1 SINOPSE DO CASO

 

Com o advento da Terceira Etapa da Reforma do Código de Processo Civil, passou-se a questionar acerca da novidade trazida pela Lei de n. 11.277, a qual se deu com a possibilidade do julgamento de causas repetidas, pelo juízo de primeiro grau e sem a necessidade de citação do réu.

Ocorre que, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, aqui como protagonista, tendo por assembléia a decisão de insatisfação com a referida lei, propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3695-DF, cujo relator é o Ministro Cezar Peluso.

Adiante, se analisará a constitucionalidade acerca da Lei de n. 11.277, tendo como pressuposto a ADI proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil bem como os princípios constitucionais. Ademais, identificando qual seria a decisão mais adequada a ser tomada pelo Supremo Tribunal Federal.

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

 

O Código de Processo Civil sofreu inúmeras modificações ao longo dos anos a fim de se adaptar às inovações e ao dinamismo das relações processuais. O referido artigo 285-A incluído no CPC em 07 de fevereiro de 2006 tem particularidades que despertaram inúmeras críticas e discussões sobre a sua constitucionalidade.

O que se deve levar em consideração é que o artigo apenas ampliou o caráter das decisões de mérito sem citação do réu. Entende-se que essa não limitação da matéria pelo termo “unicamente de direito” e “casos idênticos” amplia a possibilidade do convencimento do juiz utilizando o dispositivo com certa liberdade. A intenção do legislador foi conferir maior celeridade ao andamento das ações.

O que se mostra agora é o adiantamento da sentença de determinada matéria, já decidida anteriormente, e aplicada se houver o convencimento do magistrado enquanto seu enquadramento no caso atual. No entanto, fica facultado ao autor, que se sentido lesado pela decisão de primeira instância, poderá levar a sentença para uma análise no Tribunal Superior. Se o julgamento pelo tribunal der pela procedência do pedido, enviam-se os autos para o juízo, dando prosseguimento ao processo, caso contrário, a decisão de improcedência é mantida.

 

 2.1 Descrição das decisões possíveis;

 

a)      A inconstitucionalidade do artigo 285-A, do Código de Processo Civil;

b)      A constitucionalidade do artigo 285-A, Código de Processo Civil;

 

2.2 Argumentos para fundamentar cada decisão (usar criatividade, experiência e teoria para gerar alternativas de solução);

 

 

A partir de 2006, o Código de Processo Civil incorporou um dispositivo que afasta a necessidade de citação (ato de comunicação) em determinados casos. Este artifício, justificado pela celeridade e possível alívio ao poder judiciário foi alvo de inúmeras críticas a respeito de sua inconstitucionalidade. Até então era inconcebível uma decisão, uma sentença sem ouvir as partes. Isso foi possível graças ao art. 285-A que permite julgar o mérito desfavorável ao autor sem que haja a citação do réu.

Como é óbvio, nestes casos não há como pensar em nulidade ou inexistência do processo por ausência de citação. Em tais hipóteses a jurisdição concede tutela jurisdicional sem a necessidade de ouvir o réu, mas certamente atua através de um procedimento válido, que configura o legítimo processo jurisdicional (MARINONI, 2008, p 106).

Tal medida encontra-se para solucionar o amontoado de processos que se encontravam nas mesas do judiciário a respeito de matérias de direito já resolvidas e para finalizar algumas intenções onde já era previsto o resultado, mas a intenção do autor seria tentar a sorte ou prolongar uma situação a seu favor.

As razões alegadas e que a primeira vista são desconsideradas, é que com a otimização do tempo o grande beneficiário é o autor. Ele escusa-se de uma delonga processual acerca de um tema fadado a improcedência na consciência do magistrado além de inibir gastos desnecessários para a manutenção do processo, o que o poupa também de um desgaste físico e emocional.

Entenda-se bem, o referido artigo não vem exclusivamente a possibilitar o julgamento antecipado do mérito, ele permite que esse julgamento ocorra sem a necessidade da citação do réu, até para evitar todo um formalismo para matéria de direito já decidida. Neste caso o juízo pode basear-se em matéria já decidida por ele ou numa súmula vinculante do STF garantindo a integralidade dos princípios constitucionais do Direito Processual.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade foram utilizados como fundamento os princípio da igualdade, da segurança, do acesso à Justiça, do contraditório, e do devido processo legal.

Os princípios cardiais do processo consagrados na constituição regem o funcionamento do sistema processual brasileiro. O principal afetado pela norma em questão e o que apresenta um maior grau de importância é sim, o devido processo legal. A presença deste na Constituição Federal é suficiente para assegurar todos os demais princípios constitucionais do Direito Processual (CÂMARA, 2008, p.33). O intuito é afirmar que o princípio seria uma confluência dos demais existentes, ou seja, nele encontram-se preexistentes outros princípios como o contraditório, o da isonomia, o da ampla defesa entre outros.

