Sumário

 

1. Introdução; 2. Alguns Factos; 3. Cultura da Prudência e da Responsabilidade; 4. Pessoas-de-bem para Instituições-de-bem; 5. O Estado: Garante da Igualdade e Felicidade do Povo; 6. Síntese; Bibliografia

 

1. Introdução

 

A sociedade organizada e civilizada, estruturada por estratos sociais, com várias designações: ordens, classes, castas ou quaisquer outras, vem funcionando a partir do indivíduo, isoladamente considerado, para se desenvolver através da família, dos grupos, comunidades, instituições, estas de diferente natureza e com objetivos diversos.

Na cúpula do sistema social existe o Poder, materializado numa figura jurídico-política, denominada por Estado, que não é uma instituição abstrata, (tradicionalmente considerado uma figura sem rosto) porque tem personalidade jurídica e está concretizado e funciona organizado por diversos Departamentos oficiais, dirigidos e sob a responsabilidade de cidadãos eleitos e/ou nomeados legal e formalmente, por quem tem competência para o fazer.

E se numa concepção clássica se pode definir o Estado como sendo um grupo de cidadãos (povo), localizados geograficamente num determinado espaço (território), delimitado por fronteiras, internacionalmente reconhecidas, cujo povo comunga de uma cultura, história e língua comuns e tem objetivos e desígnios coletivos, que toda a população defende, então o Estado é constituído por todos aqueles elementos, os quais não têm quaisquer responsabilidades perante o cidadão e a instituição, particularmente considerados.

O Estado abstrato, assim entendido, nem sempre defende os interesses, não promovo a justiça, não distribui equitativamente as riquezas nacionais e não pode exigir dos cidadãos e das instituições particulares, isto é, da sociedade civil, o cumprimento de determinadas obrigações. Importa, então, analisar o Estado concreto, objetivo, identificável.

Importa, portanto, pelo contrário, considerar e aceitar o Estado nos seus constituintes materiais: humanos, jurídicos e políticos, identificados nos diferentes e especializados Departamentos, com uma nomenclatura própria: Ministério da Justiça; Secretaria de Estado das Finanças; Direcção Geral da Educação; Administração Regional de Saúde, Câmara Municipal, Junta de Freguesia e tantas outras designações.

Tais Organismos são dirigidos por pessoas, presumível e desejavelmente, responsáveis, competentes, justas, compreensivas e tolerantes. É o Estado personalizado, com rosto, humanizado, identificado, exercendo funções bem definidas, de acordo com as competências legais atribuídas ao respectivo titular do cargo, titular este que deveria ser escolhido pelo povo, desde o secretário de estado ao ministro, no mínimo, porque assim evitava-se o voto no desconhecido.

Este Estado, na sua configuração política, é detentor de poderes, praticamente ilimitados e distribuídos, pelo que constitucional e tradicionalmente se convencionou designar, por Órgãos de Soberania: Poder Legislativo; Poder Executivo; Poder Judicial, além de outros, como a Presidência da República. Estes Poderes são desempenhados por cidadãos com rosto, responsáveis e responsabilizáveis, tal como o cidadão comum que, quando não cumpre os seus deveres é punido, mesmo que tendo infringido a Lei involuntariamente e/ou por ignorância.

2. Alguns Factos

 

A problemática que se pretende analisar é tremendamente simples, tão simples que a grande maioria dos cidadãos, quando em confronto com o Estado, quase sempre perde a questão que deu origem à divergência, porque o próprio Estado se escuda na Lei que ele mesmo elabora, aprova, fiscaliza, executa e sanciona, sempre que pode, a seu favor, invocando o argumento que o protege a ele mesmo e culpabiliza o cidadão, sob a forma do princípio jurídico-legal, segundo o qual: “A ignorância da Lei não aproveita ao seu infrator”, logo, “todos devem conhecer a Lei”. O Estado raramente utiliza processos pedagogicamente fiscalizadores e corretores de situações anómalas, preferindo, na maior parte dos casos, a intervenção repressiva e punitiva.

Mas o Estado tem o rosto dos respectivos dirigentes que, antes e depois das correspondentes funções, transitoriamente desempenhadas, justamente à custa da confiança que o cidadão-eleitor neles depositaram, seja no grupo político, seja diretamente no próprio governante.

No exercício das funções que lhes foram cometidas, tais cidadãos, agora investidos de poderes especiais, devem ser os primeiros a cumprir a Lei, com equidade, com tolerância, compreensão e pedagogia preventiva, sem estratégias e processos persecutórios, sem espírito punitivo e, quantas vezes, injusto.

Os titulares de cargos públicos por eleição, são os legítimos representantes do povo e em Democracia Representativa o valor Justiça deveria funcionar sempre nos dois sentidos, tal como o valor igualdade de tratamento, de tolerância e da responsabilidade recíproca.

O Estado representativo, em Democracia e num regime jurídico justo, deve cumprir tal como exige ao cidadão comum, quando este se prontifica a obedecer à Lei, depois de chamado à atenção, inclusivamente, com efeitos retroativos, se isso for legal, então, de igual forma, o Estado através do Departamento competente que ao caso couber, deve cumprir, também ele, retroativamente, tudo o que for devido ao cidadão.

Instituir taxas, impostos, derramas e outros instrumentos de cobrança, por serviços prestados, estabelecer normas fiscais sobre atividades, rendimentos e penalizações, entre outras tarefas, são funções que o Estado de Direito Democrático tem competência, legitimidade e legalidade para exercer e que deve fazê-lo com equidade e oportunidade, dentro dos prazos e respectivas tolerâncias.

