Palavras-chave: Existencialismo, psicoterapia, método existencial.


Quando pensamos em existencialismo, o que nos salta, primeiramente, é a palavra existência. Levando em conta que a palavra existência em destaque nos mostra o foco desta linha de pensamento, podemos pensar também no seu contra-ponto, que é a essência. Segundo Sartre, um grande nome desta doutrina: "a existência precede a essência", mas falaremos disso em breve. Aqui chamei o existêncialismo de "linha de pensamento" pois na verdade o existencialismo é uma doutrina filosófica, permitindo inúmeras correntes diferentes. Todas estas correntes diferentes tem sua reflexão sobre a existência humana e a considera em seu aspecto individual e concreto.
A prevalência da existência sobre a essência não deseja tornar a existência analiticamente inteligível, mas valorizar as escolhas que o homem faz, valorizando seu aspecto livre. O homem não nasce com seus pensamentos e escolas pré-concebidas nem é condenado à algum tipo de estrutura. Nós temos a chance de escolher passar por tudo que viveremos no futuro. Até não escolher é,ainda sim, uma escolha. O existencialismo é uma expressão de responsabilidade sobre a própria vida. Para entendermos melhor a dinâmica existêncial mostrarei alguns grandes nomes desta prática com suas diversas repercussões e estudos.
Para Kierkegaard o existencialismo é mais um filosofar que uma doutrina, pois é uma maneira do homem expor a si mesmo, reconhecendo-se autenticamente em cada ato realizado. O existencialismo então é uma expressão individual de uma experiência singular. Kierkegaard se opôe a Hegel, que tenta compreender o mundo de forma racional, transformando o existencialismo numa ciência. Para Kierkegaard a existência humana não pode ser explicada através de conceitos ou de sistemas abstratos. Devido à complexidade da realidade humana seria inútil acreditar que algum sistema possa dar conta de tudo. O sistema é abstrato, a realidade é concreta. Então, o tema à cerca da escolha torna-se fundamental na filosofia existêncialismo Kiekegaardiano, é como se fosse um núcleo da existência humana. Criar uma filosofia em cima da escolha é também assumir a angústia que esta trás. A escolha é um risco pela incerteza, mas ao optarmos não escolher também estamos escolhendo algo, que mais tarde nos fará submisso à escolha do outro. Existir é escolher-se. Podemos concluir que a existência e tomada de angústias. Estamos destinados a escolher até nossos último dia. Em oposição à escolha existe o nada. O nada é a ausência de desespero, mas que também é impossível de ser vivido. A ausência de escolhas seria o contato com o infinito. Nossas decisões estão entre o tudo e o nada.
E existência humana se processa em três estágios: O estético, o ético e o religioso. O primeiro, estético, é marcado pelo hedonismo. Enquanto investiga-se as razões do viver, o homem permanece sob o total domínio dos sentidos, dos sentimentos. Convicto de que é inteiramente livre, vive buscando prazeres ao máximo, tentando aproveitar todos os momentos de sua vida de maneira intensa, entregando-se ao aspecto passageiro, fugas e único das situações que jamais se repetirão. O sujeito vive então questões a cerca das escolhas. Como não há razões lógicas que limitem o indivíduo em suas escolhas, o indivíduo tenta ao máximo encontrar o sentido de sua vida aproveitando-a ao máximo, mas parece que nada lhe trás a resposta, o homem se desespera. Surge então o segundo estágio: o ético. No estágio ético a liberdade passa a ser limitada pelo social. O indivíduo então se dá conta que não pode ignorar as exigências do social e seus compromissos diante dele. Esse segundo estágio leva o sujeito à olhar para seu passado e assumir seus atos, tornando-se responsável por eles, assumindo suas culpas, seus prazeres, suas vitórias ou fracassos. O indivíduo ainda é livre, mas têm seus limites estabelecidos pelo social. Para resolver a questão do sentido da existência, possibilitando o homem entrar em contato com o absoluto, surge o terceiro estágio. No estágio religioso está a resposta que tanto foi procurada no primeiro estágio. Mas como dito pelo próprio Kiekeergard, se a construção de esquemas e sistemas para explicar a realidade são impossíveis, torna-se também impossível um contato total com esse absoluto. A infinitude de Deus é incompreensível. A filosofia de Kierkegaard então é marcada pelor paradoxos como os vistos: concreto e abstrato, augústia e prazer, finito e infinito, liberdade e social, etc.
