RESUMO
Têm surgido diversas disciplinas relacionadas à linguagem. Perceber a linguagem apenas centrada na língua não é mais cabível. É mister uma visão bem mais ampla. Sujeito, leitura, sentido, contexto, ideologia, discurso dentre outros, são termos que têm sido alvos de discussões de muitos estudiosos. Sabe-se que a leitura é necessária para tornar o cidadão crítico aos problemas da sociedade e um dos gêneros textuais que revela esses problemas é a reportagem. Por sua vez, os PCNs têm exigido do professor de Língua Portuguesa que este insira na sala de aula os diversos gêneros textuais, para que o aluno se torne um leitor em potencial. Inserir apenas textos literários não é mais viável. Urge a inserção de textos discursivos que circulam na sociedade, para que o aluno se torne crítico e capaz de perceber a importância do diálogo que rege os textos e, assim, interaja com a realidade por desempenhar uma efetiva compreensão das leituras realizadas. É primordial que se use o gênero reportagem em sala, pois ele é visto como um instrumento que possibilita a formação desse leitor. Este artigo baseia-se em suportes teóricos como os PCNs, a visão de leitura de Sírio Possenti, Irandé Antunes e Mário A. Perini., a visão de discurso de Bakthin e Kleiman, dentre outros teóricos que são apresentados. A apresentação desse trabalho incita aos professores, a que sem medo utilizem-se desse gênero para que se tenha educandos com muito mais criticidade e capacidade de cooperar para as transformações tão necessárias na sociedade.
PALAVRAS-CHAVE: leitura; reportagem; discurso; ideologia; conhecimento extralinguístico.
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Licenciada em Letras/Português pela Universidade Tiradentes-UNIT
ANDRADE, Elda Santos [email protected]
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INTRODUÇÃO
A leitura na escola tem sido alvo de muitos trabalhos acadêmicos, pois é perceptível o desinteresse dos alunos para o seu exercício. A discussão sobre a importância da leitura tem levado profissionais, estudiosos e governantes a estarem inquietos diante de resultados estarrecedores como os apresentados pela Prova Brasil, IDEB, ENEM, Saeb, dentre outros.
Como se sabe leitura não é apenas o ato de decodificar os códigos linguísticos ou de forma mais específica o significante. Leitura vai muito mais além. É necessário que o aluno seja levado a entender o significado daquilo que eles leem. Mas, sem a prática da leitura, torna-se quase impossível esse entendimento.
Nota-se que textos privados de sentido são entregues aos alunos e isso tem levado ao entorpecimento da competência linguística dos mesmos. Alcançar a compreensão textual é necessário para se tornar um leitor em potencial, no entanto, percebe-se que o uso de gêneros sem sentido e descontextualizados tem bloqueado esse desenvolvimento.
Esse trabalho, a priori, objetiva inserir o gênero reportagem no ambiente escolar da Escola Municipal Professora Francisca de Sá com os alunos do 8º ano, entendendo que o mesmo tem muito a acrescentar ao ensino. O estabelecimento de ensino supracitado localiza-se no Povoado Lagoa da Volta em Porto da Folha-SE. O uso desse material didático é defendido como sendo um elemento motivador da leitura e, segundo Smith apud Eurídice da Conceição Tobias, “a leitura é mais fácil quando o leitor considera o material significativo”.
Embora apresente um certo grau de dificuldade devido à formalidade com o qual esse gênero é elaborado, a aproximação com a realidade social e política do aluno possibilitará que ele interaja opinando, discutindo e sendo um agente na construção de sua aprendizagem.
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O uso desse material didático – reportagem - voltado para o interesse do aluno aliado aos conhecimentos discursivos propicia realmente o desenvolvimento de competências leitoras. As dificuldades que os alunos demonstram ao realizarem atividades que envolvam interpretação de texto, decorrem devido à carência de material didático apropriado ou mesmo de temas que despertem o interesse dos mesmos e esses pontos podem ser minimizados se houver uma reflexão que vise a uma mudança na prática pedagógica de alguns professores.
Observar o que alguns teóricos apresentam acerca da leitura e tudo o que a envolve é primordial. Para tal apresenta-se nesse trabalho pensamentos de Sírio Possenti, Irandé Antunes, Mário A. Perini, Marcuschi, Bakthin, Kleiman e outros. Também, segue-se em anexo algumas das reportagens que foram discutidas em sala de aula.
