RESUMO

A incapacidade do modelo capitalista de promover a sustentabilidade das condições da natureza é o motivo deste trabalho. Para tanto percorremos por uma pesquisa bibliográfica do qual evidenciasse a espoliação da natureza e a relação direta com o homem, neste, o desenvolvimento da idéia de materialismo, como fundamental para a formulação desta crítica. O pensamento tanto fora utilizado para o questionamento a religião quanto para a gênese da idéia de conservação da natureza. A crítica de Marx parece se confundir com a antecipação da questão ambiental, da qual a natureza não é entendida como "dom divino ao homem", de outrora, mas como elemento material, que atende a leis naturais. O desenvolvimento do modelo capitalista de produção criaria condições de afastamento do trabalhador com o produto do trabalho, daí o trabalho alienado, na mesma medida, a alienação do homem com o restante da natureza, promovendo prejuízos irreversíveis.

Palavras chaves: materialismo, natureza, capitalismo, trabalho, alienação.

1 INTRODUÇÃO

Nenhum sistema de dominação moderno ? capitalismo, socialismo, regimes totalitários e ditaduras ? mostrou-se capaz de remediar sua autodestruição. O homem sempre extraindo da natureza, além do necessário. Esta relação do homem com o meio ambiente apresenta questionamentos sobre a própria manutenção da vida. Impulsionados pelo modelo de produção vigente, criamos danos irreparáveis para toda a natureza .
Historicamente a alteração do homem sobre a natureza parte da intenção econômica, excluindo o discurso do seu real uso sobre o espaço, o que compreende uma demanda de desenvolvimento pautada nas intenções do modo de produção. Esta situação cria uma nova discórdia para o homem, a degradação de si mesmo, manifestada na natureza, gerando atenção a um velho discurso, o discurso da questão ambiental.
A questão ambiental está intrinsecamente referida ao contexto social, afinal não se pode segregá-la a mera exploração dos recursos naturais. A grande importância do meio ambiente está na continuidade da vida, o que de fato atinge a todos nós. Partindo do objeto de intervenção do serviço social, (questão social) a questão ambiental está intimamente relacionada e são manifestações que se interagem mutuamente, isto porque o meio ambiente está sobre todas as coisas.
A ideologia de "economia de desenvolvimento" não responde ao crescimento comum a todos e tão pouco aos "cuidados com a casa", mas sim, a interesses de uma forma de dominação. O grau de "desenvolvimento" de uma sociedade atual, que pode ser mensurado por um dado quantitativo, conhecido como PIB , porem esta noção, não se configura como uma informação precisa, pelo fato de que além de não compreender o desgaste do uso da natureza, este "desenvolvimento" não necessariamente presume qualidade de vida para todo o corpo social.
A idéia da conservação da natureza é remota, mais que não se concretiza de forma plausível ao que deveria responder. Em análise histórica percebe-se que o homem, alavancado pelas revoluções do modo de produção, está cada vez mais distante da natureza. Este distanciamento com o mundo natural repercute ao mesmo tempo em sua destruição. Uma das manifestações desta destruição está na mudança climática, alvo da preocupação de inúmeros governos.
Um grande marco seria a Revolução Industrial, onde a partir daí o homem passou a explorar cada vez mais os recursos naturais, e aumentar a emissão de gases para superfície da atmosfera, em resposta, o processo de aquecimento intensifica-se. As mudanças ambientais ocorridas no planeta têm sido observadas e ligadas diretamente ao aquecimento global, tais como diminuição da cobertura de gelo, aumento do nível do mar e mudança do padrão climático, portanto, fatos estes, que não só influenciam as atividades do homem, mas sim todo o conjunto do ecossistema do planeta.
As previsões do IPCC ? Painel Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas ? demonstram que o aquecimento global e o aumento da temperatura média do planeta registrado desde meados do século XX é "muito provavelmente uma conseqüência do aumento da emissão de gases de efeito estufa pelo homem".
A mudança climática também já é facilitadora a criar condições para o processo de migração, visto que esta é estimulada pela impossibilidade da produção agrícola, diminuição do abastecimento de água e elevação do nível do mar. Segundo noticiário internacional , para a ONU, poderá ser calculado em 2050 até 150 milhões de pessoas consideradas como refugiados ambientais, sendo que estas pessoas, tiveram como alternativa, a migração diante do prejuízo ambiental acima relacionado, a grande diminuição das florestas contribuem também para o aumento da temperatura global.
O aumento nas concentrações de gases causadores do efeito estufa elevou a preocupação dos cientistas, pois a previsão da elevação da temperatura está acima da faixa de 1°C a 3°C o que muitos pesquisadores vêem como capaz de elevar o nível do Oceano Ártico no verão, com o progressivo desaparecimento das geleiras do Himalaia e Groenlândia. O desmatamento também é outro problema que contribui muito para o aquecimento global, a taxa de desmatamento permanece alta em muitos países e a área de florestas primárias ? aquelas que não foram afetadas pela atividade humana ? continua sendo minimizada.
Considerando a região do globo terrestre próximo a linha do equador, a mais afetada pela mudança climática, por ser também a região mais temperada da esfera do globo, fica claro afirmar que os países de capitalismo tardio, que em outros momentos históricos foram colonizados, serão as regiões mais atingidas pela alteração climática, caso as previsões estejam certas.
Em Uganda na África a mudança climática já afeta drasticamente a produção de café, principal produto de exportação do país . Há previsões de que em 2080 haverá ocorrido uma migração maciça entre 1,4 à 6,7 milhões de mexicanos para o norte da América devido ao aquecimento e seus impactos sobre a produção agrícola .
As previsões apontam para o crescimento de regiões mais improdutivas e elevação de regiões inabitáveis, não apenas pelo mau uso da terra, ou pela má distribuição ? estas seriam questões de grande alcance e mereceriam outro debate. A alteração climática pode induzir também no comportamento humano, através de uma disfunção cognitiva cerebral, gerando estresse emocional e agressividades.
Até o PIB dos países poderá ter alta redução, na média de 20% devido às catástrofes . Está claro que a natureza não dá conta de eliminar todo o lixo e poluição produzida em larga escala no atual nível de "desenvolvimento".
Neste sentido praticamente toda ação do homem modifica a natureza, mas a ação da natureza (catástrofes, alteração climática, escassez de água) não modifica ? mesmo que insistentemente ? a ação do homem, ora, a alienação da natureza não pode ser percebida em simultaneidade com a alienação do trabalho?
Como o modo de produção e suas mutações históricas distanciaram cada vez mais o homem com o restante da natureza? E como as relações da produção do trabalho poderiam desmistificar estas questões. Desta forma pretendemos aqui discutir o modo de produção capitalista e quais os impactos o mesmo produz sobre o meio ambiente. Especificamente buscamos fomentar sobre a problemática que envolve toda a sociedade, uma vez que as mudanças ambientais, provocada pelo homem, vêm causando de forma desordenada, a degradação do planeta.
Propõe-se, desta maneira, através de pesquisa bibliográfica, desenvolver uma aproximação para a compreensão da relação homem com o restante da natureza, e buscar a base para a inserção do assistente social nesta questão enquanto trabalhador, em um campo ainda pouco investido pelo Serviço Social.
2 PENSAMENTO SOBRE O MUNDO NATURAL, OS ANTAGONISMOS ENTRE MATERIALISMO E RELIGIOSIDADE NA RELAÇÃO HOMEM E NATUREZA

