SUMÁRIO

INTRODUÇÃO   ..........................................................................................................

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CAPÍTULO I. O   ESTATUDO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 NA PROTEÇÃO   DOS DIREITOS DO MENOR ......................................................................................................................

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1.1.   A evolução da legislação frente à matéria Constitucional ....................................

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1.2.   Conceitos sobre a Criança e o Adolescente .........................................................

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1.3 Os efeitos da estrutura afetiva do   inimputável .......................................................

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CAPITULO II –   A LEI PENAL E O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO TRATAMENTO À   PUNIBILIDADE DO MENOR..........

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2.1 A inimputabilidade na Teoria do   Crime .................................................................

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2.2 O Imputável e os outros elementos   de excludente da Culpabilidade .....................

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2.3 Inimputabilidade penal no tempo   ...........................................................................

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2.4 Aumento da Atividade Criminosa   .........................................................................

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CAPITULO III –   A INIMPUTABILIDADE FRENTE À PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO N.º 33/2012 ..........................................................  

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3.1 Proposta de Emenda a Constituição   n.º 33/2012 ...................................................

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3.2 A prisão como meio de reabilitação   social ............................................................

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CONCLUSÃO   ............................................................................................................  

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REFERÊNCIAS   .........................................................................................................  

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INTRODUÇÃO

 

A Constituição Federal de 1988 trata de matérias especiais previamente discutidas e inseridas pelo legislador originário, considerados essenciais aos anseios da sociedade e que merecem tratamento especial e atenção redobrada quando se pretende ferir o seu objeto. Neste caso, há que se estudar e analisar as inferências legislativas que podem levar direitos constitucionalmente constituídos que, especificamente neste trabalho, referem-se à criança e ao adolescente quanto à sua imputabilidade penal.

Assim, a Constituição Federal de 1988 explicita que adolescentes e crianças não podem ser imputáveis seguindo orientação do Código Penal, mas que podem ser aplicadas as sanções específicas, consideradas em legislação especial, fazendo menção ao Estatuto da Criança e do Adolescente, como conjunto de regras e normas capaz de conduzir e solucionar todas as problemáticas envolvendo a juventude.

O presente trabalho tematizou o Estatuto da Criança e do Adolescente face à Proposta de Emenda a Constituição n.º 33/2012 e buscou responder à seguinte problemática: A desconsideração da inimputabilidade, como sugere a Proposta de Emenda a Constituição n.º33/2012 é um instrumento adequado à punibilidade e contribuiria com a redução da criminalidade juvenil?

Objetivou-se analisar a Proposta de Emenda a Constituição n.º 33/2012 estabelecendo um parâmetro com o Estatuto da Criança e do Adolescente e seus critérios de punibilidade. Especificamente almejou-se estudar na legislação especial referente à criança e o adolescente bem como na Constituição Federal a matéria sobre a proteção dos direitos pertinentes a inimputabilidade destes frente às situações de ilícitos penais; analisar a imputabilidade e a inimputabilidade na lei penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente; e avaliar a Proposta de Emenda a Constituição n.º 33/2012 quanto à desconsideração da inimputabilidade penal, atentando-se que esta é um direito previsto na norma Constitucional de 1988 e na infraconstitucional.

 A justificativa do presente trabalho está em averiguar, diante da possibilidade de alteração na legislação quanto à criança e o adolescente, os danos que poderá provocar aos infanto-juvenis, avaliando a finalidade da pena. Por outro lado, considerando a mobilização da sociedade, pelo sentimento de justiça, que requer a redução da maioridade do menor de dezoito anos, acreditando ser a solução plausível e pacificadora do atual problema. Nesses termos, o estudo qualifica-se como sinal importante em virtude da complexidade e controvérsia de pensamentos, contribuindo para outros estudos na área.

Para tanto, procedeu-se pesquisa bibliográfica em materiais doutrinários, revistas, jornais, legislação e artigos eletrônicos, pautada especialmente na obra de Júlio Fabbrini Mirabete, sob uma abordagem qualitativa num método indutivo de análise.

Para um entendimento clareado dos aspectos jurídicos a imputabilidade penal aos menores de 18 anos, são necessários alguns apontamentos. No primeiro capítulo trata-se do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Constituição Federal de 1988 no que tange à proteção dos direitos do menor, a evolução da legislação frente à matéria Constitucional, além dos conceitos sobre a Criança e o Adolescente e os efeitos da estrutura afetiva do inimputável.

No segundo capítulo aborda-se a Lei Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente no tratamento à punibilidade do menor, abordando a inimputabilidade na Teoria do Crime, o imputável e os outros elementos de excludente da culpabilidade, a inimputabilidade penal no tempo e o aumento da Atividade Criminosa.

Já no terceiro capítulo, versa-se sobre a inimputabilidade frente à Proposta de Emenda a Constituição n.º33/2012, retratando a Proposta de Emenda a Constituição n.º 33/2012, considerando a prisão como meio de reabilitação social.

CAPÍTULO I

O ESTATUDO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 NA PROTEÇÃO DOS DIREITOS DO MENOR

  

1.1.  A Evolução da Legislação Frente à Matéria Constitucional

Através de uma abordagem histórica do Brasil, vê-se que desde o Período Colonial, em meados de 1551, as crianças eram conduzidas de forma diferente, por serem jovens e imaturas, tendo a igreja a responsabilidade de lhes proporcionar uma educação condizente com a cultura e religião Portuguesa.

Maria Auxiliadora (1992), diz que não precisa fazer uma exegese das escritas religiosas, para colocar-se de forma clara a devoção divina do homem, e o significado da criança como uma semente da vida, ou continuação dos seus antecessores.   

Segundo Fabbrini (2012) a história das nações é conhecida pela luta sangrenta da colonização de um povo pelo outro, sendo aqueles colonizados, sujeitados de forma cruel, ao aprendizado cultural e social da nação colonizadora. No caso do Brasil, exemplo de país colonizado os portugueses isolavam as crianças negras e indígenas em uma casa fechada, longe de suas raízes culturais e separadas dos seus pais, como mecanismo para facilitar a educação “colonização” pelos Jesuítas. Estes ensinavam-lhes a cultura, a religião, o vestuário e o que podia e o que não podia ser feito de acordo com os ditames e costumes portugueses.

No decorrer dos anos, passando por esse longo período de colonização, a criança e o adolescente eram vistos como um problema na sociedade, contrariando os bons costumes, a moral e a legislação vigente, figurando como autores em diversos crimes. Segundo Júlio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini:

O crime era confundido com o pecado e com a ofensa moral, punindo-se severamente os hereges, apóstatas, feiticeiros e benzedores. Eram crimes a blasfêmia, a benção de cães, a relação sexual de cristão com infiel etc. As penas severas e cruéis (açoites, degredo, mutilação, queimaduras, etc.) visavam infundir o temor pelo castigo. Além da larga cominação da pena de morte, executada pela forca, pela tortura, pelo fogo etc., eram comuns as penas infamantes, o confisco e as galés. (2011, pag. 23)

Para a professora de Direito Penal da Universidade Federal da Bahia, Maria Auxiliadora Minahim, o castigo físico como meio de correção está presente em todas as fases da história, a exemplo dos romanos, egípcios e hebreus. (1992, p. 20). No período colonial as penas se assemelhavam com as penas medievais, aceitando todo o tipo de tortura e tratamento considerados desumanos, cruéis e contra o axioma global de convivência em sociedade, revestido pelos princípios da dignidade da pessoa humana.

Maria Auxiliadora Minahim (1992), conta que no período denominado de medieval, o castigo físico era entendido como instrumento eficaz na tentativa de instruir e melhorar as crianças. Acreditava-se, nessa época, que a disciplina se conquistava com o castigo, por meio de flagelações no dorso, por socos, varas, beliscões e pontapés.

Em pouco tempo, o jovem de sete anos de idade passou a ser considerado passível de punição e, de forma suave, tinha seus delitos reprimidos, servindo apenas para moldar-se e adequar-se à civilização, agindo com prudência, respeitando as regras inerentes à perfeita harmonia entre os povos.

Com o avanço no Código Penal e a necessidade de se criar um conjunto de normas capazes de conduzir a relação entre jovem e sociedade, em 1º de dezembro de 1926, entrar em vigor o Código de Menores, por meio do Decreto n.º 5.083. Também chamado de Código Mello Mattos, este Código previa a impossibilidade de recolhimento à prisão o menor de 18 (dezoito) anos de idade devendo, no caso de cometer algum ato infracional, ser recolhido à casa de educação ou preservação, podendo também ser confiado à guarda de pessoa idônea até os 21 anos de idade. Neste sentido,

Inspirado principalmente por um critério de política criminal, colocou os menores de 18 anos inteira e irrestritamente à margem do direito penal, deixando-o apenas sujeitos às medidas de pedagogia corretiva do Código de Menores. Não cuidou da maior ou menor precocidade psíquica desses menores, declarando-os por presunção absoluta, desprovidos das condições da responsabilidade penal, isto é o entendimento ético-jurídico e a faculdade de autogoverno. (TAVARES, 2004)

Com a Constituição Federal de 1988 foram adotadas inúmeras medidas em busca de prevenir e assegurar a proteção da criança e do adolescente em sua plenitude, dispondo o artigo 227, que não só a família, bem como a sociedade e o Estado são responsáveis pela educação da criança e do adolescente já previsto na Constituição de 1988 e,  com o acréscimo da palavra Jovem, pela Emenda Constitucional n.º 65/2010.

Art. 227.  É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Neste sentido, a criança e o adolescente primam por um desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade, não sendo objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, e punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

O Legislativo, com a imperiosa missão de trazer à baila os anseios da sociedade, dirimindo as divergências e harmonizando as relações entre os povos, enxergou a importância de locar um dispositivo constitucional com fulcro em normatizar, os direitos da família e dos jovens. Acrescido a isto vislumbrou também a necessidade de uma legislação específica, para normatizar, por meio de um conjunto de regras, toda a relação do jovem com a sociedade, família e com a lei. Com isso, no dia 13 de junho de 1990, surge o Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, dispondo sobre a proteção integral dos jovens.

A Constituição Federal ao disciplinar que, é inerente a criança e o adolescente com absoluta prioridade a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, sendo um dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público, visa assegurar esses direitos, servindo esse dispositivo como relevo para o entendimento do porque da criação de uma norma especifica, nesse caso o ECA. Com relação ao Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo Maria Auxiliadora:

Enquanto declaração de direitos cumpre a Lei 8.069, sua tarefa, ao enunciá-los de modo amplo. Permanece, todavia, uma interrogação sobre a possibilidade de se obter as consequências buscadas, já que a plena efetividade da lei trasborda seus aspectos puramente formais, e a impressão de que o documento anuncia certo efeito pacificador na consciência social, tendente a sentir-se dispensada do trato com o aflitivo tema, já por causa do encaminhamento legal de que este foi objeto. (1992, p. 91)

Nota-se que a Constituição Federal implica, de forma direta, na construção ideológica do Estatuto da Criança e do Adolescente, servindo como norte, para minuciosa formação dos seus dispositivos legais, regulamentando aquilo que prescreve a Constituição Federal.

Em virtude deste estudo torna-se imperioso trazer o aspecto conceitual da criança e do adolescente, compreendendo o porquê da preocupação contínua que se tem em relação a este grupo vulnerável e historicamente prejudicado.

 1.2.  Conceitos Sobre a Criança e o Adolescente.

Para trazer como límpido e transparente a verdadeira essência da Criança e do Adolescente, buscar-se-á o auxílio de várias áreas do conhecimento para entender a preocupação diligente sempre dispensada a essa geração, que apesar dos constantes conflitos com a lei, representa até na atualidade, o significado de esperança e mudança de um mundo melhor.

E é com esse intuito que o paradigma de normas e regras juvenis, adotado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente revela a preocupação do legislador em dispensar em um código, todo valor humano, social, econômico e moral, com fulcro de estabelecer a diferença entre o direito penal e o adolescente.