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1. DIFERENTES CONCEPÇÕES SOBRE LEITURA, INTERPRETAÇÃO E DISCURSO.
Um dos aspectos importantes no ensino da Língua Portuguesa é utilizá-la de modo diversificado, ou seja, favorecer o desenvolvimento da competência linguística dos educandos. Isso significa aprender a manipular diversos tipos de textos escritos e adequar o registro às diferentes situações de comunicação (recados, cartas, bilhetes, avisos, etc.). No entanto, não é a mera inclusão de textos os mais diversos ou então de textos tidos como bons e superiores entre os textos escolares que solucionarão o problema apresentado nas estatísticas dos processos avaliativos estabelecidos pelo Ministério da Educação – MEC.
Conforme abordam os Parâmetros Curriculares de Língua Portuguesa (1997, p.30) “Cabe à escola viabilizar o acesso ao aluno do universo dos textos que circulam socialmente, ensinar a produzi-los e a interpretá-los.”
Evidencia-se, pois, que é na escola que o aluno deve ter acesso ao conhecimento, como também é nela que deve ser possibilitado o desenvolvimento da competência linguística do educando. É óbvio que não se aprende a ler, nem dominar estratégias de leitura, de uma hora para outra. Daí o porquê de a escola ter que primar por esse aprendizado ao longo do currículo pelo qual o aluno deva passar.
Possenti afirma que
Ler e escrever não são tarefas extras que possam ser sugeridas aos alunos como lição de casa e atitude de vida, mas atividades essenciais ao ensino da língua. Portanto, seu lugar privilegiado, embora não exclusivo, é a própria sala de aula. (POSSENTI, 2001, pg.20)
Com essa concepção da necessidade de se conhecer a língua, vê-se que o avanço nos estudos e uso dos gêneros textuais, trouxe uma exigência maior. Espera-se que os alunos tenham um nível de leitura mais elevado. Isso tem exigido
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deles que leiam os textos ressignificando-os no contexto e, de forma crítica, possam refletir e participar da propagação de ideias e escolhas como cidadãos que são.
É através da leitura de textos e leitura de mundo que o indivíduo se insere na sociedade. Ainda nos PCNs de Língua Portuguesa (1997, p.34) é dito que “... a capacidade de decifrar o escrito é não só condição para leitura independente como – verdadeiro rito de passagem – um saber de grande valor social.”
Mas, ter bons leitores continuando a oferecer textos sem significados para eles é utópico. Também, não se pode pensar que só mostrando a estrutura da língua, o aluno compreenderá o texto.
Um texto é uma unidade significativa. Isto quer dizer que a definição de texto está ligada a „fazer sentido‟. Isto quer dizer que, no momento em que os parceiros de uma atividade comunicativa global, diante de uma manifestação lingüística, pela atuação conjunta de uma complexa rede de fatores de ordem situacional, cognitiva, sociocultural e interacional, são capazes de construir, para ela, determinado sentido, estão produzindo textos.(COROA, 2008, p.67)
No ato da leitura não existe apenas um sujeito, existem interlocutores, com finalidades e propósitos sociocomunicativos bem estabelecidos. O aluno quando recebe um texto, se não tiver inteirado de alguns conhecimentos extralinguísticos não construirá nenhum sentido textual.
Os PCNs de Língua Portuguesa (1997, p.54) declaram que
A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a língua: características do gênero, do portador, do sistema da escrita, etc. Não se trata simplesmente de extrair informação da escrita, decodificando-a letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica, necessariamente, compreensão na qual os sentidos começam a ser constituídos antes da leitura propriamente dita.
Partindo para o jornal, nota-se que ele é um portador de diferentes gêneros - textos opinativos, como editorial, cartas dos leitores, críticas, notícias, reportagens,
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dicas culturais, classificados etc., - que se encontram distribuídos em diferentes cadernos. Ele permite a formação do hábito de ler para estudar, para buscar informações, competência essencial por toda a vida.
Alguns alunos nunca viram um jornal escrito, mas apenas os televisivos. Não sabem como um jornal é organizado, não sabem diferenciar os gêneros que um jornal apresenta, tampouco as características dos mesmos.
