O Inquérito Policial e o Princípio do Contraditório

 

Ana Luiza Costa Cirino Pereira

Acadêmica em Direito pela Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais

 

1 – Introdução

O inquérito policial possui natureza inquisitiva e administrativa, regido pelo Código de Processe Penal, que como regra é realizada pela policia Judiciária, com o objetivo de buscar provas ou indícios de materialidade e autoria de possível infração penal.

Contrapondo-se a esse ponto temos o principio do contraditório, explicito no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal, que assegura “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”

2- Inquérito Policial

O Inquérito Policial, em regra é um procedimento realizado pela Policia Judiciária, cuja finalidade e buscar indícios de autoria e materialidade de uma infração penal. E um instrumento formal para as investigações.

Surgiu com a lei 2.033 71, regulamentada pelo Decreto Lei n 4824 71, no qual consta no artigo 42 da referida lei: “O inquérito policial consiste em todas as diligências necessárias para o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e cúmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito.”

Para Fernando da Costa Tourinho Filho, o inquérito policial é “um conjunto de diligências realizadas pela Polícia Civil ou Judiciária (como a denomina o CPP), visando a elucidar as infrações penais e sua autoria.”

Fernando Capez conceitua o inquérito como “conjunto de diligências realizadas pela policia judiciário para apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo”

Uma definição inteligente sobre inquérito, e demonstrada por Dilemardo Queiroz Filho: “é o instrumento pelo qual o Delegado de Polícia materializa a investigação criminal, compila informações a respeito da infração penal, de suas circunstâncias e resguarda provas futuras que serão utilizadas em juízo contra o autor do delito.”

Dentre as definições expostas, observa-se a semelhança entre elas, em que a finalidade do procedimento seria a descoberta pela autoridade policial do verdadeiro autor do fato infringente da norma, para que as informações sejam levadas a juízo.

2.1 – Finalidade

Entre os autores, existe um consenso, de que o inquérito policial, visa possibilitar a reunião de provas que reforcem as suspeitas da pratica delituosa, para futuro ajuizamento da ação penal. Essa investigação inicial ajuda na “seleção” do sistema penal, ao filtrar casos com fatos já estabelecidos e com autoria pré definidas, prontas para serem conhecidas pelo Poder Judiciário.

Fernando Costa Tourinho Filho em sua definição expõe que “apurar a autoria significa que a autoridade policial deve descobrir o verdadeiro autor do fato infringente da norma, tendo em vista que não será possível promover a ação penal sendo desconhecido o autor do fato, ou seja, não poderá o órgão do Ministério Público, ou o ofendido, caso o crime seja de alçada privada, dar início ao processo com a denúncia ou queixa, pois o artigo 41 do CPP exige como um dos requisitos para a propositura da peça vestibular da ação penal, a qualificação do réu, ou, pelo menos, esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, sob pena da denúncia ou queixa ser rejeitada por inépcia formal.”

Assim, o inquérito policial seria uma peça da informação para instaurar o procedimento principal, com embasamentos suficientes para a existência do crime e da autoria.

2.2 – Natureza Jurídica do Inquérito Policial

O inquérito policial é um procedimento administrativo e sigiloso, que visa à investigação, a descoberta de infrações penais e de sua autoria.

Dispõe o artigo 20 do Código de Processo Penal: “A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.”

A policia judiciária atua para auxiliar a justiça no cumprimento de suas finalidades. Segundo Schmidt “procedimento na corporificação dessa atividade – procedimento administrativo reduzido a escrito mediante o qual se indicia a perseguição de infrator na lei penal, visando a coleta de elementos informativos da materialidade do fato e da respectiva autoria, de modo inquisitivo e, ate religioso.”

O Supremo Tribunal Federal, sobre o caráter administrativo, decidiu que “os vícios porventura existentes não tem condão de anular o processo judicial”, simples peca informativa que e.

