O IMPACTO DA CULTURA ORGANIZACIONAL NO MODELO DE GESTÃO DE UMA EMPRESA FAMILIAR: SEGMENTO TRANSPORTE

Mariele da Silva de Souza

RESUMO

O objetivo deste estudo foi analisar a cultura organizacional de uma transportadora localizada na cidade de Canoas/RS. Trata-se de pesquisa descritiva, com abordagem quantitativa dos dados, desen­volvida na matriz desta transportadora. A amostra foi composta por 40 sujeitos, dentre eles: gerentes, operacionais, administrativos e motoristas. Os dados foram coletados entre setembro e novembro de 2014, sendo utili­zado o Instrumento Brasileiro para Avaliação da Cultura Organizacional – IBACO. A análise dos valores organizacionais demonstrou o quanto os valores da cultura organizacional com um modelo tradicional e familiar influenciam o modelo de gestão, evidenciando a cultura paternalista do proprietário bem como as dificuldades do compartilhamento de poder dos herdeiros, a manutenção de funcionários pertencentes à família e outros com longo tempo de casa.

Palavras chave: cultura organizacional; segmento transporte; empresa familiar

1. INTRODUÇÃO

A cultura organizacional é uma referencia para seus membros, de maneira tal que os padrões e as regras estejam esclarecidos para que os indivíduos compreendam como devem ser os comportamentos na organização. A difusão ampla e intensa dos valores de determinada cultura organizacional faz com que os colaboradores possam agir em prol dos objetivos organizacionais. É um elemento que intenciona a solução de dois problemas: a manutenção da integração interna, para garantir a habilidade de adaptação e o funcionamento diário da organização; e a adaptação ao meio ambiente em que está inserida, sobrevivendo e crescendo com o surgimento das adversidades (SCHEIN, 1992). Assim, quando existe consenso entre os dois, a organização tem uma maior probabilidade de atingir seus objetivos.

Para Dias (2003) o estudo da cultura organizacional dá subsídios para a compreensão de interesses de grupos determinados, das relações de poder presente, dos comportamentos contraditórios dos membros, como também das regras estabelecidas que não sejam regulamentadas. Portanto, ao serem identificados os valores e as práticas que regem cada organização torna-se mais fácil detectar o impacto que a cultura pode ter no funcionamento da empresa.

Nessa perspectiva, a estrutura organizacional reflete a articulação entre os padrões culturais, como os valores, e os padrões políticos, relativos aos interesses. Essa relação expressa-se na associação do arcabouço estrutural com os padrões de interação (Ranson, Hinings e Greenwood, 1980). Ao constituir-se como o foco da mudança, o arcabouço estrutural, representando os componentes formalizados da estrutura organizacional, possibilita uma transformação significativa nos padrões simbólico-culturais da organização, assim como nas dependências de poder, à medida que interfere nos padrões normativos, nos valores e nos interesses institucionalizados.

Portanto, conhecer a cultura organizacional, por meio de práticas e valores auxilia os seus membros na compreensão das diretrizes de crescimento.

Desta forma o objetivo deste trabalho é identificar os elementos culturais presentes dentro de uma transportadora familiar que tem a sua sede principal instalada no município de Canoas/RS, e demais filial em Vitoria/ES, Eunapolis/BA e São Paulo/SP.

2.  Análise da Cultura Organizacional

A análise da cultura organizacional faz-se necessária, pois permite aos gestores, segundo ROBBINS (1996) dois benefícios, primeiro a visualização de como os valores da organização estão sendo absorvidos, e em segundo, pois reduz o nível de resistência a mudança, possibilitando aos mesmos após a apresentação dos resultados, participarem de modo ativo na execução dos planos de ações. Complementando a ideia de ROBBINS, JOHANN (2004) descreve que intervir sobre a cultura organizacional, além de identificar a absorção dos valores, possibilita aos gestores atuarem de forma educativa, instruindo seus colaboradores sobre as expectativas que a organização possui sobre estes.

De acordo com NASSAR (2000), a cultura organizacional é o conjunto de valores, crenças e tecnologias que mantém unidos os mais diferentes membros, de todos os escalões hierárquicos, perante as dificuldades, operações do cotidiano, metas e objetivos. Pode-se afirmar ainda que é a cultura organizacional que produz junto aos mais diferentes públicos, diante da sociedade e mercados o conjunto de percepções, ícones, índices e símbolos que chamamos de imagem corporativa. Para VERGASTA (2001), a cultura organizacional não é algo pronto e acabado, mas estão em constante transformação, de acordo com sua história, os seus atores e com a conjuntura. SCHEIN (1992, p.12) ainda conceitua cultura como “Um padrão de premissas básicas compartilhadas que o grupo aprendeu à medida que resolvia seus problemas de adaptação externa e integração interna, que funcionou suficientemente bem para ser considerada válida e, portanto, para ser ensinada aos novos membros como o meio correto de perceber, pensar e sentir em relação àqueles problemas”.