Percebe-se, pois, que a utilização do gênero reportagem – ora em estudo – um gênero do domínio discursivo, não é uma prática costumeira sequer faz parte do planejamento pedagógico anual da maioria dos professores. Na realidade, há uma predileção no uso de gêneros literários em detrimento do uso de gêneros de caráter informativo, embora se saiba que são esses os que possibilitam uma leitura crítica.
Hoje, alguns professores têm até permitido que os alunos tenham acesso a essa linguagem por perceberem que o trabalho com a leitura desses textos visa ter uma visão mais crítica do mundo. Porém, trabalhar com esse tipo de gênero requer muita disposição e entendimento, pois são muitas as didáticas que podem ser utilizadas e, às vezes, o professor não detém um conhecimento nem mesmo prática para desenvolvê-las com habilidade.
O aluno que tem acesso a tal gênero percebe a diferença entre esse tipo de texto e os textos de ficção, pois percebe a realidade imediata expressa e compara com as conversas que ouve, aquilo que vê na rua e o que assiste na televisão. Os textos informativos, quando integrados ao trabalho com textos em geral, ampliam as possibilidades de leitura do mundo. É essa visão que se espera passar com a inserção do gênero reportagem.
Infelizmente, devido à inacessibilidade desse gênero ainda hoje em muitas instituições escolares, o aluno sente dificuldade em entendê-lo quando lhe é apresentado. Essa dificuldade fica evidente também, porque muitas vezes o aluno ainda não teve acesso a outros gêneros textuais de mais fácil interpretação. Como diz Mário A. Perini:
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Na verdade, para que se dê a compreensão, mesmo em nível bastante elementar, é necessário que as pessoas tenham muito mais em comum que simplesmente uma língua. Precisam ter em comum um grande número de informações, precisam pertencer a meios culturais semelhantes, precisam mesmo ter, até certo ponto, crenças comuns. (2002, p.57-58)
Não é saber apenas ler, é necessário interpretar, é necessário interlocução. O enunciado precisa ter um sentido completo, como nos dizem os gramáticos, para estabelecer comunicação. Mas, a comunicação muitas vezes tem sido prejudicada, pois falta um fator de extrema importância que é a contextualização.
É bem verdade que ler ou até mesmo aprender a ler amplia as possibilidades de interlocução com pessoas que talvez nunca serão vistas, mas por interagir com elas através do texto, o leitor se torna capaz de criticar e avaliar os modos de compreender o mundo, as coisas, as gentes e suas relações. Nota-se que o aluno muitas vezes decodifica toda parte fonética, morfológica e sintática da língua, mas quando se depara com a semântica textual há um bloqueio intelectivo, há um distanciamento entre o emissor e o receptor. É como se os interlocutores falassem línguas diferentes. O campo semântico não é amplo e não há, pois, comunicação.
Possenti (p.47) diz que “O domínio de uma língua se dá por meio de práticas efetivas, significativas, contextualizadas”. Na opinião dele, não se aprende uma língua através de exercícios repetitivos, mas por práticas significativas. Isso mostra que o significado de uma frase ou de um texto vai muito além de um conhecimento linguístico. O entendimento de um texto é uma tarefa que depende também de um conhecimento extralinguístico, de um conhecimento de uma infinidade de coisas não linguísticas, de informações gerais sobre o mundo. Obviamente a incompreensão se dá pela ausência desses conhecimentos.
Perini (p.67) também diz que
O ato de compreender o que nos dizem não se resume, nem de longe, ao uso correto e eficiente da língua. Portanto, para que haja comunicação é preciso que os interlocutores tenham em comum muito mais que conhecimento da mesma língua; é necessário que compartilhem grandes fatias do conhecimento do mundo em geral.
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Através desse pensamento fica evidente que quanto mais você souber sobre o mundo em geral, mais chances você terá de entender o que ler ou ouvir. Mas, informações sobre o mundo em geral é também responsabilidade da escola. É ela que deve possibilitar esse conhecimento através dos textos que ela apresenta.