Para Maria Auxiliadora Minahim (1992), do ponto de vista psicológico e filosófico, a adolescência é considerada uma das mais difíceis, controvérsias e complicadas fases da vida humana. E completa:

Para a teoria psicológica, imputabilidade, como foi visto, é pressuposto da culpabilidade, mas este vínculo psicológico que prende o agente ao seu fato pressupõe sujeito capaz de entender e querer. Isto quer dizer que existe uma situação de fato do próprio agente, independentemente de qualquer valoração, que o torna ou não capaz de dolo ou culpa. (1992, p.54)

As mudanças físicas e psíquicas na passagem das fases de criança para adolescente e de adolescente para adulto, são marcadas em virtude às mudanças hormonais no organismo. A forma como o jovem encara a vida, se contradiz continuamente, visto estarem em constantes transformações, misturando sentimentos, acompanhados de sensações inquietantes, próprias da idade. Eisenstein, abordando este aspecto, afirma que:

É importante observar que ocorre uma enorme variabilidade no tempo de início, duração e progressão do desenvolvimento puberal, com marcantes diferenças entre os sexos e entre os diversos grupos étnicos e sociais de uma população, inclusive de acordo com estado nutricional e fatores familiares, ambientais e contextuais. (2013, s.p.).

Por se tratar do início da sua vida em sociedade, o jovem necessita de uma atenção especial, desenvolvendo todas as suas capacidades emocionais e subjetivas, fase muito complicada. Apesar de todos esses cuidados, de acordo com Damtom G. P. Silva, a criança e o adolescente não eram vistos como seres dotados de inteligência e vontades. Ao contrário, tratadas como objetos. A família sempre se preocupou não com o bem estar da criança e do adolescente, mas entendiam as vontades da criança como se delas fossem, como se as crianças fossem um ser sem vida, uma marionete nas mãos dos pais.

A criança não é só quantitativamente diferente do adulto em relação ao físico, ao psíquico, não é só uma questão de tamanho, de tempo de vida. A criança vive uma diferença biológica, no desenvolvimento do organismo, do seu corpo, dos seus órgãos - E a criança é psicologicamente diferente do adulto. (SILVA. 2009).

De acordo com o Dicionário Aurélio (2013), criança é ser humano de pouca idade. Já infância, este apresenta definida como um período de crescimento do ser humano, que vai do nascimento até a puberdade.

Para os filósofos, a infância é o estágio mais longo da vida, de forma que a vida se torna mais longa também, sendo a criança influenciada pelo meio em que vive, se corrompendo pela civilização e impregnada de preconceitos e todo o tipo através dos pais.

À luz da Medicina brasileira, a criança e o adolescente são caracterizados pelo desenvolvimento físico, mental, emocional, sexual, e social, marcadas pela ansiedade e esforços em busca das realizações impostas pela cultura social de cada momento histórico, quase sempre para atender as expectativas da sociedade. Para a professora-doutora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCM/UERJ), Evelyn Eisenstein:

A adolescência se inicia com as mudanças corporais da puberdade e termina quando o indivíduo consolida seu crescimento e sua personalidade, obtendo progressivamente sua independência econômica, além da integração em seu grupo social. (2013, s.p.).

  

Quanto ao critério cronológico para a criança e o adolescente a Organização Mundial da Saúde (OMS) denomina criança até o limite de 10 (dez) anos de idade e adolescente de 10 (dez) anos completos aos 19 (dezenove) anos. A Organização das Nações Unidas (ONU) enxerga essa relação de um prisma diferente, inclusive sendo adotado, para fins estatísticos e políticos, definindo criança até o limite de 15 (quinze) anos de idade e Adolescente, entre 15 (quinze) anos completos a 24 anos de idade. No Brasil, as normas e políticas de saúde do Ministério da Saúde, apontam os limites da criança compreendidos até os 10 (dez) anos de idade e do adolescente, quando alcançado os 10 (dez) anos completos até os 24 (vinte e quatro) anos de idade. (EISENSTEIN, 2013)

 Torna-se imprescindível frisar que as mudanças do ponto de vista biológico e psicossociais de cada época, denominadas de assincronia de maturação, ou seja, a idade cronológica da criança e do adolescente, mesmo sendo o parâmetro mais utilizado, não é o mais eficaz, de acordo com inúmeros estudos clínicos feitos pela Medicina. De acordo com Evelyn Eisenstein:

É importante enfatizar que, devido às características de variabilidade e diversidade dos parâmetros biológicos e psicossociais que ocorrem nesta época, e denominadas de assincronia de maturação, a idade cronológica, apesar de ser o quesito mais usado, muitas vezes não é o melhor critério descritivo em estudos clínicos, antropológicos e comunitários ou populacionais. (s.p., 2013)

 Para a psicologia o significado de criança altera no tempo cronologicamente, de sociedade para sociedade, e dentro da mesma sociedade, de acordo com as experiências, sofrendo influências culturais, históricos e com relação às pessoas que as cercam. De acordo com Maria Auxiliadora Minahim:

É o período dos grandes sentimentos e paixões. O jovem toma-se de um sentimento social abstrato para com o homem em geral, é um amor abstrato, um amor irrestrito, pois é dirigido aqueles desconhecidos e com quem nunca manterá contato. Nascem, então, as grandes vocações e a necessidade de ações heróicas, podendo levar a formação de grupos como resultado da percepção dos valores sociais e a afirmação deles diante de seus semelhantes. (1992, p. 63)

As características, o desenvolvimento da personalidade, possíveis transtornos do comportamento e emocionais, negligências, violências e abusos, são estudadas pela psicologia para evitar que a criança e o adolescente venham a ter quaisquer traumas, prejudiciais à sua convivência saudável com as pessoas ou que limitem a sua felicidade e o sentimento de conforto psicossocial natural do ser humano.

Por estas razões é grande o número de estudos e pesquisas clínicas com a preocupação de entender o comportamento delitivo do jovem, na busca por estabelecer um parâmetro para conceituar o que é criança e o que é o adolescente, os quais, ao longo dos tempos se tornam basilares para evolução jurídica do termo, inclusive para verificar se suas ações são imputáveis ou não.

Maria Auxiliadora (1992) relata que apesar da ampla e íntima relação entre as Ciências Medicas e o comportamento humano, não dificultou o sentimentalismo doutrinário em órbita da inimputabilidade penal, levando em consideração o pensamento socialmente aceito em cada época vivida.

Não se pode, contudo, separar a característica psicológica da biológica, estando intimamente ligadas  pelo fato de se relacionarem com o crescimento do homem, as mudanças no aspecto físico, refletindo na sua forma de analisar e interpretar o mundo ao seu redor.

No ponto de vista jurídico, o Estatuto da Criança e do Adolescente define que a criança é aquela com até doze anos de idade incompletos e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Essa idade variou muito no decorrer dos anos, mas foi a partir do Código Penal de 1940, que se consolidou a idade inimputável, locada posteriormente por vários dispositivos espalhados na Constituição Federal de 88, e disciplinado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, principal conjunto de normas infanto-juvenil do Brasil.

No entanto, Cezar Roberto Bitencourt (2013), ressalta a existência de três critérios definidores da doutrina jurídica, sendo o primeiro biológico, o segundo psicológico e o terceiro biopsicológico.

O aspecto biológico é representado pela saúde mental, ou seja, se o sujeito possui qualquer deficiência mental ou enfermidade grave, ele não pode ser determinado como uma pessoa normal, dono de um juízo perfeito, devendo ser caracterizado como irresponsável.

No sistema psicológico, deve-se ater se no momento do crime, o individuo contava com o discernimento intelectual suficiente para entender a criminalidade do fato, e de se posicionar de acordo com o momento volitivo do fato.

Já no método biopsicológico, vê-se a união dos dois sistemas anteriores, caracterizado pela junção biológica com a psicológica, determinando dessa forma, se o sujeito, no momento da ação, era retardado ou tinha o discernimento reduzido por alguma enfermidade qualquer, o incapacitando de entender o caráter ético-jurídico e autoderminação.

De acordo com os ensinamentos de Júlio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini a respeito da menoridade:

Adotou-se no dispositivo um critério puramente biológico (idade do autor do fato) não se levando em conta o desenvolvimento mental do menor, que não está sujeito À sanção penal ainda que plenamente capaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Trata-se de uma presunção absoluta de inimputabilidade que faz com que o menor seja considerado como tendo desenvolvimento mental incompleto em decorrência de um critério de política criminal. (2012, p. 202)

De acordo com a classificação jurídica, o menor não possui a capacidade de entender o caráter ilícito dos seus atos, sendo consideradas inimputáveis até os seus 18 anos de idade, e nesse sentido, manifestações surgem por todo país com o desejo de mudar o tratamento jurídico direcionado a esses menores, com fulcro de forçar o seu amadurecimento.

Não se deve analisar as normas e regras jurídicas em detrimento do menor como uma função paternalista em benefício da delinquência ou acreditar na repressão a única forma de reeducar esses Jovens, sem uma organização social através da família da sociedade e do governo na fomentação de uma nova perspectiva de vida para criança e o adolescente.

 1.3. Os Efeitos da Estrutura Afetiva do Inimputável

A estrutura sócio afetiva do jovem infrator se origina na ideia de família, ou melhor, estrutura familiar. Observa-se que nos dias de hoje a uma grande preocupação com a falência dessa instituição que é basilar na construção moral e de uma boa educação.

O contexto em que esse jovem delinquente se forjou é essencial para compreendermos o real motivo pelo qual ele se enveredou pelo mundo do crime ou do uso de drogas.

A criminalidade é um tema que incessantemente é debatido, ora pela sociedade organizada, ora pelo poder público, ambos com intuito único de trazer à paz a nação brasileira, exaurindo o problema da violência, fruto de uma desorganização e planejamento social.

Os argumentos sempre iguais caminham para o endurecimento da legislação, em torno da inimputabilidade penal, deixando de lado o conjunto probatório de valores que contribuiu de uma forma ou de outra para a inserção desse adolescente no mundo do crime.

Sob o pressuposto de que o “homem nasce puro, mas a sociedade o corrompe”, Rousseau aponta de forma clara e transparente, que a criminalidade esta intimamente ligada à construção moral, social, cultural e ética, do cidadão, cumprindo a família, um papel importante, funcionando como principal instrumento de formação desses valores, intrínsecos a boa convivência em sociedade.

A forma em que a criança e o adolescente deve se comportar e agir perante a sociedade é atribuição familiar, de demonstrar, para evitar a cultura da desobediência. O jovem deve saber se controlar e lidar com as regras e normas impostas não pelo simples fato de ser obedecido, mas para estabelecer uma ordem, que deve prevalecer com a finalidade de respeitar o espaço do outro.

O jovem, devido a pouca idade é imaturo e inexperiente por natureza, ficando vulnerável, diante da ação dos criminosos, encontrando esses, resistência caso a base ética e moral esteja consolidado como valores trabalhados no meio em que vive, ou seja, a criança e o adolescente é fruto do meio em que vive.

A família deve atuar como mola propulsora dos bons princípios inerentes a formação da personalidade e caráter do menor, primando sempre pela manutenção dos costumes e tradições da comunidade em que estão inseridos, passando de pais para filhos os conceitos e valores do relacionamento com os outros, e ao contrario disso, o que se vê é uma má formação dessa estrutura familiar, que torna fácil a criação de jovens delinquentes.

Os pais têm a oportunidade e por que não dizer o dever de desempenhar a função do primeiro professor dos seus filhos, durante o tempo em que estiverem juntos: uma oportunidade para dialogar e observar como a criança está crescendo e moldando a sua personalidade. Quanto mais próximo da família mais chances de se perceber possíveis desvios de comportamento que poderão causar transtornos futuros. (FARDIN, s.p.,  2013)

Quando se fala em drogas e violência, logo nos vêm à cabeça, jovens pobres e segregados a margem da sociedade, criados em favelas e periferias, das grandes metrópoles ou até mesmo interiores, mas hoje, o que incomoda, e assusta, é ver que jovens da classe media alta, cada vez mais sendo começam a vida no crime, pelo dinheiro fácil ou por vaidade, ignorância ou pelo simples fato de adquirir respeito por meio do medo.

