1. 1.   Introdução

 

 

Nesse trabalho tento trabalhar o tema o ente de razão e o ente real no pensamento de Tomas de Aquino no livro o ente e a essência, escrito pelo mesmo ainda quando jovem. Mas não me limito só na acepção tomista, coloco também o pensamento de Aristóteles que Tomas faz uma releitura, além de Spinoza e um contemporâneo Heidegger.

Na primeira parte falo do conceito e definições de ente na filosofia dos filósofos já citados, fazendo uma visão geral como Aristóteles, Spinoza e Tomas veem eu suas filosofias o ente, que para eles, se divide em ente de razão e ente real, um existe na realidade e outro é pura abstração.

Na segunda parte vamos mergulhar no ente de razão e no ente real em si, com o contrastante pensamento de Spinoza e a angustia de Heidegger. ideias de Heidegger são obscuras, isso se deve a sua maneira hermética de reinterpretar os termos metafísicos, a partir de um retorno à origem helênica da discussão sobre o ser e o pensar. Por vezes, esbarra-se na dificuldade de traduzir o significado de suas palavras e conceitos, devido à interpretação inovadora que ele impõe aos termos das línguas grega e alemã.

E na terceira e ultima parte desse trabalho entro de vez no pensamento de Tomas no seu livro o ente e a essência, onde ele parte primeiro no conceito de ente, para somente depois chegar ao de essência. O ente passa pelos dez gêneros isso relembra as dez categorias de Aristóteles, o ente de razão, aquele que não tem uma existência na realidade e o outro [ente real] são as proposições de verdade, esses conceitos serão mais aprofundados, mais bem trabalhados no decorrer desse trabalho.

 

 

 

 

  1. 2.   Diferença entre ser e ente dentro da filosofia.

 

 

De primeiro podemos dizer que ente é aquilo em qualquer dos significados existenciais de ser. Às vezes, mas raramente, essa palavra [ente] é usada para designar somente Deus: é o que faz Gioberti, em sua fórmula ideal: "o ente cria o existente" (Introduzione alio Studio della fil., II, p. 183): onde "ente" equivale a Deus, como ser necessário, e "existente" equivale às coisas criadas.

Habitualmente essa palavra é usada em sentido mais geral. Diz Heidegger: "Chamamos de ente muitas coisas, em sentidos diferentes. ente é tudo aquilo de que falamos aquilo a que, de um modo ou de outro, nos referimos; ente é também o que e como nós mesmos somos" (Ser e o Tempo, § 2). Mas nesse sentido generalíssimo prefere-se hoje a palavra entidade. [Abbagnano].

Heidegger insistiu em que deve distinguir-se entre o ente e o ser, entre o verbo e o particípio do verbo. Do ponto de vista linguístico, há que ter em conta que os significados de ente e ser dependem, em grande parte, do modo como estes termos se introduzem, por exemplo, não é a mesma coisa dizer o ente que dizer “um ente”; não é a mesma coisa usar ser como cópula num juízo que dizer “o ser”.Devido a estas e outras dificuldades, argumentou-se por vezes que a distinção entre ente e ser, pelo menos dentro da chamada “ontologia clássica”, é pouco menos que artificial, ou em todo o caso, insignificante.

Alguns autores, contudo, insistem em que perguntar pelo ente e perguntar pelo ser não é a mesma coisa; o ente é “aquilo que é”, enquanto o ser é o fato de que qualquer ente dado seja. Especialmente desde o século treze, discutiu-se o que é o ente como “aquilo que é” ou “o ser que é”. A pergunta - o que é o ser? Não foi respondida corretamente na verdade se respondeu que “o ente é aquilo que o intelecto concebe em primeiro lugar” (S. Tomás, Sobre a Verdade, pág. 128), mais não é o que se havia perguntado.

Os escolásticos trataram em pormenor os problemas levantados por esta exposição. Por um lado, e se a noção de ente é comuníssima, o ente é tudo o que é como tal. Por outro lado, se ente é o real na sua realidade, o ente pode ser aquilo que sustém ontologicamente todos os entes. Finalmente, se o ente é tudo o que é ou pode ser, dever-se precisar de que modo distinto se diz de algo que é ente. Por exemplo, pode dividir-se o ente em ente real e de razão, em ente potencial e ente atual, e este último em essência e existência, mas não vamos nos adentrarmos a esses outros aspectos não, nos limitando apenas no ente.

Pode também estudar-se de que modo se pode falar do ente, análoga, unívoca, equivocadamente. A doutrina escolástica do ente culmina possivelmente em Suarez. Nas suas disputas metas, Suarez estuda o ente não só como “aquilo que é”, mas também como a condição, ou condições, que tornam possível e inteligível qualquer ser. Mas não vamos nos adentra muito nesse sentido também de Suarez, nos limitando apenas em ente real e ente de razão.

