O Ensino de Geografia brasileiro, desenvolvimento e ambiente na década de 70.
O nosso objetivo é analisar o livro didático de geografia do autor Igor Moreira, (que se encontra na 6ª edição em 1976), destacando a abordagem do autor sobre a relação desenvolvimento-ambiente. Além disso, realizaremos um breve relato sobre a importância do livro didático como ferramenta importante para o docente e suas limitações, além de descrever o momento histórico em que o livro analisado foi publicado, que é de suma importância para entendermos as possíveis influências do autor.
O livro analisado foi publicado antes da emersão do desenvolvimento sustentável, e possui algumas características peculiares devido ao momento histórico do Brasil, que estava em um regime de ditadura militar, e do momento das discussões preliminares em caráter global sobre a relação desenvolvimento-ambiente , como a publicação do relatório "Limites do crescimento", e principalmente da realização da Conferência de Estocolmo.
Faz-se mister advertir que os discursos proclamados pelas elites brasileiras, logo do governo ditatorial desse momento, estão territorializados no livro de forma bem clara, e que inclusive há também proclamados os discursos das elites dos países centrais, porém estes últimos discursos não ameaçavam o discurso nacional, por isso a existência deles.
Ao analisar o livro percebemos a reduzida importância pela relação desenvolvimento-ambiente, que de certa forma contraria a suposta preocupação de países centrais neste mesmo momento, e simboliza, sobretudo, os interesses da elite dirigente do Brasil. Assim, apresenta-se de forma explícita o desinteresse por essa temática, e a prioridade em se discutir outros assuntos, como a dinâmica populacional, o espaço agrário e o espaço urbano, por exemplo.
Todo esse desinteresse pela temática ambiental e interesse por outras temáticas também é um reflexo do momento. A ditadura brasileira priorizava o desenvolvimento e o progresso do país, por mais que esses termos fossem ilusórios, e que esse progresso fosse exclusivamente da classe dominante. Além disso, a não importância ou a não prioridade em discutir esse tema, devia-se principalmente pelas idéias que: os problemas ambientais estavam presentes apenas nos países centrais, ou pelo menos a gravidade maior dos problemas procediam desses países; pela riqueza natural do Brasil, e a crença de que os recursos naturais seriam ilimitados; e por principalmente, (retomando a idéia), ser contrário a meta do governo qualquer perspectiva de redução ou congelamento de crescimento, pois aquele, (de acordo com o discurso ideológico proferido pelas classes dominantes), seria o momento do país crescer economicamente, e se constituir uma potência, ou um país desenvolvido no futuro, era a hora da ordem e do progresso, como estampado na bandeira do Brasil, era o "tempo de deixar o bolo crescer para mais tarde reparti-lo" (discurso utilizado na década de 70 para justificar as desigualdades sociais). Ou seja, o governo brasileiro queria, utilizando uma expressão que exprime o desejo do momento, o "direito ao desenvolvimento", que seria a solução para os males vigentes no Brasil, ou fazendo uma análise adicional e crítica, o governo combatia os discursos dos países centrais, porque estes eram contrários aos seus objetivos, e, sobretudo, era preciso combater esse discurso estrangeiro para proferir o discurso nacional, que também tinha o interesse de atender a classe dominante, sendo que a do Brasil.
O livro didático era reflexo de todo esse contexto, pois além de encontrarmos explicitamente os desejos e os objetivos do Estado, encontramos ideologias proferidas por países centrais, como por exemplo, a reprodução das concepções neomalthusianas . Outro ponto a ser destacado é que uma possível atmosfera crítica desse livro deveria ser contida pela ditadura brasileira, logo não poderia ter nenhum tipo de aversão aos pensamentos da classe dominante, tanto que as idéias neomalthusianas contidas só afetavam a população pobre, que era responsável por uma futura crise ambiental, por uma explosão demográfica etc. (devemos ressaltar que nem o livro e principalmente o professor poderiam divergir dos ideais dominantes nesse período, pois eram intitulados pela ditadura de comunistas, e/ou contrários ao desenvolvimento do Brasil).
Sabemos, então, que o livro está carregado de discursos, nacionais e internacionais, o que não torna o livro ou nossa análise menos importante, pelo contrário, a nossa análise torna-se peculiar, pela especificidade desse momento, e talvez pela característica única do livro didático de geografia desse momento. E, sobretudo, relembraremos que a nossa preocupação em analisar o livro didático é que este, como já dito, é uma ferramenta do professor, muitas vezes, (equivocadamente), a única ferramenta, e, sobretudo, é uma das fontes de informação dos alunos, que muitas vezes, julgam essa informação como uma verdade absoluta. Não temos a pretensão de enumerar as críticas sem relevar e ressaltar a importância do livro didático, pois, esse faz parte do processo ensino-aprendizagem.
Sobre a importância do livro didático encontramos nas palavras do próprio Igor A. G. Moreira e E. Auricchio, no manual do professor do livro do 8.º ano, uma colaboração importantíssima, e que demonstra o brilhantismo do autor, além de toda a importância do livro, toda a fragilidade, a imparcialidade do mesmo, e toda a responsabilidade do professor, que deve ter autonomia e respaldo teórico para divergir do livro quando possível e quando ele julgar necessário.
Assim os autores afirmam que:

"Sendo o conhecimento uma abstração incompleta e precária da realidade, qualquer livro é apenas uma forma de aprender a realidade, partindo-se da visão e do processo cognitivo de um autor (ou autores) em um determinado momento. É assim que os alunos e professores devem considerar qualquer livro, sobretudo o didático, isto é, como uma referência, um recurso a ser usado no processo de ensino-aprendizagem". (2004 p.9)

Assim, o livro didático é uma visão parcial do fato, como qualquer outro livro; todavia, qualquer tentativa da imposição de um discurso "neutro" pelos autores, representa alguma estratégia (até mesmo em abordar ou simplesmente omitir um assunto), sendo possível até na tentativa de "neutralidade" a reprodução de um discurso dominante, tendo em vista que não existe o discurso neutro. Podemos ainda entender como M. FOUCAULT (2005) que todo discurso tem uma ordem, e essa ordem representa inúmeras causas e interesses, muitas vezes relacionadas com o poder.
Complementarmente, Moreira e Auricchio (2004) acrescentam na discussão sobre a parcialidade do livro didático, advertindo que o livro também é uma visão do autor em um determinado momento, e vários fatores irão contribuir para a sua opinião em cada momento histórico, realçando a principal preocupação em nosso trabalho, que é analise do mesmo autor em diferentes momentos, tendo como marco a emersão do desenvolvimento sustentável, que culminará na nossa conclusão, de uma não-reprodução do discurso do autor e do conteúdo do livro didático nesses dois momentos ou em cada livro analisado.
É importante entendermos a fragilidade do livro didático, que, sobretudo, não é o receptáculo de verdades absolutas, e de informações sempre profícuas, isto é, há limitações no livro, e que de forma importante e coerente, é visualizada pelos autores:
"O livro didático não é a expressão inquestionável do programa de ensino. É a proposta do autor sobre um determinado conjunto temático, com uma lógica e uma linha metodológica, que pode ou não ser coerente com os pontos de vista do professor e com o projeto pedagógico da escola. Por essa razão, para a construção do conhecimento, não deve ser visto como depositário da ?verdade absoluta? nem o único material a ser utilizado em sala de aula, mas sim como um recurso a ser complementado por outros".(MOREIRA; AURICCHIO 2004 manual do professor p.9)

Logo, o livro didático de geografia da década de 70, é um reflexo do momento histórico, do Brasil e do mundo, da visão do autor e de seus referenciais teóricos, da sua formação etc, e também um reflexo da geografia desse momento. Logo, tão importante quanto a análise do livro didático é a análise da geografia desse período, que nos trará um maior embasamento para compreender a estrutura e os conteúdos do livro, temos nas palavras de Ruy Moreira que:

"Por muitos anos a Geografia esteve comprometida com os ditames das classes sócio-econômicas e dos países dominantes, logo o ensino de Geografia nada mais era que a simples transmissão de conhecimentos de cunhos ideológicos e, portanto, a finalidade estava comprometida, sobretudo, em mascarar a realidade" (MOREIRA 1987 apud BARBOSA 2006 p.15).

É importante ressaltar, que a disciplina passa por uma transformação nesse momento, com a introdução e proliferação da geografia crítica, com base marxista, tendo como principal representante, ou um dos seus símbolos o francês Yves Lacoste. Por sinal, o autor em sua principal obra "A geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra" distingue as "geografias" dentro da "Geografia", ressaltando a importância estratégica da disciplina para os Estados Maiores, e seu papel igualmente estratégico nas salas de aula, (e conseqüentemente, no livro didático), como uma disciplina simplória e enfadonha, sendo totalmente distinta da primeira.
Sobre essa última geografia, Lacoste a intitula como "geografia dos professores", e segundo o autor esta se tornou um discurso ideológico, por mascarar a geografia dos Estados Maiores, por ter a ausência de análises políticas, econômicas, e militares, resultando em um instrumento de poder da minoria (LACOSTE 2003).
Destarte, a geografia dos professores torna-se pretensiosamente despretensiosa, sendo, sobretudo, uma ferramenta para as classes dominantes. Logo utilizaremos novamente a análise de Lacoste, que ressalta:

"A geografia dos professores funciona, até certo ponto, como uma tela de fumaça que permite dissimular, aos olhos de todos, a eficácia das estratégias políticas, militares, mas também estratégicas econômicas e sociais que uma outra geografia permite a alguns elaborar" (LACOSTE 2003 p.33)

2. 1. O LIVRO DIDÁTICO DE GEOGRAFIA (1976)

Portanto, após todas essas abordagens preliminares, que serviram de respaldo para a compreensão das características do livro didático de geografia da década de 70, faz-se necessário ressaltar alguns pontos importantes no livro didático, que irão corroborar toda a nossa argumentação introdutória. O reduzido conteúdo da relação desenvolvimento-ambiente neste livro, nos faz ressaltar pontos escassos no decorrer do livro, que tem uma relação com essa temática. Relataremos os capítulos do livro para mostrar que não há nenhum capítulo específico, e sim fragmentos do nosso assunto dentro de dois capítulos basicamente.

Tabela 1 ? Estrutura do livro "O Espaço Geográfico ? Geografia Geral e do Brasil", de autoria de Igor Moreira, em sua 6ª. Edição publicada em 1976
Partes Capítulos
"Espaço Natural" Capítulo1 - Os fatores naturais, Capítulo 2 - Os grandes domínios naturais.
"A População no Espaço" Capítulo 1 - A distribuição geográfica da população, Capítulo 2 - O crescimento da população, Capítulo 3 - A estrutura da população, Capítulo 4 - A estrutura da população brasileira, Capítulo 5 - Os movimentos da população.
"O Espaço Agrário" Capítulo1 - As atividades agrárias, Capítulo 2 - A agropecuária no Brasil, Capítulo 3 - O extrativismo vegetal e a pesca no Brasil.
"Espaço Industrial e Urbano" Capítulo 1 - Industrialização e Urbanização, Capítulo 2 - A indústria no Brasil, Capítulo 3 - O Espaço Urbano, Capítulo 4 - A circulação.
"Espaço Brasileiro" Capítulo 1 - A diversidade espacial, Capítulo 2 - As unidades regionais brasileiras e os órgãos de planejamento.