2.1 A concepção de materialismo

A relação que o homem mantém com a natureza apresenta questionamentos sobre a própria manutenção da vida. Esta afirmação passa a idéia de redução de perspectivas às futuras gerações, decorrente dessa relação. Diante disso, percebe-se toda uma complexidade, sendo indispensável um recorte histórico a fim de acompanhar as mudanças desta conturbada relação, pautada no modo de produção e na sua exigência feroz por recursos naturais. É preciso entender que a terra para uns é primordial motivo de extração de recursos, que processado pelo trabalho, gera lucros, e para outros é instrumento de sobrevivência.
Para tanto o conceito de materialismo será estudado a partir de seu aspecto mais contemplativo, definido como a mudança de pensamento da qual o homem abstrato passa a ser compreendido a partir do material, considerando o seu desenvolvimento histórico. A idéia de materialismo surge da filosofia grega como teoria da natureza das coisas. Neste sentido, um dos grandes pensadores materialistas da antiguidade foi Epicuro 341 a.C., cidadão ateniense. (FOSTER)
A concepção de materialismo como teoria natural entra em conflito com os dogmas da existência divina sendo posteriormente "destituído para a escuridão" e desenvolvido apenas séculos depois. A pregação religiosa viria para impregnação de que Deus houvesse criado todas as coisas, o materialismo conflitava dizendo que as coisas existem por si só, pela matéria, sendo que "não há necessidade de explicação fora da natureza em si". (FOSTER 2005:45) Fica claro que o materialismo antes mesmo da existência do Cristianismo, já questionava a percepção da imortalidade da alma sobre os homens.
Barão de Holbach (1723-1789) apud FOSTER, 2005:47 traz uma contribuição pertinente: "a doutrina da imortalidade da alma distraiu a humanidade das suas condições presentes e da necessidade de refazer o mundo segundo sua própria liberdade e necessidade". Por "condição presente e necessidade" percebe-se a idéia da relação que o homem deveria estabelecer com a natureza, tanto pela necessidade de conservação, pois o que não se conserva está fadado a fim, quanto pela liberdade humana, e esta essência de liberdade humana parece algo distante do homem moderno. A palavra humana, neste sentido, seria localizar todos os homens, sem distinção. Mas em qual momento histórico o homem se viu livre do próprio homem?
Epicuro (forte influência na tese de doutorado de Marx apud FOSTER) apresentava sua concepção da filosofia natural como ideologia de que o homem se libertaria do medo e da superstição. Com grande capacidade de prever a destituição da natureza ao passo que "nada é jamais criado pelo poder divino a partir de nada" e "a natureza... jamais pode reduzir qualquer coisa a nada". (FOSTER, 2005, p.58) A interpretação da frase anterior leva a um apontamento sobre a idéia de conservação, tão difundida e (des)conceituada no presente momento. Se a natureza não pode reduzir qualquer coisa a nada, significa dizer que todas as coisas ainda estão na natureza, de alguma forma. O que para nós pode ser óbvio foi dito a mais de dois milênios.
Epicuro além desta notável capacidade de antecipação do pensamento crítico sobre a dominação da natureza, também contribuiu para a conceituação da essência de justiça. Segundo ele apud FOSTER, 2005:58 se a lei "não acabar por levar vantagem nas relações dos homens uns com outros", cessar de estar concertada com o seu conceito geral, se deixar de conformar-se as circunstâncias materiais, "então ela não tem mais a natureza essencial da justiça". O que pode perceber é que esta "natureza essencial" da justiça não ficou muito clara nas práticas das relações sociais, o que para isto, tenha sido os interesses de uns sobre os outros.
A idéia da individualização da riqueza natural, foi responsável por grande parte do sistema de desequilíbrio social. Desequilíbrio este que em outros momentos não foram tão amplamente desequilibrados em comparação ao sistema capitalista.
Outro ilustre pensador que utilizou do materialismo para o desenvolvimento do seu pensamento foi Charles Darwin (1808-1882). Na sua teoria sobre a evolução das espécies Darwin acreditava que todas as criaturas seriam fruto de um longo processo natural de evolução, inclusive o homem, e que este processo não estaria no final da sua escala evolutiva. (FOSTER) Para Darwin se os seres humanos se extinguissem surgiria então nova espécie para completar o nicho ecológico. Darwin acreditava que o materialismo não significaria necessariamente um ateísmo, no entanto Darwin censurava suas idéias materialistas de concepção da realidade. Como se faz perceber em seus anotes: (apud FOSTER, 2005:51) "Sendo o pensamento hereditário é difícil imaginá-lo como sendo qualquer coisa além da estrutura hereditária do cérebro... ah! seu materialista!". No século XVIII o cérebro já era tido como órgão responsável a todas as faculdades mentais.