A filosofia procura, vive buscando “o que o é ente enquanto é”. A filosofia está a caminho do ser do ente, quer dizer, a caminho do ente sob o ponto de vista do ser. Aristóteles elucida isto, acrescentando uma explicação ao que é o ente, Heidegger contesta a passagem acima citada, Isto significa: que é a entidade do ente? “O ser do ente consiste na entidade”. Esta, porém - a ousia -, é determinada por Platão como ideia, por Aristóteles como energeia. [M. Heidegger]

A metafísica tem, enquanto a verdade do ente enquanto tal, duas formas. Mas a razão destas duas formas e mesmo sua origem está fechada para a metafísica, e isto, sem dúvida, não por acaso ou como consequência de uma omissão. A metafísica aceita esta dupla face pelo fato de ser o que é: a representação do ente enquanto ente. Para a metafísica  não resta escolha. Enquanto metafísica ela está excluída pela sua própria essência da experiência do ser; pois ela representa o ente constantemente apenas naquilo que a partir dele se mostrou enquanto ente. Contudo, a metafísica não presta atenção àquilo que precisamente neste ente, na medida em que se tornou desvelado, também já se velou. [M. Heidegger. O retorno ao fundamento da metafisica, pág. 145 § 3].

 

 

 

  1. 3.   O ente real e o ente de razão.

 

 

Inicialmente é importante esclarecer o que Espinosa entende por ente. Sua definição é bastante esclarecedora. Definição de ente: “Tudo aquilo que, por meio de uma percepção clara e distinta, reconhecemos existir necessariamente, ou pelo menos poder existir” [B. Spinoza. Pensamentos Metafísicos, pág. 56]. Desta maneira Espinosa considera ente propriamente dito ou ente real apenas as coisas que existem incontestavelmente, ou seja, tudo aquilo que nossa percepção racional tem certeza em existir ou, pelo menos, há possibilidade infalível de existir.

Esta definição de ente torna-se fácil de compreender quando nos deparamos com outras figuras as quais não são consideradas entes propriamente ditos, são eles: Ente fictício: coisas que um homem, partindo apenas de sua liberdade, junta aquilo que quer juntar ou separa aquilo que quer separar, não sem saber, como no falso, mas deliberada e cientemente. Em outras palavras, tudo aquilo que o homem cria a partir da sua imaginação tendo a consciência de que tal coisa não existe. Por exemplo, animal que fala, automóvel com vida, etc.

Ente de Razão: um modo de pensar que serve para que as coisas conhecidas sejam mais facilmente retidas, explicadas ou imaginadas. Quer dizer que é tudo aquilo que somente existe dentro do nosso intelecto servindo de meio ou forma para nos situarmos no mundo real, por exemplo, as horas, dias ou anos; os números, as medidas, etc.

 Essa classificação dos entes é muito apropriada, pois as pessoas estão tão acostumadas com certas denominações que se esquecem de que tal coisa não existe realmente a não ser dentro da nossa mente. Um exemplo típico é o tempo. Estamos acostumados a determinar horas, dias, anos, que muitos acreditam que faz parte da realidade, quando na verdade são divisões criadas pelo nosso raciocínio como forma de organizar nossa existência. Neste exemplo, o instante constante e eterno do “tempo” é um ente real, já as definições de horas, dias, anos, etc., são entes da Razão.

Para deduzir a realidade das coisas sem cometer erros é imprescindível não confundir os entes reais com os entes de Razão. Investigar a natureza das coisas é diferente de investigar os modos pelos quais nós as percebemos. O ente fictício é muito simples de entender. Trata-se de coisas oriundas da imaginação, criadas intencionalmente, que não existem tampouco tem a possibilidade de existir. Filmes de cinema, por exemplo, estão repletos de entes de ficção.

Com relação ao ente real divide-se em ente que por sua natureza existe necessariamente, isto é, cuja essência envolve a existência, e ente cuja essência não envolve a existência senão possivelmente. No caso do ente possível, se subdivide em substância e em modo. Assim diz Espinosa:

 

 

Desta definição, ou se se preferir desta descrição, segue-se que uma quimera, um ente fictício e um ente de Razão não podem de modo algum ser colocados entre os entes, pois uma quimera, por sua própria natureza, não pode existir. O ente fictício, por sua vez, exclui uma percepção clara e distinta, visto que um homem, partindo apenas de sua liberdade, junta aquilo que quer juntar ou separa aquilo que quer separar, não sem saber, como no falso, mas deliberada e cientemente. Enfim, um ente de Razão nada mais é do que um modo de pensar que serve para que as coisas conhecidas sejam mais facilmente retidas, explicadas ou imaginadas. Deve-se notar aqui que por modo de pensar entendemos aquilo que explicamos no escólio6 da proposição da parte I, a saber, todas as afecções do pensamento, tais como o intelecto, a alegria, a imaginação, etc. [B. Spinoza, pensamentos metafísicos, pág. 37].

 

 

Deve-se notar também que muitos confundem o ente de Razão com o ente fictício, admitindo, portanto, que o ente fictício também é um ente de Razão porque não existe fora da mente. Entretanto, se estivermos atentos às definições dadas acima do ente de Razão e do ente fictício, verificaremos haver a maior diferença entre eles não somente em virtude de suas causas, mas também em virtude de suas naturezas sem referência às suas causas.