 Já ROBBINS (1996, p.681) conceitua o termo como “Uma percepção comum compartilhada pelos membros da organização; um sistema de significado compartilhado”.

 A PRICE WATERHOUSE, através da sua equipe CHANGE INTEGRATION (1999, p. 116) conceitua cultura através de seis diferentes características, a saber:

a)              Valores: os princípios ou qualidades considerados compensadores pela organização, tais como atendimento ao cliente ou inovações no produto, sinceridade ou poder e autoridade compartilhados entre os colegas.

b)              Crenças: as hipóteses, premissas e modelos de negócios da organização tendem a ser verdade. A transmissão de visão do mundo em geral, crenças, pode ser verdadeira ou não. As crenças geram paradigmas, isto é, modelos atraentes que mostram o que é bom para os negócios e a melhor forma de agir. Os paradigmas, por sua vez, podem tanto expandir quanto tolher as metas organizacionais.

c)                Atmosfera: o ambiente ou atmosfera de uma organização observável a partir do layout físico dos espaços de trabalho e mais precisamente, a partir de como os funcionários interagem entre si, com clientes e com estranhos. Como é trabalhar aqui? A organização é formal ou informal?

d)              Normas: os padrões e normas desenvolvidos na empresa, tais como se as pessoas trabalham duro, quando começam e quando saem do trabalho. Envolvem questões em todos os níveis, desde o padrão do vestuário e atitudes acerca do trabalho no fim de semana até a questão de se uma estratégia de crescimento lento é aceitável. As normas, geralmente não escritas, afetam o grau de decisão de gerentes e empregados. Determinam quem pode e quem não pode tomar decisões e realizar tarefas.

e)              Símbolos: ícones, doutrinas, rituais, e tradições que cercam mensagens poderosas sobre o que é importante. Podem incluir eventos positivos, tais como cerimônias e celebrações e reconhecimentos, tais como vagas especiais para o funcionário do mês. Os símbolos podem ser negativos – regalias corporativas oferecidas somente aos escolhidos, festas corporativas suntuosas no momento em que foram cortados aumentos anuais para os funcionários dos níveis mais baixos devido aos resultados dos negócios.

f)                 Filosofia: as políticas e ideologias declaradas que norteiam as ações da organização em relação a proprietários, funcionários, clientes e etc.

ROBBINS (Op. Cit.: p.681), salienta que a cultura organizacional refere-se ao sistema de significado compartilhado pelos membros que distingue uma organização de outras. Esse sistema de significado compartilhado é um conjunto de características chave que a organização valoriza.

2.1 MUDANÇAS NA CULTURA:

Para se conhecer a cultura organizacional de uma empresa, é preciso conhecer a sua estrutura, seus relacionamentos, o seu histórico, seus costumes e as mudanças comportamentais que provocadas quando há mudanças.

“Diz-se, com frequência, que as pessoas reagem mal às mudanças e, em parte, isso pode ser verdade em função da necessidade de desconfirmar o que antes era considerado importante na realidade daquela organização” (FREITAS, 2010, p. 20). “A mudança de cultura é um processo mais longo, duro e nada fácil, porém possível”. “Na maioria das vezes, ela ocorre em função de alguma mudança radical, do ponto de vista do negócio ou da gestão” (TANURE, 2010, p. 24).

Um estudo sobre a cultura organizacional da empresa pode ajudar em processos de mudanças, principalmente as mudanças mais radicais que o grau de aversão pode ser alto. Em algumas empresas quando o processo de mudança é muito forte que a cultura está enraizada no principal executivo da empresa e sem a quebra de um paradigma, as pessoas não vão assimilar a nova cultura. “As tão desejadas culturas fortes podem aqui dificultar o processo de mudança”. “Não é pó acaso que em alguns processos mais radicais se troca o top management como uma forma clara e inequívoca de evidenciar a ruptura com os valores até então vigentes” (TANURE, 2010, p. 25).

