O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: AS MEDIDAS SÓCIOEDUCATIVAS E O PORQUÊ DO ABISMO ENTRE A LEI E A REALIDADE.

 

JOSÉ RIBAMAR BEZERRA JÚNIOR[1]

  ANA PAULA MARIA ARAÚJO GOMES[2]

 

RESUMO:

O Estatuto da Criança e do Adolescente, além de prever a proteção integral, responsabilizou o adolescente pelos seus atos considerados infracionais, através de aplicações das medidas socioeducativas. A principal finalidade das medidas é a reeducação e a ressocialização do jovem infrator, para que ele possa formar uma opinião critica sobre o ato que cometeu e não voltar a praticar tais atos. Entretanto o que ocorre na prática é que o os adolescentes recebem essas medidas e logo após o cumprimento, cometem outro ato infracional, não se conscientizando da gravidade do ato realizado anteriormente. Criando um abismo entre o que está previsto na lei com sua prática na realidade.

PALAVRAS CHAVE: Criança, Adolescente, Ato Infracional, As Medidas Sócioeducativas, Ressocialização.

INTRODUÇÃO:

A doutrina de proteção integral, previsto no Art. 227, da Constituição Federal de 1988, reitera para o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, (lei 8.069/90), que todos os direitos da criança e adolescente devem ser reconhecidos, possibilitando o acesso irrestrito e privilegiado à Justiça, sendo um dever não só da família, mas também da sociedade e do Estado, principalmente pela condição que os adolescentes ostentam de pessoas em desenvolvimento e serem detentores de direitos.

 O Estatuto, além de estabelecer a proteção integral do infante, previu a responsabilização dos jovens que cometerem atos infracionais, através da aplicação de mediadas sócioeducativas. Essas medidas comportam aspectos tanto de natureza coercitivas, uma vez que são de caráter punitivo, bem como de natureza educativa, devendo ser aplicadas atividades pedagógicas durante sua aplicação. Tem como principal finalidade a reeducação e a ressocialização do adolescente para que ele possa viver em sociedade.

Na prática, em virtude da experiência na atividade de Segurança Pública, verificamos que durante as aplicações de tais medidas, não são executadas com o caráter pedagógico previsto no ECA, mas meramente a de caráter punitivo, haja vista que a reeducação e a ressocialização do que cometeu o ato infracional não tem sido alcançadas, estando distante do real objetivo para que foram criadas. Já que o os adolescentes recebem essas medidas e logo após o cumprimento, cometem outro ato infracional, não se conscientizando da gravidade do ato realizado anteriormente.

Atualmente, o Centro Educacional São Miguel, localizado no bairro Jardim União na cidade de Fortaleza, destinava-se ao cumprimento de medidas sócioeducativas de internação apenas de caráter definitivo. Hoje, somente recebe adolescentes de caráter provisório. Esses jovens ficam na verdade presos de maneira que não se constata uma evolução em sua capacidade de reinserção na sociedade, além de não receberem práticas educacionais ou a profissionalização. Aliais a maioria dos adolescentes que passam por esse centro, ao saírem, estão mais experientes e voltam a realizar novos atos infracionais.

O objetivo do ECA, em sua origem era de conferir as medidas sócioeducativa suma caráter pedagógico-protetivo. Entretanto, não é o que ocorre na prática uma vez que o Brasil não possui estrutura suficiente para isso. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância-UNICEF, o Brasil tem uma normatização de referência internacional voltada para a proteção infanto-juvenil e não consegue a efetivação de sua aplicabilidade.[3]

Com essa realidade estrutural dos Centros Educacionais, podemos observar segundo levantamentos feitos pela Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP, órgão vinculado ao Ministério da Justiça, que nos últimos anos houve uma crescente onda de violência em nosso País. E o que tem contribuído para esses elevados índices de criminalidades são as práticas de atos infracionais cometidos por crianças e adolescentes, a cada dia ingressando no muito do crime mais novos por vários fatores sociais, morais e psicológicos.