 

  1. 4.   O ente para Tomas de Aquino.

 

 

O Aquinate concebe o ente analogamente. O conceito de ente não é unívoco, porque não se diz só e da mesma maneira de um único ser. O que é unívoco? O conceito unívoco diz-se do nome que significa uma mesma essência, que se diz de uma única natureza, ou seja, a conveniência do nome com a natureza, como no caso do nome Deus [S.Theologica I].

 O conceito de ente não é equívoco, porque não é o que significa várias coisas por um mesmo nome, como ocorre na ambiguidade, onde se toma a similitude entre as realidades, mas a unidade do nome em que não há proporcionalidade entre o nome e a essência, ou seja, o nome é comum, mas a substância diversa como ocorre com o nome cão dito do animal, da constelação e do temperamento irascível do homem [S.Theologica I, pág. 46].

O conceito de ente não é genérico, porque não inclui todas as diferenças predicáveis do ente que fazem parte da definição, como o conceito de animal que inclui as diferenças racional e irracional [S.Theologica I], como no conceito de ente não entra alto, magro, baixo, gordo etc. O conceito de ente é análogo, porque resulta da comparação entre os diversos entes, por proporção [S.Theologica I], em que o nome, segundo um significado aceito, é posto na definição de algo, com outro significado [S.Theologica I], como o que se diz de algo que comumente se aplica a muitos, como saudável dito do alimento e do corpo que dele se alimenta.

O ente considerado em si mesmo, como algo que existe fora da mente, de modo autônomo e independente, é dito essencial, como o abacateiro. O ente considerado como algo que existe fora da mente, mas que existe em outro, como algo que depende da existência do outro, é dito acidental, como o tom de cor verde do abacateiro. O ente que existe fora da mente é dito real porque é uma realidade concreta e singular e o ente que é considerado pela e na mente é dito de razão, porque ou é uma imagem ou um conceito abstrato e universal. O ente que já é o que é, é dito ente em ato, como o abacateiro é abacateiro em ato. O ente que vem a ser o que ainda não é dito ente em potência, como a semente de abacateiro que ainda não é abacateiro em ato, senão só em potência. 

 Neste sentido, ente se diz da essência, do acidente, real e de razão, da potência e do ato. Mas há que advertir que ente por acidente não é propriamente ser e, por esta razão, não há ciência acerca do ente por acidente.

O ente que é considerado abstraído da realidade concreta, pelo intelecto, é dito ente abstraído ou, como já dissemos, ente de razão. Há o ente de razão com fundamento no real, dito desta maneira porque resultou da abstração de uma realidade concreta, como o conceito de maçã. Há, também, o ente de razão raciocinado, enquanto produzido pela razão só a partir dos dados da imaginação, com as imagens que já existem nela, daí ente de razão derivado do raciocínio da razão, como produzido pela imaginação, por exemplo, uma maçã com asas, ou minotauro.

Daí, ente de razão com fundamento no real e ente de razão raciocinado ou raciocinante. De qualquer modo, a consideração do ente de razão é própria da Lógica e do ente real, considerado em si mesmo, é próprio da Metafísica. Em um e outro caso, o estudo do ente é primeiríssimo, porque é o que primeiro capta o intelecto quando considera o real. Concluindo, quando o intelecto concebe o ente afirma que o ente é aquilo que é e o não ente aquilo que não é, sendo impossível conceber o ente sendo e não sendo ao mesmo tempo. Desta captação do ente real, o intelecto, a partir dos primeiros princípios de conhecimento que possui como hábitos formulam os primeiros princípios de demonstração.

 

 

 

 

 

 

  1. 5.   Conclusão

 

 

Portanto em tomas, O conceito de ente  é fruto de uma total abstração. É um conceito universal e, para os escolásticos, o mais universal dos conceitos. Tomás de Aquino define: "Ente é o que tem essência real". Sua essência é o ser.  Se afirmarmos que é o que é apto a existir realmente, nesse caso é o que tem “coisa”. Seria, então, o que tem existência efetiva.

E o ente tal se dá quando a sua aptidão a existir é presente, dá-se no exercício da existência ou vem a suceder na possibilidade. É intrinsecamente possível, quando o ente que, por coerência consigo mesmo, não tem nenhuma existência atual. Possível é o que pode existir. Impossível o que não pode existir. Ente puramente possível é aquele que pode existir, sem existir em ato.

A possibilidade intrínseca formal da coisa não existente carece de toda atualidade física. Para os escolásticos é existente o que de fato é dado nas coisas da natureza é a existência uma forma lógica intrínseca, cuja afirmação se pode fazer porque, de fato, se dá nas coisas da natureza. Em suma, é existente, para os escolásticos, o fático ou o que se funda no fático.

Se ente é o que tem aptidão à existência, ente existente é o que tem aptidão em ato, isto é, aquele cuja aptidão transita no exercício da existência. Se ente é o que tem aptidão à existência, ente existente é o que tem aptidão em ato, isto é, aquele cuja aptidão transita no exercício da existência.