Todas as pessoas têm suas crenças e apresentam tendências a resistir a mudanças, mas essas “[...] mudanças são aquelas que impulsionam na direção da mudança desejada e as de resistência são as que tendem a conter essas ocorrências de mudanças, quando as forças desestabilizadoras, que são as forças externas, são resistentes às mudanças o processo pode ser lento” (FERNANDES; PEDROSO, 2010, p. 26).

Por todas as mudanças que uma empresa passa, as pessoas que nela trabalham acabam se aproximando se seus chefes e principalmente em empresas familiares que o comandante é o próprio dono, para quando houver mudanças, elas não sejam fortemente afetadas. Nas empresas familiares “[...] a noção de individualismo nasce a partir da vontade do senhor ou do chefe, impondo-se de cima para baixo” (FREITAS, 2010, p. 47), onde a cultura da organização é baseada nessa figura.

A relação entre patrão e empregado acaba tendo uma relação às vezes familiar aonde “[...] o núcleo familiar centrado na figura do patriarca é dirigido por princípios de laços de sangue e do coração” (FREITAS, 2010a, p. 47). Por isso que acabamos chamando das empresas de familiares, aonde acaba a relação entre padrão com seus funcionários acaba tendo uma relação familiar e uma relação de confiança. “Ao estabelecer uma relação de confiança, protege-o contra seu filho e, com o empregado na mão, controla-o” (FREITAS, 2010a, p. 49). Essa relação acaba “[...] por sua vez, o empregado, ao sentir-se protegido, retribui com lealdade a seu superior” (FREITAS, 2010a, p. 47).

O comprometimento dos funcionários determina o seu bom desempenho no trabalho, pois é necessário que ele aceite o seu trabalho como algo que mais tarde irá recompensá-lo de alguma forma, seja em questão de melhoria de salário, do seu papel na empresa que foi reconhecido pelo chefe ou até pelas boas condições de trabalho como um bom ambiente e bom relacionamento entre colegas da instituição (FERNANDES;PEDROSO, 2010, p. 18-19).

A tomada de decisão das empresas não é um processo simples que dependendo da cultura que é exercida dentro da organização poderá existir uma concentração de poder que segundo Prates e Barros (2010, p. 59) são “[...] da força militar tradicionalista e do poder racional-legal para o estabelecimento e a manutenção da autoridade, criando, assim, uma cultura de concentração de poder baseada na hierarquia/subordinação”.

Entendemos que, nos dias que se sucedem, não apenas as organizações mudaram, mas também os indivíduos e as sociedades, o que altera o nível de expectativas e jogo de forças perante uma gestão que carece assumir compromissos maiores e mais duráveis em relação aos seus mais variados públicos redesenhando o seu próprio papel.

2.2 Liderança

 É certo que a corrente de pesquisadores que partilha o pressuposto da unicidade cultural coloca toda a responsabilidade das definições culturais nos fundadores e no grupo dirigente e serão sempre eles que terão a exclusividade sobre a criação, o desenvolvimento e a manutenção deste fenômeno na organização.

Schein ( 1984,1985ª , 1985b ) fez deste tema a sua preocupação e a sua contribuição principal, assumindo que uma cultura se forma pelas definições dos fundadores e líderes, mas que ela se desenvolve progressivamente por meio do envolvimento e da aprendizagem dos grupos e indivíduos. As organizações, e as empresas em particular não aparecem de forma acidental ou espontânea, elas são definidas intencionalmente com objetivos a serem alcançados; elas são criadas a partir de um sentido que dará forma a coordenação ás diversas atividades e recursos necessários a sua existência e operação.   

No caso das empresas familiares, a relevância do fundador é ainda muito maior, pois ela confunde a história organizacional com a própria história pessoal dele , não sendo difícil encontrarmos relações interpessoais  nessas empresas marcadas por elevado nível de intimidade, que pode ser interpretado como semelhante as relações familiares envolvendo todos membros organizacionais em torno de um grande patriarca carismático, seja ele generoso ou tirano em situações como esta não é incomum que a impossibilidade ou a morte do fundador endeusado pode significar o fim da empresa, mesmo quando ele tem sucessores, que nunca estarão a altura do personagem que eles estariam destinados a substituir.

Conquanto aceitemos e importância dos fundadores e lideres no arcabouço cultural, não podemos esquecer que toda organização, especialmente as empresas, necessita de constantes reavaliações e redefinições em função das mudanças que ocorrem no meio ambiente; também os fundadores e lideres envelhecem e os processos sucessórios podem ocorrer com maior ou menor divergência entre o que os seus atores principais consideram o caminho a ser seguido pela organização.