O princípio do devido processo legal tutela três objetos resguardado pelo direito, a vida, a liberdade e a propriedade. Qualquer decisão que diga respeito a esse trinômio faz referência direta a este princípio. Indaga-se então é como esse direito é agredido se não há privação da liberdade ou da propriedade de alguém? Se houvesse a possibilidade de procedência do julgamento, ai sim, poderia se falar em afronta direta ao principio.

O julgamento antecipado do mérito vem a prestigiar o princípio da razoabilidade, pois não é lógico nem razoável que se perpasse por todas as fases do processo quando, desde o início, se tinha a certeza do resultado. Não se faz necessário a presença do réu para se defender das acusações se o juiz as dará como improcedente.

Além deste, o princípio do contraditório e da ampla defesa, elencados no art.5º LV da CF, são chamados à questão como forma de ataque ao dispositivo referente ao 285-A. Afirma-se que não é oferecida uma oportunidade de defesa, que não há processo justo sem ser oferecido o contraditório.

Não se nega a importância do contraditório e da ampla defesa tendo em vista se tratar de uma das garantias cedidas pelo Estado Democrático de Direito, entretanto não se pode considerar que o julgamento antecipado do mérito sem citação do réu faz uma afronta direta a estes princípios. Não há nenhum prejuízo ao réu, se não há dano não ha violação ao contraditório. Ademais, o contraditório não é vedado, mas no máximo postergado, pois em casos de aceitação ao recurso do autor o réu será chamado para apresentá-lo. É necessário atentar que houve, por parte do legislador, uma preocupação com a integridade dos princípios constitucionais na elaboração da norma. Em sua concepção a delonga processual não o torna justo, mas sim, pela rápida e eficiente prestação jurisdicional.

Princípios basilares do processo como o contraditório, a ampla defesa e o devido procedimento legal foram instituídos em benefício da parte para evitar que ela sofra prejuízo. No entanto, se nenhum prejuízo advier à parte, nada há a reclamar. É o que acontece quando o mérito é julgado a favor do réu, em que a sua citação em nada importa e mesmo desta não o prejudique. A ausência da citação nenhum prejuízo traz ao réu (art. 249, parágrafo 2º, do CPC). (SOUZA, 2006)

Reafirma-se que é desnecessário que o autor venha a juízo alegar a improcedência das acusações se isso pode ser visualizado pelo magistrado.

O outro lado da questão incide sobre as súmulas vinculantes que definem a interpretação da lei federal. O princípio aqui evocado é o da livre convicção do judicial e a idéia de o juiz dizer o direito. Neste caso, não há uma idéia própria do juiz, no entanto há um “consenso” sobre aquele assunto.

Contra essa idéia se levanta a alegação de que estaria ferido o principio da livre convicção do judicial e a prerrogativa do juiz dizer o direito conforme a sua consciência. O argumento, porém não é suficiente para ensejar a crítica. A uma, porque a força vinculante somente incide sobre a interpretação do direito e não sobre a apreciação dos fatos concretos. Objetiva-se apenas dar força vinculante à analise jurídica feita por tais tribunais, sem que isso se retire do juiz a prerrogativa de examinar o caso concreto, dando-lhe a solução adequada. (MARINONI, 2008, p. 97)

Logo, o juiz decidir por consciência própria e de forma diferente ao fixado pelos superiores tribunais intenta um descrédito ao Poder Judiciário. Existe uma desatenção do magistrado quando considerado que o Judiciário vem a resguardar os direitos constitucionais, que seu interesse é propagar a justiça e o princípio da igualdade em casos idênticos.

Como já foi colocado, o art. 285-A dá ao juiz o poder de conferir sentença, indeferindo o pedido, meramente com a presença da petição inicial, sem ocorrer à citação do réu, isso quando já houver sido proferida tal sentença em outros casos idênticos e o mérito for meramente de direito, até porque quando envolverem questões de fato, as peculiaridades do caso poderão implicar soluções diferentes.

Sendo assim, não se pode alegar abuso ao direito de defesa, mas apenas em violação ao direito de ação, como coloca MARINONI (2008, p. 101):

Aí compreendido como o direito de influir sobre o convencimento do juiz [...], para se evitar violação ao direito de influir, confere-se ao autor o direito de interpor recurso de apelação, mostrando as dessemelhanças entre a sua situação concreta e a que foi definida na sentença que julgou o caso tomado como idêntico.

Baseado no art. 557 pode-se afirmar que quando o juiz decidir utilizando-se do instrumento do art. 285-A, não caberá recurso se a decisão estiver de acordo com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. Porém, se a decisão recorrida estiver confrontando súmula ou jurisprudência dominante do STF, ou Tribunal Superior, poderá relator dar provimento ao recurso, como está nas linhas do parágrafo 1º do mesmo artigo.