Não se pode com isso, atribuir à violência ou rotular jovens pobres e marginalizados, não por sua conduta, mas pelo ambiente em que vivem, como autores generalizados dos diferentes crimes noticiados pela mídia.

A criminalidade juvenil mostra hoje, sua nova face, não estabelecendo um critério econômico ou social, recrutando em todas as classes sociais o seu exercito de menores infratores.

A violência se reestrutura de formas impensáveis até mesmo para os especialistas políticos, ultrapassando as barreiras da vaidade e mordomia, entrando em condomínios e bairros de luxo, recrutando jovens que pela situação econômica nunca precisariam de se enveredar pela contra mão no caminho do que é certo e lícito.

Olhar os dois ângulos, é importante para direcionar o problema enfrentado pelas duas classes sociais, nesse sentido, as margens da sociedade, a classe pobre, ou melhor, dizendo, a classe segregada em estado de miséria, sem perspectiva, apenas sobrevivendo ao avanço capitalista e o competitivo mercado de trabalho, curvam-se perante o destino, alimentando a tristeza e a magoa de viver em um país com enorme desigualdade social e econômica.

Algumas décadas atrás, não se falavam em situação sociocultural e econômica, por medo ou o simples fato de não aceitar a precariedade em que se encontrava aos poucos o país foi se desprendendo das amarras da ignorância, percebendo o global mundo de informação e competitivo mercado de trabalho, que reavaliar conceitos e buscar soluções é uma máxima que deve ser seguida para que a violência seja apenas uma fazer rápida da história.

 Visualiza-se o problema da violência como um empecilho para o desenvolvimento, o Estado teve de reconhecer sua falha, ou seja, anos de segregação, marginalização e falta de uma distribuição de renda capaz de atender as dificuldades e vontades básicas de cada indivíduo.

Concatenado a essa situação, o uso de drogas e bebidas alcoólicas torna o ambiente familiar propicio para a revolta do menor de idade, que vê o mundo das drogas ou o envolvimento com o trafico, uma válvula de escape para solução desses problemas.

                  Quando a presença do Estado é insuficiente, ocorre um aumento de ambientes degradados pela criminalidade onde não há nenhum tipo de assistência por parte do Estado, fazendo assim, que haja um aumento significativo da criminalidade juvenil.

A miséria somada à falta de perspectiva que a juventude tem com relação ao futuro torna-se uma grande arma para os cafetões do crime. A desestruturação familiar, o acesso limitado no mercado de trabalho e a formação educacional precária, fazem com que os jovens se afastam das pessoas, restringindo sua integração social, se desvanecendo do mundo caracteristicamente imediatista e preconceituoso, enxergando no crime a solução de seus problemas que esta diretamente relacionada a questões éticas e morais.

A realidade familiar dos jovens da classe baixa nem sempre é agradável, quase sempre os filhos são criados por mães ou pais solteiros, quando morando juntos, a bebida alcoólica, o uso de drogas e a prostituição, gira em orbita da relação entre casal e entre pais e filhos, vivendo quase sempre decepcionados com o sistema, se sentindo humilhados, mergulhados em profunda depressão, vivendo literalmente em um inferno dentro de casa, com brigas e desavenças constantes, criando assim, a vontade de se rebelar contra o mundo e as pessoas a sua volta.

Aí está a criança e o menor, no seio desta família, como pelo centrípeto de toda esta desarmonia sócio-econômica e como força centrífuga a irradiar, em futuro não menos distante um comportamento inadequado a espera de uma rotulagem que procuramos à cada instante, para justificar o injustificável – “a pobreza absoluta” como causa primeira das seqüelas ditadas pela desassistência global. (SIQUEIRA, 1979,       p. 99).

                   Com nenhum incentivo e condições para mudar a sua e a realidade da sua família, o menor inicia uma série de pequenas infrações obtidas com sucesso, criando com o passar do tempo coragem para pratica cada vez mais de crimes audaciosos e arriscados, se tornando um delinquente juvenil, sendo o arrimo de casa, a pessoa que leva comida e condições de viver para sua família e, portanto, uma vítima do sistema e do seu próprio destino.

Ao mesmo tempo, observa-se que existe o ambiente familiar desprovidos de valores essenciais para formação moral e cultural desse jovem, acumulando a angustia de saber que muito dificilmente ultrapassara as barreiras da miséria, nutrindo o ódio em vez do amor, a revolta no lugar da complacência, se tornando também uma vitima do sistema Estatal falido. 

Entretanto, mesmo com as estatísticas demonstrando ser o jovem de classe baixa os principais autores de atos infracionais, um novo exército de delinquentes vem se forjando não pela falta de políticas publicas e ausência do Estado, mas pelo excesso de cuidados, levando muitos jovens da classe média e classe média alta a se tornarem capitalistas compulsivos.

Ainda é difícil identificar a causa de tantos jovens da classe média e classe média alta, envolvidas em crimes, antes, visto como uma característica intrínseca as pessoa de baixa renda, marginalizada e descriminalizada pela situação financeira insuficiente.

Amparados por uma boa formação acadêmica e por uma estrutura material sólida, esses jovens se encontrão em constante conflito com seus próprios valores, sendo acostumados com dinheiro fácil e viciados em compras e acúmulo de riqueza. Esses jovens apresentam cada vez mais viciados pelo poder, detentores de uma personalidade individualista e egocêntrica, própria do sistema capitalista, impregnado na forma de agir e pensar dessa juventude consumista, nunca satisfeita com o que tem.

O turbulento e tumultuado mercado de trabalho, recruta e exige pessoas cada vez mais capazes e dispostas a estressantes cargas horárias concatenadas ao acúmulo de responsabilidades e atribuições, inerentes ao cargo ou função dentro da empresa.

O mercado de trabalho, antes dominado pelos homens, tem em diversos setores o trabalho das mulheres que tem como características o cuidado, zelo, responsabilidade e facilidade de se adaptar, aprender e desempenhar funções, antes  protagonizada pelos homens.

As mulheres do novo milênio adquiriram direitos, desprendendo das amarras do machismo, corroborando para uma nova estrutura familiar diferente da de outrora, onde se restringiam ao zelo da casa e aos cuidados dos filhos. Hoje, não só os homens, como também as mulheres saem para trabalhar, na busca por melhores condições e qualidade de vida, reforçando a economia familiar.

Essa nova estrutura familiar, norteada pelo acumulo de riquezas e consumo desmedido, estão criando um novo exercito de delinquentes juvenis. Com intuito de suprir a ausência dentro de casa os pais, enchem seus filhos de presentes, satisfazendo todas as vontades e vaidades dessas crianças, que crescem sem dar o verdadeiro valor no trabalho e na forma laboriosa exigida para supris cada desejo satisfeito, por ter sempre o que quer de forma fácil e sem restrições.

Sem conhecer o valor e o desprendimento dos pais para suprir suas vontades, esses jovens se tornam monstros capitalistas, e a partir do momento que seus desejos e anseios não podem mais ser supridos pelos pais, se tornam delinquentes juvenis, para manter seu status social.

De  acordo  a “Folha de São Paulo” uma pesquisa realizada pela Secretaria de Estado da Justiça do Rio de Janeiro revela que a pobreza não é fator determinante da criminalidade. Segundo os dados, 81% dos presos  de  18  a  24 anos no sistema penitenciário estadual tiveram o sustento de suas casas assegurado pelo pai, à mãe ou ambos.

Definido o paradigma familiar da classe segregada ou miserável e o da classe média e classe média alta, observa-se que a formação do jovem delinquente, apesar de utilizar do mesmo instrumento, qual seja, o da violência e criminalidade, tem seus objetivos semelhantes, mas com suas estruturas diferentes.

O jovem da classe segregada ou miserável vê na criminalidade uma forma de elevar o seu nível socioeconômico ou se rebelar contra o sistema que o excluiu ou o colocou a margem da sociedade, já o jovem da classe media ou classe média alta, enxerga na criminalidade uma forma de manter o seu patamar de vida.

 CAPÍTULO II

A LEI PENAL E O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO TRATAMENTO À PUNIBILIDADE DO MENOR

 O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõem que se o menor comete ato infracional, ele está sujeito à punição através de medidas socioeducativas e de acordo com o estatuto, ato infracional significa a conduta descrita como crime ou contravenção penal. Já o Código Penal tem em seus dispositivos, um critério mais rigoroso na aplicação da pena, visando, ao contrario do Estatuto da Criança e do Adolescente, a reabilitação do apenado. Nesse sentido, debater o aumento da criminalidade, distinguindo o agente imputável do inimputável se torna primordial.

 2.1. A Inimputabilidade na Teoria do Crime.

Para haver uma melhor compreensão sobre a proposta em questão, e entender o crime em sua amplitude e aplicação prática, faz-se mister, abordar o assunto sobre a Teoria do Crime, conhecida por muitos penalistas como o cerne do direito penal, podendo muito bem ser chamada de tória da infração penal, por se tratar também das contravenções penais, estando o crime disposto nos artigos 13 a 28 do Código Penal.

O crime, para Júlio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini, é definido da seguinte forma:

Atendendo-se ao aspecto externo, puramente nominal do fato, obtém-se uma definição formal; observando-se o conteúdo do fato punível, consegue-se uma definição material ou substancial; e examinando-se as características sou aspectos do crime, chega-se a um conceito, também formal, mas analítico da infração penal. (2012, p. 79).

No Brasil, a doutrina majoritária adota na teoria do crime a corrente tripartite ou tricotômica, composta, como o próprio nome já diz, por três elementos, Fato Típico, Ilicitude ou Antijuridicidade e Culpabilidade, sendo necessário o conjunto dos elementos para a conduta ser tipificada como criminosa.

Fato Típico é o primeiro elemento do crime composto pela Conduta, Resultado, Relação de causalidade e Tipicidade penal, que por sua vez e formado pela Tipicidade Legal, ou seja, o Tipo incriminador / disciplinador do Direito Penal e a Tipicidade Conglobante, definida como uma norma jurídica anulatória ou permissiva, ou melhor, uma definição legal e capaz de anular o caráter permitivo do Tipo Legal, abrindo brechas para não fazer o que a lei permite ou de fazer o que a lei proíbe.

De acordo com Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pirangeli (2009, p.421),  define-se que “O Tipo penal é um instrumento legal, logicamente necessário e de natureza predominantemente descritiva, que tem por função a individualização de condutas humanas penalmente relevantes (por serem penalmente proibidas)”.

Nestes termos, Conduta é todo comportamento humano voluntário, podendo ser excluída por um caso fortuito ou força maior; por uma coação física irresistível; por atos reflexos ou os atos inconsciente, agindo o agente em qualquer uma dessas hipóteses com uma ação de excludente da conduta, por não caracterizar a vontade do agente, e nesse caso, se nçao a conduta não a crime.

Dessa forma, pode-se concluir que a conduta pode ser dolosa, quando a uma vontade consciente do autor, culposa, quando o fato é praticado por imprudência, negligencia ou imperícia, podendo ser também uma ação, na qual se divide em crime comissivo quando o autor age por meio de uma norma proibitiva ou omissiva, diferenciada por ser uma norma mandamental, praticando essa modalidade de crime o autor que não age de acordo com a determinada conduta.

Seguindo os elementos que compõe o Fato Típico do Crime, veremos que existem dois tipos de Resultado, o Resultado naturalístico, responsável pela mudança no mundo exterior, como a morte, as mudanças patrimoniais e a ofensa a honra, e o Resultado jurídico ou normativo, caracterizado pela lesão ou perigo concreto de lesão ao bem jurídico tutelado pelo tipo penal. Para Mirabete e Renato Fabbrini:

Naturalismo é o efeito natural da ação que configura a conduta típica, ou seja, o fato tipicamente relevante produzido no mundo exterior pelo movimento corpóreo do agente e a ele ligado por reação de causalidade. Entretanto, ao mesmo tempo, afirma-se no art. 13 que a existência do crime depende do resultado. Dessa forma, deve-se buscar um conceito jurídico ou normativo de resultado, evitando-se a incompatibilidade absoluta entre os dispositivos que descrevem comportamentos que não provocam a modificação no mundo exterior e o disposto no art. 13. (2012, p. 94)

Todo crime tem Resultado jurídico ou normativo, mas nem todo crime tem Resultado Naturalístico, ou seja, o Resultado Naturalístico é caracterizado pela transformação ou alteração no mundo exterior e nesse sentido, o agente poderá ao agir criminosamente apresentar um Resultado Jurídico ou Normativo, não sendo representado na sua conduta o Resultado Naturalístico.