O Estado deve dispor de receitas suficientes que lhe permitam desenvolver os programas sociais, económicos, educativos, saúde, acessibilidades, transportes e tantos outros domínios sociais. O Estado, através dos respetivos titulares dos diversos Departamentos, deve ser o exemplo da sobriedade, do rigor, da austeridade, isto é, o paradigma da boa e justa governação.

A aplicação da Lei pelos Órgãos competentes do Estado deve ser igual para todos, e quando o Estado legisla, em favor de um determinado grupo económico, desportivo, cultural ou outro, ignorando o cidadão anónimo que, quantas vezes, tem mais dificuldades em pagar os seus impostos do que um grupo empresarial ou instituição desportiva, está a discriminar, pela negativa, o cidadão, individualmente considerado, o que não é justo.

Num estado de Direito Democrático, a dimensão cívica dos cidadãos deve ser garantida e salvaguardada pelo exercício pleno da cidadania que, obviamente, se deseja ser igual para todos, inclusivamente para a participação fiscal de cada indivíduo ou grupo, porque: «Na prática, o direito de participação pressupõe a reunião de quatro condições: a autonomia da vontade, a nacionalidade, o domicílio, o pagamento de impostos» (MADEC & MURARD, 1998:91).

O Estado de Direito Democrático, enquanto entidade concreta, física e responsavelmente representada nos seus inúmeros Departamentos, orientados e servidos por pessoas concretas, também elas cidadãos de direitos e deveres, tem a obrigação indeclinável de dar exemplos de compreensão, tolerância, resolução justa, equitativa e isenta das situações que indivíduos, empresas, grupos e associações lhe apresentam, deve legislar objetivamente, sem lacunas, por vezes, deixadas nos textos jurídico-legais, sem ambiguidades, porque de contrário a segurança do Direito é posta em causa e, rapidamente, descredibilizada.

A interpretação da norma jurídica parece que está cada vez mais na dependência do parecer deste ou daquele grupo de advogados, juristas, magistrados e constitucionalistas, sendo certo que na decisão final, muitas vezes, sempre acaba por prevalecer a interpretação do Estado, através dos seus próprios Tribunais: Judiciais, de Circulo, Supremo, Arbitrais, de Polícia, de Família, Administrativos, Constitucional.

Além disso, na defesa dos seus legítimos interesses, o cidadão de menores recursos nem sempre tem acesso a uma defesa consistente, empenhada e detentora de boas técnicas, estratégias, metodologias, experiências adquiridas ao longo de uma carreira, porque não pode pagar, por exemplo, a prestigiados causídicos e/ou grupos/associações de advogados que, em muitas situações, funcionam como autênticas empresas da interpretação do Direito, no sentido de construírem a melhor defesa para o constituinte, incluindo a estratégia de esgotar todos os prazos, até atingir a prescrição do ato que esteve na origem do processo. É evidente que tudo isto custa muito dinheiro e o pobre não o tem.

O Estado quando legisla, em parte, já está a colaborar com todo um sistema assim instalado e, desta forma, prejudica o exercício da cidadania, no que se refere ao acesso a uma Justiça oportuna, célere e igualitária para todos, porque privilegia uma minoria de ricos em prejuízo da maioria pobre, pouco esclarecida quanto aos seus direitos e conhecimento da legislação (até neste aspecto o Estado é desleal para com o cidadão, porque através da Lei determina que a ignorância da norma jurídica não aproveita ao seu infrator, porém, os serviços do Estado, beneficiam de todos os meios para conhecer e aplicar a Lei, precisamente, também, à custa dos impostos daqueles que não a conhecem, porque não podem assinar e/ou não sabem consultar o Diário da República)

O paradigma do Estado de Direito Democrático deverá ser construído a partir de premissas transparentes, equitativas, isentas e adequadas às situações, circunstâncias e legítimos interesses de toda a comunidade, independentemente de posições económico-financeiras, de estatuto sócio-profissional ou de quaisquer estratégias e objetivos ditos de utilidade pública e/ou do alegado interesse nacional, que mais não servem do que para encobrir, muitas vezes, outros desígnios menos corretos.

 Frequentemente, o que se verifica um pouco por todo o mundo é que: enquanto o Estado apoia, favorece e legisla a favor de determinados grupos e estes ficam ao abrigo de benefícios e privilégios, que a maioria não tem, ainda vão permanecendo num determinado local, a produzir alguma coisa, todavia, cessando os benefícios e os privilégios e diminuindo os lucros, o grupo rapidamente se deslocaliza para outro ponto, começando tudo de novo, depois de enviar para o desemprego trabalhadores, famílias e outras pessoas dependentes e deixando ao Estado dívidas elevadíssimas que, no fundo, terão de ser suportadas pelos impostos dos contribuintes honestos.

O contrário da situação descrita, pode verificar-se em relação ao cidadão contribuinte, cumpridor, honesto, ou seja, este cidadão que, por ignorância da Lei não cumpriu um determinado preceito jurídico, por exemplo, a nível fiscal, imediatamente os Serviços competentes o intimidam e, com grande destreza, lhe hipotecam os parcos bens que, quantas vezes, conseguiu, quase no final de uma vida de sacrifícios, de poupança, de privações, empréstimos com juros elevados e outras dificuldades de vária ordem.

O cidadão anónimo, sem capacidade económica para contratar bons defensores, fica à mercê das decisões de outros seus concidadãos, que naquele momento detêm o poder de executar a Lei, retirando-lhe o património, ou parte dele, que mais tarde até seria para os filhos e netos, não havendo a possibilidade para este cidadão de beneficiar da prescrição, de uma amnistia, de um perdão, para anulação da dívida que, involuntariamente, porque desconhecia a Lei, lhe é imputada.