Irandé Antunes diz que a atividade da leitura é
uma atividade de interação entre sujeitos e supõe muito mais que a simples decodificação dos sinais gráficos. O leitor, como um dos sujeitos da interação, atua participativamente, buscando interpretar e compreender o conteúdo e as intenções pretendidos pelo autor. (2003, pg.67)
A compreensão textual se dá ao longo da interação do leitor com o mundo de textos que lhe são apresentados em todo o seu desenvolvimento escolar. Espera-se, que o mesmo domine o uso de um número cada vez maior de textos dos mais fáceis aos mais complexos, buscando identificar os significados dos mesmos. Para isso, Celso Antunes (2002, p.22) propõe que o professor permita ao aluno que o mesmo faça releituras das informações recebidas através do manejo consciente do universo vocabular do estudante. Releitura, segundo Celso Antunes, significa:
Literalmente, a decomposição do texto lido, um verdadeiro mastigar de cada palavra, para que se compreendam as ideias que abriga e sua hierarquia, as sintaxes que propõe e sua harmonia, as emoções que desperta e a inevitável associação que essa leitura trás a tudo quanto sabemos e conhecemos. Uma verdadeira releitura aproxima o aluno de uma verdadeira apropriação do texto, caracterizando o processo de aprendizagem como o de uma conquista que se incorpora à estrutura dos saberes existente nessa pessoa. (2002, p.22)
Esse processo levará o aluno ao questionamento, ao desenvolvimento do raciocínio intuitivo e dedutivo tão necessário para se perceber o que há nas entrelinhas do tecido textual, que o autor/locutor, intencionalmente ou não, quis deixar implícito.
Como se sabe toda linguagem é dialógica, é sociointeracionista, ou seja, todo enunciado é sempre um enunciado de um locutor para seu interlocutor, logo toda
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linguagem é fruto de um acontecimento que envolve pessoas. É um acontecimento social. Não é um ato meramente individual, porque através do que é enunciado, o indivíduo se insere na sociedade. É uma interação comunicativa na sociedade através do texto, por isso também chamada de sociodiscursiva a qual subentende-se, que quem escreve ou fala revela uma intenção.
Como diz Bakthin apud Marcuschi
Mas a língua é muito mais do que um sistema de estruturas fonológicas, sintáticas e lexicais. A língua não é sequer uma estrutura; ela é estruturada simultaneamente em vários planos, tais como o fonológico, o sintático e o cognitivo, que se organizam no processo de enunciação. A língua é um fenômeno cultural, histórico, social e cognitivo que varia ao longo do tempo e de acordo com os falantes: ela se manifesta no seu funcionamento e é sensível ao contexto. Não é um sistema monolítico e transparente, para “fotografar” a realidade, mas é heterogênea e sempre funciona situadamente na relação dialógica, como ensina Bakhtin (1979). (MARCUSCHI 2008, p. 240)
O texto revela-se, pois, como uma linguagem funcional, porque ele tem uma ação sócio-discursiva que age sobre o locutor e o interlocutor. Marcuschi mesmo já disse em um dos seus textos que “os gêneros são ações sociodiscursivas que age sobre o mundo e diz o mundo, constituindo-o de alguma forma.” Logo, a compreensão dos enunciados não é função exclusiva de um processamento das estruturas linguísticas contidas neles, mas é também parcialmente função da percepção da situação em que o sujeito se encontra, com quem se comunica, o que sabe e aquilo que acredita que seu interlocutor também saiba. A questão da compreensão está intrinsecamente ligada à questão do sujeito, pois espera-se dele uma atitude.
"A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas, nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui a realidade fundamental da língua". (Bakhtin1986:123).
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Como se vê, pois, o discurso não se prende apenas à língua, mas estabelece uma ligação entre o nível linguístico e o extralinguístico. Michel Pêcheux apud Hélia Oliveira (2009) prioriza outros elementos que vão além do ato comunicativo e corrobora com essa ideia quando diz que
[...] a língua não quer apenas transmitir informações, não quer apenas anunciar algo, mas leva em consideração o contexto social, histórico e ideológico em que um determinado enunciado foi produzido. O discurso transpassa uma exterioridade da linguagem e abarca elementos ideológicos e sociais. (OLIVEIRA, 2009)
Obviamente qualquer análise lingüística deverá partir do texto, mas não apenas dele. Como a linguagem é um meio de dominação e de força social e, através dela, as relações de poder são estabelecidas e até de certa forma institucionalizadas, percebe-se a necessidade de se considerar o papel do contexto. É aqui que entra a Análise do Discurso que estuda a linguagem como prática social e, para tal considera o papel crucial do contexto, ou seja, a relação entre linguagem e o poder.