Assumir que uma organização não pode mudar é lavrar um atestado de óbito para ela, por outro lado uma cultura que muda a todo instante não referencia nada, visto que ela não se presta a realizar sua tarefa principal: Ser um guia e um saber de receita ou esquema de interpretação para as situações mais comuns na dinâmica organizacional.

A vida organizacional, ainda que fundada em uma lógica e em uma racionalidade instrumental, precisa do tempero que a irracionalidade e o simbolismo aportam, pois é ele que gera os envolvimentos, a dedicação, a lealdade e a paixão tão necessários a dinâmica organizacional marcada pela competição extremada em um ambiente turbulento. Quanto mais o mercado se torna competitivo e agressivo, mais as empresas necessitam do comprometimento de seus membros, ainda que ela própria não possa garantir nenhuma reciprocidade.

2.3 Empresa Familiar

As empresas familiares são grupos de grande relevância no mundo inteiro, suas formas são as mais variadas, no entanto, todas têm uma característica em comum: elas são oriundas de histórias atreladas a uma família, cujos familiares estão no comando da empresa, sendo que estes cultivam expectativas em torno da sobrevivência e longevidade desta empresa, com isso torna-se importante aprofundarmos estudos sobre a dinâmica que envolve essas empresas.

Há inúmeros conceitos sobre empresa familiar, mas a definição geralmente admitida globalmente é de que a empresa familiar abrange três grandes posições, a primeira são suas propriedades, em que a maioria do capital está sob o controle da família; a segunda é a gestão, porque são as pessoas da família que ocupam os cargos hierárquicos de níveis mais altos; a terceira é a sucessão, onde os cargos deixados pelos parentes serão substituídos e administrados pelos membros da família, ou seja, pela segunda geração e assim sucessivamente. Christensen (1953) um dos primeiros autores a realizar estudos sobre Pequenas e Médias Empresas (PME) familiares, afirmou que tais empreendimentos caracterizam-se pelas peculiaridades de gestão, onde estão diretamente vinculados o exercício das funções principais, a gestão e a propriedade.

Segundo Garcia (2001), as histórias de como nascem às empresas familiares têm os mais diversos enredos. Algumas surgem para atender a escassez ou a falta de produtos ou serviços numa comunidade, numa região ou num segmento da sociedade. Alguém que está envolvido e sentindo essa carência, trata de supri-la.

Desta forma pode-se observar que a empresa familiar na primeira geração tem o comando único e centralizado, a postura de autoritarismo e austeridade do fundador, seja na forma de vestir, seja na administração dos gastos, se divide com atitudes de paternalismo, que acabam sendo empregadas como forma de manipulação, e a empresa é propriedade da família (esta detentora da totalidade ou da maioria das ações).

Muitas empresas familiares não possuem uma administração profissional, este é um fator crítico, pois muitas vezes o sucessor não possui ideais em comum ou a mesma concordância com a empresa e, a sua inclusão é vista como uma imposição por parte do fundador. Assim, o processo sucessório se dá pela formação genética e não pela competência, e os resultados podem ser o inicio do declínio da empresa.
Entre os principais problemas que ocorrem durante a sucessão estão: a pouca atenção ao planejamento pela maior parte dos empresários; dificuldades para transferir o poder e as divergências entre o sucedido, sucessores e sócios e, aliados a isso, desinteresse, ou pouco preparo para assumir o negócio. O correto é que se faça um plano do que se aspira e que possa ser desenvolvido num limite de três a cinco anos antes do afastamento do dono da empresa.

Quando se refere à empresa familiar, é aceitável compreender porque a cultura do fundador é tão viva dentro da organização. Assim a criação de um novo período na empresa do sucessor é um trabalho difícil, onde o vinculo entre empresa e o seu fundador são tão próximos, e o distanciamento de um dos membros gera muita dúvida no que se refere ao futuro da empresa e do novo administrador.

A mudança é efetuada pela cultura organizacional que é responsável pelo comportamento, ações, hábitos e costumes praticados nas empresas e que estão enraizados, formando raciocínios similares, muitas vezes difíceis de serem mudados, unindo as pessoas em busca de objetivos comuns, onde qualquer mudança já é um desafio aos gestores.

A empresa familiar é definida por Lodi (1978) como aquela em que a consideração da sucessão está ligada ao fator hereditário e onde os valores institucionais da firma identificam-se com um sobrenome de família ou com a figura do fundador. Após a análise conceitual proposta por diversos autores, considera-se como definição de empresa familiar aquela em que no mínimo duas pessoas da mesma família trabalham na empresa e pelo menos uma delas faça parte do quadro societário.