Diariamente somos surpreendidos com notícias de jornais de grande circulação nacional, relatando casos e mais casos de crianças e adolescentes praticando atos infracionais cada vez mais cruéis. Não é muito diferente da realidade nacional com o que o município de Quixadá vivencia nos últimos anos, há uma progressão de indicies de criminalidade disparar por conta da violência infanto-juvenil.

Finalmente esse artigo, além de questionar o abismo existente entre a lei e a realidade das aplicações das medidas sócioeducativas, propaga que é melhor a prevenção dos menores do que a punição, pois somente dessa forma veremos um resultado positivo.

UM TRILHAR HISTÓRICO ACERCA DA PUNIBILIDADE DO ADOLESCENTE

A legislação de proteção relativa à criança e o adolescente será exposta de acordo com a problemática que o menor sofreu até a implantação da lei 8.069 de 13 de julho de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

No primeiro momento, o jovem brasileiro não tinha uma ampla proteção jurídica, pois os seus interesses confundiam-se como os dos seus pais, o objetivo principal era disciplinar as prerrogativas dos genitores para com seus filhos. Com o passar do tempo foram criadas alguns legislações de proteção juvenil.

O Código Imperial de 1830, sendo o primeiro código criminal brasileiro, previa ao menor de 14 anos a esponsabilidade penal podendo, se estender aos menores de 14 anos contanto que o agente agisse com discernimento, não reconhecendo o aspecto social da questão.

Isto significa que a teoria do discernimento[4]continuava dominando, sendo usada pelo juiz, para apenar ou não o menor de 14 anos. Não havia, portanto, uma presunção júris et de jure de irresponsabilidade do menor, muito menos medida de proteção e assistência.

Dando um salto na evolução da legislação de proteção ao menor o Código de Menores, conhecido como Código Mello de Matos, foi o primeiro código a usar o termo: Menor e consolidou as leis de assistência e proteção aos menores abandonados ou delinqüentes com idade inferior a 18 anos.

Sobre o assunto o Roberto da Silva compreende:

O código de 1927, que consolidou toda a legislação sobre crianças até então emanada por Portugal, pelo Império e pela República, consagrou um sistema dual no atendimento à criança, atuando especificadamente sobre os chamados efeitos da ausência, que atribui ao estado a tutela sobre o órfão, abandonado e os pais presumidos como ausentes, tornando disponível os seus direitos de pátrio poder. Os chamados direitos civis, entendidos como os direitos pertinentes à criança inserida em uma família padrão, em moldes socialmente aceitáveis, continuou merecendo a proteção do Código Civil Brasileiro, sem alterações substanciais.[5]

Desta forma o Código de Menores elencava em seus capítulos as medidas aplicáveis aos menores abandonados e aos menores delinqüentes. Quanto a este ultimo o código em seu capítulo VII conceituava-os como sendo aqueles que tendo menor de 18 anos praticassem atos definidos como infrações penais.

O Código Mello Matos, trouxe varias inovações em relação as legislação anteriores. Estabeleceu que todos os menores que se enquadrassem na categoria de abandonados, vadios, mendigos ou libertinos, ficam sobre proteção estatal, tratando-se dos casos de inibição ou remoção do pátrio poder, se fossem descumpridas quaisquer das obrigações estipuladas aos pais pelo Código Civil. Além de estabelecer que os processos de internação bem como o processo de destituição do pátrio poder seriam gratuitos e deveriam correr em segredo de Justiça.

A transição entre o Código de 1927 e o Código de 1979 o chamado Código de Menores, efetivou-se com a criação da fundação nacional do bem-estar do menor. Que contava com equipes de técnicos em diversas áreas, que eram responsáveis pela reformulação dos valores éticos e sociais dos menores.

O novo Código aumentou os poderes dos juízes dos menores, como postulava o artigo 8° que lecionava que a autoridade judiciária, além das medidas especiais previstas na lei, poderia através de portarias ou provimentos, determinar outras medidas de ordem geral, que ao seu arbítrio, demonstrassem ser necessárias à assistência e vigilância ao menor. Respondendo o magistrado por qualquer ato de abuso ou desvio de poder.