Prosseguindo, outro elemento do Fato Típico é a Causa, conceituada por toda atividade humana ou natural que contribui para a ocorrência de um determinado resultado, podendo também ser denominada de Teoria da equivalência dos Antecedentes Causais, ou seja, tudo que contribuiu para o resultado é causa dele.

Para entender se um fato contribuiu ou não para o resultado deve-se observar a Teoria da Eliminação Hipotética, ou seja, retira-se hipoteticamente o fato e verifica-se o resultado pode acontecer sem a presença dele; caso isso ocorra, observaremos que o fato não contribuiu para o resultado pretendido, visto isso, o fato não é “causa” do resultado.

Para uma análise mais abrangente, veja-se o resumo de Cezar Roberto Bitencourt:

Imagina-se que o comportamento em pauta não ocorreu, e procura-se verificar se o resultado teria surgido mesmo assim, ou se, ao contrario, o resultado desapareceria em consequência da inexistência do comportamento suprimido. Se concluir-se que o resultado teria ocorrido mesmo com a supressão da conduta, então não há nenhuma relação de causa e efeito entre um e outra, porque mesmo suprimindo esta o resultado existiria. Ao contrario, se, eliminada mentalmente a conduta, verifica-se que o resultado não se teria produzido, evidentemente essa conduta é condição indispensável para a ocorrência do resultado e, sendo assim, é sua causa. (2013, p. 182). Grifo original.

Para finalizar o Fato Típico, faz-se imperioso falar em Tipicidade do crime, que por sua vez se distribui em Tipicidade Formal, caracterizados pela simples imputação da conduta no tipo penal incriminador e a Tipicidade Material, é a relevância, a significância da lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico, não há tipicidade apesar de se enquadrar a um tipo penal não gerar.

Pela ordem, a Ilicitude ou Antijuridicidade, tem como fundamento analítico ser o segundo substrato da Teoria do Crime, compreendida também pela Ilicitude ou Antijuridicidade material, se resumindo na contrariedade do fato típico ao ordenamento jurídico. Há a possibilidade de excluir a ilicitude do fato típico, chamadas de causas excludentes de ilicitude, ou seja, o fato pode ser típico, mas não ser ilícito, dessa forma, não há crime. O código penal brasileiro trás a seguinte definição de causas excludentes de Ilicitude:

Art. 23.  Não há crime quando o agente pratica o fato:

I - em estado de necessidade;

II - em legítima defesa;

III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Parágrafo único.  O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

Art. 24.  Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.

§ 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.

§ 2º Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.

Art. 25.  Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Tem-se ainda a modalidade “supralegal” da causa excludente de Ilicitude pelo consentimento do ofendido, desde que a discordância da vítima não seja elementar do tipo penal, e no caso de haver consentimento por parte do ofendido, a atitude torna-se atípica.

Posto isso, é preterível a exigência de dois requisitos: primeiro, que a pessoa concedente seja capaz, segunda, que sua decisão seja livre e consciente, ou seja, sem ameaça, violência ou fraude e terceira e última que o bem seja disponível e de propriedade do concedente, que deverá prestar essa autorização antes ou durante a execução do fato típico.

Para finalizar faz-se necessário analisar o instituto jurídico da Culpabilidade, enquadrando-se como terceiro substrato da Teoria geral do crime, dividindo-se em três elementos: Imputabilidade, Potencial conhecimento da ilicitude e Exigibilidade de conduta diversa. Para Mirabete e Fabbrini:

As palavras culpa e culpado tem sentido lexical comum de indicar que uma pessoa e responsável por uma falta uma transgressão, ou seja, por ter praticado um ato condenável. Somos culpados de nossas más ações, de termos causado um dano, uma lesão. Esse resultado lesivo, entretanto, só pode ser atribuído a quem lhe deu causa se essa pessoa pudesse ter procedido de outra forma, se pudesse com seu comportamento ter evitado a lesão. (2012, pag. 181)

Dentro desse contexto, só vai existir crime se estiverem presentes, simultaneamente, todos os elementos elencados no terceiro substrato da Teoria Geral do Crime, chamada de Culpabilidade, podendo no caso da falta de qualquer um dos elementos descritos acima, ser o agente isento de pena, visto ser a Culpabilidade pressuposto para aplicação da pena.

 2.2. O Imputável e os Outros Elementos de Excludente da Culpabilidade.

Para compreender o ser inimputável, cabe esclarecer o significado do imputável no ordenamento jurídico brasileiro. Cezar Roberto Bitencourt (2013) retrata esse elemento como juízo de valor feito pelo indivíduo em um acontecimento porvir, acreditado como simplesmente possível e real, ou melhor, é a concepção de um fato ocorrido, determinado.

O agente imputável é passível de culpa, detentor de uma propriedade da Culpabilidade, devendo, para ser rotulado dessa forma, ter maturidade o suficiente pra entender o caráter ilícito de sua conduta.

O arcabouço de normas jurídicas penal de 1940, não retrata de forma clara o ser imputável, fazendo menção apenas dos casos que afasta essas condutas, denominando tais sujeitos dessa prerrogativa jurídica de inimputáveis. E por essa razão a própria doutrina encontra deficiência pela amplitude que essa nomenclatura pode vir se revelar, atribuindo em consequência disso, uma diversidade de definições. Zaffaroni e Pierangeli, trás a seguinte definição:

“Imputabilidade”, em sentido muito amplo, é a imputação física e psíquica, mas nem a lei e nem a doutrina a utiliza com tamanha amplitude. Em geral, com ela se pretende designar a capacidade psíquica de culpabilidade. É por essa razão que a imputabilidade – possui dois níveis, um que deve ser considerado como a capacidade de entender a ilicitude, e outro que consiste na capacidade para adequar a conduta a esta compreensão. (2019, pag. 592). Grifo original

  

Convêm esclarecer, que a Imputabilidade, o Potencial conhecimento de ilicitude e a Exigibilidade de Conduta Diversa, são causas excludentes da Culpabilidade previstas no código penal nos presentes artigos:

Art. 26.  É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único.  A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Art. 27.  Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.

Aplicam-se as causas excludentes da Culpabilidade somente no momento em que o fato estiver acontecendo. Nesse sentido, caso o agente venha a sofrer qualquer distúrbio mental completo ou retardado após ter cometer o crime, o mesmo sofrerá pena, sendo transferida posteriormente para medida de segurança, podendo a pena apenas ser reduzida de um a dois terços, caso a falta de discernimento seja prejudicada parcialmente conforme.

A legislação vigente considera o agente que perdeu totalmente o sentido do que é certo ou errado de inimputável, mas se essa perca do discernimento for parcial o agente será considerado semi-imputável.

No Brasil, segundo Bitencourt (2013), é adotado o Sistema Vicariante, no qual o Juiz pode aplicar somente a pena ou a medida de segurança, nunca os dois ao mesmo tempo, dispondo o substrato da Culpabilidade de três modalidades, o imputável, sendo culminado ao agente somente a pena, o inimputáveis, resumindo ao cumprimento de medida de segurança e o semi-imputável, quando a capacidade mental do agente é diminuída, podendo a pena ser reduzida de um a dois terços, ou substituir ser substituída por tratamento ambulatorial ou internação, quando a ocorrência de uma deficiência mental vier posterior ao crime cometido.

Outra modalidade de excludente da Culpabilidade e parte essencial para sequência do presente trabalho é a chamada de menoridade penal, sendo adotado pelo código penal brasileiro o critério biológico, sendo pressuposto de avaliação apenas a idade do agente. A luz de doutrinária de Mirabete e Fabbrini:

Trata-se de uma presunção absoluta de inimputabilidade que faz com que o menor seja considerado como tendo desenvolvimento mental incompleto em decorrência de um critério de política criminal. Implicitamente, a lei estabelece que o menor de 18 anos não é capaz de entender as normas da vida social e de agir conforme esse entendimento. (2012, p. 202)

Outra hipótese de excludente de Imputabilidade é quando o menor comete um crime produzindo efeito ou resultado, somente após ter o autor completado maioridade penal, sendo julgado como inimputável, por ser jovem na época da atividade criminosa e penalmente inimputável.

Este é o ponto da discussão, pois a prática de crime exige uma sanção Estatal, até como resposta à sociedade e como repreensão e educação frente aos valores ético-sociais da sociedade. Entretanto quando se refere à criança e o adolescente, a questão fica mais complexa, pois não obstante o agente possuir plena capacidade civil, por ser emancipada qualquer atividade criminosa cometida antes de completar a sua maioridade penal, o agente será considerado inimputável, pois apesar de possuir capacidade civil, a sua capacidade penal será adquirida somente após completar 18 (dezoito) anos de idade.

Posto isso, o menor de 18 (dezoito) anos não comete crime, mas sim ato infracional, sendo aplicado sobre esse jovem os efeitos da legislação especial, qual seja, a Lei n.º 8.069/90, chamada de Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.

Prossegue as causas excludentes de Imputabilidade, o agente que é embriagado completamente e involuntariamente.

Diante disso, a embriaguez pode ser voluntária, quando o agente age com dolo ou culpa, podendo essa embriaguez ser completa ou incompleta, e involuntária quando o agente é embriagado de forma acidental, causado por caso fortuito ou de força maior, podendo também ser completa ou incompleta.

 O segundo elemento da Culpabilidade, chamado de potencial consciência da ilicitude do fato, é outro substrato que pode excluir a Culpabilidade. Nestes termos, a potencial consciência da ilicitude é a possibilidade do sujeito saber que a sua atitude é ilegal, e pode ser excluída pelo erro de proibição, ou melhor, erro sobre a ilicitude do fato, desde que inevitável, e com isso o agente não teria a possibilidade de saber o caráter ilícito da sua conduta.  Para Bitencourt:

O erro de proibição, quando inevitável, exclui a culpabilidade, impedindo a punição a qualquer titulo, em razão de não haver crime sem culpabilidade. Se o erro de proibição for evitável, a punição se impõe, porém, sempre por crime doloso (ou melhor, sem alterar a natureza do crime), mas com pena reduzida. (2013, p. 326)

Dessa forma, para que exista a culpabilidade, além do agente ser Imputável e de possuir uma potencial consciência da ilicitude ele deve possuir a faculdade de agir com uma conduta diversa.

Com esse raciocínio, é importante agora analisar as causas que excluem a exigibilidade de conduta diversa, formada por duas modalidades, uma determinada pela Coação moral irresistível e a outra pela obediência a ordem não manifestamente ilegal de superior hierárquico.

Após estruturar de forma clara e suscita o entendimento jurídico doutrinário da Teoria Geral do Crime, registra-se a presença de três substratos compostos pelo Fato Típico, Ilicitude e Culpabilidade, identificando a imputabilidade como um dos elementos inseridos na Culpabilidade, sendo o agente inimputável e isento de pena por não ter praticado atividade criminosa e sim, ato infracional.

 2.3. Inimputabilidade Penal no Tempo

É fato que a criança e o adolescente têm um papel muito importante na construção de uma sociedade justa, solidária e soberana, contribuindo para formação de uma nação de homens e mulheres comprometidas com fazer o bem, tornando-se cidadãos críticos capazes de modificar o estado atual das coisas, por meio de um pensamento progressista e humanitário.

Dessa forma, o ordenamento jurídico dispensa cuidados diferenciados a essa faixa etária, compreendida até a idade de 18 anos, quando completará sua capacidade civil e penal, tornando-se imputável.