Outro tanto acontecerá com os grandes grupos, empresas e figuras públicas e portanto todos estes contribuintes são tratados de igual forma? Sob o argumento de um qualquer preceito legal, não haverá, por exemplo, perdões de dívidas fiscais, amnistias e outros instrumentos de anulação?

Outro facto que poderá revelar se o Estado é ou não “paradigma de pessoa-de-bem” prende-se com o relacionamento inter-instituições, integradas numa determinada hierarquia e que, supostamente, dependendo umas das outras, a colaboração institucional, e mesmo pessoal, entre os seus dirigentes e funcionários deverá pautar-se por normas legais, éticas e de boa convivência.

Em Portugal, as dificuldades podem começar logo ao nível do Poder Local, concretamente entre os dois tipos de poderes consagrados na Lei Fundamental: Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia, sabendo-se que a grande maioria destas dependem daquelas, em elevada percentagem da arrecadação de receitas e realização de melhoramentos, bem como nos domínios técnicos, de recursos humanos e equipamentos. Ao nível de formação profissional dos Autarcas também poderiam depender daquela instância do Poder Local.

A boa colaboração entre estes dois níveis do Poder Local é salutar, desejável e rentabilizadora na aplicação de recursos, por isso, a Lei prevê a celebração de protocolos que funcionam como uma delegação de poderes da Câmara Municipal para a Junta de Freguesia, em que esta responde perante o público, fornecedores e prestadores de serviços e também perante a entidade delegante.

Após haver acordo entre as partes, celebra-se o protocolo quanto ao: tipo de melhoramentos a realizar; seus montantes; prazos de reembolso das despesas efetuadas pela Junta de Freguesia, no cumprimento das competências delegadas e execução dos trabalhos.

Quando a entidade delegada, na circunstância, a Junta de Freguesia, tem alguma disponibilidade financeira, deve liquidar os serviços recebidos pelas entidades prestadoras, salários aos trabalhadores e outras despesas, honrando assim, em tempo útil, os compromissos assumidos para com terceiros e transmitindo a imagem de uma Instituição Pessoa-de-bem.

Seguidamente, envia a documentação para a entidade delegante, na circunstância, a Câmara Municipal e esta, dentro dos prazos definidos no Protocolo, liquida à Junta de Freguesia os valores protocolados e acordados entre as partes.

Trata-se de um procedimento legal que traz imensos benefícios para as entidades envolvidas e para as populações, maior celeridade nos pagamentos aos prestadores de serviços e dignificação das Instituições envolvidas e respectivos responsáveis que, tal como aquelas, tudo devem fazer para serem consideradas pessoas-de-bem.

A administração de uma freguesia em Portugal implica, hoje, graves responsabilidades que são acrescidas em função dos serviços técnicos que o respetivo órgão executivo – Junta Freguesia –, tem ao seu dispor. Na esmagadora maioria das freguesias portuguesas, os autarcas não têm o apoio técnico suficiente, em nenhum sector: administrativo, jurídico, obras públicas, empreitadas e concursos, segurança social, gestão de cemitérios, contabilidade, recursos humanos e outros. Estes autarcas ficam, assim, à mercê de qualquer indivíduo que procura a litigância, quase sempre, de má-fé.

Tal como os municípios, também as freguesias tem a sua história, a sua dignidade, a sua importância e imprescindibilidade na resolução dos problemas comunitários.

A freguesia nasceria, justamente, nos pequenos núcleos populacionais que se instalaram ao redor das igrejas, sob a orientação do pároco, de que resultaram as paróquias, cujas atividades no meio rural, para além da religiosa, passaram a abranger os domínios sociais e económicos que mais interessavam aos residentes (fregueses), com destaque para a administração de terras, águas, emissão de documentos diversos para, a partir de 1878, se lhes reconhecer e «conferir à freguesia o carácter de serviço público». (TRINDADE, 2003:12).

A dignidade da instituição Freguesia está constitucionalmente consagrada, e coloca-a ao mesmo nível do poder local dos municípios. A definição resulta clara da Constituição da República Portuguesa, donde se pode interpretar que a freguesia é uma pessoa coletiva territorial, dotada de órgãos representativos, que tem por objetivo a satisfação de interesses próprios da população residente na respectiva área de jurisdição da freguesia, sendo fundamentais os seguintes elementos: território, população, interesses próprios dos moradores e órgãos representativos. (Cf. CRP, 2004: Artº 235º e seg., Pp. 87-89).

E se por um lado, o Estado tem de construir e implementar o Paradigma de “Pessoa-de-bem”, a começar nas e entre as suas próprias instituições de base: as Autarquias Locais, criando laços de confiança e credibilidade, adotando uma postura pedagógica, atuando em tempo útil, sem discriminações, independentemente das ideologias político-partidárias dos diversos responsáveis;

Por outro lado e nas atuais circunstâncias, o exercício do poder local democrático, nas freguesias rurais e semi-urbanas carece de uma profunda revisão e estruturação. Nesse sentido o cidadão contemporâneo tem de participar no processo de atualização e ajustamento às realidades existentes, de forma a garantir dignidade, competência, eficácia, iguais direitos e tratamento para com todos os seus concidadãos, independentemente das suas opções político-partidárias.

Sendo assim e considerada a complexidade deste Órgão do Poder Local Democrático em Portugal, o cidadão que se deseja para este século tem, obrigatoriamente, de saber as tarefas que recaem sobre o órgão ao qual se candidata, bem como as competências que lhe estão cometidas e os recursos que dispõe para desenvolver um trabalho profícuo e de satisfação das necessidades da população. Antes de fazer promessas, deve inteirar-se da realidade.

