O ensino da língua materna nos anos iniciais do Ensino Fundamental: a coesão e a coerência no processo de construção do texto.  ANTUNES, I. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.

RESENHA CRÍTICA 

O ensino da língua materna nos anos iniciais do Ensino Fundamental: a coesão e a coerência no processo de construção do texto.

ANTUNES, I. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.

O primeiro capítulo do livro intitulado de Estudo da língua aponta as dificuldades que os alunos possuem para escreverem e se expressarem oralmente num registro mais formal. Existe uma falta de orientação específica para professores e alunos do ensino fundamental e médio que queiram conhecer explicitamente certas questões da linguagem, a maioria dos livros é destinada aos pesquisadores tendo uma linguagem quase sempre especializada e científica e os livros didáticos concebem poucas questões em relação especificamente textuais.

 A autora evidencia uma preocupação em atender a explicita vontade de alunos e professor em entender como se estuda a língua com base no texto, ou seja como se faz o estudo das regularidades do texto. Para ela, os alunos precisam entender o que passa em sala de aula, precisam saber avaliar a relevância do que está sendo proposto como ensino e de como este ensino está sendo feito. Uma primeira deficiência do ensino diz respeito ao fato que há uma primazia quase absoluta da oralidade quase restrita ao informal, ou seja as atividades de escrita e leitura não chegam a serem significativas. Outra deficiência ocorre em relação às oportunidades de escrita que se limitam apenas a finalidade escolar para atender os objetivos imediatos das disciplinas, sem perspectivas sociais inspiradas nos diferentes usos da língua fora do ambiente escolar.

Dessa forma torna-se comum a artificialidade das condições de produção desses textos, o que resulta numa falsa compreensão do que seja construir textos relevantes e ajustados a um contexto de compreensão mais amplo, tudo se reduz mecanicamente em por algo no papel, mesmo que sem sentido. E ainda existe o fato que muitas vezes o próprio professor não é um leitor e ´´escrevente`` assíduo.

No texto é destacado várias concepções sobre o ato de escrever entre elas: Escrever é como falar, uma atividade de intercambio verbal, que só tem sentido se trocar com alguém alguma informação. Escrever na perspectiva da interação deve ser uma atividade cooperativa em que dois ou mais sujeitos agem conjuntamente para interpretação de um sentido. Escrever aos outros de forma interativa é uma atividade contextualizada situada em algum momento ou espaço, não se escreve com os mesmos padrões em contextos diferentes. Tal qual falar, escrever é uma atividade textual, ninguém fala com palavras justapostas aleatoriamente, desconectadas ou soltas, nos comunicamos através de textos, sejam orais ou escritos. Escrever é uma atividade tematicamente orientada, ou seja, em um texto há uma ideia central, um tópico, um tema global que se pretende desenvolver, há sempre um ponto em vista e perde-lo significa romper com a unidade temática e comprometer a relevância comunicativa da interação. Escrever é uma atividade intencionalmente definida, escreve para cumprir um determinado objetivo. Escrever é uma atividade que envolve além de especificidades linguísticas, outras pragmáticas. Escrever é uma atividade que se manifesta em gêneros particulares de textos, assim os textos não têm o mesmo esquema de seqüenciação, ou seja, o mesmo conjunto de partes ou a mesma forma de distribuição dessas partes. Escrever é uma atividade que retoma outros textos, o discurso vai se compondo através de conhecimentos já adquiridos. Escrever é uma atividade de relação de interdependência com a leitura, é a contraparte do ato de escrever, o que lemos foi escrito por alguém e o que escrevemos é para que o outro leia.

Ao escrever um texto Antunes (2003) cita três grandes momentos que são: planejamento, escrita propriamente dita e revisão. O planejamento e revisão aprecem na escola como um procedimento eventual e não uma prática sistemática.

O texto deve permear toda e qualquer atividade na sala de aula da mesma forma que ele permeia toda e qualquer atividade de nossa ação social, deve ser o objeto de estudo das aulas de língua, a fim de que se descubra uma língua funcionando, viva e real. Um conjunto de palavras deve ter algumas características para que possa funcionar e ser reconhecido como texto, são elas: coesão, coerência, informatividade e intertextualidade.

O segundo capítulo conceitua o que é coesão e suas funções. A autora inicia com uma crônica de Fernando Sabino que apresenta palavras soltas fazendo uma analogia com a maneira inadequada de compreender o texto e também de como as escolas ensinam a escrever frases a partir de palavras isoladas. Reconhecer que um texto está coeso é reconhecer que suas partes não estão soltas e fragmentadas. A função da coesão é nesse sentido promover a continuidade do texto, a sequência interligada de suas partes para que não se perca o fio da unidade que garante a sua interpretabilidade.

No terceiro capítulo é abordado como é feita a coesão no texto. Ressalta que a continuidade que instaura se pela coesão é fundamentalmente uma continuidade de sentido, uma continuidade semântica que se expressa no geral pelas relações de reiteração, associação e conexão. A reiteração é a relação pela qual os elementos do texto vão de algum modo sendo retomados, criando se um movimento constante de volta aos segmentos prévios o que assegura ao texto a necessária continuidade de seu fluxo, de seu percurso.