Pode-se concluir que o pensamento de Darwin também representava um ataque a sociedade religiosa, e isto era algo que causava preocupações ao pensador. A ponto de que o mesmo só apresentou sua descoberta duas décadas depois de formulada, e mesmo, somente após ter sido ameaçado de ser desbancado por outro cientista (FOSTER, 2005:42). Esta demora poderia ter alguma relação direta com questões sobre a religiosidade presente a época.
O materialismo apesar de ser definido aqui de modo abstrato e com ampla abordagem contribuiu também para o fomento da relação entre ciência social e ciência natural, embasamento este presente no pensamento marxista. Marx ao desenvolver sua idéia sobre o uso da agricultura à lógica do capital tomou referência dos reais prejuízos ao ambiente sobre a luz da ciência natural. A perspectiva de mundo de Marx alcança o âmbito ecológico, sobretudo na manifestação do seu materialismo e sua aproximação com a ciência natural. (FOSTER) Tal crítica enfatiza-se na modificação do modo de produção, ora feudalista, ora capitalista.
A vasta mudança na organização social não se limita a ser uma especificidade do capital, entendendo que com a consolidação do feudalismo durante a idade média, ressurge também no desenvolvimento da atividade humana, profundas mudanças na ocupação das cidades, na agricultura e no desenvolvimento do comércio. Neste período a distinção entre campo e cidade começa a ter fôlego, basicamente no campo, o desenvolvimento da agricultura, na cidade, atividades comerciais.
O aumento das transações comerciais provocou modificações aos costumes da época, principalmente pelo fato de que o feudalismo e suas modificações na estrutura econômica permitiam a difusão da idéia de que Deus não era o único a responder pela vida do homem, mas sim o próprio homem. Neste período claramente era possível ampliar a agressão a natureza, visto que a ordem dos "pecados" já não estava em primeiro plano na sociedade burguesa emergente, até a separação entre ciência natural e ciência social foi usada como reforço para o distanciamento do homem com o restante da natureza.
Neste sentido, a preponderância do materialismo para a compreensão da vida, propôs para a Igreja ? instituição esta, que durante a Idade Média exerceu predominantemente o controle social mais atuante. (TANAKA, 2008) ? um novo questionamento, ameaçando sua doutrina. É importante ressaltar que até o séc. XI a igreja mantinha monopolizado o ensino da escrita e da leitura, se algum sujeito almejasse ser alfabetizado deveria ele se submeter a toda ideologia cristã. Neste mesmo período houve uma ostensiva da igreja voltada para o comportamento do individuo em público de forma a se portar de acordo com as normas da Igreja. Até as relações sexuais foram motivos de detalhamento diante do confessionário. (FOUCAULT, 1988)
A visão religiosa de que a terra e todas as demais espécies foram criadas de Deus para o homem, amplamente difundida, aliada as transformações econômicas, que ao se desenvolverem em nível superior, desenvolveram a ciência, além de promover um questionamento acerca das doutrinas da fé cristã, promoveram também o desenvolvimento do novo sistema de reprodução social, muito ligado a forma de se produzir mercadorias e consumi-las.
A ciência esteve mais preocupada com a manutenção do capital, do que para o desenvolvimento humano, considerando que os avanços tecnológicos promovidos pelo capital não necessariamente significam um desenvolvimento humano, dando sentido não apenas para o trágico resultado deste novo modelo, enfatizado na desigualdade entre os homens, na acumulação, mas também a todo o desgaste da ordem natural. E este prejuízo assume progressivamente a preocupação dos governos, sejam eles de países de capitalismo desenvolvido ou tardio, no entanto esta nova preocupação, até o presente momento, não demonstrou estar voltada para uma concepção de outra "condição presente e necessária".
Esta crescente corrosão da natureza pode ter evidenciado seu ápice na mudança do modelo de produção, o feudalismo já não respondia a demanda de manutenção da ordem, ameaçado sobre o crescimento populacional (e posterior inchaço das cidades), e disponibilidade de empregos, visto que o homem migrando do campo para a cidade, necessariamente deveria vender sua força de trabalho para sua sobrevivência.

