O INSTITUTO DESPENALIZADOR DA DELAÇÃO PREMIADA COMO INCIDÊNCIA DA TEORIA DOS JOGOS: CONFLITOS DE INTERESSE E COMBINAÇÕES DE ESTRATÉGIA

                                                                                                             Juliana Araújo Abreu
                                                                                                Rafaela Coelho Rodrigues Lima
                                                                                                     José Claudio Cabral Marques³

RESUMO

A presente pesquisa mostra-se atual e relevante no que visa investigar o instituto da delação premiada no Brasil, avaliando sua incidência diante das legislações específicas, assim como no Código Penal Brasileiro. O conceito de delação premiada consiste na figura de um delator que entrega seus comparsas, podendo inclusive restituir objetos e produtos decorrentes do crime, sob a condição de ter redução da pena, substituição de pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos ou obtenção do perdão judicial. O tema sempre foi alvo de intensos questionamentos, mas atualmente com a Operação Lava Jato, deu-se um maior enfoque ao assunto, deste modo, busca-se compreender a delação premiada como reflexo da teoria dos jogos, assim como as benesses oferecidas aos delatores e o conceito de negociação e estratégia, o que induz a uma possível negociação na aplicação da sanção penal.

INTRODUÇÃO

A Teoria dos Jogos, criada e desenvolvida por John Nash, teve seu uso inicialmente pelos matemáticos, onde eles usavam tal teoria para solucionar casos envolvendo a lógica no processo de tomada de decisões. De acordo com o autor Alexandre Morais da Rosa, o Estado impõe as regras do jogo processual e tais regras são sustentadas pelo magistrado. Deve haver desta forma uma interação entre jogador e julgador, pois o resultado depende basicamente dessa interação, em conjunto com o seguimento correto das regras do jogo, haja vista que o jogo individual não é aceitável e pode vir a ser considerado nulo.

A partir do dilema do prisioneiro e a teoria dos jogos, pode-se afirmar que há uma clara estratégia, na qual o fim maior é beneficiar-se, o que gera, portanto, um conflito de interesse, já que se, diferentes, as ideias do prisioneiros haverá um que será mais prejudicado, ou na pior das hipóteses os dois sairão em prejuízo. Com dilema do prisioneiro, a cada decisão, este poderá satisfazer o seu próprio interesse, não confessar; ou atender ao interesse do grupo, confessar (ALMEIDA, 2006: 04). Mas é certo que não há nenhuma garantia que um vá cooperar com o outro, por isso, não é visto como um equilíbrio, nem cooperativismo, vez que os jogadores vão procurar satisfazer suas próprias vontades.

Não se pode começar um processo penal de maneira imediata, deve haver todo um estudo sobre o caso, preparação e investigação acerca dos sujeitos envolvidos, em seguida, uma busca de elementos que possam justificar a instauração do processo contra aquele determinado indivíduo, haja vista que cercear o direito de liberdade da pessoa, tem que ser utilizado apenas em ultimo caso.

Em relação aos institutos despenalizadores observa-se que eles são utilizados em casos em que a Constituição Federal permite, em juizados especiais, que foram criados para a solução de conflitos em casos de infrações que possuem procedimento oral, o que acaba tornando mais célere o processo. Casos em que sejam utilizados os institutos como a própria delação premiada, que será abordada futuramente, bem como a transação penal, composição civil entre outros.

É necessário de antemão afirmar que despenalização não é o mesmo que descriminalização, pois a despenalização não irá retirar a ilicitude do ato, o ato continuará sendo ilícito, entretanto, o que ocorre é a implantação de medidas alternativas de pena, penas mais brandas, que dessa forma, evita a pena maior que é a pena privativa de liberdade, em casos, por exemplo, de menor potencial ofensivo.

A delação premiada, ou o chamamento do correu, ocorre quando o acusado faz uma afirmação, quando interrogado em juízo, ou pela polícia, onde além de confessar que cometeu uma infração penal, também atribui a outra pessoa, participação no mesmo crime, como se o terceiro fosse seu comparsa.

A delação premiada, para ser considerada como meio de prova, necessita de três requisitos. Badaró (p.315,2014) afirma que são: 1. O correu que fez a delação tenha confessado sua participação no crime, 2. A delação encontre amparo em outros elementos de prova existentes nos autos, e 3. No caso da delação extrajudicial, que tenha sido confirmada em juízo.

Segundo o autor supracitado, sem a presença desses três requisitos, e sem o devido respeito ao contraditório, a delação não irá possuir qualquer tipo de valor para o processo, sendo, portanto, um ato sem nenhuma eficácia jurídica.

A confissão que o delator fará, é considerado elemento essencial. Se houver negação da autoria por parte do delator, este, apenas induzindo que um terceiro cometeu a infração, este ato não possuirá valor de prova. Será apenas uma espécie de ato de defesa do indivíduo.

Dessa forma, é necessário demonstrar como se dá verdadeiramente a delação premiada, bem como, os outros institutos depenalizadores, fazendo uma intrínseca relação com a teoria dos jogos, demonstrando que os jogadores devem mostrar um interesse nas estratégias, saber com quem está lidando, no caso, com o julgador, que é o juiz, para saber como se defender para obter êxito em todo o andamento do processo.

1 ANÁLISE DA TEORIA DOS JOGOS NO ORDENAMENTO PENAL BRASILEIRO

A teoria dos jogos no ordenamento brasileiro pode ser aplicada por várias áreas, como por exemplo, ser aplicado em questões sociais, políticas e econômicas. Como o próprio nome diz, tem a participação de três jogadores, sendo um deles o julgador, que é o Estado, representado pelo Juiz, e os outros dois jogadores.

A teoria dos jogos pode ser aplicada em institutos despenalizadores, onde cada passo que o jogador irá tomar será decisivo para o ganho ou não do jogo, só que deve se observar que o jogador deve possuir uma estratégia, ele não deve “jogar sozinho”, pois cada ato seu, irá interferir em algum tipo de ato que o outro jogador possa dar.

Cabe ressaltar que o jogo em que tanto se fala, não é um jogo qualquer, jogo de azar comumente dito por aí. É apenas uma expressão para que se entenda melhor o que a teoria dos jogos quer dizer:

No jogo processual as regras são impostas pelo Estado e sustentadas pelo magistrado. Limita o tempo, desde a denúncia até o trânsito em julgado, bem como o espaço que é o Tribunal, em que será jogado. É dinâmico e com a possibilidade de mudança, alternância, vitória, empate ou derrota. O Tribunal é o lugar sagrado onde as condutas tidas como criminosas entram em campo. Nele acontece o espetáculo do crime e do castigo. Especialmente no Direito, Huizinga aponta o processo como uma competição. Os jogadores estão dominados pela recompensa, vitória, afinal ninguém entra no jogo para perder. No julgamento há sempre uma parcela de sorte/azar e uma guerra de argumentos. (DA ROSA, p. 15, 2014)

Alexandre Morais da Rosa (2014) ainda expõe que existem três planos paralelos e simultâneos onde existe a atuação do jogo processual. Existe o plano do reconhecimento das normas processuais, onde incide os princípios e as regras que são utilizados pelos jogadores e julgadores. Existe o plano da teoria da informação probatória em conjunto com seus fatores de convencimento, que indica os condicionantes internos e externos, e o terceiro plano, o plano da singularidade do processo, onde há a presença das táticas e estratégias do jogador e julgador. Dessa forma, afirma-se que os três planos existem de forma paralela e vão se desenrolando no transcorrer do jogo, de forma contingente.

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