A associação é o tipo de relação que se cria no texto graças à ligação de sentido entre as diversas palavras presentes, sejam do mesmo campo semântico ou de campos semânticos afins que criam e sinalizam esse tipo de relação. Em relação a conexão, a mesma apresentada correspondendo ao tipo de relação semântica que acontece especificamente entre as orações e por vezes entre períodos, parágrafos ou blocos supraparagráficos. Realiza por meio das unidades da língua que preenchem essa função, mais especificamente as conjunções, preposições e respectivas locuções.

Através do quarto capítulo é possível conhecer os procedimentos e recursos da coesão que são Repetição, Substituição, Seleção lexical e Conexão sintático-semântica, entretanto é salientado que nem sempre os procedimentos estão presentes em um mesmo texto. Em alguns determinados tipos ou gêneros, um ou outro procedimento pode não aparecer, sem prejuízo para a coerência.

No quinto capítulo é explicado os recursos da Repetição que são: Paráfrase, Paralelismo e a Repetição Propriamente dita. A paráfrase é uma operação de reformulação, trata-se de um recurso bastante comum nos textos explicativos, no qual há um interesse na compreensão dos pontos abordados. O paralelismo é um recurso ligado à coordenação de segmentos que apresentam valores sintáticos idênticos, na qual os elementos coordenados entre si apresentem a mesma estrutura gramatical. A repetição propriamente dita corresponde ao ato de voltar ao que foi dito com o recurso de fazer reaparecer uma unidade que já ocorreu previamente, essa unidade pode ser uma palavra ou até uma frase inteira. Durante todo o capitulo é dado exemplos de textos com os recursos citados.

O sexto capitulo é moldado pelo recurso da Substituição. As línguas dispõem de diferentes recursos que podem referir sem usar as mesmas palavras, assim é possível substituir uma palavra por um pronome, advérbio ou outra palavra que seja textualmente equivalente. Esse recurso se subdivide em substituição gramatical e substituição lexical. A gramatical é realizada por outras palavras como pronome e advérbio, já a lexical é um recurso coesivo pelo qual se promove a ligação entre dois ou mais segmentos textuais, implica o uso de uma palavra no lugar da outra que lhe seja textualmente equivalente.

No sétimo capítulo é apresentado a Coesão pela associação semântica das palavras também chamado de coesão lexical do texto, pois atinge as relações semânticas que se criam entre as unidades do léxico.A coesão ultrapassa a simples marca superficial do texto, ou a simples justaposição de palavras ou frases.

A Coesão pela conexão é abordada no oitavo capítulo. Ela é efetuada por meio de conjunções, preposições e locuções conjuntivas e preposicionais, bem como por meio de alguns advérbios e locuções adverbiais. O recurso da coesão se torna significativo quando se considera que os conectores não servem apenas para ligar ou conectar e sim para articular segmentos, sendo relevante reconhecer que esses elementos também cumprem a função de indicar a orientação discursiva argumentativa que o autor pretende emprestar ao seu texto.

O nono capítulo apresenta a Coesão, o Léxico e a Gramática. É enfatizado que a coesão não apenas estabelece os nexos que ligam as subpartes do texto como também sinaliza e marca esses nexos e quais pontos eles articulam. A coesão ultrapassaa mera ocorrência dos efeitos linguísticos na superfície do texto e está em íntima correlação com a coerência do texto.

O décimo capítulo apresenta a Coesão e Coerência. Traz o conceito que a coerência é uma propriedade que tem a ver com as possibilidades de o texto funcionar como uma peça comunicativa, como um meio de interação verbal, não sendo possível avaliar a coerência de um texto sem ter em conta a forma como as palavras aparecem ou a ordem de aparição dos segmentos que a constituem.

No último capítulo a autora conclui afirmando que a língua não pode ser reduzida a uma questão de certo ou errado, seus usos incluem muitos outros elementos e mobilizam muitos mais conhecimentos do que aqueles puramente gramaticais. A língua não é um sistema de signos isolados do resto do mundo, tudo que é pensado e previsto acontece refletido na linguagem. Conhecer explicitamente os recursos que deixam um texto coeso, conhecer explicitamente regras de sua coerência é, portanto, benéfico a qualquer pessoa, sobretudo àquelas que fazem da linguagem um instrumento de trabalho.

O livro é finalizado com o discurso que na vida cotidiana os textos não são poéticos, mas também somos desafiados a lutar com as palavras e precisamos tomar a devida precaução de saber explicitamente que recursos utilizar para que as palavras se submetem aos nossos propósitos de interação e que consigamos a façanha de encantá-las.

            A coesão e a coerência são fatores primordiais no processo de construção do texto de qualidade e que comunique com eficácia.

Os referenciais teóricos foram realizados com base nos autores Lajolo (1986), Antunes (2003), Haliday & Hasan (1976), Marcuschi (2003), Perini (2004), Adélia Prado (1976).