Dyer (1988) apresenta os padrões culturais das empresas familiares, destacando quatro tipos como os principais: a cultura paternalista, a cultura laissez-faire, a cultura participativa e a profissional. As características de cada categoria indicam como os líderes das empresas familiares usam os pressupostos na operação de suas empresas.

Quadro 1: Culturas em empresas Familiares

Fonte: Dyer (1988)

 

2.3.1 A Sucessão

Uma das principais questões para as empresas familiares e seus membros está diretamente relacionada com a sucessão. Quem será o sucessor? O filho mais velho? Qual é o membro da família mais preparado para ocupar essa posição? Existe a possibilidade de o sucessor ser um profissional que não faça parte da família? Cada uma dessas questões envolve desejos e expectativas de uma série de pessoas e muitas vezes é tão difícil para a família tomar a decisão da sucessão que ela acaba sendo adiada.

Geralmente é nos momentos da sucessão que a família procura ajuda de um especialista. O processo de sucessão é bastante complexo e, por isso, os especialistas em empresas familiares optam por uma intervenção multidisciplinar envolvendo, sobretudo, profissionais das áreas de administração, psicologia e direito, trabalhando em equipe. Dessa forma, os resultados tendem a serem muito mais positivos do que a simples soma das partes, ou seja, a soma das intervenções realizadas por cada um desses profissionais isoladamente (Gersick e cols, 1997).

A empresa em questão esta passando por este momento de sucessão, e conta com o auxilio de uma equipe de profissionais (advogados e administradores) para auxiliar neste processo.

É interessante ressaltar que a sucessão é um importante processo pelo qual todas as empresas passam, sejam elas familiares ou não, e não são raras às vezes em que encontram dificuldades. Entretanto, esse processo pode se tornar mais complexo nas empresas familiares, já que o que “está sendo testado” não é apenas a competência profissional dos candidatos à sucessão, mas as relações afetivas, as intrigas familiares.    

 3 METODOLOGIA:

Trata-se de uma pesquisa descritiva, com abordagem quantitativa dos dados, estruturada a partir do referencial de Hofstede. O estudo foi desenvolvido em uma transportadora da cidade de Canoas, Rio Grande do Sul, Brasil, classificada como empresa de grande porte especializada em carregamentos de matérias prima.

A população do estudo foi representada pelos 88 funcionários lotados nos diferentes setores da instituição: motoristas nas rotinas externas, funcionários das áreas administrativas, diretores e operacionais.

Para a definição do tamanho amostral, foi utilizado o mé­todo de amostragem aleatória simples. Considerando uma precisão de 5%, foram entregues questionários para todos os funcionários lotado na matriz, e selecionado somente questionários com a classificação mínima de respostas, no total foram selecionados uma amostra com 40 questionários.

Os critérios de inclusão foram: profissionais que não esta­vam afastados do trabalho no período de coleta de dados e que responderam pelo menos 90% das questões apresenta­das no questionário.

Para a coleta de dados, foi utilizado instrumento compos­to por duas partes. A primeira representa a caracterização dos trabalhadores (idade, sexo, escolaridade, local de trabalho, tempo de empresa) e a segunda é composta pelo Instrumento Bra­sileiro para Avaliação da Cultura Organizacional – IBACO.

Segundo Ferreira et al (2009), a construção do IBACO deu-se em duas etapas: no primeiro foram realizadas 17 entrevistas com diretores e/ou gerentes de empresas públicas e privadas, no qual se indagava sobre as metas prioritárias da organização, atividades, atitudes, relacionamento, mudanças, recompensas, procedimento para tomadas de decisão, e atendimento aos clientes internos e externos. Inicialmente o Instrumento continha 126 itens. Na segunda etapa foi aplicado uma amostra de 823 membros de empresas públicas e privadas e compunha-se de 94 afirmativas. Para as situações de diagnóstico e de identificação foi desenvolvida a versão reduzida do instrumento, a partir dos itens que apresentaram as maiores cargas fatoriais na versão original, mantendo suas qualidades psicométricas.