No entanto, mesmo sendo conhecedor dos instrumentos legais que regem esta matéria, os meios para concretizar os objetivos têm que lhe ser fornecidos, em quantidade, em qualidade e em tempo útil. A não ser assim, não é justo nem legítimo que se lhe peçam responsabilidades.

3. Cultura da Prudência e da Responsabilidade

Os Órgãos do Estado constituem-se e funcionam a partir da existência de vários componentes: um corpo jurídico; infraestruturas físicas; recursos financeiros e técnicos; equipamentos atualizados; recursos humanos. Importa abordar nesta reflexão o papel do cidadão enquanto agente ou funcionário do Estado, colocado num determinado órgão, porque é com este elemento humano que todo e qualquer sistema (político, económico, religioso) funciona melhor ou pior, o que leva a inferir-se que quanto melhor preparado estiver este cidadão, melhor será a intervenção e imagem do Estado.

Tal cidadão tem de ser uma pessoa-de-bem e utilizar na vida pública os critérios de justiça, honradez e exigência, como os utiliza na sua vida privada, (obviamente, partindo do princípio que os usa), eventualmente e se possível, ainda com mais rigor quando, no serviço público, tem de se relacionar com outras instituições e inúmeras pessoas, individualmente consideradas. O paradigma de um Estado Pessoa-de-bem é possível sempre que ao seu serviço estejam pessoas singulares de bem.

A pessoa singular de bem, forma-se nos valores mais elementares da justiça, da ética e deontologia profissionais, da competência, da solidariedade, na circunstância de ser agente do Estado, solidariedade, individual e institucional, no respeito pelas caraterísticas de uma verdadeira cidadania, enquanto pessoa social, inserida numa sociedade que tem o dever de ajudar a melhorar em todas as suas vertentes.

Este agente, que também é um ser social, tem obrigações acrescidas em relação aos cidadãos anónimos, que não pertencem aos quadros de pessoal do Estado, por isso se pede àqueles, exemplos de boas-práticas, também como cidadão social porque: «O ser social manifesta-se igualmente no seu relacionamento com as outras instituições, com o Estado: fiscalidade, uso dos serviços públicos, de segurança social, comportamentos em relação à Lei, à polícia, ao ambiente natural. O ser social exprime-se ainda, e talvez de um modo mais revelador, na vida de todos os dias, no espaço público, na rua, na escola, no trabalho, em férias.» (MADEC & MURARD, 1995: 86).

E se ao nível do funcionário público, sem funções de chefia, é exigível que se lhe peça responsabilidades no âmbito das suas funções e que para as exercer bem, se lhe deve dar a formação adequada, frequente e ao longo da sua carreira, muito mais se exige àqueles que exercem funções de chefia, resultante da progressão numa determinada carreira profissional no Estado, os quais têm a obrigação de dominarem e aplicarem corretamente todos os conhecimentos e competências adquiridos, afinal, na esmagadora maioria dos casos, à conta dos cidadãos que contribuem com os seus impostos para o funcionamento do sistema.

No topo desta pirâmide hierárquico-funcional estará o dirigente político, o decisor eleito, ao qual se impõe regras de conduta ético-políticas, acima de qualquer outro agente/funcionário do Estado, justamente, porque concorreu de sua livre vontade a um determinado cargo e, mesmo sendo eleito, não foi obrigado a ocupar tal cargo.

Mas se decide assumir o lugar, fá-lo de sua livre vontade, para servir bem todos aqueles que dele dependem: não lhe bastará ser uma pessoa-de-bem, tem de parecer uma pessoa-de-bem, tem de agir como uma pessoa-de-bem, para que a Instituição que dirige seja uma Instituição de bem, cumpridora das suas obrigações, sempre disponível para honrar os compromissos que vai assumindo, bem como os que institucionalmente foram assumidos pelos seus antecessores. Não se pode passar uma esponja no passado de uma instituição, só porque ela foi gerida, colegialmente, por cidadãos de quadrantes políticos diferentes.

Ao político com funções de decisão pedem-se capacidades, competências, qualidades e virtudes, porque a boa ou má decisão sempre sairá da sua mente, as consequências para quem vai ser objeto de tais decisões podem ser tão importantes ao ponto de recuperar uma pessoa como destruí-la, não necessariamente na sua condição física, mas na sua dimensão cívica e na sua dignidade.

O político detentor do poder decisório não pode deixar-se envolver por sentimentos ideológico-partidários; nem por questões mal resolvidas, no passado, em relação àquele sobre quem vai decidir algo; muito menos poderá ignorar a dignidade e o respeito devidos à Instituição que vai responder pelos efeitos da sua decisão e, em última análise, em circunstância alguma deve decidir contra os legítimos e legais interesses de um povo que, a partir da eleição, deve ser tratado todo por igual.

A prudência e a responsabilidade, serão, porventura, as qualidades que melhor poderão caracterizar este político e a sua Instituição como pessoas-de-bem, porque: «Um homem prudente deve assim escolher os caminhos já percorridos pelos grandes homens e imitá-los, assim, mesmo que não seja possível seguir fielmente esse caminho, nem pela imitação alcançar totalmente as virtudes dos grandes, sempre se aproveita muita coisa.» (MACHIAVEL, s.d:39).

Os homens e as mulheres passam, as instituições ficam; mas o contrário também é verdade. Este princípio deve nortear todos aqueles que, ao serviço de uma instituição, tomam decisões que a colocam numa situação de grande dignidade ou de total descrédito.