Husserl, matemático e criador do método fenomenológico. Crítico às ciências humanas, achava que estas utilizavam os mesmos métodos das ciências naturais para entrar em contato com o objeto com a realidade. Dizia que a realidade não se reduz apenas ao que nosso sentidos e que só a partir disso podemos estudar os objetos como ciência e como método. Para ele, há duas maneiras de você entrar em contato com os objetos do mundo externo: intuitivamente ou por uma integração significativa. A captação intuitiva junta o que recebemos pelos sentidos, que pode ser falho, e o que ligamos com nossa nossa perspectiva e suas limitações. Isso com certeza não nos dará uma visão completa dos objetos, mas algo impreciso e parcial. Mas o ato de conhecer funciona pela "integração significativa". Ela nos propõe uma espécie de síntese com o objeto, formando um novo objeto, o "objeto total". Por fazermos parte também deste objeto total, síntese entre observador e objeto, podemos ter uma visão verdadeira da realidade, integralmente. Para Husserl a realidade não pode ser reduzida à visão naturalista de que tudo que captamos é resultado de nossos sentidos, mesmo que realizando uma integração. Passamos a captar então os objetos não como eles se mostram no mundo, mas como eles refletem em nossa consciência, que deve estar aberta, livre de perspectivas e limitações. Fazendo isso chagamos mais perto possível do que o objeto realmente é. O objeto dá condição para existência da consciência e vice-versa. Este é o principío da intencionalidade. Para haver essa integração entre objeto e consciência é preciso eliminar a vivência original do indivíduo, é preciso retirar tudo que esteja fora desse estado psicológico. Esta é a condição da redução fenomenológica. São realizados vários tipo de redução fenomenológica numa análise de objeto. A iminência da possibilidade de atingir esse estado de consciência é chamado de "consciência transcendental". Nasce dessa uma atitude fenomenológica que descarta a crença petrificada da realidade objetiva pelo método científico. Husserl por esse método visa atingir a essência das coisas, tal como elas são. Pensamento(noese) e objeto(nome) passam a ser a mesma coisa. O conhecimento que surge de tal experiência é auto-vidente e não requer justificativa, é pré-teórico e, para ele, deve fundamentar todo conhecimento científico.
Já Martin Heidegger foi um discípulo alemão de Hussel e criou o chamado: " existencialismo alemão". Foi o primeiro a aplicar o método fenomenológico. Heidegger sempre gostou de deixar claro sua diferença do existencialismo para o que fazia. Em "Ser e tempo"(1927) elaborou a "análise da existência". O existencialismo, em geral, é uma filosofia que centra sua reflexão no homem particular, individual, concreto. A análise da existência não demonstra interesse pela existência pessoal e os problemas que dela vêm. Heidegger se preocupou na elaboração de uma Teoria do Ser, ele quis discutir o que seria o ser de uma forma ontológica.
Mas o que é ser? Temos antes de nos perguntar o que é "ser", entender também o que é "ente". Quando tentamos definir um ser estamos transformando o ser em um ente. Porém não é possível falar de ser se não existir um ente. Ainda assim é importante mantê-los separadois: O ente e o ser apresentam problemas diferentes e a determinação de um não se aplica ao outro. Para tratar mais concretamente da problemática do "ser", Heidegger falou do Dasein, o "ser-aí". Este ser é um ser determinado, um ser que existe, um ser característico da condição existencial. Da significa "aí" e Sein presença, existência. Logo, Dasein é um "ser-no-mundo" é um constante "estar-no-mundo", e esse é o foco do estudo de Heidegger, diferentemente das ciências naturais que focam no ente, no ser concreto(ôntico). O Dasein coexiste na experiência cotidiana com outros Deseins numa relação temporal, a única que permite sua existência. Com a imersão na experiência cotidiana acabamos por imergir nosso eu às regras do outro. Nosso eu autêntico então se dilui nas obrigações do dia a dia e a responsabilidade de nossas escolhas passam a ser uma responsabilidade comum, de todos. Tornamo-nos seres inautênticos e a punição para isso surge: a culpa. Adquirindo uma forma autêntica de existência surge o "Existenz", que é o ideal existencial do Dasein.
Para Heidegger há dois métodos de você viver uma vida inautêntica. Ou você se dilui no coletivo buscando uma diminuição da responsabilidade ou se atém à algum objeto como trabalho ou algum comportamento mecânico. O indivíduo ao escolher uma vida inautêntica visa se defender do desamparo e da angústia decorrentes da existência. Desde que nascemos nos deparamos com o desamparo, afinal não escolhemos nascer e ficamos totalmente entregues à um outro. Durante toda a existência o ser se encontra com situações de desamparo e tem como resposta à isso o medo e a angústia. Diante dessa angústia o indivíduo tem que escolher eximir-se da responsabilidade de sua vida e culpá-la por sua angústia ou usar da angústia, que coloca o ser em contato com o nada, como instrumento que vai fazer o indivíduo a escolher uma vida autêntica ou inautêntica. O sujeito então se coloca diante de uma escolha. O Desein pode viver dependente, dissolvido no coletivo, numa espécie de anonimato com sua singulariodade anulada se tornando um alheio, massa. Sem pensamento próprio com sentimentos embotados e não se vendo livre de opiniões e hábitos que lhe são impostos vive uma vida atormentada por medos, angústias e ansiedades neuróticas. A vida interior degrada-se, vulgarizando-se na superficionalidade. No trabalho,a tecnologia passam a fazer o ser se identificar com objetos que dele nada entende e sua vida profissional passa a ser conduzida por superiores.
Há também outro conceito fundamental na obra de Heidegger que é o conceito de morte. Todos os desein se projetam para o conceito mais autêntico da existência, que é a morte. Então, o desein é um "ser-para-a-morte". Para Heidegger toda angústia é uma angústia diante da morte e que se repete a cada situação. Sabendo que o Desein é um ser da angústia, cabe ao indivíduo aceitá-la e conviver com ela. Isso é autêntico.