Aquilo que alguém disse, disse em um contexto específico que proporciona significados diferenciados de acordo com seus interlocutores, pois envolve ideologias e subjetividades relacionadas às experiências de cada um até aquele momento. Mas, quando há interação entre o locutor e o interlocutor a compreensão é possível, pois não se pode pensar o homem, segundo Bakthin apud Euridice da Conceição Tobias, fora das relações que o ligam ao outro.
Mas, a Análise do Discurso vai analisar também as relações de dominação, discriminação, poder e controle, na forma como elas se manifestam através da linguagem. Sendo a linguagem de natureza socioideológica, Pedrosa (2008, p. 25) diz que “A ideologia é um reflexo das estruturas sociais e entre linguagem e sociedade existem relações dinâmicas e complexas que se materializam nos discursos ou, melhor, nos gêneros do discurso” e, citando Bakthin, continua dizendo que “tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo” (Pedrosa 2008, p.25)
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Os leitores ou ouvintes não são recipientes passivos quando se relacionam com o texto, mas quando o leitor é inexperiente a ideologia que é imposta ao leitor o levará a ser um sujeito ativo ou passivo diante do discurso que lhe é apresentado.
Ainda conforme Kleiman apud Ângela Maria Pereira
[...] o leitor adulto não decodifica, mas lê percebendo as palavras de uma maneira global e adivinhando muitas outras. Isso ele faz orientado pelo seu conhecimento prévio e por suas hipóteses de leitura. Se o leitor conseguir levantar hipóteses de leitura independentemente, fazendo uso do conhecimento prévio e dos elementos formais mais aparentes e de alto grau de informatividade, a leitura terá o caráter de verificação de hipóteses, para ratificação ou contestação e revisão, num processo envolvendo atividade consciente, autocontrolada pelo leitor, assim como várias estratégias úteis à compreensão. (PEREIRA, p.4)
É claro que um texto ao ser produzido assume uma exteriorização que atrai o leitor. Enunciado, cores, figuras, quadros, etc, são elementos exteriores que fazem parte da ideologia do autor o qual espera que seu interlocutor se envolva com o que é exposto e, assim corresponda à intenção ideológica proposta.
Fica claro, então, que por trás de todo texto há uma ideologia. Não há apenas a intenção de transmitir informações, trazer à tona o conhecimento de algum fato, mas o objetivo é uma reação do sujeito leitor. Obviamente uma reação que seja favorável àqueles que dominam histórica e socialmente.
Voltando para o estudo de reportagem no suporte jornal, percebe-se, nele, a menção de diversos temas e, assim como todo texto informativo, ele visa formar opiniões. Como é sabido, o suporte jornal é manipulado pela classe dominante que dita o que deve ou não ser informado. Por isso, mesmo sendo um suporte textual a que grande parte da população tem acesso, apenas pessoas que têm um certo grau de escolaridade ou que possuem poder aquisitivo são os receptores de seus discursos e com eles interagem.
Um fato que não se pode esquecer é que a ação do discurso será favorável ao seu produtor dependendo de sua posição social e da posição social do
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interlocutor. Um exemplo bem claro é o discurso de um médico e de um indivíduo comum na sociedade. A posição daquele determinará o que pode e o que não pode ser tomado pelo paciente. Esse muitas vezes sequer questiona, por faltar-lhe o domínio discursivo, mas quando esse tem uma competência lingüística e extralingüística adulta, como diz Kleiman - já supracitado - haverá de questionar as razões daquele discurso ideológico. Daí, subentende-se, que o mesmo discurso pode ter interpretações diferentes, pois dependerá do posicionamento, ou seja, da posição social de cada interlocutor.
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2. ANÁLISE DAS REPORTAGENS PRESENTES NO JORNAL CINFORM.