2.2 As mudanças na organização produtiva e seus devidos reflexos

No cenário exposto era preciso pensar um novo modelo de produção de mercadorias, para atender as novas exigências de organização social. Esta idéia foi sustentada pela observação de modificar o manuseio das máquinas, até então empregado pela força humana, por alguma outra tração, uma nova matriz energética, que pudessem minimizar o tempo gasto para produzir algo. A descoberta da energia movida a vapor foi a resposta a esta questão. Aliada a outros fatores como o aumento populacional, a ampliação das relações sociais (com o aumento da infra-estrutura das cidades), colonialismo europeu (grande gerador de riquezas aos colonizadores), a utilização desta nova matriz energética aliado a outros fatores contribuíram para o marco histórico conhecido como Revolução Industrial . Naquele momento (entre 1780 e 1860) o homem não apenas aperfeiçoava a forma de produzir mercadorias, mas iniciava um processo que significaria uma nova orientação para o sentido da própria vida, inclusive tornando, oportunamente o homem como "mercadoria". A ocasião destas modificações coincide com o aumento demográfico das cidades. (VIANNA)
A construção das estradas de ferro permitiu um aumento significativo da circulação de pessoas e mercadorias. A reorganização do processo produtivo das cidades com a industrialização originou também uma inovação na escala de produção do campo. O aumento da infra-estrutura viária somado aos cercamentos de terras, anteriormente comum, e a inovação da tecnologia aplicada à agricultura eliminando postos de trabalho, foram fatores primordiais do inicio da fuga da população do campo para as cidades. Esta migração provocou a imagem de sufocamento das cidades, entendendo que a mesma não possuía condições de atender a demanda da sua nova configuração populacional.
A migração do campo para a cidade fora em parte empregada pela indústria fabril, menos exigente a formação técnica destinada à mão de obra (VIANNA) (se comparado aos ofícios anteriores ao surgimento do capitalismo), esmagando de vez a produção artesanal. Porém esta modificação massiva da composição populacional dos novos centros urbanos não foi completamente suprida pela demanda de trabalho, gerando assim uma base de sustentação para o capital, uma parcela considerável da população, sem trabalho, um verdadeiro exército, almejando a vaga de algum outro trabalhador, que deveria se sujeitar a variadas situações para mantê-la.
Neste sentido é que o conceito de exército de reserva concebido por Marx faz-se real. O desaparecimento de campos de trabalho devido a inovação das máquinas, e a perversa lógica da acumulação sem precedentes é a base da construção deste fenômeno. O trabalho utilizado pelo homem para a alteração da natureza, previamente idealizada, somada a inovação tecnológica, instrumento que sistematicamente eliminou campos de trabalho e as profundas modificações da produção de mercadorias gerada pelo desenvolvimento do capitalismo, fora o auge para o distanciamento do homem com o restante da natureza.
Agora além de livre das provocações religiosas, o homem propôs um modelo de (des)crescimento que nos deixa cada vez mais perplexos e prontos para (minimamente desejar) o consumo de todo o mercado. No entanto este desenfreado consumo que estaria a direcionar os passos da humanidade exige uma deteriorização, um prejuízo a todo o globo terrestre, esta destituição, da natureza, angariada pelo consumo não pode ser entendida como sinônimo de qualidade de vida.
O que determina a qualidade de vida esta mais para a condição histórica e social, largamente influenciada pelo modo de produção, do que para a necessidade real do homem. No capitalismo qualidade de vida é entendida pela medida de consumo. (MOREIRA)
Apesar do apelo midiático e da sociedade capitalista entender o assunto do bem estar por via do consumo, este entendimento sobre o significado está também para a subjetividade, no sentido de que bem estar pode intrinsecamente estar relacionado à condição real de vida do individuo. Crocker apud Moreira: "diz que as pessoas sequer podem ser, para não falar em ter bem-estar ou uma boa vida, se não dispõem de certos bens". O que é qualidade de vida para um agricultor que tira da terra o seu sustento pode não ser a mesma noção de algum executivo. Por fim qualidade de vida está muito mais relacionada às necessidades dadas como o apetite pelo consumo de bens.