Para Mirabete e Fabbrini (2012), o agente que comete qualquer crime, no dia em que completou 18 (dezoito) anos, pode ser considerado imputável independente do momento certo e preciso em que nasceu. Nesse sentido, os Tribunais vêm julgando da seguinte forma:

TRF1-019744) PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. MENORIDADE DO ACUSADO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. O trancamento da ação penal é medida excepcional adotada somente em casos de manifesta atipicidade do fato narrado, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou de ausência de indícios de autoria ou de materialidade do delito. 2. A regra do art. 27 do CP determina que os menores de 18 (dezoito) anos são inimputáveis, sendo certo que a prova da menoridade, conforme determina o art. 155 do Código de Processo Penal deve ser feita por documento idôneo. Neste sentido também a Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça que preceitua que "para efeitos penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil." 3. A alegada menoridade do paciente encontra suporte nos documentos constantes dos autos, em especial o Auto de Qualificação Indireta realizado com base nas informações contidas nos autos e nos bancos de dados do Departamento de Polícia Federal, não tendo sido contestada pelo órgão acusador. Reconhecimento da inimputabilidade do paciente à data dos fatos. Aplicação do princípio in dubio pro reo. 4. Reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva em razão do transcurso do prazo prescricional. 5. Habeas Corpus concedido. (TRF, Habeas Corpus nº 0030204-13.2010.4.01.0000/PA, 2013).

TRF4-084763) PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 334, § 1º, "C", DO CP. MENORIDADE DO ACUSADO. INIMPUTABILIDADE. COMPETÊNCIA DO JUIZADO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. 1. O agente que contar com menos de 18 anos na data dos fatos é penalmente inimputável, nos termos do art. 27 do Código Penal e 228 da Constituição Federal. 2. Compete ao Juizado da Infância e da Juventude conhecer de representações promovidas pelo Ministério Público destinadas a apurar ato infracional atribuído a adolescentes. Inteligência do art. 148 da Lei nº 8.069/90. (TRF, Questão de Ordem no RSE nº 0000289-67.2009.404.7016/PR, 2013).

Posto isso, vale a pena, recordar, que nem sempre foi assim. Apesar da criança desde a priori dos tempos ser visto como a passagem para o progresso da humanidade, por representar o futuro e os frutos das sementes plantadas no presente, houve uma época, que o tratamento a estes, era visto de forma rigorosa, para tanto, voltar ao passado, para compreender como se deu a formação da maioridade penal no passar dos anos.

E nesse sentindo, faz-se necessário remeter ao Direito Romano, importante no ordenamento jurídico, pois influenciou juristas e doutrinadores por todo o mundo até os dias de hoje. De acordo com o antigo Direito Romano o menor, sendo homem com a idade de 7 (sete) a 18 (dezoito) anos, e se mulher com 7 a 14 anos,  já estavam sujeitos a punição, como instrumento de inibir nova atitude contraria as normas e regras romanas, castigo esse materializado por meio de chibatadas (Bastão, admoestação), sendo a maioridade penal constituída após completarem 25 anos de idade. Os pais detinham nas mãos o poder de decidir como bem queriam sobre a vida dos filhos, não muito diferente da Lei de Moises relatada na história por meio do antigo testamento a respeito do tratamento dispensado aos filhos. Para Heloisa Gaspar Martins Tavares:

O primeiro registro histórico do direito do menor normatizado, que se tem noticia, encontra-se em Roma, com a celebre distinção entre infantes, púberes e impúberes, contida na Lei das XII Tábuas, de 450 a.C., que levava em conta o desenvolvimento estrutural para nortear os limites de faixa etária daquela classificação. (2013, s.p).

À luz doutrinária de Bitencourt (2013) é no direito Romano que o sistema jurídico fundamenta inúmeros institutos jurídicos, representando a ligação entre o mundo antigo e o mundo moderno, prevalecendo uma mistura sociocultural, ou melhor, consuetudinário.

Em meados do século XIX, norteado pela influência religiosa da Igreja Católica no Brasil, o menor, demonstrando discernimento suficiente para entender o caráter ilícito do fato, era punível como se fosse um adulto, seguindo os fundamentos e princípios da escola clássica.

Influenciado pelos ditames da Igreja, o Estado passou a aceitar, a partir dos dezesseis anos de idade, a pena de morte, e a partir dos 21 anos o sujeito estaria apto a sofrer com todas as consequências dos seus atos como sendo absolutamente imputável.

Nesta mesma época aos moldes da teoria correcional, como forma de reeducar o menor infrator, surge a prisão especial ou chamada de reformatório, que ao final se igualava com a prisão tradicional, conhecida na atualidade.

Até a criação do Código Penal brasileiro, o Brasil adotava, e estava sob a regência da legislação lusitana, oriunda de Portugal, país colonizador, até o ano de 1830 quando da independência do Brasil, e a criação do Código Criminal do Império, inspirada no Código Frances 1810. A luz dos ensinamentos Moreira apud CARVALHO:

O nosso Código Criminal de 1830 distinguia os menores em quatro classes, quanto à responsabilidade criminal: a) os menores de 14 anos seriam presumidamente irresponsáveis, salvo se provasse terem agido com discernimento; b) os menores de 14 anos que tivessem agido com discernimento seriam recolhidos a casas de correção pelo tempo que o juiz parecesse, contanto que o recolhimento não excedesse a idade de 17 anos; c) os maiores de 14 e menores de 17 anos estariam sujeitos às penas de cumplicidade (isto é, caberia dois terços da que caberia ao adulto) e se ao juiz parecesse justo; d) o maior de 17 e menor de 21 anos gozaria da atenuante da menoridade. (MOREIRA, s.p., 2013)

Este primeiro Código apresentava a maioridade penal absoluta a partir dos 14 anos de idade, podendo o juiz a luz do critério do discernimento ou biopsicológico encontrar em uma criança com uma idade menor que esta, a capacidade para o cometimento de crime, com a inteligência de saber o que é certo e o que é errado, o condenando a recolhimento a casa de correção, não podendo esse internato ser superior a idade de dezessete anos.

O ordenamento jurídico no Brasil passou a criar uma nova roupagem com o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil, também conhecido como Código Penal da República, advento do Decreto n.º 847/1890, norteado mais uma vez pelo sistema do discernimento ou biopsicológico, onde os jovens com 9 (nove) anos completos eram detentores da inimputabilidade absoluta, e a partir dessa idade até os 14 anos, a criança estaria submetidos a uma análise pelo Juiz, para verificar a atividade delinquente provocada pelo menor. Com ancora nos ensinamentos de Aníbal Bruno:

Nos fins do século XIX outra ordem de motivos veio a influir na matéria – motivos de natureza criminológica e de política criminal, segundo os novos conhecimentos sobre a gênese da criminalidade e a ideia da defesa social, que impunha deter os menores na carreira do crime. Daí nasceu o impulso que iria transformar radicalmente a maneira de considerar a tratar a criminalidade infantil e juvenil, conduzindo-a a um ponto de vista educativo e reformador. (2005, p. 543).

E, em 1921, surge a lei n.º 4.242, revogando os dizeres auferidos no Código Penal de 1890 no que tange à inimputabilidade penal, anulando o atual sistema do discernimento ou biopsicológico, determinando a proibição de punir menores de 14 (quatorze) anos, adotando o sistema objetivo da imputabilidade penal, iniciando nesse período a criação e organização de serviços de assistência e proteção à infância abandonada e delinquente, já nessa época, utilizando de políticas públicas como forma de dirimir a violência.

A ideia era criar um mecanismo capaz de conscientizar o jovem por meio de medidas punitivas, há evitar a pratica de crimes, educando-os segundo os preceitos aceitáveis pela sociedade.

Outras providências foram tomadas, como a construção de casas de abrigo, casas de preservação, nomeação de Juiz responsável pelo guardião dos direitos da criança e da juventude e outras adoções tendo o Governo da República como vanguarda.

Alguns anos depois, é aprovado, em 7 de dezembro de 1940, o novo Código Penal Brasileiro, por meio do Decreto lei n.º 2848, adotando o critério biológico, vigorando com a seguinte matéria “Art. 27. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”.

Em 5 de outubro de 1988 é aprovada a Constituição Federal do Brasil, garantindo a inimputabilidade do menor de 18 anos, remetendo a legislação especial a sua regulamentação. Dentro desse contexto, no dia 13 de julho do ano de 1990, aprova-se o Estatuto da Criança e do Adolescente.

A proteção da criança e do Adolescente no decorrer dos anos trouxe um instituto capaz de assegurar um crescimento físico, biopsicológico, social e cultural desse jovem por meio do instituto chamado de inimputabilidade penal, ou seja, o menor de 18 (dezoito) anos está penalmente livre dos rigores da legislação criminal, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial, ou seja, no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.

Art. 2º .................................................................................................................

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Mesmo sendo notória a denominada inimputabilidade penal da criança e do adolescente no ECA, o sentimento de impunidade perpassa por todas as pessoas que muito das vezes se sente refém da própria lei, acreditando ser o estatuto uma guarida para o mal feito, ou uma vantagem para o cometimento desenfreado de infrações. Segundo decisão do TJBA:

Outra posição se eleva, talvez até mesmo um tanto mais adiante do ECA, mas certamente respeitando-o e defendendo-o. Trata-se da perspectiva "abolicionista" que é defendida por estudiosos europeus e que começa a despertar interesse entre brasileiros opositores da cultura da punição, do castigo e do encarceramento. Vale trazer a colaboração de Silva (referem-se a Roberto Baptista da Silva): O padrão penalizador de resposta às situações-problema em que se envolvem os adolescentes no Brasil é uma prática que, além de infringir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - que privilegia o princípio pedagógico como meio para se chegar à solução das questões atinentes ao futuro cidadão - é uma prática que deve ser combatida, não para substitui-la por "penas alternativas", enquanto imposições de modelos preestabelecidos de respostas, tidos como axiomas que preservam a centralização do poder, mas com o intuito de, através de uma educação horizontalizada e que valoriza a conciliação, atingir maior grau de liberdade.

A lei regula medidas para garantir uma melhor vivência da Criança e do Adolescente, mas também reprime as infrações cometidas por meio de Medidas de proteção e Medidas Socioeducativas, que se traz a baila.

Verificada a prática de ato infraconstitucional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as medidas socioeducativas, levando em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração, nos termos do ECA:

Art. 112.  Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semiliberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

O ECA dispensa tratamentos diferenciados à criança e ao adolescente, dessa forma, até os 12 (doze) anos incompletos a criança receberá apenas medida protetiva, o adolescente compreendido na idade de 12 (doze) anos completos até os 18 anos incompletos, receberá medida socioeducativa ou medida de proteção. 

Como se pode, ver apesar do menor ser penalmente inimputável, existem medidas que garantem a sua reeducação, não o deixando sair ileso sem nenhuma responsabilidade com seus atos. Ao contrario, mesmo que mais brandas, as medidas de proteção ou socioeducativas, aplicadas eficazmente, representariam uma mudança significativa no contexto social e humanitário.

 2.4. Aumento da Atividade Criminosa.

Mesmo com todas essas peculiaridades da lei, começando pela Constituição Federal, passando pela legislação criminal até chegar ao Estatuto da Criança e do Adolescente, são diversos os trechos jurídicos, com fulcro disciplinador dessa matéria, mas, no entanto, a delinquência juvenil é uma crescente em nosso país.

Vive-se hoje uma realidade obscura, o medo à violência e o sentimento de abandono pelo poder público é uma constante nos olhos das pessoas que ficam a mercê de criminosos que utilizam crianças e adolescentes para se livrar da prisão. E em meio a esse contexto, vem se tornando rotina assistir brutais crimes cometidos por crianças e adolescentes, estimulando a discussão visando buscar uma solução para, a prática de vários delitos e ações cometidas por menores de idade.

O caso do garoto João Hélio de 6 (seis) anos, morto em fevereiro de 2007 após ser arrastado por 7 Km  do  lado  de  fora do veículo que havia sido roubado por assaltantes, dentre eles um menor de idade,  deixou a sociedade horrorizada, intensificando a luta por uma mudança legislativa no sistema penal brasileiro.