O foco do Código de Menores era correcional repressivo, um modelo assistencialista, segundo Tarcísio Martins Costa (1994, p.135):

[...] o assistencialismo dirige-se à criança e ao jovem perguntando pelo que ele não é, pelo que ele não sabe, pelo que ele não tem, pelo que ele não é capaz. Daí que, comparado ao menino de classe media, tomando como padrão de normalidade, o menor marginalizado passa a ser visto como carente bio-psico-sócio-cultural, ou seja, um feixe de carência.

Ergido sobre visão, o atendimento pautou-se pela tentativa de restituir à criança e ao jovem tudo o que lhe havia sido sonegado no âmbito das relações sociais. Isso levou a adoção dos centros de triagem, nas capitais, e das redes oficiais de internatos, no interior como modelo básico de atendimento público ao menor em todo país.

Assim, podemos observar que tal legislação não se preocupava com as crianças e adolescente do país, mas apenas aqueles que se encontrava em situação irregular, situações essas previstas no artigo 2° do referido Código em estudo:

Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor:

- privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de:

a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;

b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;

Il - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável;

III - em perigo moral, devido a:

a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes;

b) exploração em atividade contrária aos bons costumes;

IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável;

- Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;

VI - autor de infração penal.

Podemos verificar que a lei era muito autoritária e centralizada, e o tratamento dado ao jovem infrator pouco divergia das legislações anteriores, mesmo com inovações como a inimputabilidade penal aos 18 anos, mas a lei autorizava o juiz o confinamento desse jovem em centros de reeducação, se julgasse necessários.

Em seguida, como resultado do processo de redemocratização, promulga-se a tão sonhada Constituição Cidadã de 1988, com significativos avanços. Nesse contexto privilegiado surge o Estatuto da Criança e do Adolescente e inicia-se o reordenamento institucional, com a criação da Fundação Centro Brasileiro para a Infância e a Adolescência, em substituição à Funabem, mas com a tarefa peculiar e transitória de fomentar a organização nacional, estadual e municipal dos Conselhos de Direitos e dos Conselhos Tutelares.

A promulgação da Constituição da República, em 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA, em 1990, marcam o início de uma nova fase, que pode ser chamada de desinstitucionalizadora, caracterizada pela implementação de uma nova política que rompe com paradigmas anteriores de atenção à criança desamparada. Esta nova fase persiste até os dias atuais.

A Constituição Federal dispõe acerca das políticas sociais como instrumentos de garantia dos direitos sociais, que por sua vez integram o rol dos direitos e garantias fundamentais. Em seu artigo 227 trata dos deveres da família, da sociedade e do Estado assegurando com prioridade absoluta, os direitos das crianças e dos adolescentes.

A Constituição, em seu artigo 227, dispõe que:

Artigo CF/88. é dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Tal dispositivo reconhece o principio da proteção integral, fixando criança como ser principal, ou seja, com prioridade absoluta, ampliando o dever de protegê-la à família, à sociedade e o Estado.

Essa teoria da proteção integral originou-se dos seguintes documentos: a) Convenção das Nações Unidas Sobre os Direitos da Criança; b) regras Mínimas das Nações Unidas Para Administração da Justiça da Infância e da Juventude (regra de Beijing); c) regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade; e d) diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil (diretrizes de Riad).

Segundo Wilson Donizeti Liberati (2003, p. 113):

Antes do Estatuto, as medidas aplicadas aos menores infratores visavam, sobretudo, sua proteção, tratamento e cura, como se eles fossem portadores de uma patologia social que tornava insustentável sua presença no convívio social. O pior disso é que esses menores não eram considerados sujeitos de direitos, mas objetos de atividades policiais e das políticas sociais.

O fundamento dessa proteção integral é a idéia de que os menores, frente à família, ao Estado e à sociedade, são sujeitos de direitos. Esgota a idéia de que crianças e adolescentes sejam meros objetos da sociedade, os inserido como pessoas que possuem direitos, como todos os sujeitos, bem como desfrutar de tratamentos especiais, consequências da situação que possuem de pessoas em desenvolvimento.

Após, a doutrina de proteção integral adotada pela Constituição, surgiu à necessidade de se criar uma legislação infraconstitucional voltada exclusivamente para à criança e ao adolescente, assim em 13 de julho de 1990, foi criada a lei n° 8.069, conhecida com Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.