Há uma busca de uniformidade, ao serviço dos atores hegemônicos, mas o mundo se torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente universal. Enquanto isso, o culto ao consumo é estimulado. (Santos, 2000:19 apud Costa)

Por mais que uma sociedade encontre-se desenvolvida economicamente este desenvolvimento, para além da perspectiva econômica, estará intrinsecamente relacionado a apropriação da base natural. Portanto é plausível a idéia de que extinta a reprodução desta base natural estaria também comprometida a manutenção da vida humana e de todas as demais espécies.
A base do trabalho está na extração de recursos naturais, que manipulados pelo homem (ou pela máquina) torna-se um produto, o qual somos instigados a consumi-lo, progressivamente de maneira passageira e, após, retorná-lo em forma de lixo para a natureza o prejuízo à ordem natural chega a ser tão amplo que não basta focalizar na extração de recursos naturais para compreendê-la. Tal degradação representa um detrimento a condições indispensáveis a vida, como a qualidade das águas e a fertilidade dos solos.
Quando a extração e a poluição atingem níveis da qual a natureza é incapaz de reproduzi-las na mesma medida em que é desapropriada de suas qualidades, daí as manifestações da crise ambiental. Estas manifestações foram exaustivamente enfatizadas nas relações capitalistas. Na existência deste modelo acentuam-se duas características de agravamento social, a pobreza e o crescimento populacional.
A pobreza (contemporânea) no geral foi acerada pelo desemprego, e a ausência de trabalho, provocada (também) pelo desenvolvimento tecnológico, fator conhecido como desemprego tecnológico que seria a substituição do trabalho vivo pelo desempenho das máquinas (tanto na cidade quanto no campo).
Já o crescimento populacional também inserido no hall de anomalias sociais, teve causa e obviamente conseqüência. É inviável para a natureza comportar o aumento radical da população, este aumento gera um conflito no ecossistema, este possui limitada capacidade de extração e absolvição de dejetos, assim, qualquer espécie que apresentar um crescimento robusto, inevitavelmente estará criando um desequilíbrio ecológico. (FOLADORI) Mas ressalta-se que este desequilíbrio não estaria sendo violentado meramente pelo crescimento populacional, mas pela responsabilidade das relações capitalistas.
As nações desenvolvidas da América do Norte (EUA e Canadá) geram um consumo energético, em média, dez vezes superior ao consumo da África e da Ásia, no entanto possuem uma taxa de crescimento demográfico três vezes inferior a devida comparação (FOLADORI, 1999:32). Segundo Foladori, a população pobre no mundo aumentou (nos últimos 50 anos de século passado) chegando a 22,8% da população mundial, porém o critério utilizado era de renda, até 370 dólares por ano, o que poderia ser considerado como miseráveis, apesar da flutuação cambial.
Todo este desequilíbrio permanece pautado nas relações sociais, que esta cada vez mais para o lucro e para o crescimento ilimitado, mas a exploração ilimitada nos reduz a degradação e a poluição também sem limites. Esta degradação não está apenas para o âmbito do mundo natural, mas representa também uma fragilidade da própria humanidade e, sobretudo, a toda massa dos não possuidores, resultado de um processo histórico, ressaltado na utilização das máquinas, com suas modificações profundas nas relações de produção encurtando o tempo necessário na produção de mercadorias. A máquina aparece como indispensável à mudança do modo de produção em geral. "Trata-se do homem de ferro contra o homem de carne e osso" (MARX, 1982:108).
O uso da máquina produziu efeitos drásticos sobre o trabalhador na medida em que o elimina e o substitui. Afinal uma manufatura que utiliza da tecnologia das máquinas tem condições de produção superior ao modelo independente, de fato a não ser mais independente, sobre o peso da concorrência com a produção de larga escala. A tendência seria substituir o trabalho humano pelas máquinas.