Portanto, trataremos de dois tópicos levantados nas parte de "População e Espaço" e "Espaço Industrial Urbano". A primeira grande discussão que levantaremos está na página 67, e relata o conflito População X Alimentos e as soluções, onde por alguns momentos o autor se distancia das concepções neomalthusianas e em outros momentos o autor se aproxima, deixando transparecer o caráter neomalthusiano de sua análise.Assim, Moreira (1976) ressalta que há duas soluções, ou duas correntes que pretendem solucionar esse dilema: a primeira o autor chama de pessimista, onde se enquadraria os neomalthusianos, que, conseqüentemente, defendem o controle de natalidade, e culpam o crescimento populacional pela falta de alimentos do mundo, e pela fome. Além disso, o crescimento populacional seria, na visão dessa corrente, responsável por um comprometimento do futuro da humanidade (toda essa preocupação e esse controle deveriam ser exercido nos países subdesenvolvidos ou periféricos, já que são nesses países os maiores índices de crescimento populacional).
A outra corrente é denominada pelo autor de "otimistas" ou "reformistas", que segundo o próprio autor, se preocupariam com o aumento da produção, alegando que a dita "explosão populacional" não seria a causa principal, mas a conseqüência do atraso econômico e social dos países subdesenvolvidos. Logo, através das reformas econômicas e sociais , da distribuição e proliferação da tecnologia, a produção seria elevada e abasteceria a todos, sem nenhuma exceção.
Posteriormente, o autor afirma, sem clarificar e explicar a sua afirmação, "que ambas posições são defensáveis, cada qual segundo o seu ponto de vista" (MOREIRA 1976 p.68), o que concordamos parcialmente, na nossa interpretação cada discurso tem seu interesse, sua intencionalidade, sendo o primeiro, por exemplo, o discurso das elites dos países centrais, reproduzidas nos países periféricos (pelas elites pelo mesmo interesse e por outros segmentos pelo senso comum), que teria o objetivo principal de atribuir à população pobre o inchaço das grandes cidades, a pressão em cima da produção dos alimentos e do ambiente; e o segundo discurso, referente à necessidade de aumentar a produção do país, (e que só através do aumento da produção solucionaria o problema da falta de alimentos), que também reflete um objetivo principal, o de atender as elites brasileiras, principalmente a elite agrária que através da revolução verde e da modernização do campo pretendia um aumento de produção e de lucro, e, complementarmente queria evitar a reforma agrária.
É importante ressaltar que concordamos apenas que cada discurso tem o seu propósito, e nestes casos o de atender aos desejos das elites dominantes, mesmo tratando-se de elites diferentes, e que não acreditamos na viabilidade dessas proposições. Moreira, que já deixara a lacuna aberta na afirmação anterior (a que ambas posições são defensáveis), deixa-se sucumbir pelas idéias neomalthusianas e afirma posteriormente, reproduzindo essa ideologia, que "além disso, o elevado crescimento demográfico repercute não só no problema alimentar atual, como também na própria sobrevivência futura da humanidade, através das suas implicações no equilíbrio ambiental" (MOREIRA 1976 p. 68).
Não são as populações pobres as responsáveis pela maior pressão no ambiente, ou pelo desequilíbrio ambiental; são, pelo contrário, as populações ricas, que são minorias no globo, e que são as maiores responsáveis pelo "desequilíbrio ambiental", como sugere Moreira, ou na nossa visão, pela degradação, em larga escala do ambiente.
Outro ponto a ser destacado, é a abordagem feita pelo autor sobre os "problemas urbanos", na quarta parte intitulada "Espaço Industrial e Urbano", no capítulo III, que trata especificamente do Espaço Urbano, e ao seu final sobre os problemas existentes nesse espaço causados pelo homem (mais especificamente pela sociedade capitalista), e pela transformação da paisagem produzida pela a ação humana e suas inúmeras conseqüências. Assim, o autor propõe que o crescimento das cidades, a formação de metrópoles, a partir dos processos de urbanização e industrialização, provocou inúmeros efeitos, que se tornaram mais graves com o decorrer dos anos, e com a aceleração desses processos, provocando uma espécie de efeito dominó no espaço urbano. Logo, na visão do autor, os problemas de habitação, causariam a favelização, e a maior intensidade do que SOUZA (2007) denomina de movimento pendulário diário, que teria como conseqüência problemas no setor de transporte, como o congestionamento, e a própria circulação urbana no que se refere ao abastecimento de produtos (MOREIRA 1976).
Após essa relação, o autor adiciona na lista de problemas a "poluição ambiental", afirmando que:

"Mas talvez mais grave seja o problema da poluição ambiental, em especial das águas e do ar, provocada principalmente pelas indústrias que buscam a proximidade dos grandes centros. Diante disso, urge que se discipline, através do planejamento urbano, a localização industrial, bem como se fiscalize a emissão de substâncias poluentes".(MOREIRA 1976 p. 224)

O autor parece muito crítico à proliferação das indústrias nos grandes centros, que por conseqüência, provocam a poluição das águas e do ar (e agravam todos aqueles problemas descritos anteriormente). Tendo em vista esses problemas, o autor apresenta como solução, ou como meta para amenizar esses problemas o planejamento urbano, e a fiscalização na emissão de poluentes.
A fiscalização de emissão de poluentes no Brasil mostrou-se uma tarefa bastante árdua, por basicamente dois motivos: o primeiro, é o fato de que a própria negligência do governo em fiscalizar se mostrou incapaz de regular as emissões; o segundo motivo é explicado pela preocupação nesse momento (relembrando) ser de atração de empresas, ou seja, de atrair as tecnologias sujas, para "desenvolver" o parque industrial brasileiro. Então não se poderia propagar a idéia de controle de poluentes, e sim propagar a idéia de que se polua no Brasil (como era o slogan na época).
A outra idéia exposta pelo autor, é a do planejamento urbano, o que é basicamente uma das idéias centrais do governo brasileiro desse momento, "planejar o desenvolvimento do país". Assim, Moreira, incorpora essa idéia produzida no governo ditatorial, e a reproduz por vários momentos no livro didático, como por exemplo: "Agora que o Brasil inicia sua arrancada para o desenvolvimento, é preciso planejar" (MOREIRA 1976 p.242), ou através da enumeração e da explicação dos órgãos de planejamento regional do Brasil, como a SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste), a SUFRAMA (Superintendência de Desenvolvimento da Zona Franca de Manaus), que viabilizariam, na visão do autor, o desenvolvimento dessas regiões, e conseqüentemente, o desenvolvimento do Brasil. Discorrendo sobre o "desenvolvimento" da Amazônia, com a construção de grandes rodovias (como a Transamazônica), com a fixação de grandes estabelecimentos, o autor prossegue na reprodução de discursos do governo, afirmando que o processo atual causava impacto no ambiente, como o desmatamento, e no próprio equilíbrio ambiental, porém, essas eram conseqüências do processo de desenvolvimento, que deveria ser entendido como meta principal, e justificativa de qualquer impacto (MOREIRA, 1976). Visualizaremos melhor através da citação do autor:

"Grandes estabelecimentos agropastoris estão se instalando na região. (...) Tais iniciativas estimuladas por incentivos fiscais são a de maior efeito povoador. Mas, ao mesmo tempo, fazem surgir a questão do desmatamento em grande escala, cujos resultados no equilíbrio ecológico regional merecem cuidadosos estudos. De qualquer modo, todos esses empreendimentos representam os primeiros passos no sentido de um efetivo povoamento, valorização e conseqüente integração da Amazônia, cujos inevitáveis problemas deverão ser solucionados na medida em que aparecem". (MOREIRA, 1976, p. 253)

Destarte, o autor explicita todo o discurso do governo brasileiro, inclusive a justificativa ao desmatamento e aos outros impactos ambientais. E, como o governo brasileiro ? o autor afirma no decorrer do livro ? que apesar de todos os problemas criados pelo homem, o mesmo tem o poder de derrotá-los através, do que o autor chama, de "instrumento tecnológico", ou seja, a técnica aparece como redentora (GONÇALVES, 1996) ou a grande solução, logicamente, adicionada à outras idéias (como o planejamento), e todas vinculadas a idéia principal, a de desenvolvimento.
É importante ressaltar que o nosso objetivo não é crucificar o autor pela reprodução dos discursos da classe dominante e pela preferência à idéia de desenvolvimento do que a idéia de preservação do ambiente, e sim (nesse capítulo) constatar como era a estrutura do livro didático antecessor ao surgimento do desenvolvimento sustentável, e especificamente, a estrutura do livro de geografia do Brasil, com a ênfase na relação desenvolvimento-ambiente na década de 70, em plena ditadura militar, abordando, complementarmente, a influência desse período e dos discursos, tanto nacionais quanto internacionais, na visão do autor e no conteúdo do livro.
Se atualmente nos parece clara a importância de preservar, ou pelo menos essa idéia é proliferada, e acoplada estrategicamente nos discursos das elites brasileiras e mundiais (e inclusive presente nos livros didáticos), temos que realizar o esforço, de entender que nesse momento no Brasil, essa idéia não era tão importante, principalmente como discurso das elites dominantes, e, por conseguinte, o discurso a ser proliferado era o de desenvolvimento. Da mesma forma que se prolifera a idéia de desenvolvimento sustentável atualmente, e é vista por vários segmentos da sociedade como uma verdadeira panacéia para os problemas ambientais, a idéia de desenvolvimento, era vista na década de 70 no Brasil como uma panacéia para os males econômicos, sociais, e até mesmo ambientais, quando se acredita que através da técnica poderemos esgotar os problemas e os impactos gerados pelo desenvolvimento.

Referências Bibliográficas

BARBOSA, T. O Conceito de natureza e análises dos livros didáticos de geografia. 301 f. Dissertação (Mestrado em Geografia), Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciência e Tecnologia ? Campus de Presidente Prudente ? SP, 2006.
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. Editora Loyola, 14º edição. São Paulo. 2006
________ Microfísica do poder. Editora Graal. 21º edição. 2005
GONÇALVES, C.W.P. O desafio ambiental. Rio de Janeiro,Editora Record, 2004.
________A Globalização da natureza e a Natureza da globalização. Rio de Janeiro Civilização brasileira. 2006
_______ Geografia Política e Desenvolvimento Sustentável, em Revista Terra Livre no. 11-12 (São Paulo, Marco Zero/AGB, São Paulo). 1996
LACOSTE, Y. A geografia - Isso Serve, Em Primeiro Lugar, Para Fazer a Guerra.São Paulo: Papirus, (5º edição). 2001
MOREIRA, I. O Espaço Geográfico - Geografia Geral e do Brasil. Editora Ática 6º edição São Paulo. 1976
MOREIRA, I.; AURICCHIO,E. Construindo o Espaço - Construindo o espaço americano. Editora Ática. 2º edição, São Paulo. 2004
SOUZA, M.L.de O desafio metropolitano: Um estudo sobre a problemática sócio-espacial nas Metrópoles Brasileiras.Rio de Janeiro.Editora: Bertrand Brasil. 2005