Neste estudo, o IBACO foi aplicado em sua versão reduzida, composta de 30 (trinta) afirmativas distribuídas igualmente entre 3 (três) fatores de valores organizacionais (profissionalismo cooperativo, profissionalismo competitivo e satisfação e bem-estar dos empregados) e 3 (três) fatores de práticas organizacionais (integração externa, recompensa e treinamento e promoção do relacionamento interpessoal). São, portanto, 30 (trinta) itens, respondidos na escala Likert de cinco pontos que varia de 1 (“não se aplica”) a 5 (“aplica-se totalmente”). A escala de Likert é baseada em uma ordem numérica, onde se demonstra a concordância ou discordância em relação às variáveis relacionadas ao objeto de estudo. Os escores em todos os fatores indicam que quanto maior o resultado, maior o grau em que o valor ou prática organizacional mensurada encontra-se presente na organização avaliada.

Com base em Ferreira et al. (2009), segue o quadro- Fatores do IBACO, que corresponde aos conceitos, fatores, respectivas descrições e os números dos itens correspondentes no questionário:

 

 

Quadro 2: Fatores do IBACO

Fonte: Ferreira ET al (2009)

Inicialmente foi solicitada para o diretor da empresa a autorização para a coleta dos dados, após a autorização foram aplicados os questionários, os funcionários lotados na empresa recebiam o formulário no inicio do dia e entregavam devidamente preenchidos no final do dia, no caso dos motoristas era entregue o instrumento e eles levavam para preencher nos momentos vagos da viagem, em média levaram de uma a duas semanas para entregar os formulários preenchidos.

Após a coleta dos dados, esses foram digitados em planilhas do Excel para servir como banco de dados. Assim que atingiu a meta de 40 questionários devidamente preenchidos foi feita uma média geral das respostas a fim de analisar os valores e práticas organizacionais, e uma média das respostas dos motoristas visto que a maioria dos questionários respondidos eram deles.

 

     4 RESULTADOS

Dos 88 funcionários selecionados, 43 consentiram em participar do estudo e devolveram os instrumentos devida­mente preenchidos. Mais da metade dos funcionários recusaram-se a parti­cipar do estudo, argumentando ser muito extenso o questionário; dos 43 respondidos, três deles estavam com diversas questões em branco e foram excluídos da amostra.

Dos 40 participantes, verificou-se que eram 28 motoristas, 4 operacionais, 2 gerentes e 6 administrativos, podemos assim registrar a predominância de homens 87,5 (%), de trabalhadores com idade entre 26 e 40 anos (67,5%), com nível escolar de ensino médio completo 75(%) e superior 10(%), e 87,5(%) trabalham  á mais de 3 anos na empresa. Conforme ilustração dos resultados abaixo:

 

Quadro 3: Resultado da Pesquisa Sócio econômica.

Fonte: Autoria própria, 2014.

 

A partir das respostas emitidas pelos funcionários, foi feita a comparação dos resultados visto que a maioria dos funcionários que responderão eram motoristas, veri­ficou-se escore médio de 3,18 para valores de profissiona­lismo cooperativo (motoristas 3,26); 2,93 para valores relacionados à profissionalismo individual e competição no trabalho (motoristas 3,13); 2,87 para valores relacionados ao bem-estar e a motivação dos trabalhadores (motoristas 2,94).

         Conforme tabelas abaixo:

Tabela 1: Valores Organizacionais – Valores de profissionalismo cooperativo dos participantes.

Questão do 01 ao 05

Média

Mot.

1

As iniciativas individuais dos empregados são valorizadas quando não contrariam os interesses da empresa.

3,10

3,18

2

O esforço e a dedicação ao trabalho são qualidades bastante apreciadas.®

3,18

3,25

3

O profissionalismo dos empregados é visto como uma grande virtude.®

3,28

3,54

4

A preocupação em superar as dificuldades do dia-a-dia é vista como de grande valor.®

3,05

3,07

5

Os empregados que demonstram dedicação e espírito de colaboração são os melhores modelos a serem seguidos.®

3,30

3,25

Média geral

3,18

3,26

Fonte: Autoria Própria, 2014.

 

Tabela 2: Valores Organizacionais – Valores de profissionalismo competitivo e individualista dos participantes.

 

Questão do 06 ao 10

Média

Mot.

6

Somente os bons empregados recebem benefícios que lhes garantem um melhor bem-estar.®

2,70

2,82

7

A criatividade é um dos requisitos básicos para a ocupação de cargos gerenciais.®

2,98

3,18

8

O crescimento profissional é considerado indispensável à permanência do empregado na casa.®

3,40

3,79

9

A competição é valorizada, mesmo que de forma não sadia, porque o objetivo da empresa é a produtividade e o lucro.