Trata-se para o trabalhador não somente da eliminação da especialização e da depreciação de sua capacidade de trabalho, mas da eliminação mesma desta parte cuja flutuação e constante e pertencente a ele como sua única mercadoria ? a a eliminação da sua capacidade de trabalho. Capacidade que se coloca como supérflua ante a maquinaria, seja porque cabe a esta última a realização completa de parte do trabalho, seja porque diminui o numero de trabalhadores que assistem diretamente à maquinaria. Da mesma forma que isso ocorre, também aqueles trabalhadores vinculados ao modo de produção precedente, na concorrência com a maquinaria, acabam por arruinar-se. (Marx, 1982:107)

A redução do tempo necessário a fabricação do produto do trabalho não significou uma redução da jornada de trabalho, muito pelo contrário, o capital além de apreciar a destituição do trabalhador com a longa jornada foi capaz de reduzi-lo a condição de supérfluo e assim diminuir gradativamente a necessidade do trabalho vivo. O capital não é apenas detentor das necessidades materiais ao trabalho (matéria prima e meios de produção). O valor empregado na produção de uma mercadoria (mão de obra, matéria prima e tempo utilizado) alavancado pelo desenvolvimento da tecnologia industrial, não mais define o valor social desta mercadoria, sendo esta diferença a conceituação de mais-valia, apropriada pelos capitalistas.
A dialética entre o capital e trabalho desenvolve-se até o auge de sua contradição (ou inicio deste ápice) do modo que o primeiro seria capaz de violentar o outro na mesma velocidade em que se desenvolve. Esta violência está na intenção de diminuir a quantidade de trabalhadores empregados (através do uso da máquina) e aumentar a jornada de trabalho. E isto parece tarefa obrigatória para o aumento da produção nos moldes do capital.
Marx não fora contra o desenvolvimento da tecnologia, "em primeiro lugar, deve ficar claro que a maquinaria é boa porque poupa trabalho" (MARX, 1982:109). A crítica está embasada no uso desta tecnologia por uns, como instrumento de dominação sobre outros.
O desenvolvimento do trabalho serviu como estrutura para a distinção do homem com o restante do mundo orgânico, no entanto a dependência é mútua. A alteração da natureza não se resume ao desaparecimento da mesma. O trabalho e as modificações do modo de produzir aparecem como mecanismos de desenvolvimento que expande a própria questão ligada ao trabalho, o homem ao modificar a natureza estará também modificando a si, pois a partir, surge um novo entendimento tanto da própria natureza, enquanto meio de recursos naturais, quanto da própria forma em se aprimorar o modo de modificar esta natureza. As respostas às necessidades do homem foram criando novas necessidades e também novas possibilidades.
O homem pré histórico, tendo manipulado ferramentas rústicas, em resposta a sua necessidade real de construir algum objeto, produziu também uma acumulação de conhecimentos e habilidades que tenderiam ao desenvolvimento destas próprias ferramentas, portanto, a alteração da natureza remete a um sentido que transcende a si mesmo. O momento em que o trabalho passa a não responder as necessidades do trabalhador, mas a interesses externos a si, de apropriação da produção em troca de salário, daí o início da alienação sobre o trabalho, e este processo é esclarecido no surgimento da agricultura, nesta, o início da produção excedente as suas necessidades, o homem passa a perceber a possibilidade de explorar o outro para a continuidade da progressão deste excedente.
A princípio esta exploração de daria por meio de violência direta, afinal é mais vantajoso um escravo do que um prisioneiro, e o trabalho de um escravo só foi possível através do uso da força.
Com o desenvolvimento dos meios de produção as relações entre os homens não mais se limitam ao mundo do trabalho. A história permite o conhecimento de que progressivamente as sociedades estariam em um nível de complexidade relacionado ao desenvolvimento das forças produtivas. Em dado momento, para a continuidade do modelo de acumulação de riquezas, se fez necessário a institucionalização do poder de uns sobre os outros, instrumento fundamental para a manutenção da exploração do trabalho. Daí o trabalho alienado , cujo motivo não esta mais para a necessidade do trabalhador, mas para a acumulação de riqueza do outro, que não o próprio trabalhador, é neste sentido também o surgimento das classes sociais.
Estes instrumentos, que não devem se confundir com o mundo do trabalho, mas que interagem entre si, ficaram para a infiltração da ideologia, sustentação (até por uso da força se for preciso) e justificativa da apropriação do trabalho de outrem. O Estado, a política e o Direito foram alguns destes mecanismos, sendo utilizados para a repressão e supressão de movimentos reivindicatórios por melhor condição social, e o uso destes instrumentos como coerção não pareceu estar justificado pela essência da justiça, tão aclamada por tais instituições. A organização societária possibilitou o uso da violência para que uma classe não apenas viva do trabalho de outra, mas também, para que a ideologia de valores de uma, sejam apregoadas a todos.
A alienação da natureza ocorre em simultaneidade com a alienação do trabalho, na medida em que um é a alteração do outro, sendo o produto do trabalho (em concepção geral, não considerando opções do capital como o setor de serviços) a alteração da matéria de origem natural sobre uma prévia concepção de resultado.
A partir desta concepção de alienação da natureza, é possível uma análise em que a aproximação entre ciência natural e ciência social se faz pertinente a fundamentação da critica sobre os impactos do modelo de produção atual.