À época, a revista VEJA (2007) noticiou o fato:

Na quarta-feira passada, a dona-de-casa carioca Rosa Viestes se preparava para encerrar um dia como tantos outros. Pouco depois das 9 horas da noite, deixou o centro espírita que costuma frequentar em Bento Ribeiro, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e entrou no carro com seus dois filhos, Aline, de 13 anos, e João Hélio, de 6, e uma amiga. Logo a família estaria toda reunida, segundo seus planos. Hélcio, seu marido, passara a tarde na casa nova que a família acabara de comprar, acompanhando a reforma, e iria encontrá-los para o jantar. Poucos quarteirões adiante, ao parar num sinal de trânsito, o carro em que estavam foi abordado por dois bandidos armados, que ordenaram que todos descessem. Começou, então, o pior drama que uma mãe pode viver – e uma trágica histórica que tirou a respiração de todos os brasileiros. Rosa, Aline e a quarta passageira, que viajava no banco do carona, saíram do carro. Mas o pequeno João, que estava no banco de trás e usava cinto de segurança, demorou um pouco. A mãe abriu a porta traseira e tentou ajudá-lo. Não deu tempo. Os bandidos entraram no carro e partiram em alta velocidade levando o garoto dependurado, preso pela barriga. Rosa gritou e saiu correndo atrás do veículo, mas só viu o filho ir embora, arrastado pelo chão. O que se passou depois foi uma cena difícil de imaginar, mesmo nos piores filmes de terror – aliás, nenhum roteirista ousou escrever uma cena daquela. Um crime de tamanha crueldade tem de ser encarado como a gota d'água para mudar o combate à violência no Rio de Janeiro e em todo o Brasil. João Hélio foi arrastado por 7 quilômetros em ruas movimentadas de quatro bairros da região. (VEJA, 2007).

João Hélio foi apenas mais uma vítima do sistema mal articulado, demonstrando a precariedade e fragilidade do conjunto de fatores capazes de intervir na criação do jovem, formado pelo Estado, a família e a sociedade.

A “busca de dinheiro fácil” e a “fictícia sensação de poder” seduz esse menor, pela promessa de uma vida de respeito e força dentro da sua comunidade, tornado a estrutura familiar cada vez mais vulnerável. E diante dessa mistura de desigualdades, desestrutura familiar e falta de condição digna de sobrevivência, surge o conflito do jovem com a própria lei.

Com isso, a alta estatística de crimes cometidos por menores se torna um dos principais problemas do nosso País. E pelo elevado índice de atrocidades, como roubo, assalto, estupro, tráfico de drogas, e inúmeros outros crimes, é que a sociedade anseia por uma mudança legislativa no sistema penal brasileiro, com relação à inimputabilidade do menor infrator.

Dessa forma, o Estado se mobiliza cada vez mais com essa questão, debatendo e buscando mecanismos de implementação de políticas públicas, visando amenizar o problema da criminalidade juvenil, bem como, identificar os fatores que levam a pratica dessa conduta criminosa.

Tanto as grandes como as pequenas cidades no Brasil sofrem com a desigualdade social, levando muitos jovens para linha de frente do trafico de drogas, aumentando consequentemente o uso constante de entorpecentes, que muito das vezes, é uma combinação agressiva e fulminante, desencadeando o aumento significativo de ações violentas, protagonizada pela juventude.

A constância de atos violentos cometidos nem sempre por menores de idade levam a sociedade a se proteger de diferentes formas, se fechando dentro de sua própria casa, por meio de grades, cercas elétricas, portão eletrônico, inclusive a criação de cães, alimentando a falsa sensação de segurança, e ao mesmo tampo a ideia de que as pessoas de bem e inocentes é que estão presas dentro de sua própria casa, reclamando um endurecimento da legislação quanto a sua aplicação a criança e o adolescente.

Diante desta questão, vale a pena, ver o que nos conta Nelson Hungria a respeito da figura do jovem na legislação, diante de uma possível alteração na pena:

O reajustamento do processo de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal. De resto, com a legislação de menores recentemente editada, dispõe o Estado dos instrumentos necessários ao afastamento do jovem delinqüente, menor de 18 (dezoito) anos, do convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do delinquente adulto, expondo-o à contaminação carcerária. (HUNGRIA, p. 250 2004)  

Nesse sentido deve-se observar que a educação é fator primordial na construção da personalidade do agente, e ao contrario, o Estado em vez de punir por meio de medidas repressivas como a pena, inclusive privativa de liberdade, fazer investimentos na educação de qualidade para todos.

O sistema criminal contém instrumentos suficientes para combater e socializar o menor por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, não sendo necessário recorrer à lei dos adultos, como fórmula de adequação social ao menor. Apesar do clamor social em busca de reduzir a maioridade penal observa-se pelo quadro abaixo que não há muita diferença de um país para o outro quanto à imputabilidade penal.

PAÍS

IDADE DA RESPONSABILIDADE PENAL   JUVENIL

MAIORIDADE PENAL (IMPUTABILIDADE   PENAL)

Alemanha

14

18   – 21*

Argentina

16

18

Arkansas/EUA

-

21

Áustria

14

19

Bélgica 

16

18

Bolívia

12

16

Bulgária

14

18

Califórnia/EUA

-

21          

Chile

14

18

Colômbia

12

18

Costa   Rica

12

18

Dinamarca

15

18-21*  

Egito

-

15

Espanha

12

18-21*  

França

13

18

Grécia

13

18

Holanda

12

18

Hungria

14

18

Índia

-

15

Inglaterra

7-15

18

Itália

14

18

Paraguai

-

15

Peru

12

18

Polônia

13

17

Portugal

-

16-21*  

Romênia

16

18-21*  

Suécia

15

18

Suíça

7-15

18-25*  

Uruguai

14

18

Wyoming/EUA

-

19**21***

Fonte:  GOMES (2013)

* Entre as idades apontadas, aplica-se legislação especial para o jovem adulto.

** Sexo masculino.

*** Sexo feminino.

Quando se fala em criminalidade, imputabilidade e inimputabilidade observa-se pelo quadro acima, que mesmo na crescente delinquência em todos os países, vê-se a construção de uma consciência preocupada com a formação desse adolescente.

O combate à criminalidade tem que ser encarado de forma emergencial, com a concentração de esforços que visem projetar o jovem de forma a garantir o seu desenvolvimento psicossocial.

Só na última década, foram vários casos envolvendo menores de idade, tais como: o sequestro de Roberto Medina – que deu causa à edição da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90); o caso dos policiais flagrados por cinegrafista amador agredindo gratuitamente populares em Diadema – episódio do qual resultou a Lei de Tortura (Lei n. 9.455/97); o assassinato da atriz Daniela Perez – que culminou em alterações tornando mais rígida a Lei dos Crimes Hediondos; entre outros casos.

Não obstante, todos esses crimes cometidos diariamente, o Estado ainda erra em apelar ao endurecimento da lei, esquecendo-se de visualizar o contexto histórico desse jovem, e o que o levou à prática de tantas infrações violentas, sabendo das consequências, e que mesmo sendo menor de idade, ou seja, inimputável, responderá pelos seus atos em juízo.

No capítulo seguinte tratar-se-á da Proposta de Emenda a Constituição n.º 33 de 2012, que propõe alterar a redação dos artigos 129 e 228 da Constituição Federal, e acréscimo de parágrafo único para prever a possibilidade de desconsideração da inimputabilidade penal aos maiores de dezesseis anos e menores de dezoito anos por meio de lei complementar. Além de, entre outras medidas, autorizar o Ministério Público a analisar a capacidade de compreensão do menor quanto ao caráter criminoso de sua conduta.

Esta situação traz preocupações na esfera politica e jurídica, o que culmina na elaboração de legislação especial quanto à possibilidade de punir ou não o jovem e como sua conduta pode ser avaliada na esfera penal, em relação à inimputabilidade. Dentro desse contexto social seguem tramitando no Congresso inúmeras Propostas de Emenda à Constituição com fulcro de enrijecer a forma de aplicação da pena com o intuito de minimizar, por meio de cunho repressivo, a atuação delinquente dos jovens infratores.

CAPÍTULO III

A INIMPUTABILIDADE FRENTE À PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N.º 33/2012

 3.1.  Proposta de Emenda à Constituição n.º 33 de 2012

O índice de violência, como roubo, assalto, estupro, tráfico de drogas, e inúmeros outros crimes, preocupa as autoridades, ansiando a sociedade por uma mudança legislativa no sistema penal brasileiro, no que tange à inimputabilidade do menor infrator.

Após várias Propostas de Emenda à Constituição - PEC, como a PEC n.º 171/1993 de autoria do ex-deputado Federal Benedito Domingos (PP-DF), a PEC n.º 20/1999 de autoria do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (sem partido), a PEC n.º 74/2011 de autoria do Senador Acir Gurgaz (PDT-RO) e a PEC n.º 83/2011 de autoria do Senador Clésio Andrade (PMDB-MG), todos buscando alterar o artigo 228 da Constituição Federal de 1988, “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”, com objetivo de reduzir essa inimputabilidade para dezesseis anos, ter fracassado por diversas vezes, surge uma nova perspectiva para os adeptos dessa corrente com a criação da Proposta de Emenda a Constituição n. º 33 de 2012.

A referente Proposta de Emenda a Constituição tem o escopo de alterar a redação dos artigos 129 e 228 da Constituição Federal e apresentando um novo paradigma jurídico, alterando a ideia de inimputabilidade do menor e propondo uma nova direção nos trabalhos realizados pelo órgão do Ministério Público.

O tema abordado, por ser polêmico e de relevante importância, prima pela cautela no seu desdobramento, definindo novos efeitos penais aos jovens que estão em contradição com a lei. Para a atual legislação a imputabilidade é a capacidade do agente de sofrer pena, encontrando subsídios no Código Penal, e inimputabilidade significa a condição do agente de ser enquadrado em uma norma especial, no caso em estudo, encontrando subsídios no Estatuto da Criança e do Adolescente e, por isto, alterações nessa ordem traz impactos significativos na sociedade e no sistema jurídico.

A matéria que visa alterar a redação dos artigos. 129 e 228 da Constituição. Onde se lê:

Art. 129.  São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

Art. 228.  São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

Com a alteração e os acréscimos trazidos pela Proposta de Emenda a Constituição n.º 33/2012, passar-se-á a ler:

Art. 1.º - O inciso I, do art. 129 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação.

I – promover, privativamente, a ação penal publica e o incidente de desconsideração de inimputabilidade penal de menores de dezoito e maiores de dezesseis anos. (NR)

Art. 2.º Acrescente-se um Parágrafo Único ao art. 228 da Constituição Federal com a seguinte redação:

Art. 228 - ............................................................................................................

Parágrafo Único – Lei complementar estabelecerá os casos em que o Ministério Público propor, nos procedimentos para a apuração de ato infracional praticado por menor de dezoito e maior de dezesseis anos, incidente de desconsideração da sua inimputabilidade, observando-se:

I – Propositura pelo Ministério Público especializado em questões de infância e adolescência;

II – julgamento originário por órgão do judiciário especializado em causas relativas a infância e adolescência, com preferência sobre todos os demais processos, em todas as instancias;

III – cabimento apenas na prática dos crimes previstos no inciso XLIII, do art. 5º desta Constituição, e múltipla reincidência na pratica de lesão corporal grave e roubo qualificado;

IV – capacidade do agente de compreender o caráter criminoso de sua conduta, levando em conta seu histórico familiar, social, cultural e econômico, bem como de seus antecedentes infracionais, atestado em laudo técnico, assegurada a ampla defesa técnica por advogado e o contraditório;

V – efeito suspensivo da prescrição até o trânsito em julgado do incidente de desconsideração da inimputabilidade;

VI – cumprimento de pena em estabelecimento separado dos maiores de dezoito anos;

Art. 2º - Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

A mencionada PEC acrescenta no artigo 129 da Constituição Federal uma nova responsabilidade às funções institucionais do Ministério Público, garantido a promoção privativa da ação penal pública podendo, inclusive, conforme o caso, desconsiderar a idade do menor de dezoito anos quanto à sua inimputabilidade.