Nesse sentido tudo deve ser feito para prestigiar a instituição, garantir uma imagem de Pessoa-Coletiva-de-bem. Os compromissos assumidos em nome da instituição devem ser cumpridos, integralmente respeitados, independentemente das pessoas físicas que, no exercício das suas funções, legais e legítimas, os assumiram.

Por isso é que qualquer candidato a um lugar de eleição, para uma determinada instituição deve: primeiro, informar-se sobre tudo o que a ela respeita; segundo, se entender que não tem condições para a orientar e gerir, então não deve candidatar-se, porque de contrário estará a portar-se como uma pessoa que, dificilmente, se poderá considerar uma pessoa-de-bem, o que afetaria a instituição. Isto será o mínimo que ao nível da Ética Politica e da Deontologia Profissional se deve impor aos candidatos a quaisquer cargos.

Exige-se uma grande prudência e responsabilidade, quer na escolha dos candidatos, quer, posteriormente, por parte destes quando: primeiro, decidem aceitar candidatar-se; depois, no exercício das respetivas funções.

4. Pessoas-de-bem para Instituições-de-bem

 

O Estado, compreendendo as diversas Administrações: Central, Regional e Local, com diferentes e especializados departamentos: Ministérios, Secretarias de Estado, Direções Gerais, Institutos, Forças Armadas, Forças Policiais, Tribunais, Repartições Públicas em geral e tantos outros órgãos, com designações apropriadas, integrando uma hierarquia complexa e muito extensa, dispõe de todos os instrumentos/meios, infraestruturas, recursos humanos, financeiros e técnicos e um poder quase absoluto, posicionando-se em lugar privilegiado, de grande supremacia, face ao cidadão vulgar, o qual, envolvido que esteja em qualquer situação conflituosa com esse mesmo Estado, parte sempre em manifesta e injusta desvantagem, não lhe sendo garantidas, em tempo útil, as mesmas oportunidades de defesa.

Por exemplo: quantas vezes se prende o cidadão (apenas por suspeita e/ou indícios, alegadamente, consistentes), investiga-se o cidadão e só depois, e mesmo assim nem sempre, é que este tem a oportunidade de organizar a sua defesa, em liberdade.

Se no fim do conflito, nada se prova contra o cidadão, as indemnizações que lhe são devidas, (que jamais pagam o sofrimento, a humilhação e o fim de uma vida ativa, quer profissional, quer social) e que ainda têm de ser requeridas por ele, quando deveria ser iniciativa do Estado assumir essa obrigação, sem mais delongas nem burocracias, são objecto de grandes atrasos, por força dos recursos e outras estratégias legais dilatórias.

Não se pretendendo generalizar a situação descrita, a verdade é que muitos são os casos que vêm a público pelos diversos meios da comunicação social e/ou pelos próprios cidadãos atingidos que, alguns, inocentemente, são apanhados por um sistema que é nitidamente parcial, prepotente, paradoxalmente, também nos regimes democráticos.

O Estado, enquanto instituição nacional suprema, é servido por cidadãos que no exercício das respectivas funções, cumprem ordens, executam a Lei e prestam contas aos seus superiores hierárquicos, e assim sucessivamente, numa cadeia hierárquica, que tem por limite a Lei Fundamental, isto é, o mais alto magistrado do Estado, também presta contas às instituições às quais, constitucionalmente, deve obediência e, finalmente, à própria Lei.

O que por vezes se verifica é uma certa impreparação do cidadão-funcionário, qualquer que seja a sua categoria e poder decisório, conjugada com uma grande insensibilidade para certas situações de manifesta injustiça para com o cidadão-contribuinte-utente, a que se alia uma evidente falta de solidariedade para com o cidadão que precisa de ser ajudado, pedagogicamente esclarecido, orientado e resolvido o seu problema com a celeridade, competência e justiça que se impõem.

Acresce, ainda, que o cidadão-funcionário, quem sabe se, quantas vezes se limita a uma análise literal da Lei, interpretá-la no contexto dessa literalidade e aplicá-la com objetivos punitivos, nada pedagógicos, quem sabe se com algum prazer, devido a eventuais quezílias anteriores com aquele cidadão-utente. A verificarem-se as circunstâncias descritas, estar-se-ia perante um cidadão-funcionário que, dificilmente, se poderá considerar uma pessoa-de-bem.

O cidadão-funcionário do Estado, enquanto pessoa-de-bem, para além dos seus conhecimentos e competências profissionais e cumprimento das suas obrigações ético-deontológicas, deve possuir outras qualificações, capacidades, atitudes e sentimentos, porque toda a situação que envolve o cidadão-contribuinte-utente de um serviço público, tem uma origem, causas que lhe estão associadas, uma explicação (verdadeira ou falsa, que deve ser rigorosamente averiguada) e um conjunto de circunstâncias, atenuantes e/ou agravantes.

O cidadão-funcionário não tem o direito de presumir que aquele cidadão-utente é, à partida, culpado doloso, um delinquente, um malfeitor e, mesmo que o seja, tem direito a provar que não houve intenção de cometer o acto que lhe é imputado e muito menos ser qualificado de doloso. O princípio, segundo o qual: “até prova em contrário presume-se a inocência”, deve ser escrupulosamente respeitado.

O cidadão-funcionário, que se preza como sendo pessoa-de-bem, deve dar todas as oportunidades ao cidadão-utente, conduzir o processo com respeito, imparcialidade, solidariedade e consideração por aquele cidadão, que para além do mais é uma pessoa humana com dignidade, porque se as situações e os papéis se inverterem, então, aquele cidadão-funcionário passa a cidadão-utente e este ao papel de cidadão-funcionário.