Conforme anteriormente dito, a utilização do gênero reportagem não é uma prática costumeira nem faz parte do planejamento pedagógico anual da maioria dos professores. E, embora o trabalho com a leitura desses textos visa ter uma perspectiva mais crítica do mundo, percebe-se que muitos alunos ao chegarem ao Ensino Médio, não têm criticidade necessária a esse nível escolar. Esse problema possivelmente se relaciona ao fato de que não foi dado nos anos anteriores o mínimo do acervo dos gêneros textuais. Com isso a compreensão como leitor ativo fica sempre em decréscimo.
Para o início da atividade proposta foram dadas algumas orientações aos alunos sobre os tipos textuais. Falou-se sobre os principais gêneros que aparecem no jornal, como editorial, notícias, reportagens, etc. Foi mostrada a organização do jornal, os cadernos que fazem parte dele, a importância do tamanho das letras, das fotos e das legendas. Diferenciou-se o gênero reportagem de outros gêneros encontrados nos jornais. Enfatizaram-se as características de um texto informativo e de uma reportagem diferenciando-a da notícia. Foi dada uma noção geral para ver o nível textual em que os alunos se encontravam.
A série em que a análise foi realizada deu-se por se acreditar, que devido ao percurso escolar dos alunos, os mesmos já tivessem uma noção ou até mesmo domínio do gênero, mas a maioria dos alunos nunca pegou sequer em um jornal.
A fim de saber as condições de leitura e compreensão das reportagens a turma foi dividida em grupos e cada grupo ficou com uma reportagem para analisar. Algumas questões foram elaboradas e foi pedido que os grupos respondessem dentro do texto a eles oferecido. Observou-se uma dificuldade em extremo para responder as questões. É natural e fica evidente que de fato o texto só terá sentido para aqueles que já tenham não apenas um conhecimento lingüístico, mas também um conhecimento extralinguístico adulto, como disse Kleiman. É necessário para a
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compreensão textual um conhecimento muito mais desenvolvido e que leve em consideração a visão cultural e sociointeracional do indivíduo.
Sabe-se que as pessoas de baixa formação escolar ou com formação escolar debilitada, não têm a linguagem formal desenvolvida e, em um povoado no qual a variedade que a maioria das pessoas apresenta é a linguagem coloquial, o entendimento esperado se torna bem mais difícil. Isso dificulta também a sociointeração textual. Não há diálogo, não há envolvimento entre os interlocutores, e o discurso não atinge a sua proposta ideológica.
A seqüência didática da atividade se procedeu com a seleção e entrega de algumas reportagens do jornal Cinform dos dias 28/02 a 06 de março de 2011 – Ano XXIX, edição 1455, para leitura. As reportagens eram originais, para que os alunos que não conheciam um jornal tivessem acesso, conhecessem sua estrutura e percebessem os diversos gêneros presentes nesse suporte e identificassem as características presentes nas reportagens.
Em seguida foi dado o questionário para exploração do conhecimento do aluno sobre o gênero e possíveis conhecimentos de informações extralingüísticas: Qual tipologia textual do gênero lido? A qual público é dirigido o gênero escolhido? O gênero lido foi bem elaborado para atingir o seu objetivo? Qual objetivo o autor tinha ao escrever esse gênero? A linguagem utilizada é formal ou informal? Explique. O meio/canal de comunicação utilizado foi adequado para atingir o objetivo ao qual o autor se propõe? O gênero despertou o seu interesse? Por quê? Quais as características do gênero escolhido em termos de composição, conteúdo, nível lingüístico, propósito? Qual o domínio discursivo desse gênero? Qual a sua reflexão sobre o gênero escolhido?
Ao analisar as respostas dos grupos percebeu-se que as reportagens foram satisfatórias. A leitura foi mais fácil, pois eram temas atuais e que falavam da realidade de alguns despertando o interesse deles. Mesmo tendo dificuldade de responderem algumas questões, eles compararam algumas reportagens com as conversas que ouviam e até mesmo com reportagens de telejornais. Eles perceberam também algumas características de uma reportagem, como quadro
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informativo, depoimentos, fotos, recursos gráficos utilizados etc., elementos que já tinham sido discutidos anteriormente.