O que essa nova redação objetiva é dar poder aos órgãos do Ministério Público de avaliar a situação em que foi cometido o crime pelo menor inimputável e, dependendo da conduta delitiva, anular a inimputabilidade do menor de dezoito anos e maior de dezesseis a fim de desconsiderar o seu caráter inimputável e se tornar passível de pena, ou seja, considerado imputável aos moldes do Código Penal, e julgado como se fossem adultos.

 Já ao artigo 228 da Constituição Federal, acrescenta-se parágrafo único e incisos com a função de complementar o artigo 129, inciso I, da Constituição Federal, atribuindo a responsabilidade da Lei Complementar com papel de regulamentar os critérios para a ação do Ministério Público, quando do oferecimento da ação penal, com escopo de escarnecer atos infracionais cometido por menores de dezoito anos e maiores de dezesseis e podendo desconsiderar a inimputabilidade desse jovem, alterando a sua conduta de infracional para conduta criminosa.

Em um sentido mais amplo, o Ministério Público, para ter a desconsideração da inimputabilidade aceita, deve analisar a conduta do agente ao longo da sua criação, levando em consideração o contexto social, cultural, econômico e familiar em que esteve inserido antes da prática delituosa, primando por verificar os fatos anteriores ao ato delinquente, na busca suprema da justiça.

Não obstante buscar subsídios para compreender o motivo que levou a prática infracional do adolescente por meio da sua infância, a PEC orienta identificar outro fator, chamado de psicológico, para ter a segurança de que no momento da atividade delinquente o jovem possuía a capacidade de compreender o caráter ilícito de sua conduta.

Por outro lado não se deve negar o princípio basilar de todo arcabouço jurídico, sintetizado no Princípio da Ampla Defesa e do Contraditório, possibilitando que esse jovem seja amparado juridicamente por meio de um advogado, orientando o Ministério Público pelos antecedentes infracionais desse adolescente.

De acordo com a PEC n.º 33/12 a oferta de desconsideração da inimputabilidade deverá ser feita pelo Ministério Público da Infância e Juventude sendo o julgamento realizado por um juiz da infância e juventude, por se tratar de uma questão especial, sobrepondo todas as outras instâncias, tendo prioridade sobre os outros processos.

Convêm esclarecer que a PEC em discussão não declara que são todos os crimes cometidos por adolescentes que permitirão ter a sua inimputabilidade desconsiderada, devendo o Ministério Público observar se o crime foi praticado com múltipla reincidência de lesão corporal ou roubo qualificado, ou nos crimes cometidos no disposto inciso XLIII, do art. 5º da Constituição Federal.

Art. 5º XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

           

Para melhor compreensão da PEC 33 de 2012, observam-se os dispositivos da Lei n.º 8.072 de 1990 que dispõem sobre os Crimes Hediondos, ou seja, os crimes cometidos com maior violência e humilhação ao ser humano, com fulcro de determinar quais os crimes praticados pelos jovens adolescentes, que poderão ser suscetíveis de desconsideração da inimputabilidade.

Art. 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados:

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I, II, III, IV e V);

II - latrocínio (art. 157, § 3º, in fine);

III - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2º);

IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ 1º, 2º e 3º);

V - estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º);

VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º);

VII - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1º);

VII-A - (vetado);

VII-B - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais

Parágrafo único. Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956, tentado ou consumado.

Mesmo estando o legislador a buscar o endurecimento da punição consoante ao menor de dezoito anos, caso haja a desconsideração da inimputabilidade e vier esse jovem a ser condenado, ele não poderá cumprir a sua pena com maiores de dezoito anos, devendo suspender a prescrição até o trânsito em julgado de desconsideração da inimputabilidade.

Apesar da grande movimentação do então autor da PEC, Senador Aloysio Nunes do PSDB de São Paulo, em busca da conscientização dos demais Senadores da importância da aprovação dessa proposta, diversos setores da sociedade organizada se mobilizam de encontro com essa ideia.

Nesse sentido, a Comissão Especial da Criança, do Adolescente e do Idoso do Conselho Federal da OAB se posiciona contra a aprovação da PEC n.º 33/2012, por acreditar, conforme o presidente nacional Ophir Cavalcante (gestão 2012), que a redução, por mais que não seja generalizada a todos os fatos, não representa a cerne do problema, e diz mais: ”A criminalidade juvenil há de ser combatida em sua origem – a miséria e a deseducação; não será expondo jovens de 16 anos ao falido sistema penitenciário que se poderá recuperá-los”.

Mas esse entendimento não é corroborado pelo relator da (PEC) Senador Ricardo Ferraço do PMDB, do Espirito Santo, árduo defensor da matéria, inclusive apresentando parecer favorável à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – CCJ. De acordo com o relator, “A desconsideração da inimputabilidade penal dependerá da comprovação da capacidade do agente de compreender o caráter criminoso de sua conduta, levando em conta seu histórico familiar, social, cultural e econômico, bem como seus antecedentes”.  (BRASIL, s.p., 2013)

O ECA não representa a impunidade da criança e do Adolescente, prevendo inclusive medidas privativas de liberdade que, se aplicadas em sua plenitude e respeitando as condições da idade, da infração e da sua compleição física, representará um grande avanço socioeducativo desse jovem, conforme os artigos 98, 99 e 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Deve-se lembrar de que o Estado tenta, sem obter o sucesso esperado pela sociedade, fornecer condições dignas de trabalho, educação e moradia a esses jovens, ainda que tais direitos estejam previstos na Constitucional Federal de 1988. Diante disso, usar a criança e o adolescente, ou melhor, as vítimas do sistema corporativo inoperante, como culpados pelo aumento das atividades delinquentes e imputar-lhes o enrijecimento da lei é o mesmo que retirar a responsabilidade do Poder Público de oferecer instrumentos capazes de potencializar as qualidades desse jovem.

De acordo com a deputada Maria do Rosário o endurecimento da lei de nada adianta sem Políticas Públicas especificas na área da juventude, "Temos de debater esse tema com muita responsabilidade. A sociedade brasileira não aguenta mais a violência, mas enquanto soluções do tipo mágicas forem apresentadas para combatê-las, nós realmente não vamos superá-la”.  (BRASIL, 2013)

Reduzir, mesmo que não seja de forma generalizada a maioridade penal, seria uma atitude imediatista e superficial, sem atacar o verdadeiro problema, apenas modificando o conceito de infração por crime. De acordo com o eminente Ministro da Justiça, Marcio Thomas Bastos, em entrevista à “Folha de São Paulo”, que observou enfaticamente “Não sou a favor dessa redução nem do endurecimento da lei (...) não podemos legislar pela emergência, temos que termos um plano”.

Corroborando com o entendimento do Ministro Marcio Thomas Bastos o ilustre professor Luiz Flávio Gomes diz:

Não é preciso, evidentemente, chegar à solução dada por alguns países no sentido de punir o menor como se fosse um maior. Não parece aceitável, de outro lado, remeter o menor para o Código Penal; muito menos transferi-lo para os cárceres destinados aos adultos quando completa 18 anos. (GOMES, s.p., 2012).

Como se vê apesar de considerar um erro a redução da maioridade penal, por mais que seja restrito a determinados casos, existe também material que defende essa desconsideração da inimputabilidade, por mais que seja restrita.

       Não obstante, Júlio Fabbrini Mirabete (2012) se posiciona contra a redução, pois de acordo com o eminente Professor, criaria a promiscuidade das crianças e adolescentes com delinquentes contumazes e nesse sentido, deve prevalecer o entendimento de que mesmo tendo adquiridos tantos direitos ao longo da história, desconsiderar o fator biológico e psicológico da criança e do adolescente é regredir no processo evolutivo do ordenamento jurídico brasileiro, devendo priorizar o investimento na educação e cultura.

 3-2 – A Pena Privativa de Liberdade como Meio de Reabilitação social.

        Desde os primórdios da civilização o homem se organiza em grupos que tinha na força bruta o poder de comandar, devendo os seus súditos ou subordinados, satisfazer suas vontades e vaidades.  De acordo com a Mestre em Historia Social, Flavia Lages de Castro:

Embora algumas vezes as pessoas confundam Direito e Lei escrita, se partirmos do pressuposto de que um conjunto de regras ou normas que regulamentam uma sociedade pode ser chamado (ainda que humildemente) de direito – indiferentemente de quaisquer características que tenham – produziam ou produzem seu “Direito”. Muitos grupos utilizam o procedimento de, em intervalos regulares de tempo, terem suas regras enunciadas a todos pelo chefe (ou chefes) ou anciões. Outras formas são os Provérbios e Adágios que desempenham papel decisivo na tarefa de fazer conhecer as normas da comunidade. (2007, p. 7).

A criação de regras de convivência passou a ser imprescindível e aquele que contrariasse as normas do grupo era abandonado e isolado, deixado a mercê do perigo, e na maioria dos casos fadados à morte por pessoas de outros grupos sociais.

A devoção divina passou a nortear à vida de toda a sociedade, criando a Igreja Católica a figura da blasfêmia, ceifando muitas vidas pela repressão, tendo o corpo esquartejado, amputado, marcado com fogo no rosto e nos ombros, supliciado, ou seja, o cidadão era levado ao extremo, cumprindo uma pena dolorosa e inexprimível como diz Michel Foucault (2009).

E com a evolução civilizacional da população em meados do século XVIII essas cenas de torturas e mortes, expostas de forma teatral em praça pública, passou a ser repudiadas, aos olhos humanitários, invertendo a situação, sendo o condenado revestido de um sentimento piedoso, visto como coitado; o carrasco como criminoso, e os magistrados descriminados e denominados assassinos. À luz da inteligência de Michel Foucault:

A punição vai-se tornando, pois, a parte mais velada do processo penal, provocando varias consequências: deixa o campo da percepção quase diária e entra no da consciência abstrata; sua eficácia é atribuída à sua fatalidade não à intensidade visível; a certeza de ser punido é que deve desviar o homem do crime e não mais o abominável teatro; a mecânica exemplar da punição muda às engrenagens; Por essa razão a justiça não mais assume publicamente a parte de violência que esta ligada a seu exercício. (2009, p. 13)

O açoitamento, humilhação e vexame até chegar à morte, transfiguravam no cumprimento da pena, alterando com isso, o conceito de punição. Dessa forma, não tardou para a prisão se tornar o principal instrumento de punição, sendo definido por Arminda Bergamini Miotto (1992), como um prédio ou local onde são detidas pessoas, por tempo determinado, devendo permanecer privadas da sua liberdade e seguindo normas de condutas e regimento interno próprio.

E aos poucos, a cadeia, ou melhor, a prisão, começou a ser adotada como mecanismo de reeducação do condenado, se reinventando como uma política de ressocialização, projetando o apenado para ser novamente inserido na sociedade. No Brasil, o Artigo 1.º da Lei de Execução Penal dispõe: “Execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”

Mas com o aumento vertiginoso da criminalidade no país, criou-se um novo problema no sistema penitenciário: a superlotação das cadeias; dificultando a reabilitação do sentenciado, para convivência harmoniosa em sociedade. A falta de estrutura física dos presídios brasileiros, em vez de preparar o criminoso, para voltar à convivência fora da prisão, funciona como supletivo da marginalidade por não haver condições de individualização da pena, diante da falta de espaço e material humano para garantir essa previsão Constitucional. No dia 22 de outubro de 2012, o jornal O Globo, publicou uma matéria retratando a realidade carcerária no Brasil, revelando o caos prisional:

A situação agravou-se de forma preocupante, segundo números do Ministério da Justiça. As vagas criadas pelo governo nos últimos anos ainda são menores do que a quantidade de pessoas que vão para trás das grades. De 2005 a 2011, o volume de presos aumentou 74% (de 294.327 para 514.582), enquanto as vagas subiram 66% (de 183.610 para 306.497).

A violência causada pela superlotação dessas cadeias é um sério problema que o Brasil deve enfrentar com austeridade; daí se infere que, em uma prisão, o acúmulo de pessoas em uma mesma sela instiga a rixa entre os mais antigos ou entre os mais fortes, para determinar quem é o comandante, ou melhor, quem é o dono do espaço.