Certamente que o agora cidadão-utente, espera, exige, manifesta-se e até invoca direitos que, quando na qualidade de cidadão-funcionário, quantas vezes teria negado aos utentes da sua Repartição. Aqui reside, também, uma certa solidariedade institucional e cívica, porém, deve ser revelada imparcialmente para com todos os cidadãos-contribuintes-utentes. Um traço comum, todavia, os une: é que ambos são cidadãos-contribuintes e pessoas-de-bem.

É fundamental selecionar e admitir pessoas-de-bem, para integrarem os quadros de pessoal das organizações públicas e privadas, dotadas, portanto, de capacidades académicas, técnicas e conhecimentos específicos, conjugados com faculdades e qualidades no domínio verdadeiramente humano, no sentido de serem capazes de se colocarem na posição do outro, desenvolverem uma pedagogia solucionadora dos problemas, preventiva de novas situações e não uma postura punitiva, autista e arrogante.

Escolhidas, portanto, as pessoas certas para os lugares certos, que demonstrem, inequívoca e lealmente as virtualidades de pessoas-de-bem, estarão reunidas as condições para que se tenham instituições de bem, que estejam ao serviço dos utentes, consumidores e beneficiários dos seus serviços, onde se possam sentir em segurança, tratados com civismo, educação, de igual para igual, com lealdade, transparência de processos, pelos quais os problemas possam ser resolvidos e as faltas analisadas com humanismo, com solidariedade, compreensão e tolerância, onde sejam aplicadas todas as circunstâncias atenuantes, fazendo notar que também existem algumas agravantes (se a tanto houver lugar), para que o cidadão-utente não seja, à partida, tratado como um criminoso de alta perigosidade que, ainda assim, tem direitos, desde logo o direito de se defender e de não ser humilhado, desrespeitado e condenado em praça pública.

O Estado deve caminhar para que todo e qualquer cidadão possa aceitá-lo como o “Paradigma de Pessoa Coletiva de Bem”, a partir do qual, toda e qualquer organização, pública, privada, cooperativa, unipessoal, associação e Instituições Privadas de Solidariedade Social, possam seguir-lhe o exemplo. Nesse sentido impõe-se uma permanente atualização de conceitos, de métodos, de objetivos e resultados compatíveis com este desejável paradigma.

Urge formar o cidadão em geral para estes novos valores institucionais, relacionais e interpessoais, quando ao serviço de uma organização; proporcionar-lhe uma formação específica e também polivalente, ao longo da vida, imbuindo-o num espírito e cultura para os novos valores, para práticas coerentes com tais valores e objetivos da instituição, dos seus servidores e utentes.

Cabe aos atuais responsáveis, promover e/ou reforçar, de imediato, todas as iniciativas que conduzam ao reforço do paradigma de organizações de bem, obviamente, a começar naquelas que integram as Administrações Públicas do Estado.

O paradigma de um Estado Pessoa-de-bem passa, igualmente, pela solidariedade institucional entre as diferentes organizações e instituições, de tal forma que, o que é por um agente institucional implementado, qualquer que seja a sua categoria e poder decisório, terminadas que sejam as suas funções e mandato, deve ser assumido pelo seu substituto, para assim haver uma continuidade de ação, podendo, o novo titular daquele cargo, introduzir alterações se, entretanto, surgirem factos ou oportunidades mais favoráveis à instituição, aos seus trabalhadores e utentes, porém, não pode, nem deve, eximir-se ao cumprimento dos compromissos assumidos pelo seu antecessor, tomados no âmbito das suas funções, ao serviço da instituição, perante a sociedade civil, prestadores de serviços, outras instituições e organizações.

As instituições públicas, enquanto tais, normalmente órgãos colegiais, são independentes das pessoas físicas que as dirigem, portanto não podem ser manchadas, desrespeitadas, descredibilizadas pelo incumprimento de obrigações assumidas em seu nome, de contrário, quando mudam os corpos dirigentes, os novos elementos, recusariam todos os passivos contraídos pelos seus antecessores, avocariam os ativos e a anarquia tomaria conta do sistema

O Estado, através das suas instituições, tem a oportunidade de reforçar a construção do “Paradigma de Pessoa Coletiva de Bem”, continuando as suas instituições a assumir os compromissos contraídos, independentemente das pessoas físicas, ideologias, partido e/ou força política a que pertencem as pessoas e dos projetos que em cada época eram considerados os melhores para a instituição, legal e democraticamente aprovados nas instâncias competentes.

5. O Estado: Garante da Igualdade e Felicidade do Povo

 

Entre muitas outras virtudes possíveis, abordou-se a prudência, à qual se poderia aliar, praticamente como sua sinónima, a sabedoria, esta entendida no seu sentido morusiano e, concretamente, quanto ao seu objetivo: «A sabedoria reside em procurar a felicidade sem violar as leis.» (MORUS, s.d.:99). Significa que o Estado, Pessoa-de-Bem, deve lutar pela felicidade do seu povo e nesse sentido a felicidade pode equivaler ao Bem-comum, ao Bem-estar de todos em geral, e de cada um em particular.

Não será necessário violar as leis para proporcionar felicidade ao povo, mas é imperioso que se criem e aprovem boas leis: justas, exequíveis na sua aplicação e, quando as circunstâncias o aconselharem, atualizá-las, para que se cumpram no interesse do povo.