2,40

2,43

10

A competição é vista como indispensável à obtenção de bons resultados. 

3,18

3,43

Média geral

2,93

3,13

Fonte: Autoria Própria, 2014.

 

Tabela 3: Valores Organizacionais – Valores de satisfação e bem estar dos funcionários participantes.

 

Valores satisfação e bem-estar dos empregados dos participantes

Média

Mot.

11

As necessidades pessoais e o bem-estar dos funcionários constituem uma preocupação constante da empresa.®

3,18

3,36

12

Investe-se no crescimento profissional dos empregados.®

3,30

3,07

13

Os empregados recebem treinamento para poderem desenvolver sua criatividade.

3,20

2,71

14

Programas para aumentar a satisfação dos empregados são regularmente desenvolvidos.®

2,73

2,04

15

Procura-se manter uma atmosfera de segurança e estabilidade para deixar os empregados satisfeitos e confiantes.

1,95

3,50

Média geral

2,87

2,94

Fonte: Autoria Própria, 2014.

 

Em relação às práticas organi­zacionais, verificou-se uma média de 3,59 para práticas de integração externa (motoristas 3,54); 2,51 para práticas de recompensa e trei­namento (motoristas 2,71) e 3,16 para práticas relacionadas à promoção das relações interpessoais no ambiente de trabalho interno (motoristas 2,75).

Conforme tabelas abaixo:

Tabela 4: Práticas Organizacional – Práticas de integração externa dos  participantes.

 

Questões de 16 á 20

Média

Mot.

16

O atendimento às necessidades do cliente é uma das metas mais importantes.®

3,88

3,68

17

Persegue-se a excelência de produtos e serviços como forma de satisfazer aos clientes.®

3,70

3,54

18

O acompanhamento e atendimento das necessidades dos clientes são feitos constantemente.®

2,95

2,86

19

Mantêm-se relações amigáveis com os clientes.®

3,93

3,79

20

As inovações são em geral introduzidas para atender às necessidades do mercado.®

3,50

3,82

Média geral

3,59

3,54

Fonte: Autoria Própria, 2014.

 

Tabela 5: Práticas Organizacional – Práticas de recompensa e treinamento dos  participantes.

Questões de 21 á 25

Média

Mot.

21

Os empregados que apresentam ideias inovadoras costumam ser premiados.®

2,43

2,79

22

Os empregados são premiados quando apresentam um desempenho que se destaca dos demais.®

2,35

2,46

23

Eventos sociais com distribuição de brindes são comumente realizados para os empregados.®

2,30

2,39

24

As inovações costumam ser introduzidas por meio de programas de qualidade.

2,70

2,75

25

Os empregados costumam ser premiados quando alcançam metas pré-estabelecidas.

2,78

3,14

Média geral

2,51

2,71

Fonte: Autoria Própria, 2014.

 

Tabela 6: Práticas Organizacional – Práticas de promoção do relacionamento interpessoal dos  participantes.

Questões de 26 á 30

Média

Mot.

26

Os empregados têm ampla liberdade de acesso aos diretores.®                

4,33

3,14

27

Os chefes imediatos são como pais para os empregados.

3,00

3,00

28

É prática comum a comemoração dos aniversários pelos empregados.®

2,70

2,36

29

As relações entre empregados e membros do alto escalão são cordiais e amigáveis.®

2,68

2,21

30

Os empregados se relacionam como se fossem uma grande família.

3,10

3,04

Média geral

3,16

2,75

Fonte: Autoria Própria, 2014.

 

Os resultados desta investigação revelam que os va­lores e práticas que definem a cultura da transportadora estão intimamente relacionados ao modelo de organização e gestão do trabalho adotado na instituição. Assim, a cultu­ra institucional apresenta elementos relacionados a empresa familiar onde os funcionários tem amplo acesso aos diretores e se relacionam como se fossem uma grande família, dentre os valores mais fortes identificados é no que o crescimento profissional é um termo fundamental para permanência na casa, contrariando o “espírito de família”, por outro lado fica evidente que a empresa investe em seus funcionários no requisito treinamento e os bons funcionários são vistos como modelos a serem seguidos. Embora fique evidenciado a centralização de poder, o empregado tem ampla liberdade de acesso aos diretores.  Há exis­tência de competição entre os trabalhadores, individua­lismo e dificuldade de desenvolvimento do trabalho em equipe; desinteresse no bem-estar dos trabalhadores e na promoção das relações interpessoais, desconsiderando as necessidades dos trabalhadores.  Não costumam premiar nem incentivar novas ideias.

