - por crime cometido durante a vigência do benefício;

II - por crime anterior, observado o disposto no Art. 84 deste Código.

Neste viés[5], caso a revogação da condicional seja motivada pela incompatibilidade entre a pena em execução e uma pena posterior resultante de delito diverso cometido antes da concessão do benefício da primeira pena, é possível a obtenção de um novo livramento, ou seja, é cabível a manutenção da liberdade para um indivíduo mesmo após uma segunda condenação sofrida na vigência do livramento condicional, sendo tal hipótese cabível caso o período de pena a cumprir durante a primeira condenação venha a ser suficiente para a obtenção do livramento condicional mesmo com a soma das duas condenações.

Assim, supondo que um réu condenado a X anos de reclusão por uma primeira condenação por crime comum venha a obter o livramento com o cumprimento de 1/3 da pena, e, transcorridos alguns anos em liberdade, e, portanto na vigência do benefício, o mesmo venha a sofrer uma segunda condenação a Y anos por um segundo delito, caso o período já livrado até aquele momento represente pelo menos metade do total das duas penas (efeito da reincidência para a concessão do livramento), o indivíduo, poderá seguir em liberdade.

Contudo[6], caso a revogação advenha por qualquer motivo diverso, não será computado na pena o tempo em que o condenado ficou livre, bem como não será admitida a concessão de outro livramento no condizente a mesma pena.

No condizente a revogação facultativa da liberdade condicional, o magistrado deverá ouvir o reeducando em uma audiência de justificação, onde poderá revogar o benefício, aplicar uma advertência, ou agravar as condições do cumprimento para o liberado. Nestes termos, preconiza o artigo 87 do Código Penal:

Art. 87 - O juiz poderá, também, revogar o livramento, se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade

Outrossim[7], caso o liberado venha a sofrer nova condenação por qualquer contravenção ou crime cuja pena não seja privativa de liberdade (multa ou restritiva de direitos), o livramento será facultado ao juiz, não importando se este novo delito tenha sido cometido dentro ou fora do período de concessão do benefício.

Por fim[8], da decisão que revogar o livramento condicional caberá agravo em execução, nos termos do artigo 197 da Lei de Execução Penal.

OS EFEITOS DA REVOGAÇÃO DA CONDICIONAL

Os efeitos do livramento condicional[9] encontram-se descritos na normal penal contida no artigo 88 do Código Penal, que preconiza:

Art. 88 - Revogado o livramento, não poderá ser novamente concedido, e, salvo quando a revogação resulta de condenação por outro crime anterior àquele benefício, não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado.

Desta forma[10], a revogação do livramento condicional irá acarretar o retorno do reeducando ao cumprimento da pena em que foi concedido o benefício, impedindo a concessão de um novo livramento a partir da pena em cumprimento; e vetando o aproveitamento, na pena já cumprida, do período em que esteve solto, exceto quando tal condenação superveniente for por crime anterior, já que, neste caso, a revogação não se deu por descumprimento das condições do benefício, conforme extenuado anteriormente.



[1] MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. Editora Saraiva, 7ª Edição, 2009, p. 227.

[2] MARTINS, Sérgio Mazina. Execução Penal. Parte I. Jurisprudência organizada e comentada. Revista do IBCCrim, n. 19, p. 333.

[3] MARCÃO, Renato. Livramento condicional em crimes hediondos e assemelhados após a declaração de inconstitucionalidade do regime integral fechado. (art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90). Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 980, 8 mar. 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8073>. Acesso em: 10 jun. 2014.

[4] JESUS, Damásio E. de. Reincidência específica e livramento condicional. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/2402>. Acesso em: 10 jun. 2014.

[5] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo e Execução Penal. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 979.

[6] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo e Execução Penal. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 979.

[7] MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. Editora Saraiva, 7ª Edição, 2009, p. 212.

[8] MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. Editora Saraiva, 7ª Edição, 2009, p. 213.

[9] MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. Editora Saraiva, 7ª Edição, 2009, p. 208.

[10] MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. Editora Saraiva, 7ª Edição, 2009, p. 208.