O GESTOR E A QUESTÃO CURRÍCULO

Minha pratica pedagógica foi forjada nas trincheiras da luta social do Movimento Sem Terra, onde militei e trabalhei em escolas de Assentamento do MST durante 10 de minha práxis. Nestes anos de experiências com a formação dos filhos dos Sem Terra e na busca de organizar as escolas pude muitas vezes confrontar as idéias em questões como a do currículo escolar. Quando me deparei com esta atividade na sala ambiente percebi que iria voltar um pouco e relembrar o início de formação. E talvez isso pareça meio nostálgico ou até mesmo personalista por demais, mas vamos lá.  Vamos teorizar.

Em meio a luta social em que estão inseridas as escola do MST é impossível pensar um currículo que saia da escola para os seus atores. Que seja elaborado a partir de um único referencial ou entre quatro paredes. Numa escola do campo não se constrói currículo entre os muros da escola, sua formação vem de todo contexto social, político e real dos atores envolvidos. Também não se vê o currículo como conteúdo a serem seguidos, pois de acordo como os números estatísticos o Fracasso Escolar é real e significativo e o motivo desses dados é funcionalidade da escola. Pelo contrário este concebido como uma política que dispões de aspectos significativos inerentes ao processo de aprendizagem. E por ser uma questão política deve vir da luta social para dentro da escola. Posto que a luta social e forma como os sujeitos constroem a vida tonam-se agentes cognitivos da política curricular conforme Sacristan (2000; p 109).

Este é um aspecto especifico da política educativa que estabelece a forma de selecionar, ordenar e mudar o currículo dentro do sistema educativo, tornado claro o poder e a autonomia que diferentes agentes têm sobre ele, intervindo, dessa forma, na distribuição do conhecimento dentro do sistema escolar e iniciando na prática educativa, enquanto apresenta o currículo seus consumidores, ordenam seus conteúdos e códigos de diferentes tipos.

Sabe se que a política educacional tem um valor significativo no que se refere à construção do currículo, mas é necessário que as escolas tais como seu funcionamento não tome com isto como receita a ser cumprida, pois a mesma refere-se a currículo como estratégia de ação deixando as escolas responsáveis pela construção do seu currículo e consequentemente do projeto pedagógico.

A educação é o processo pelo qual o homem produz o conhecimento, uma vez que este é capaz de elaborar idéias e conceitos em meio à diversidade existente no universo da construção cognitiva. Partindo desta idéia de currículo colocamos a escola como mediadora entre saber cientifico e empírico. "Pela mediação da escola, dá-se a passagem do saber espontâneo ao saber sistematizado, da cultura popular à cultura erudita". Isso dado ao fato de o currículo é um instrumento significativo para desenvolver os processos de conservação, transformação e renovação dos conhecimentos, Moreira (2003).

Ao modo que os envolvidos no cotidiano escolar pratiquem o princípio de que "nada do que é humano é estranho. '' O currículo deve demonstra de forma clara uma concepção de humano, posto que, como política que é a ação educativa deve se preocupar com o processo de humanização.

A minha práxis me faz entender que seja a partir dos PCNs ou seja a partir de qualquer outro regencial existe algo que o currículo deve sempre comtemplar e primar, a concepção de humano. Penso que o currículo deve compreender o ser humano como produtor e não como produto, uma vez que necessita produzir para sua própria existência, essa produção se dá através do trabalho, sendo essa a principal diferença entre o homem e os outros animais. Pois o homem por ser racional utiliza-se desse saber para conquistar o lugar de destaque entre os demais. Essa concepção busca compreender também a práxis e a cultura, já que o ser humano possui habilidades capazes de intervir na transformação do mundo em sua volta. Para Saviani sociedade está no indivíduo, assim como o indivíduo está na sociedade. Como diria Émile Durkheim é o fluxo do devir, quanto mais inferimos na sociedade, mais a nossa existência é determinada por ela ao passo que transformamos e somos por ela transformados. A escola deve estar preparada para esta visão tão global da ação humana em sociedade. Conforme revela Perrenoud (2005):

A abordagem a partir do currículo real e da experiência de vida tem consequências enormes quanto ao papel do professor", pois, "se ensinamos o ‘que somos', segundo uma fórmula que convém tanto à educação quanto à sociedade, o primeiro recurso da escola seria o grau de cidadania dos professores".