O ECA sistematiza, uma linha de defesa de direitos através da instituição de medidas de proteção (artigos 98 a 102), a explicitação do devido processo legal para apuração de atos infracionais praticados por adolescentes (artigos 103 a 128) e a instituição de um elenco de medidas jurídicas, administrativas e judiciais, de proteção desses direitos (artigos 129-1130 e 208 a 258).

Veronese (1996) destaca o caráter inovador do ECA na parte referente ao acesso à justiça, que é a proteção judicial dos interesses individuais, difusos e coletivos referentes às crianças e adolescentes. É o que garante, ao menos formalmente, o acesso à educação e aos serviços de saúde, por exemplo, a grande parte da população infantil e, também, aos adolescentes privados de liberdade.  

A responsabilidade da família e da comunidade em garantir os direitos das crianças aparece, de forma declarativa, na parte geral e, de forma prescritiva, na parte especial, quando se normatizam as medidas pertinentes aos pais ou responsáveis e os crimes e infrações administrativas. Diante do contexto histórico de uma não proteção para uma proteção integral do jovem, Passaremos a analisar as medidas socioeducativas bem com os atos infracionais e o porquê do abismo entre a lei e a realidade.

 O ADOLESCENTE E A PRÁTICA DE ATO INFRACIONAL

Os atos infracionais cometidos pelas crianças e adolescente, geralmente ocorrem por conta do meio social em que vivem. Isso se explica não só pelas dificuldades de subsistência econômica, mas também por falha do Estado nos investimentos de política social básica, ou seja, em saúde, educação, assistência social e outros. Algumas vezes por serem carentes de afetos sentindo-se abandonados pelos pais, voltar-se-ão para o mundo do crime.

Segundo ensina Luiz Ângelo Dourado (1969, p.114):

Quando se estabelece firme e duradouro laço entre os pais, o desenvolvimento psicológico do filho se efetuará bem, seu superego será normal e criança tornar-se-á um individuo normal e socialmente independente. Mas, se os pais, principalmente as mães se satisfazerem em permanecerem como personagens alheios e impessoais ou agem de forma que seja impossível uma inclinação perante filhos e pais, a educação dos filhos será um fracasso, o desenvolvimento do caráter far-se-á mal, a adaptação social poderá ser superficial e o futuro da criança correrá o risco de ficar exposto a todos os perigos possíveis de um desenvolvimento anti-social.

Desta forma, não é necessário somente ter os pais em casa, é necessário que os pais dêem carinho, amor, ou seja, exista uma vinculo de afeto, pois se não existe isso na infância, poderá refletir no desenvolvimento da personalidade desse jovem, facilitando num momento oportuno a entrada dele no mundo do crime. A disciplina muito rigorosa, como exemplo, pode se analisada como falta de carinho e amor, gerando uma revolta no jovem contra regras impostas pela sociedade.

Contudo, não podemos afirmar que somente os adolescentes de classes sociais mais baixas, de um grupo marginalizado, cometem atos infracionais, pois nem todos cometem tais atos, existem aqueles adolescentes que sempre viveram em condições de vida privilegiada que praticam atos infracionais. Tais atos não se justificam por falta de oportunidade, nem discriminação social, mas por fatores morais e psicológicos. Assim esclarece Mariana Custódio de Souza (2003, p.46):

Logicamente, não se pode vincular a delinqüência ao fator de pobreza exclusivamente, de outra maneira, é necessário retira esse “rotulo” de criminoso em decorrência de sua condição social, porem não podemos “fechar os olhos” ao fato de que para alguns indivíduos as condições reais de vida se apresentam tão difíceis e insuperáveis pelosmeios legais e legitimo, ao seu ponto de vista, que acabam por impulsionar à pratica de condutas delituosas (especialmente tratando-se de adolescente).

Então, não se pode generalizar, dizendo que a delinquência advém somente de fatores econômico-social, ou vem somente do fator psicológico, pois todos esses fatores contribuem para que o jovem cometa algum ato infracional.

Segundo Jeferson Moreira de Carvalho (1997,p.9), [...] considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção. Desta forma, o ato infracional é a ação praticada por uma criança ou adolescente, correspondente as ações definidas como crimes ou contravenções cometidas pelos adultos, tendo sua previsão legal no artigo 103 do Estatuto em estudo.