A ilação deste raciocínio é simples – se um compromisso é assumido ao abrigo de uma lei ou de um conjunto de cláusulas, em que uma ou mais partes com elas concordam, não pode depois uma das partes recusar o seu cumprimento, acrescentando condições ou argumentos que não estavam explícitos e esclarecidos aquando da assinatura do acordo.

É esta sabedoria, talvez um pouco utópica para alguns, que todos os cidadãos devem utilizar no seu relacionamento com as instituições e/ou interpessoal. A título de exemplo, o candidato a um cargo por eleição, firma um contrato com o eleitorado, através de um programa eleitoral. Eleito tal candidato, ele deve cumprir o que ficou previamente acordado e não pode, depois, no exercício das respectivas funções, alterar o clausulado do programa eleitoral.

Considera-se perfeitamente compatível implementar, numa sociedade democrática, estratégias e metodologias que visem proporcionar à população melhores condições de vida, de bem-estar material e espiritual, cabendo aos responsáveis pelo exercício do poder criar as alternativas e aplicar as soluções que contribuam para aquele desiderato.

O governante, pessoa-de-bem, ancorado numa excelente formação humanista, certamente, terá o maior orgulho e sentirá prazer em ver os seus concidadãos felizes, em boa harmonia, sentindo-se parte integrante deste sucesso. Este governante, qual cidadão do futuro, terá de abdicar de certo tipo de mordomias, benesses, privilégios e impor um espírito de austeridade a si próprio, à sua equipa e também aos seus correligionários políticos.

Os cidadãos devem ter acesso ao conhecimento destas medidas de rigor, de transparência e de solidariedade para com os mais desfavorecidos, podendo aquelas ser praticadas por aqueles que já tem mais do que o precisam, abdicando um pouco do que lhes é oferecido, em favor dos mais carenciados.

A cidadania também envolve renúncia à sumptuosidade de quem governa, que deve dar o exemplo, de tal forma que as desigualdades se atenuem até onde for possível. Ainda se vive num período em que a cidadania, com todos os seus deveres e direitos, não abrange todos os sectores da sociedade, por isso as desigualdades, em diversas áreas e países, ainda prevalecem, no entanto: «(…) é importante recordar que, embora os direitos de cidadania sejam universais, o princípio da cidadania nunca foi generalizado a todas as instituições sociais. Especialmente o sistema económico e as classes sociais a ele associadas permanecem exclusivos da sua natureza e marcados por um alto grau de desigualdade e concentração do poder.» (BARBALET, 1989:74).

Compete ao Estado, na sua qualidade de Pessoa-de-bem, reduzir até ao limite mínimo possível as desigualdades, taxando todos os cidadãos, grupos, empresas e organizações com fins lucrativos, pelos mesmos critérios objetivos e justos, sem privilégios, sem benefícios que não sejam “reembolsáveis” para a comunidade, porque o Estado quando concede um apoio financeiro, facilidades fiscais e sociais, está a utilizar recursos que são dos cidadãos contribuintes, logo, é justo e impõe-se que aquele tipo de auxílios sejam entendidos como investimentos, com retorno acrescido, em benefício da comunidade, até porque, parte do investimento inicial lhe pertence.

O Estado com rosto tem o dever de ser competente, de zelar pelos legítimos interesses dos seus cidadãos, naturais, residentes, aqui se incluindo todos os imigrantes, e também aqueles que estão na diáspora, mostrando neste domínio, e uma vez mais, que é Pessoa-de-bem, isenta, austera e vigilante, face às engenharias e estratégias financeiras.

De igual forma se exigem cidadãos que estejam preparados para assumir todos os seus deveres e direitos de cidadania, contribuindo para uma sociedade mais solidária entre os seus membros, através do trabalho, do estudo e da participação cívica.

Pretendem -se cidadãos e um Estado, Pessoas-de-bem, que lutem pela felicidade da comunidade, que defendam, compreendam, tolerem e ajudem para que todos tenham uma vida digna. Um Cidadão e um Estado humanistas, num país onde se sinta prazer e orgulho de viver.

6. Síntese

 

E se numa concepção clássica se pode definir o Estado como sendo um grupo de cidadãos (povo), localizados geograficamente num determinado espaço (território), delimitado por fronteiras, internacionalmente reconhecidas, cujo povo comunga de uma cultura, história e língua comuns e tem objetivos e desígnios coletivos, que toda a população defende, então o Estado é constituído por todos aqueles elementos, os quais não têm quaisquer responsabilidades perante o cidadão e a instituição, particularmente considerados.

O Estado abstrato, assim entendido, nem sempre defende os interesses, não promovo a justiça, não distribui equitativamente as riquezas nacionais e não pode exigir dos cidadãos e das instituições particulares, isto é, da sociedade civil, o cumprimento de determinadas obrigações. Importa, então, analisar o Estado concreto, objetivo, identificável. (Int. 1).

Mas o Estado tem o rosto dos respectivos dirigentes que, antes e depois das correspondentes funções, transitoriamente desempenhadas, justamente à custa da confiança que o cidadão-eleitor neles depositaram, seja no grupo político, seja diretamente no próprio governante.

No exercício das funções que lhes foram cometidas, tais cidadãos, agora investidos de poderes especiais, devem ser os primeiros a cumprir a Lei, com equidade, com tolerância, compreensão e pedagogia preventiva, sem estratégias e processos persecutórios, sem espírito punitivo e, quantas vezes, injusto.(Cap. 2)

E se por um lado, o Estado tem de construir e implementar o Paradigma de “Pessoa-de-bem”, a começar nas e entre as suas próprias instituições de base: as Autarquias Locais, criando laços de confiança e credibilidade, adotando uma postura pedagógica, atuando em tempo útil, sem discriminações, independentemente das ideologias político-partidárias dos diversos responsáveis.