2.3 A falha na relação homem e natureza

Não é a unidade da humanidade viva e ativa com as condições naturais, inorgânicas, da sua troca metabólica com a natureza, e daí a sua apropriação da natureza, que requer explicação ou é o resultado de um processo histórico, mas a separação entre estas condições inorgânicas da existência humana e esta existência ativa, uma separação que só é completamente postulada na relação do trabalho assalariado com o capital. (Karl Marx, Grundrisse apud FOSTER 2005:13 )

A idéia de metabolismo (stoffwechsel), sobre a perspectiva de Marx, aponta para a história da relação homem com a natureza, da qual a última é totalmente regulada pelo uso do homem. A "falha (rift) irreparável" faz parte de um processo decorrente do modo de produção do capital e do distanciamento da realidade entre o campo e a cidade. O homem parece não se interessar em "governar o metabolismo... com a natureza de modo racional". (FOSTER, 2005:201)
Se a relação do homem com a natureza realiza-se, a princípio, sobre a manipulação direta, historicamente, esta relação passa por profundas modificações, definida pelo desenvolvimento, também histórico, do modo como o homem passa a produzir. Tendo da retirada da natureza, os seus interesses, os homens deveriam estabelecer uma relação em que as condições de reprodução desta natureza, fossem capazes. Aí definimos a base da conceituação do metabolismo homem e natureza. O conceito de metabolismo representa a idéia de "troca material". O sentido (amplo) da palavra metabolismo, para Marx apud FOSTER, 2005:188 pode ser evidenciado nos seus apontamentos científicos: "eu empreguei a palavra... como o processo natural de produção da troca material entre o homem e a natureza."
A critica de Marx apud FOSTER esteve baseado na ênfase de três elementos da economia política burguesa, sendo: a extração da mais valia; a renda fundiária capitalista e a teoria malthusiana da população. O último de grande importância para identificar "uma expressão brutal do ponto de vista brutal do capital" e também por " afirmar o fato da superpopulação em todas as formas de sociedade" O erro primordial da teoria malthusiana, segundo Marx, estava em "não reconhecer o caráter histórico e social da reprodução humana". (Marx, apud FOSTER 2005:203)
A questão histórica traz diferentes interpretações sobre superpopulação, entende-se que um pequeno número em alguma sociedade pode trazer outro significado a outra forma societária. O que seria compreendido como um alto nível populacional, na sociedade ateniense, da antiguidade, atualmente pode representar quase nada em matéria quantitativa.

No capitalismo, pois, a superpopulação era determinada não simplesmente pela existência de uma população excedente relativa de trabalhadores em busca de emprego e portanto de meios de subsistência; mas, mais fundamentalmente, pelas relações de produção que tornavam a existência continuada dessa população excedente relativa necessária ao sistema. (Foster, 2005:204)