Com isso, é necessário definir o que seria criança e o que seria adolescente. Essa definição encontra-se no artigo 2° da lei n° 8.069/90 - ECA, que leciona: Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescentes aqueles entre doze e dezoito anos de idade.

Observamos que para o artigo em estudo, criança é a pessoa que tem até 12 anos e o adolescente é a pessoa que tem entre 12 e 18 anos. Diante de tal distinção podemos especificar quais medidas devem ser aplicadas. Para as crianças as medidas são as de proteção e para os adolescentes as medidas são tanto as de proteção quanto as socioeducativas.

Leciona, o artigo 101 do ECA:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;

V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII - acolhimento institucional;

VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX - colocação em família substituta.

Desta forma, fica evidente que o legislador infraconstitucional preocupou-se tanto com a criança quanto a sua família, pois se a criança cometeu um ato infracional, é porque sua base familiar não conseguiu sustentar esse menor dentro da sociedade. Já os adolescentes que praticam, poderão receber as medidas sócio educativas previstas no artigo 112 do ECA.

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

De acordo com Olympio Sotto Maior (2002,p.362), “trata-se de um rol taxativo sendo, portanto, vedada a imposição de medidas diversas das enunciadas”.

O Estatuto, além de estabelecer a proteção integral do infante, previu a responsabilização dos jovens que cometerem atos infracionais, através da aplicação de mediadas socioeducativas. Essas medidas comportam aspectos tanto de natureza coercitivas, uma vez que são de caráter punitivo, bem como de natureza educativa, devendo ser aplicadas atividades pedagógicas durante sua aplicação. Tem como principal finalidade a reeducação e a ressocialização do adolescente para que ele possa viver em sociedade.

Segundo Konzen (2005) apud Maciel (2006, p.805):

Além do caráter pedagógico, que visa à reintegração do jovem em conflito com a lei na vida social, as medidas socioeducativas possuem outro, o sancionatório, em resposta à sociedade pela lesão decorrente da conduta típica praticada. Destarte, fica evidente a sua natureza híbrida.

As medidas socioeducativas visam, principalmente, à inserção do adolescente na família e na sociedade, além da prevenção da delinquência. Só que na prática, em virtude da experiência na atividade de segurança pública, verificamos que durante as aplicações de tais medidas, não são executadas com o caráter pedagógico previsto no ECA, mas meramente a de caráter punitivo, haja vista que a reeducação e a ressocialização do que cometeu o ato infracional não tem sido alcançadas, estando distante do real objetivo para que foram criadas. Já que o os adolescentes recebem essas medidas e logo após o cumprimento, cometem outro ato infracional, não se conscientizando da gravidade do ato realizado anteriormente.

A EFICÁCIA DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS EM RELAÇÃO AO ADOLESCENTE INFRATOR

Quando o assunto é eficácia das medidas socioeducativas, há de admitir que o tema seja controverso, pois, algumas pessoas entendem que tais medidas têm o caráter de reeducar e ressocializar o adolescente infrator, outros afirmam que o Estatuto elencou, no art. 112, medida privativa e restritiva de liberdade fazendo com que ganhem natureza sancionatória, como uma forma de oferecer uma resposta para a sociedade.

 Essa segunda compreensão é equivocada, pois a intenção da ECA, em sua origem, era a de proporcionar às medidas sócioeducativas um caráter pedagógico-protetivo. Se tais medidas forem cumpridas na prática sendo aplicadas a cada caso concreto, elas serão eficazes. Desta forma, observamos que se as medidas sócioeducativas em seu caráter pedagógico forem aplicadas de forma tal qual se encontram no Estatuto da Criança e do Adolescente teriam resultados eficazes, e em casos que não são aplicadas de forma correta não obteriam a sua eficácia desejada.

