Este caso aconteceu em Santarém, no Bairro Diamantino, mais precisamente na Avenida Mararu, nas imediações da ULBRA. Aline nunca se entendeu com sua madrasta. Seu pai viajava muito. Seu único e fiel companheiro era o jardineiro, Seu Clóvis. Certo dia, o jardineiro percebeu que plantas estranhas estavam nascendo e crescendo muito rápido, em volta da mansão dos Bentes. Embora fosse sexta-feira santa, Seu Clóvis resolveu trabalhar. Estava ele preocupado com a menina Aline, filha do patrão, que costumava brincar ali. Havia perigo de ser atacada por insetos, cobras, lagartos e outros bichos. Aliás, fazia um dia que não via Aline e decidiu limpar um pouco os galhos do jardim, podar as árvores, cortar a grama, principalmente porque o mato estava tomando conta da entrada da casa.
Começou a capinar e ouviu uma cantiga infantil:
“Jardineiro, do meu pai,
Não me corte os cabelos.
Minha mãe me penteava,
Minha madrasta me enterrou,
Pelos figos da figueira
Que o pássaro picou”

Seu Clóvis, intrigado com aquilo, parou de carpir e resolveu procurar a madrasta de Aline para saber o que estaria acontecendo. Pensava que a menina tinha viajado com o pai dela e agora essa voz... Achava tudo muito esquisito. A malvada sorriu, disse que Seu Clóvis estava ficando velho, cansado e que precisava relaxar um pouco. Falou para ele que Aline estava dormindo no seu quarto. Convidou – o para ir até o pomar, e em um momento de distração, deu uma marretada na cabeça dele que o deixou desmaiado. Ainda vivo, arrastou-o até o fundo do quintal e numa vala que já o esperava, enterrou-o em pé com os cabelos para fora.
No dia seguinte, o pai de Aline, Seu Manoel Olímpio Bentes chegou de viagem. Dando por falta da filha e do jardineiro, perguntou à mulher onde eles estavam, ao que ela, passando por vítima, simulando medo, respondeu:

- Estão fazendo uma floresta em torno da casa para nós dois não sairmos daqui. Vamos embora logo. Estão tramando contra nós!

O homem não entendeu bem, mas desconfiou da história. Entretanto, nada falou. Pegou uma enxada e pôs-se a cortar as árvores e plantas que invadiam o jardim e arredores da mansão. Ao bater a enxada no solo, ouviu uma voz:
- Patrão amigo, sou seu jardineiro. Sua mulher enterrou a mim e à sua filha ainda vivos. Tire-me daqui debaixo da figueira. Depois eu ajudo você a encontrar Aline. Ela pode ainda estar viva!

Seu Manoel Olimpio Bentes desenterrou o jardineiro. Ambos desenterraram a menina que ainda respirava. Arrancaram todas as plantas que não deviam estar ali. O patrão queria matar a madrasta, mas Aline e Seu Clóvis o aconselharam a desistir de seu intento. Argumentaram que assim estaria sendo tão desprezível quanto ela. E a deixaram fugir.
Hoje, a paz reina na mansão de Seu Manoel Olimpio Bentes. As plantas e árvores do jardim, do pomar e do quintal, são as que eles escolhem. Aline colhe flores que cultiva no jardim e faz decorações e ornamentações de batizados e casamentos. Seu Clóvis continua cuidando do jardim com muito carinho. Seu Manoel Bentes colocou uma floricultura na Avenida mais importante do centro de Itaituba.
E a madrasta? Pensa que ela morreu? Esta vivinha da silva, navegando pelo Tapajós, bem contente da vida! Dizem que a malvada continua vindo na Lancha Pérola, zanzando de Manaus a Belém; de Belém a Santarém; e de Santarém à Itaituba, procurando mansão para alugar, de preferência que tenha jardim, pomar e quintal, em busca de gente boa para enterrar!
Vocabulário:
Pomar: parte do terreno nos fundos de uma casa em que se planta e colhe frutas.
Jardim: parte da frente de uma casa onde se cultivam flores.
Quintal: área da casa em que se aguarda ser atendido.