Sartre foi o maior nome do existencialismo e o fez da sua vida uma constante reflexão sobre as formas e problemáticas da existência humana. Dele partiu a clássica frase "a existência precede à essência.". Sartre junta três formas de pensamento: o materialismo dialético, a fenomenologia e o existencialismo. Sartre acreditava que o pensamento humano não deve partir da realidade, mas da intencionalidade. Se a consciência é sempre consciência de algo, o conceito de "eu transcendental" é ignorado. Pois se a consciência é a consciência de algo que ela não é e não consegue representar, ela é um nada. Há dois tipos de consciência. A consciência de primeiro grau une-se ao objeto com a redução fenomenológica, já a consciência de segundo grau existe numa consciência de si mesma e é necessária para que possamos exercer uma ação reflexiva sobre o objeto. Sartre diz que a consciência de primeiro grau, irreflexiva, surge antes da reflexiva, pois para a segunda existir é necessário que tenha se passado pela primeira, que é autônoma.
Sartre é um filósofo que rejeita qualquer possibilidade de prender o homem em sua natureza humana. O homem é livre para escolher como quiser e o que quiser, realizando sua essência. O homem apesar de fazer parte da espécie humana, tem a liberdade como afastador dessa própria espécie, pois a partir do momento em que usamos da liberdade nos aproximamos da humanidade. A ideia em Deus, principalmente, cria a ideia de que existe uma essência comum entre todos os homens, algo que Sartre é contra; reforçando sempre que o homem é livre para escolher e construir o seu destino. O homem, então, é aquilo que faz de si próprio, o que projeta e não um projeto.
Visto os principais teóricos do existencialismo vimos que o sujeito se constrói a partir da liberdade e que muitas vezes se aprisionam em padrões que o levam a escolher uma vida de má-fé onde a culpabilização do outro por suas angústias impera. As escolhas feitas por cada indivíduo tem de ser vistas com responsabilidade e embasadas em seu contexto histórico. O homem é livre, porém dentro dos limites de sua própria liberdade regulada pelo sócial. Cabe ao indivíduo dar o devido valor à sua vida não se colocando como meramente vítima dos fatos, mas pondo-se numa papel ativo diante da sua própria existência. O indivíduo constrói a sua própria sorte e é livre para exercer sua posição. Essa construção nem sempre é fácil e nos deparamos com angústia e desamparo, porém o reconhecimento do vazio da existência também é importantíssimo para nos motivarmos a sempre buscar nossa autonomia e liberdade. Vimos acima uma forma didática de expor os caminhos da liberdade.
No processo da clínica é fundamental que entendamos o projeto original de um indivíduo e como ele aprendeu a ter e a ver a si próprio. O indivíduo as vezes constrói uma auto-imagem coerente com uma determinada realidade mas que o faz muito infeliz. É uma auto-imagem que o coloca numa posição passiva porém ainda sim é menos angustiante do que entrar em contato com sua angústia e se propor novas possibilidades. A ser humano pode escolher dois caminhos. Ou uma saída saudável, que é a de conviver com a angústia e usá-la para criar novas possibilidades ou então da má-fé, encaixando-se em modelos e petrificando valores e ideias colocando a responsabilidade de sua vida nos outros. É muito importante no processo terapêutico a formulação de um vínculo com o terapeuta, pois o indivíduo precisa se sentir menos ameaçado para não ter a crença de que seu "eu" desintegrará a com a formulação de um auto-conceito. Somente com a ausência de ameaça à estrutura pessoal que as experiências de mudança e reestruturação podem ser processadas. O processo terapêutico então consistem em o indivíduo tomar consciência de suas próprias defesas e trabalha-las, entendendo-as e responsabilizando pelas suas escolhas rumo à um ser autêntico, sem medo da perda da identidade. O instrumento que a análise usa para ajudar o indivíduo a atingir esse ser autêntico é o método fenomenológico. A terapia existencial está longe de ser um sistema de terapia, exatamente pelas suas variadas vertentes e pela liberdade do ser humano, mas é sim uma atitude no sentido de fazer as pessoas atingirem uma existência autêntica. Não é possível a construção teórica de um método de psicoterapia existencial. Ao fazer isso estaríamos colocando o homem numa posição de objeto a ser estudado, algo teórico e apenas inteligível a partir de um processo de estudo semelhante ao das ciências naturais. O saber existencial é pré-teórico. Cada relação do terapeuta com o cliente é um encontro único e irrepetível. A cura no processo terapêutico existencial é a própria autenticidade. É a aceitação de sua condição humana e a criação de um sujeito ativo sobre sua própria realidade. O cliente devará decidir quando seu processo terapêutico deve acabar.


Bibliografia

? TEREZA CRISTINA S. ERTHAL Psicoterapia Vivencial ? Uma abordagem existencial em Psicoterapias (Rio de Janeiro - 2004)
- JOÃO DA PENHA ? O que é existencialismo (São paulo -1987)