Publiquei um artigo que trata a questão do currículo em outro enfoque, mas que aproveito aqui para me ajudar a tecer esta trama. Defendo um currículo tenha uma função social a cumpri diante do grupo social. Desta forma destaco a necessidade de um currículo cultive sonhos, e vontades, vontades de ser e agir sem medo de ser feliz. Nossa educação precisa ajudar os homens a projetarem para futuro e a adquirirem a capacidade de intervenção e de transformação prática da realidade. Não acredito na educação somente como o desenvolvimento da chamada consciência crítica; que é aquela onde os indivíduos conseguem denunciar, discutir sobre os problemas e suas causas, mas não conseguem buscar soluções. Entendo que o currículo deve propor uma educação capaz de desenvolver uma consciência organizativa, que leva os indivíduos de forma organizada a promoverem ações que passem da crítica para a ação e resolução de problemas. É preciso considerar que a ação libertadora tem uma dimensão educativa que nenhum estudo teórico pode substituir. Por outro lado percebemos que em muitas instituições acontece o chamado currículo oculto.

O currículo oculto é constituído por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem, de forma implícita para aprendizagens sociais relevantes (...) o que se aprende no currículo oculto são fundamentalmente atitudes, comportamentos, valores e orientações... (Silva, 2001:78).

Na escola que trabalho é possível perceber alguns aspectos relevantes deste currículo oculto, que de forma não planejadas acontecem a acabam se amarrando ao fazer pedagógico dos professores, um exemplo disso é a sala de leitura que foi criada a partir de rodas de leitura que eram realizadas pelos professores com seu aluno, e hoje acabou se tornando um dos espaços de aprendizagens da escola, e um enfocando um componente curricular.

No livro Gestão da Escola, Desafios a Enfrentar Vieira (2002) transferiu de forma o entendimento que tenho da grandiosa a responsabilidade dos pilares da educação e do sistema de gestão da escola, ou seja, aprender a conhecer, aprender a fazer aprender a conviver e aprender as ser (UNESCO 1999), não é função apenas do sistema escolar como um todo, mas competências a serem conquistada pelo gestor educacional.

ü  Aprender a conhecer o mundo contemporâneo e relacioná-lo com as demandas de cada escola (sua clientela - seus sonhos, suas necessidades, seus direitos – seus profissionais, sua vizinhança, suas condições etc.);

ü  Aprender a planejar e fazer (construir, realizar) a escola que se quer (o seu projeto pedagógico);

ü  Aprender a conviver com tantas diferentes pessoas, definindo e partilhando com elas o projeto da escola;

ü  Aprender a utilizar, sem medos, as próprias potencialidades de crescimento e formação contínua.

O relatório do X Congresso nacional de educação enfoca alguns elementos importantes na vida escola com relação ao currículo, em particular as escolas do campo. Este relatório mostra a escola do campo como espaço de concretização do currículo uma vez que este brotou da luta social e agora chega à escola, o espaço que lhe dará consistência político-pedagógica.

Segundo Moreira (2006):

Nesta perspectiva, ele é o instrumento central pelo qual ocorre a promoção da qualidade do ensino, como destaca o autor o currículo é o “coração da escola”, todas as suas ações giram em torno dele. Para isso, é preciso que exista uma flexibilização por parte para que suas ações não se tornem dogmáticas e inflexíveis.

A questão do currículo nas escolas do campo é um desafio muito significativo para o corpo docente, direção, bem como para todos os integrantes da escola, uma vez que é preciso o professor tenha um bom domínio teórico e históricos dos processos de elaboração e implementação do currículo.

Segundo Arroyo (2006) um projeto de educação do campo tem que incluir uma visão mais rica do conhecimento e da cultura, onde o gestor escolar esteja capacitado ou pelo menos aberto para as novas idéias e necessidades do campo. É preciso que as questões curriculares incorporem saberes do campo, do homem do campo, e que acima de tudo prepare o homem para a produção e o trabalho, para a emancipação, para a justiça, para a realização plena como ser humano.

Neste sentido, não pode separar o tempo da cultura e tempo do conhecimento, a formação e a luta social. É preciso que a escola do campo crie sua própria identidade e que isto seja evidenciado no currículo, que quando olharmos para a proposta pedagógica possa ver o homem do campo identificado nela, para isso, é importante que a escola esteja mais aproximada da realidade na qual está inserida e mais preparada para dela participar efetivamente. O gestor tem papel preponderante uma vez que este é responsável pela condução do processo de construção e execução do currículo da escola.

Bibliografia

 

 

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