Só atingiriam sua eficácia na prática, na medida em que, os órgãos públicos forneçam a estrutura necessária para o cumprimento do que se encontra escrito na lei n° 8.069/90. Dessa forma leciona Mauricio Neves de Jesus (2006, p.77):

O tratamento a ser dispensado ao adolescente em conflito com a lei penal, com a mudança de paradigma pretendida pelo Estatuto, depende do que se chamou de salto triplo, ou seja, mudar a lei, criar uma estrutura que permita a sua efetivação e capacitar os agentes responsáveis por aplicá-la e executá-la. Pouca valia tem um texto legal limitando ao seu arcabouço teórico e é assim que se encontra o Estatuto em relação à aplicação das medidas sócio educativas, com raras e pontuais exceções.

Com isso podemos observar que a lei avançou muito teoricamente mais na sua aplicação prática ainda carece de ajustes na parte estrutural de acolhimento desses jovens infratores e a equipe de profissionais capacitados para trabalhar com esse público, assim como toda lei o ECA, não traz consigo um dispositivo que regulamente sua eficácia.

As medidas socioeducativas estão divididas de uma maneira didática como as medidas em meio fechado, como a internação e a semiliberdade, que importam em privação de liberdade do jovem infrator, tendo como princípios basilares a brevidade e excepcionalidade, previsto no art. 121 do Estatuto, respeitado sempre a condição que esse jovem tem de pessoa que ainda está em desenvolvimento. Esses princípios decorrem de expressa disposição constitucional que os contempla no inciso V do parágrafo terceiro do art. 227 da Constituição Federal.

Sendo as medida em meio aberto quatro: Advertência, Obrigação de Reparação de Dano, Prestação de Serviços à Comunidade e Liberdade Assistida. Pelo seu próprio caráter de duração bem como do vínculo entre os jovens e a instituições executoras, o psicólogos e os assistentes sociais atuam principalmente nestas duas modalidades, conforme, previsão no art.112 do ECA.

Tendo como princípios basilares os da capacidade física e psíquica do adolescente para o cumprimento da medida, a circunstância e a gravidade da infração, a vedação do trabalho forçado, o atendimento as necessidades pedagógicas do jovem. Há a preferência da aplicação das medidas que visam o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, tendo inclusive a possibilidade de aplicação isolada ou cumulativa dessas medidas, ou a substituição a qualquer tempo por outra que sejam compatíveis a uma melhor alteração do comportamento delitivo desse jovem infrator, conforme disposto no art. 227§ 3 inciso V da Constituição Federal: “obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade”.

    Através da minha experiência profissional, na área de Segurança Pública, observamos na aplicação das medidas socioeducativas de Privação da Liberdade, a sua pouca eficácia, pois exclui o adolescente do convívio familiar e social, restando para este o contato com as regras das instituições que não cumprem com seu papel de reeducação e ressocialização.

Segundo essa premissa o regime que deveria ser positivo na recuperação do adolescente pode vir a causar influências desastrosas em seus internos. Visto que em diversos casos, o adolescente que tem privado sua liberdade ao ter sua liberdade resgatada, poderá cometer outros atos infracionais, utilizando-se dos métodos que aprendeu no regime de internação. Assim esclarece Mauricio Neves de Jesus (2006, p. 82):

O Estatuto é o reconhecimento de que a política criminal dedicada aos menores abandonados e infratores foi um fracasso, pois causou as suas mortes ou os transformou em adultos excluídos e delinquentes.

Dessa forma, a eficácia das medidas está ligada a um atendimento completo que promova, além de escolarização, profissionalização e atendimento médico especializado, uma mobilização de todo o Estado e da sociedade no auxílio e monitoramento dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas.

As medidas de Prestação de Serviços à Comunidade e a Liberdade Assistida dentro de uma estrutura com uma equipe de profissionais multidisciplinares possibilitam melhoras do perfil do adolescente infrator, visto que, além de proporcionar oportunidades de ressocialização, já que continuam em contato com a sociedade, ainda permitem que o adolescente reflita sobre os atos praticados.

O adolescente sente-se necessário quando presta serviço à comunidade, além de ser uma medida que atende a todos os objetivos propostos - quais sejam, ressocialização e inserção em ambiente profissional - ainda possibilita que o infrator continue em constante contato com a sua família e com a sociedade. Assim ensina Roberto Bergalli (2000,p.385):

A submissão de um adolescente a prestação de serviços à comunidade tem um sentido altamente educativo, particularmente orientando a obrigar o adolescente a tomar consciência dos valores que supõem a solidariedade social praticada em seus níveis mais expressivos.