Esse domínio se dá pela supremacia e liderança conquistadas através da força física, causando uma série de atos violentos, inúmeras discórdias e incontáveis atritos, um com os outros dentro da mesma sela.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais: “O sistema penitenciário deve ser repensado desde a reforma dos atuais estabelecimentos, a fim de proporcionar reeducação e recuperação do preso, até a construção de novos, que atinjam os diversos fins das penas (restritiva, preventiva geral e preventiva especial).” (BRASIL, 2013)

Diante deste quadro, surge a preocupação quanto à garantia de que aos adolescentes será dado tratamento diferenciado e que permita o seu desenvolvimento integral, sem afrontar a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, considerando a realidade do tratamento dispensado aos presos comuns.

Portanto, a proposta da desconsideração da inimputabilidade precisa apresentar alternativa na penação dos adolescentes e crianças, pois, colocar esses adolescentes nesse ambiente, degradante, hostil e sem a mínima condição de levá-los à compreensão delinquente dos seus atos, principalmente ladeados de criminosos adultos, sem perspectiva e com penas que ultrapassam a sua expectativa de vida, é o mesmo que incentivá-los a perpetuarem no mundo do crime.

Os problemas como o da superlotação dos presídios, bem como, o aumento da criminalidade provocam revolta social. O Estado, com o papel de fornecer condições dignas de sobrevivência, falha aos olhos da sociedade pela falta de estrutura Estatal para proporcionar uma perspectiva diferente à criança e ao adolescente. Após lutar para melhorar a estrutura preventiva, como a universalização do Ensino Médio e a liberdade assistida, sem muito sucesso pela quantidade de presos no Brasil, o Estado ainda não satisfaz deficiências básicas com a falta de estrutura física e humana, dificultando a readaptação do apenado nos presídios para convivência em sociedade.

Para Railda Saraiva (1989), o interesse social não reside na percepção do aumento de criminosos atrás das grades, muito menos na obtenção forçada de confissões, ou em punições e humilhações prévias, antes de ser decididas pelo juízo competente, mas sim, que os fatos sejam elucidados segundo o Princípio do Devido Processo Legal e do Contraditório.

No Brasil, a função do Estado na ressocialização do condenado deve ser repensada, e com isso, reavaliar a proposta do então Senador Aloysio Nunes, de desconsiderar a inimputabilidade do jovem, por não ser o presídio um ambiente adequado para formação moral desse adolescente.

O artigo 41 da Lei n.º 7.210 de 1984, chamada de Lei de Execução Penal – LEP enumera alguns dos direitos e garantias que todo preso deve possuir, com a finalidade mínima de proporcionar a dignidade necessária par sua reabilitação:

Art. 41 Constituem direitos do preso:

I – Alimentação suficiente e vestuário;

II – Atribuição de trabalho e sua remuneração;

III – Previdência social

IV – Constituição de pecúlio;

V – Proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho o descanso e a recreação;

VI – Exercícios das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas, desde que compatível com a execução da pena.

VII – Assistência material, a saúde, jurídico, educacional, social e religioso;

VIII – Proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;

IX – Entrevista pessoal e reservada com o advogado;

X – Visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;

XI – Chamamento nominal;

XII – Igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena;

XIII – Audiência especial com o diretor do estabelecimento;

XIV – Representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;

XV – Contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes;

XVI – Atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciaria competente.

O isolamento e a privação de liberdade configuram a mais grave das punições no Brasil, e como essa alternativa visa fazer com que o preso pense nas atitudes por ele tomadas fora do complexo prisional, algumas regras internas devem ser obedecidas para preservar e proporcionar uma reabilitação e não uma revolta ainda maior desse indivíduo. Nesse sentido, o artigo 41 da LEP trás algumas diretrizes como pode observas na citação supracitada.

Apesar de todas essas normas de conduta que devem ser obedecidas tanto pelo Estado como pelo condenado, a ressocialização do preso ainda é questionada, pois o aumento do número de imputáveis presos levou a Organização das Nações Unidas (ONU), no dia 28 de março de 2013 a apresentar um relatório apontando medidas a ser seguidas pelo Brasil, com fulcro de evitar o aumento de detentos. De acordo com os peritos do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a comunidade carcerária no país é a maior em todo o mundo.

O Ministério da Justiça divulgou, em 2012, dados que apontam um crescimento significativo no número de presos acima dos dezoito anos no Brasil, de 514.582 em dezembro de 2011, para 549.577 em julho de 2012. Outro dado importante foi anunciado, o déficit nas delegacias e cadeias públicas somam 250.504 vagas. De acordo com o Ministério da Justiça, em 1992, eram 74 presos para 100 mil habitantes; em 2012, esse quadro mais que dobrou, chegando a 288 presos para 100 mil habitantes. Nessa mesma época, enquanto a população do país cresceu 28%, o numero de presos aumentou 380,5%. (BRASIL, 2013)

Como se pode observar, apesar do elevado número de prisões no país, a criminalidade continua uma crescente, não diminuindo sequer, a sensação de segurança da população. E colocar jovens com a idade abaixo de 18 anos, em estabelecimentos prisionais como estes, é o mesmo que eternizar esses menores no mundo do crime.

Fica fácil identificar que, se o Estado colocar esses jovens em um complexo que já tem dificuldade de garantir a ressocialização desse condenado imputáveis, proporcionado uma real transformação na forma de encarar a vida, com o aumento desta população pela segregação do adolescente fica ainda mais difícil podendo transformar esses complexos prisionais em faculdades do crime. O Ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio declara o seguinte:

O Estado é responsável pela ressocialização daquele que claudicou na vida em sociedade por haver claudicado essa pessoa exige uma atenção maior em termos de reintegração a sociedade, e quanto essa reintegração, não pode haver preconceito, muito menos por um órgão público.

Ao contrário, muito frequente nos presídios, cadeias e delegacias pelo Brasil, é o sentimento de indignação por parte dos presos, de estarem em regime privativo de liberdade, e em vez de nutrir um sentimento de compromisso com a sua reabilitação social, impregnam-se de ódio e vontade de vingança da sociedade que o segregou, isolando-o do convívio social.

Na realidade, com o aumento da comunidade carcerária, a individualização no cumprimento da pena torna-se impossível de ser efetivada, fazendo com que os presos que cometeram crimes de magnitude e complexidade maior, cumpram pena com condenados por crimes menores, dificultando com isso a recuperação desse preso, que enfurecido com a condição que se encontra, concatenado com a experiência da companhia de um preso mais perigoso, se torna um hábil e exímio na arte do crime.

E nesse sentido, o presidiu funciona mais como a faculdade do crime, do que um ambiente propicia para a ressocialização desse preso, findando fracassada a tentativa do Estado de regenerar esse condenado, justamente pela falta de uma politica seria em torno dessa questão.

Diante do quadro, a Proposta de Emenda a Constituição n.º33/1012 sintetiza os anseios da sociedade em busca de uma solução na redução da maioridade penal como única forma de dirimir a violência e com isso a criminalidade juvenil.

  CONCLUSÃO

 Há grande preocupação quanto à inimputabilidade penal do menor por parte da sociedade brasileira. O aumento da criminalidade protagonizada por adolescentes e crianças cria o sentimento de impunidade e desconforto quanto à segurança e a legislação vigente. A criança e o adolescente, compreendendo no máximo dezoito anos, de acordo com doutrinadores, por estar em plena formação moral e em desenvolvimento psíquico, se encontra em condição de vulnerabilidade e diante disso, passível de proteção jurídica, disposta na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Por esse motivo, o adolescente e a criança têm sido alternativas para as quadrilhas organizadas. Pois evita que seus integrantes, imputáveis, sejam responsabilizados. Isto face à inimputabilidade dos menores. Mas, ao contrário, o menor não está isento de pena e, de acordo com o ilícito cometido, poderá receber punição, inclusive de pena privativa de liberdade. A mídia, em virtude do crescente número de ações criminosas, cada vez mais violentas e cruéis, com envolvimento de menores, propaga a ideia de alteração na inimputabilidade penal. Desta forma, instiga-se na sociedade a vontade de reduzir a maioridade penal.

A Proposta de Emenda a Constituição n.º 33/2012, com escopo de desconsideração da maioridade penal nos crimes hediondos e nos cometidos com múltipla reincidência em lesão corporal grave e roubo qualificado, apesar de impulsionar um avanço no debate político, social e cultural da sociedade, representa uma medida imediatista e radicalmente repressiva, posto significar um retrocesso legislativo e declínio da discussão em torno das Políticas Públicas.

Mesmo restringindo-se a determinados crimes, primando por uma análise histórica da estrutura familiar, social, cultural e econômica da criança e do adolescente, não se pode desconsiderar um fator preponderante que é a sua formação biológica e psicológica. Desmerecer a qualidade de criança e adolescente desses jovens por falta de Políticas Públicas de conscientização do seu papel em sociedade é condenar o país a um caos social, visto ser o jovem de hoje o responsável pela continuação progressista e desenvolvimentista da humanidade.

O Estado deve atentar-se a discutir mecanismos capazes de identificar as regiões mais afetadas pela fomentação do jovem em conflito com a lei, e identificar suas potencialidades. Tal conhecimento possibilitará a construção uma sociedade harmônica e comprometida com o crescimento social, compreendendo-se que a crença em uma punição mais severa como viabilizadora de paz e justiça social, não figura o melhor entendimento.

São notórias as crises no complexo prisional no Brasil, marcadas pela superlotação dos presídios e cadeias de todo país aliada à falta de estrutura física e humana para geri-lo. Torna-se ainda mais complexa essa realidade quando se considera o reduzido número de estabelecimentos prisionais no território nacional. Dentre outros agravantes resultantes dessa situação, está a dificuldade de organizar os detentos de acordo com sua periculosidade.

Neste contexto, todavia, a aprovação da estudada Proposta de Emenda Constitucional não trará avanços à questão da marginalidade. Isto, pois os sujeitos que passarão a ser imputáveis serão agregados a este sistema fadado, em presídios já com lotação máxima. Desta forma, como já é notório, não será cumprido o seu papel social e cultural, responsável pela ressocialização, mas alavancará a revolta desses jovens que culpam o Estado e a sociedade pela situação degradante por eles vivenciada.

Deve-se entender que o Estatuto da Criança e do Adolescente possui instrumentos suficientes para educar o jovem para retornar ao convívio em sociedade. Nesse sentido a Proposta de Emenda à Constituição n.º 33/2012 não contribuiria para reduzir a crescente criminalidade juvenil. Diante do convívio nas penitenciárias, a reintegração social será, e muito dificultada graças à falta de dignidade nesses estabelecimentos.

Diante disso, aprovar tal proposta seria o mesmo que desconsiderar um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988 corroborado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Pois, da mesma forma que este protege o menor, também oferece instrumentos suficientes para inserir o menor em conflito com a lei em condições de educação social, protegendo também a sociedade desse adolescente e criança infrator.

Posto isso, verifica-se que a solução da criminalidade, não está na redução da maioridade penal e se deve haver um endurecimento da legislação, não deve ser na Constituição Federal de 1988, mas sim no Estatuto da Criança e do Adolescente, que por si só garante medidas socioeducativas suficientes para disciplinar à criança ao adolescente.

O Estado deve investir em Políticas Públicas para assegurar os direitos e garantias fundamentais dispostos tanto na Constituição de 1988 como no Estatuto da Criança e do Adolescente. Além de proporcionar à família desses jovens condições dignas de moradia e sobrevivência, com boa alimentação, saúde de qualidade, educação pública gratuita e pra todos, lazer e esporte. Dessa forma, contribuirá para a formação de jovens conscientes, prudentes e preocupados com o seu futuro, bem como com o futuro de sua família e comunidade na qual se inserem, pugnando por um país cada vez mais justo, solidário e democrático.

É notório que a referida propositura de emenda não provocou alterações no cenário brasileiro. Não há diminuição da criminalidade ou marginalidade por parte de adolescentes e crianças. O que se tem são índices cada vez mais crescentes do envolvimento de menores em organizações criminosas ou de sua atuação em eventos de intensa crueldade de violência. Não há reflexos de impactos ou de influências no comportamento dos menores delinquentes, face à Proposta de Emenda Constitucional nº 33/2012.

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