Uma talagada no drink e alguns tragos no cigarro: a vida.

Sei que a vida toda fui um pouco avoado. Às vezes até demais. Mesmo consciente disso, sempre gostei de manter a cabeça aberta. Sinto-me bem desbravando horizontes, sonhando com situações impossíveis, fantasiando, deslumbrando.

A imaginação pode ser como a ficção científica, capaz de nos fazer viajar no tempo, ir para outros planetas e mundos, encontrar com seres extraterrestres, conversar com robôs e ressuscitar dinossauros.

Em um dos sonhos mais fascinantes, poderia ter me tornado um astronauta, viajado até a Lua, passado meses em uma estação espacial e ter sido o primeiro homem a pisar em Marte - e, ainda assim, não teria ido tão longe.

Mas em que ponto os pés devem estar no chão, pisando no mesmo chão onde pés suaram e pés sangraram? Em que ponto os pés devem estar pisando no mesmo chão onde pés foram explodidos e mutilados por minas colocadas por homens com os mesmos pés que os pés que ali pisaram?

No ponto em que a "realidade" da sociedade tenta nos domar, nos usar como tijolos na parede de uma construção sem pé nem cabeça, que ninguém sabe onde vai dar e nem como vai ficar – uma verdadeira obra faraônica a Deus dará.

Já criei teorias sobre o ser humano e cheguei a classificá-lo de egoísta, acreditando que a fonte inesgotável da sua existência fosse o próprio ego. Hoje, por vezes me pego a pensar que, com essa teoria, superestimei a raça, lhe atribuí mais inteligência e dei mais crédito a 10% de cérebro. Uma expressão comentada por uma amiga não sai da cabeça: "animal homem".

Assusta-me a falta de capacidade de percepção dos homens, como notar que somos, de certa forma, todos iguais, filhos do mesmo planeta e que habitamos o mesmo espaço. Entretanto, compreender também que, em outro ponto de vista, somos diferentes – no que diz respeito ao interior, à peculiaridade, aos desejos, gostos e vontades.

No jogo da vida, esse paradoxo nos leva a uma sinuca de bico: somos irmãos, vivemos no mesmo planeta, mas temos diferentes facetas. E, dessa forma, através de contra-sensos criamos impasses, como Deus ou Alá? Socialista ou capitalista? Libertino ou puro? Agitado ou tranqüilo? Noturno ou diurno? Sonhador ou realista?

Na verdade, a nossa escolha pouco importa, porque estamos vivendo dentro de moldes e rótulos que a sociedade insiste em nos impor, mesmo tendo criado muitas de suas certezas a partir de crenças. Perdemos a essência de simplesmente viver, pois não temos a oportunidade de experimentar e saborear uma vida desprovida de regras e valores.

E não a temos por nossa própria incompetência como animais. Animais que, livres ou conduzidos por leis, são incapazes de respeitar e amar o próximo.

Terça-feira, 06 de Fevereiro de 2007