 Por outro lado e nas atuais circunstâncias, o exercício do poder local democrático, nas freguesias rurais e semi-urbanas carece de uma profunda revisão e estruturação. Nesse sentido o cidadão contemporâneo tem de participar no processo de atualização e ajustamento às realidades existentes, de forma a garantir dignidade, competência, eficácia, iguais direitos e tratamento para com todos os seus concidadãos, independentemente das suas opções político-partidárias. (Cap. 2).

O político detentor do poder decisório não pode deixar-se envolver por sentimentos ideológico-partidários; nem por questões mal resolvidas, no passado, em relação àquele sobre quem vai decidir algo; muito menos poderá ignorar a dignidade e o respeito devidos à Instituição que vai responder pelos efeitos da sua decisão e, em última análise, em circunstância alguma deve decidir contra os legítimos e legais interesses de um povo que, a partir da eleição, deve ser tratado todo por igual. (Cap. 3).

O Estado, enquanto instituição nacional suprema, é servido por cidadãos que no exercício das respectivas funções, cumprem ordens, executam a Lei e prestam contas aos seus superiores hierárquicos, e assim sucessivamente, numa cadeia hierárquica, que tem por limite a Lei Fundamental, isto é, o mais alto magistrado do Estado, também presta contas às instituições às quais, constitucionalmente, deve obediência e, finalmente, à própria Lei.

 O paradigma de um Estado Pessoa-de-bem passa, igualmente, pela solidariedade institucional entre as diferentes organizações e instituições, de tal forma que, o que é por um agente institucional implementado, qualquer que seja a sua categoria e poder decisório, terminadas que sejam as suas funções e mandato, deve ser assumido pelo seu substituto, para assim haver uma continuidade de ação, podendo, o novo titular daquele cargo, introduzir alterações se, entretanto, surgirem factos ou oportunidades mais favoráveis à instituição, aos seus trabalhadores e utentes, porém, não pode, nem deve, eximir-se ao cumprimento dos compromissos assumidos pelo seu antecessor, tomados no âmbito das suas funções, ao serviço da instituição, perante a sociedade civil, prestadores de serviços, outras instituições e organizações. (Cap. 4).

O governante, pessoa-de-bem, ancorado numa excelente formação humanista, certamente, terá o maior orgulho e sentirá prazer em ver os seus concidadãos felizes, em boa harmonia, sentindo-se parte integrante deste sucesso. Este governante, qual cidadão do futuro, terá de abdicar de certo tipo de mordomias, benesses, privilégios e impor um espírito de austeridade a si próprio, à sua equipa e também aos seus correligionários políticos.

A cidadania também envolve renúncia à sumptuosidade de quem governa, que deve dar o exemplo, de tal forma que as desigualdades se atenuem até onde for possível. Ainda se vive num período em que a cidadania, com todos os seus deveres e direitos, não abrange todos os sectores da sociedade, por isso as desigualdades, em diversas áreas e países, ainda prevalecem.

O Estado com rosto tem o dever de ser competente, de zelar pelos legítimos interesses dos seus cidadãos, naturais, residentes, aqui se incluindo todos os imigrantes, e também aqueles que estão na diáspora, mostrando neste domínio, e uma vez mais, que é Pessoa-de-bem, isenta, austera e vigilante, face às engenharias e estratégias financeiras.

De igual forma se exigem cidadãos que estejam preparados para assumir todos os seus deveres e direitos de cidadania, contribuindo para uma sociedade mais solidária entre os seus membros, através do trabalho, do estudo e da participação cívica. (Cap. 5).

 

Bibliografia

BARBALET, J.M., (1989). A Cidadania. Trad. M.F. Gonçalves de Azevedo, Lisboa: Editorial Estampa, Lda., Temas Ciências Sociais, (11).

BÁRTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2002). “Silvestre Pinheiro Ferreira: Paladino dos Direitos Humanos no Espaço Luso-Brasileiro” Dissertação de Mestrado, Braga: Universidade do Minho, Lisboa: Biblioteca Nacional, CDU: 1Ferreira, Silvestre Pinheiro (043), 342.7 (043).

BARTOLO, Diamantino Lourenço Rodrigues de, (2009). Filosofia Social e Política, Especialização: Cidadania Luso-Brasileira, Direitos Humanos e Relações Interpessoais, Tese de Doutoramento, (Curso Livre), Bahia/Brasil: FATECTA – Faculdade Teológica e Cultural da Bahia.

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, (2004), Versão de 2004. Porto: Porto Editora.

MACHIAVEL, Niccoló, (s.d.). O Príncipe. Tradução, prefácio e notas, Lívio Xavier, S. Paulo (Brasil): Editora Escala.

MADEC, Annick; MURARD Numa, (1995). Cidadania e Políticas Sociais, Trad. Maria de Leiria. Lisboa: Instituto Piaget.

MORUS, Thomas, (s.d.). A Utopia, Prefácio de Mauro Brandão Lopes, Tradução de Luís Andrade, S. Paulo: Escala.

ROMERO, Emílio, (1998). As Dimensões da Vida Humana: Existência e Experiência, São José dos Campos: Novos Horizontes Editora.

TRINDADE, António Manuel Cachulo da, et al, (2003). Administrar a Freguesia, Coimbra: Fundação Bissaya Barreto, Instituto Superior Bissaya Barreto, Março/02.

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo                                  

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Blog Pessoal: http://diamantinobartolo.blogspot.com

Portugal: www.caminha2000.com (Link Cidadania)

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