Ou seja, o juiz não é obrigado a rejeitar liminarmente a ação repetitiva apenas porque há súmula do seu tribunal ou do Superior Tribunal de Justiça. Porém, não há racionalidade em admitir que ele possa rejeitá-la liminarmente em contrariedade com súmulas destes tribunais.

Na hipótese em que a súmula já consolidou o entendimento sobre a improcedência das demandas idênticas, a rejeição liminar da ação somente poderá observar a orientação do tribunal. Isto porque a razão de ser do julgamento liminar de improcedência seria frontalmente contrariada caso se admitisse uma decisão que negasse a súmula. (MARINONI, 2008, p. 102)

O art. 285-A cuida efetividade da jurisdição apenas no que se diz respeito à decisões de improcedência, ou seja, quando a decisão favorável ao pedido já estiver consolidada em casos idênticos, o juiz não poderá julgar antecipadamente a citação do réu.

Embora não possa o juiz julgar liminarmente procedente sem ocorrer à citação do réu, o mesmo não deverá entrar em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, sendo assim “basta ao juiz, na dicção do art. 285-A, proferir sentença, reproduzindo o teor da anteriormente prolatada”. (MARINONI, 2008, p.102)

No julgamento das ações repetitivas, a luz do art. 285-A, o juiz rejeita liminarmente o pedido, não havendo a oportunidade de emenda para a petição inicial, pelo motivo de que a sentença liminar não ocorre por um defeito sanável à petição inicial, a improcedência do mérito ocorre por se tratar de ação idêntica à outras julgadas anteriormente, que por envolver questões apenas de direito, dá ao juiz o poder de liminarmente julgar pela improcedência do pedido.

Não há, por razões óbvias, espaço para emenda à inicial, já que não se trata de “defeito suprível”, de modo que a sentença liminar de rejeição deve ser dada de pronto. Trata-se de sentença de mérito, de improcedência (fundada no art. 269, I, CPC), e não de hipótese de extinção do processo sem resolução de mérito (art. 267, CPC). Esta sentença, por isso mesmo, produz coisa julgada material, impedindo a repropositura da ação. (MARINONI, 2008, p.103)

Discordando o autor da sentença liminar de improcedência, poderá entrar com uma apelação, sendo facultado ao juiz decidir, no prazo de cinco dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação (art. 285-A, §1º, CPC). Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso. (art. 285-A, §2º, CPC). Tem-se aqui o procedimento regular previsto para a apelação.

O autor, no recurso de apelação, poderá argumentar que o seu caso concreto não se enquadra na decisão tomada como parâmetro e/ou que a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau no caso idêntico não está de acordo com o ordenamento jurídico – ou não é justa –, devendo, em razão de qualquer um destes argumentos, ser reformada. (MARINONI, 2008, p. 103)

Foi defendido que é plenamente constitucional a decisão antecipada do mérito sem citação do réu isso quando o mérito for desfavorável ao autor. O conhecimento sobre essa ação é impossível pelo réu. O ponto a ser observado é que, se o autor adentrar com a mesma ação em outro juízo, cujo juiz apresente posição diversa daquele primeiro, não há possibilidade do autor utiliza-se daquela anterior decisão neste novo processo, não terá o réu a possibilidade de alegar a preliminar da coisa julgada.

A questão a ser levantada é que para obter esta celeridade não se pode ficar comprometido o entendimento de que o processo não pode ser utilizado para viabilizar abusos de direito, assim como atuação em defender a ordem jurídica justa. O autor deveria utilizar-se desta sentença para sua defesa visto que, sendo de mesma matéria, o judiciário não poderá apresentar duas respostas sem justa causa.

Uma boa solução seria, com o transito em julgado, ao réu, bastaria uma intimação informacional, discorrendo sobre o fato acontecido. A intenção do legislador foi impedir a citação desnecessária do réu e com essa medida de comunicação estará preservando a ética presente no processo. Essa medida visa não apenas da celeridade a um único processo, mas sim a todos os outros de forma geral que com este possa coincidir.

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2008.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. 7. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

SCHULZE, Clenio Jair. Afinal, há inconstitucionalidade no art. 285-A do CPC?. Out, 2007. Disponível em: http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao020/Afinal%20ha%20inconstitucionalidade%20no%20art%20285A%20do%20CPC.htm. Acesso em 28 set 2011.

SOUZA, Gelson Amaro de. Sentença de mérito sem citação do réu (art. 285-A do CPC). Revista Dialética de Direito Processual, n. 43. São Paulo: Dialética, 2006.

PEREIRA, Ricardo Alberto. O atual art. 285-A do CPC: breves anotações da Lei nº 11.277/06. Fev. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8060>. Acesso em: 28 set 2011.

ADI3695. Relator: Min..Cezar Peluso. Distribuído em: 29/03/2006. Disponível em www.senado.gov.br/sf/senado/advocacia/doc/ADI3695.doc. Acesso em 28 set 2011.