Defini-lo como administrativo, não quer dizer que não deve ser resguardado os direitos fundamentais do investigado, em que o magistrado, a autoridade policial e o Ministério Público devem conduzir a investigação de forma a evitar afrontas ao direito do acusado.

3 – Princípio do Contraditório

O principio do contraditório esta embasado de forma expressa na Constituição Federal, podendo ser encontrado no artigo 5º inciso LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”

Nos dizeres de Maria Helena Diniz, o principio “assegura aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, o direito de ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, vedando ao órgão judicante a prolação da decisão sem antes ouvi-los, sob pena de nulidade processual. Mas se um deles não se manifestar, sendo revel, aplicar-se-lhe-á a pena de confesso, presumindo-se como verídicas as alegações da outra parte.”

Nélson Nery Júnior, relata ainda que “o princípio do contraditório, além de fundamentalmente constituir-se em manifestação do princípio do Estado de Direito, tem íntima ligação com o da igualdade das partes e o do direito de ação, pois o texto constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla defesa, quer significar que tanto o direito de ação, quanto o direito de defesa são manifestação do princípio do contraditório.”

E ainda, para Tourinho Filho para o contraditório “consubstancia na velha parêmia audiatur et altera pars – a parte contrária deve ser ouvida. Traduz a idéia de que a defesa tem o direito de se pronunciar sobre tudo quanto for produzido em juízo pela parte contrária. Já se disse: a todo ato produzido por uma das partes caberá igual direito da outra parte de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que lhe convenha, ou, ainda, de dar uma interpretação jurídica diversa daquela apresentada pela parte ex adversa. Assim, se o acusador requer a juntada de um documento, a parte contrária tem o direito de se manifestar a respeito. E vice-versa. Se o defensor tem o direito de produzir provas, a acusação também o tem. O texto constitucional quis apenas deixar claro que a defesa não pode sofrer restrições que não sejam extensivas à acusação”.

O princípio contraditório é o reconhecimento da necessidade da oitiva da parte contrária, a bilateralidade da audiência (“audiatur et altera pars”). O réu também tem direito a se defender.

4-Conclusão

Percebemos que, a presença do contraditório no inquérito policial não se aplica, uma vez que não existe acusado.

Nas palavras de Alexandre de Moraes, “o contraditório nos procedimentos penais não se aplica aos inquéritos policiais, pois a fase investigatória é preparatória da acusação, inexistindo, ainda, acusado, constituindo, pois, mero procedimento administrativo, de caráter investigatório, destinado a subsidiar a atuação do titular da ação penal, o Ministério Público.”

Tourinho Filho também expressa pela inexistência do contraditório nos inquéritos policias. Segundo o autor a expressão “processo administrativo”, não engloba o inquérito policial, mas somente processos instaurados pela Administração Pública para apurar infrações administrativas, visto que nestes casos é possível a aplicação de uma sanção, o que não ocorre com o inquérito policial.

Existem ainda mais argumentos que sustentam a tese de que o princípio do contraditório não esta presente no inquérito policial, encontrados no Código de Processo penal, nos artigos:

Artigo 107. Não se poderá opor suspeição às autoridades policiais nos atos de inquérito, mas deverão elas declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal.

Artigo 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade.

 

Bibliografia:

BRASIL. Código de Processo Penal. 51º. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 7 Ed. São Paulo: Saraiva, 2001

CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988;

DINIZ, Maria Helena; Dicionário Jurídico, Volume 3, Edição 1998.

JÚNIOR,Nelson Nery; Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 2ª Edição, Editora Revista dos Tribunais.

MORAES, A; Direito Constitucional, 18ª Edição, Editora Atlas.

SCHMIDT, Eberard. Los Fundamentos teóricos y constitucionales Del Derecho Procesual Penal, cit. por TUCCI, Rogério L. Constituição de 1988 e processo. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 125.

SUPREMO, STF – 5º T – RHC no. 3.898-5/SC – relator Ministro Edson Vidigal – Ementário STJ, 11/600.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 25 ed. Ver. E atualizada. São Paulo: Saraiva, 2001. Vol.1