Na prática, podemos verificar que o sistema de aplicações atual das medidas sócioeducativas esbarra na vontade política em se cumprir o disposto na Lei, e as medidas chamadas intermediárias surtem relativo efeito positivo devido aos esforços do Ministério Público e de Juízes, que conseguem moldar a letra legal de acordo com a situação do infrator confrontada no meio social em que vive. No entanto, quando se refere à medida privativa de liberdade, nota-se não possuir a estrutura material, anteriormente. 

CONCLUSÃO

Assim podemos concluir nosso presente trabalho, tomando por base na minha vivencia profissional com agente de Segurança Pública, bem como nas pesquisas realizadas sobre o tema em estudo por diversos autores consultados, que os motivos que levam o adolescente a cometer atos infracionais resultam dos problemas econômicos, sociais e culturas desse jovem, bem como pela influencia de amigo que já cometeram algum ato infracional, pela falta de escolaridade e o uso de drogas.

Uma vez apreendidos eles serão responsabilizados pelos seus atos através das medidas sócioeducativas, tais medidas comportam aspectos de natureza educativa, no sentido da proteção integral, com oportunidade de acesso a inclusão social. Só que na prática isso não ocorre, o que realmente vemos é uma exclusão total desse jovem, tornado-se a medida e caráter repressivo.

Nessa premissa, as medidas estabelecidas pelo ECA, tornam-se ineficazes, na reeducação e na ressocialização de crianças e adolescente, pois o Estado não tem estrutura e nem profissionais treinados nas diversas áreas de estudo para trabalharem com esse público alvo. Na realidade existem instituições superlotadas e sem profissionais capacitados para o real cumprimento das medidas.

Outro grande desafio seria a universalização dos programas e ações de cultura e lazer na integração com as demais políticas, com direito que deve ser assegurado no processo de desenvolvimento de toda criança e adolescente. Tais programas devem primar pelo atendimento individualizado, aproximando-se mais do convívio familiar desse jovem infrator. Sendo ainda necessária a integração operacional dos órgãos do Poder Judiciário, Segurança Pública com a Assistência Social.

Com essas ações poderíamos efetivar a natureza ressocializadora das medidas sócio educativas do Estatuto, diminuindo o abismo existente entre no que esta prevista na lei n°8.069/90 e na prática.

 

REFERÊNCIAS

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[1] Policial Militar do Estado do Ceará, pertencente a 1°Cia do 3°BPCOM, Batalhão de Policiamento Comunitário e Acadêmico do 9° semestre do Curso de Direito da Faculdade Católica Rainha do Sertão.

[2] Especialista em Direito Público, pela Universidade Estadual Vale do Acaraú, Mestranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza, Professora do Curso de Direito da Faculdade Católica Rainha do Sertão.

[3]Noticia fornecida por Vermelho Portal: Evento Discutirá Conquistas e desafios nos 20 anos do ECA. 12 de julho/2010, Disponível em: <http://www.vermelhoportal.org.br/noticia/133107-8> Acesso em: 29 de Março/2015.

[4]A teoria do discernimento estabelecia que os menores de 14 anos que tivessem agido com discernimento, seriam recolhidos a Casa de Correção pelo tempo que o juiz julgasse necessário, não podendo passar da idade de 17 anos. E entre 14 e 17 anosos menores estariam sujeitos às penas de cumprimento equivalente a 2/3 do que cabia ao adulto, e os maiores de 17 anos e menores de 21 anos gozariam da atenuante de menoridade. WEBARTIGOS. Menor infrator: (in) eficácia na reinserção social através das mediadas sócio – educativas, disponível em: HTTP://www.webartigos.com/artigos/48484/, acesso em: 14 de maio/2015.

[5]SILVA, Roberto da. A Construção do Estatuto da Criança e do Adolescente. In: âmbito jurídico, agosto/2001, disponível em:<http://www.ambitojuridico.com.br/aj/eca0008.htm>. acesso em: 3 maio/2015.