Nota-se pela realização e análise desse trabalho que a maioria dos alunos entenderam, pois verbalizaram através de suas respostas escritas e através da oralidade, apontando até mesmo na reportagem, algumas de suas características. Não se descarta, obviamente, o entendimento dos outros que tiverem certa dificuldade de se exporem, tampouco deve desvalorizá-los, pois pelo que foi estudado, o sentido de um texto dependerá de outros fatores que são inerentes ao sujeito, por isso são subjetivos.
Em um questionário particular perguntou-se com relação à leitura de textos diversos como o aluno se achava como leitor. Ele respondeu que encontrou algumas dificuldades na leitura devido a algumas serem muito longas, serem assuntos sem interesse e porque lhe faltava o costume com determinados tipos de leitura. Ao perguntar o que ele achava que facilitaria sua leitura, o mesmo afirmou que ler mais devagar, exercitar mais a leitura, reler o texto se necessário e prestar atenção também em figuras, gráficos que ajudem a compreender o texto.
A utilidade da leitura para ele foi que ampliou seus conhecimentos, teve uma nova visão do assunto e sentiu-se preparado para ler outros textos. O mesmo contribuiu com seu pensamento sobre o que é necessário para ser um bom leitor ao afirmar que ler com concentração e ler diferentes tipos de textos, de diferentes portadores ( jornais, folhetos, revistas, etc.) é muito importante.
Evidencia-se, pois, que para o entendimento de qualquer gênero é necessário que o professor explore pontos do texto e informações que serão pertinentes à reflexão do aluno, pois a partir daí a construção do sujeito se tornará mais sólida. A elaboração de perguntas levará o aluno a ver o texto por outro ângulo, garantindo a eles um nível mais aprofundado de compreensão.
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CONCLUSÃO
Embora tenham sido apresentadas dificuldades em trabalhar com o gênero reportagem, constata-se que ele é riquíssimo para que o aluno tenha uma leitura mais aprofundada, contribuindo assim num melhor desenvolvimento no processo de leitura. A leitura de reportagens não leva a uma individualidade, ela exige a coletividade, a discussão dos conhecimentos prévios que o aluno já tem. Isso levará aos questionamentos, a apologias e comprovações tão necessárias para que o aluno interaja com o texto.
Esse tipo de trabalho proporcionará momentos de reflexão sobre a prática pedagógica de alguns professores e os momentos do ato de ler dos seus educandos. Também a proposta em trazer implicações da realidade refletidas em muitos materiais de leitura que são veiculados pelos meios midiáticos, possibilitará uma intervenção positiva na formação do leitor.
É primordial que o professor apresente novos caminhos para levar o aluno ao estágio de compreensão no ato da leitura, como sinônimo de um processo discursivo, envolvendo a linguagem como prática social e cultural. Que tais conceitos sirvam de base para o professor no desenvolvimento do processo de leitura em sala, sabendo que não é possível esperar de nossos alunos que tenham apenas uma ideia coletiva, antes pelo contrário sejam sujeitos atuantes das suas ideias e que as mesmas venham a ser aplicadas na sociedade através de seus posicionamentos individuais.
Se o professor proporcionar aos alunos esses novos caminhos, levarão os mesmos a uma leitura mais ampla com mais significado. Se em qualquer gênero e, no caso em análise - na reportagem -, se houver uma relação direta com a experiência concreta do leitor, se houver um conhecimento prévio das características do texto, ele irá compreender e perceber a ideologia presente nos mais diversos gêneros.
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É necessário refletir sobre a importância de que os contextos escolares e os extraescolares interagem entre si, e essa reflexão se dará por meio de atividades interdisciplinares e intertextuais. Com a inserção de textos com diferentes usos e funções comunicativas e, de uma forma especial, textos informativos, haverá consequentemente a melhoria do desempenho no ato de leitura do aluno, que é o esperado.
O professor não deverá descartar os textos literários, mas no momento, urge a inserção e a predileção por textos informativos, pois são esses os textos que os alunos têm tido mais acesso pelos meios de comunicação e que possibilitam uma efetiva leitura crítica dos enunciados. Dizer que os mesmos não têm prazer no ato da leitura é um ledo engano haja vista os mesmos passarem horas a fio conectados à Internet, lendo e produzindo textos os mais diversificados.