Por se tratar de uma empresa familiar os costumes e as tradições vinham de seus antepassados, mais propriamente do fundador da empresa que tem uma característica conservadora de empresa fechada, embora os filhos tenham feito a sucessão, o poder não mais ficou com o fundador foi dividido entre seus três herdeiros, cada um com 33,33% das ações da empresa, continuaram com a mesma forma paternalista de liderança, e o questionamento dos funcionários é que não há um único diretor, todos os herdeiros definem e opinam sobre todos os setores da empresa e normalmente entram em atrito por divergência de ideias causando descontentamento.

5 CONCLUSÃO:

Os resultados deste estudo comprovam a relação en­tre a cultura organizacional, o modelo de gestão e orga­nização do trabalho adotado pela empresa. Fica evidente que modelos tradicionais de administra­ção e princípios da organização historicamente incorporada pelos gestores e fundadores da instituição, sustentam as práticas de trabalho e determinam os valores e práticas organizacionais.

Assim, na percepção dos trabalhadores, os valores e as práticas organizacionais que permeiam são a forma paternalista da empresa, embora não haja premiações e incentivos a inovações, grande parte dos funcionários estão alinhados com as metas da empresa buscando a satisfação dos clientes. Fica evidenciado que os funcionários estão sempre buscando algo em troca de seu trabalho, neste caso o que se pode perceber é que lutam para ter o respeito dos dirigentes como uma forma de entrar para o grupo. Essa concepção do trabalho fortalece a individualidade dos funcionários, difi­cultando o trabalho em equipe, o desenvolvimento de ações de interdisciplinaridade nos diversos processos ali desenvolvidos, por outro lado estão todos buscando sempre um maior alcance na qualidade dos serviços prestados.

A pesquisa demonstrou que a empresa distingue-se por duas áreas distintas e que pensam de maneira diferente, uma a dos motoristas que visualizam uma empresa tranquila, com todos os recursos necessários para a realização de um bom trabalho, matem pouco contato com a direção da empresa tendo em vista que passam a maior parte do tempo em viagens e o contato pessoal restringe-se somente no momento dos acertos de contas onde o motorista permanece no máximo dois dias e por poucas horas dentro do local de trabalho, trazendo assim uma imagem de empresa “perfeita”. Por outro lado à outra área que seria a dos funcionários internos da empresa em que concentram os setores administrativos, operacionais e gerentes, visualizam a empresa de maneira contraria a dos motoristas, por estar sempre presente na empresa podem observar o modo em que a direção age, os costumes, a forma de liderar, fazendo-os se tornarem exigentes em alguns aspectos, cito: Acreditam que a empresa tem obrigação de premia-los pelos serviços prestados já que acreditam ser  “parte da família” e mereçam.

Além disso, nota-se uma insegurança e instabilidade dos empregados internos pois a empresa não matem uma atmosfera tranquila nos setores administrativo e operacionais, por outro lado no mesmo requisito os motoristas se consideram satisfeitos e confiantes com o ambiente de trabalho, vale ressaltar que estamos tratando de dois ambientes totalmente opostos, um que tem contato diariamente com os diretores e outro externo que pouco mantém contato com gestores e lideres.

Deste modo, é necessária a transformação das práticas exercidas pelos funcionários e diretoria por meio da adoção de novas formas de gestão e organização do trabalho, as quais tem sido es­tudadas e implementadas em diversas outras empresas do mesmo ramo, na tentativa de substituir modelos tradicionais. Preconiza-se a gestão compartilhada, desde que de maneira civilizada, o trabalho em equipe e a va­lorização das necessidades dos indivíduos.

No entanto foi possível constatar que há resistências á mudanças, principalmente envolvendo os diretores/proprietários da empresa. Esta resistência à mudança envolve principalmente questões de autonomia de trabalho, responsabilidades e liderança entre os diferentes setores da empresa, ficou evidente que não há um diretor geral da empresa capaz de tomar uma decisão, o poder é compartilhado pelos três donos que geralmente entram em contradição, não sendo possível a implementação de novas práticas empresariais.

É importante destacarmos que essa mudança somente será efetiva no momento em que ocorrerem modificações nos valores que são compartilhados entre os indivíduos e que for­mam a cultura das organizações, processo que pode contribuir para a melhoria, progresso e profissionalização da empresa citada, visto que a mesma tem um caráter familiar, e que deve ser iniciado pelos gestores e coor­denadores do trabalho.

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