Evidentemente que as habilidades lingüísticas necessárias à leitura de textos de gêneros variados devem ser trabalhadas em sala de aula. O leitor competente deve saber localizar informações explícitas, formular suas hipóteses sobre informações que vão além texto, saber identificar o sentido global do texto, as intenções do autor o que há nas entrelinhas, dentre outras competências. Estas terão um direcionamento dado pelo professor que espera o desenvolvimento dessas habilidades em seus alunos.
Não tendo esgotado o assunto e seguindo orientação dos PCNs, afirma-se que é necessário que outros estudos sejam realizados para que haja uma efetivação em massa da inserção dos múltiplos gêneros textuais no ambiente escolar, uma vez que nem todos os gêneros têm sido apresentados. Isso possivelmente porque falta esclarecimento, maturidade e convivência também dos professores com os gêneros textuais.
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REFERÊNCIAS
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Rumo ao Rio, River!. Jornal CINFORM: Aracaju-SE. 28/02 a 06 de mar. de 2011. Caderno Líder. pg.07
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ANEXOS
Cronograma das Atividades
Data
Atividade
Local
Horário
01/03/2011
Orientações sobre as tipologias textuais e alguns gêneros textuais
Escola Municipal Profª Francisca de Sá - Sala do 8º Ano
13:00 – 14:30
04/03/2011
Orientações sobre os gêneros textuais apresentados em um jornal mostrando-os no suporte em estudo
Escola Municipal Profª Francisca de Sá - Sala do 8º Ano
13:00 – 15:15
08/03/2011
Orientação sobre a diferença entre notícia e reportagem
Escola Municipal Profª Francisca de Sá - Sala do 8º Ano
13:00 – 14:30
11/03/2011
Entrega do questionário e devidos esclarecimentos.
Divisão em grupos
Entrega das reportagens e início da discussão em grupos
Escola Municipal Profª Francisca de Sá - Sala do 8º Ano
13:00 – 15:15
15/03/2011
Retorno da reunião em grupos para responderem as questões
Escola Municipal Profª Francisca de Sá - Sala do 8º Ano
13:00 – 14:30
18/03/2011
Término e entrega do questionário
Escola Municipal Profª Francisca de Sá - Sala do 8º Ano
13:00 – 15:15
04 à 17 do 04 de 2011
Análise das respostas para levantamento de dados
Casa da Professora
Indefinido
QUESTIONÁRIO INDIVIDUAL
Como você se avalia como leitor? Faça o teste, respondendo às questões seguintes.
1. Com relação à leitura dos textos:
a) Foi fácil.
b) Foi difícil.
c) Houve algumas dificuldades.
2. Pense sobre os textos que achou difícil ou que apresentaram alguma dificuldade para leitura. Escolha as alternativas que indicam as dificuldades encontradas por você
a) Textos muito longos.
b) Vocabulário difícil.
c) Letra miúda.
d) Assunto sem interesse.
e) Linguagem difícil.
f) Falta de costume com leitura/esse tipo de leitura.
g) Outra razão, não apontada aqui. Qual?
3. O que você acha que teria facilitado sua leitura?
a) Ler mais devagar.
b) Exercitar mais a leitura.
c) Reler os textos se necessário.
d) Voltar a passagens que apresentem dificuldade.
e) Prestar atenção também em figuras, gráficos que ajudem a compreender os textos.
f) Anotar o que não compreendeu para perguntar para alguém.
4. Você acha que as leituras foram úteis para:
a) Ampliar conhecimentos.
b) Ter uma nova visão do assunto.
c) Sentir-se preparado para ler outros textos.
d) Trazer ideias para escrever.
5. Quais a(s) alternativa(s) que representa(m) o que você pensa sobre o que é necessário para ser um bom leitor:
a) Não é necessário exercitar a leitura de textos longos.
b) Ler bastantes textos.
c) Ler com concentração.
d) Ler só quando o assunto do texto interessa.
e) Ler só os textos dos livros didáticos.
f) Ler diferentes tipos de textos, de diferentes portadores (jornais, folhetos, revistas, etc.).
g) Conversar e discutir sobre os textos lidos.
h) Não é preciso conversar sobre os textos lidos para compreendê-los melhor.
6. Escreva um parágrafo sintetizando sua autoavaliação como leitor.