A população em busca de empregos está para o interesse do flagelo à condição do trabalho, sendo que neste, está a única fonte de sustentação dos não detentores da riqueza, já a existência continuada desta população está para o interesse incansável de acumulação, dando sentido, não a diminuição da produção e, no entanto desemprego, mas ao desenvolvimento desta forma de produzir da qual é possível alavancar o nível de produção empregando cada vez menos o trabalho vivo.
Está no mundo do trabalho a ênfase do desgaste ecológico, mas não necessariamente apenas, já que o homem, em outro momento, chegou a pensar o mundo como obra da criação divina, todas as coisas de Deus para o homem.
A análise ecológia de Marx partia da alienação mútua, entre o mundo do trabalho e a relação do homem com o restante da natureza, sendo indispensável que estes fossem explicados historicamente. Esta alienação serviria também como instrumento que dificultasse a compreensão da interdependência humana com a terra. Na época, parte do discurso ecológico demonstrava exclusivo embate entre o antropocentrismo, como forma de apropriação da natureza, e ecocentrismo, como adoração a natureza. (FOSTER) Porém suas fragilidades estariam expostas em não absolver o materialismo histórico somado a dialética, a fim de melhor compreensão das mudanças através das evoluções da forma de produção.
Marx analisou a alienação humana em relação à natureza, com base na sua preocupação pela ação da agricultura capitalista e seu prejuízo ao solo, comprometendo sua capacidade de nutrientes, daí sua aproximação com a ciência natural. Para o geógrafo italiano Massimo Quaini apud FOSTER 2005:23 "Marx... denunciou a espoliação da natureza antes do nascimento de uma moderna consciência ecológica burguesa".
Na Inglaterra a terra pertencia a proprietários fundiários que a arrendavam para os agricultores capitalistas, as terras mais férteis tenderiam a uma cobrança superior, no entanto, através de práticas agrícolas como a utilização do esterco de origem animal, drenagem e irrigação, era possível elevar o aproveitamento do solo (menos fértil) de modo racional, mas esta prática não tenderia a ser explorada, visto que o produtor evitaria tais medidas que extrapolasse o prazo de arrendamento. (Anderson apud FOSTER, 2005) Daí o início do grande obstáculo da agricultura capitalista, a degradação da fertilidade do solo. James Anderson (1739-1808) foi um escocês, economista político e agricultor, teve grande influência na teoria ecológica de Marx.

Todo indivíduo que pelo menos já ouviu falar em agricultura, sabe que o esterco animal, quando aplicado ao solo, tende a aumentar a sua fertilidade; é óbvio que ele deve ser sensível ao fato de que toda circunstância que tende a privar o solo desse esterco deveria ser considerada um desperdício antieconômico altamente merecedor de culpa. (Anderson, 1801 apud FOSTER, 2005:206)

O alto desperdício da matéria orgânica, que possibilitaria um melhor aproveitamento do solo, fora criticado por Anderson, sendo que "diariamente (estes dejetos eram) despejados no Tamisa, cuja passagem sujeita as pessoas da parte mais baixa da cidade aos elúdios mais ofensivos" (Anderson apud FOSTER, 2005:207).
Percebe-se o prejuízo a natureza em três níveis, primeiramente pela não utilização da adubagem do solo através do esterco orgânico, seguindo pelo despejamento deste no percorrer das águas, alterando a qualidade da mesma e sujeitando pessoas a toda má sorte das doenças de vinculação hídrica.
A teoria malthusiana de escassez de grãos devido à superpopulação, não apresentava sentido para Anderson, pois a fertilidade do solo nada seria influenciada pela questão numerosa da população, a não ser pela manipulação do solo, atrelada primeiramente a interesses econômicos. "Anderson absolutamente não presume... que diferentes graus de fertilidade sejam mero produto da natureza". (Marx apud FOSTER, 2005:207) A indisponibilidade de alimentos poderá ser alcançada graças às anomalias construídas no campo social e na manipulação do solo, do que, sobre questões relativas à agricultura.
Na sua concepção histórica, Anderson, mesmo tendo formulado uma teoria superior a de Malthus e Ricardo, não fora suficientemente capaz de abordar a questão da ciência da composição do solo. (FOSTER, 2005) Era preciso compreender a exaustão do solo de modo mais profícuo, a fim de embasar a crítica sobre a agricultura capitalista, neste caso, se fez necessário absolver o conhecimento sobre a composição química do solo.
No século XIX a questão primordial sobre a degradação ambiental apontava para o esgotamento da fertilidade do solo e a crescente poluição das cidades. (FOSTER) Já estava reconhecido que a segunda revolução agrícola (entre 1830-1880) fora impulsionada pelo surgimento da indústria de fertilizantes. A preocupação sobre a espoliação do solo estava a tal ponto que "os agricultores europeus da época invadiram os campos de batalha napoleônicos de Waterloo (1815) e Austerlitz (1805) e cavaram catacumbas, de tão desesperados que estavam por ossos para espalhar sobre seus campos." (FOSTER, 2005:212) Esta demanda por fertilidade do solo, estava para o sustento da agricultura capitalista.
A preocupação com a degradação do solo levou os EUA e a Inglaterra, em meados do século XIX, a uma larga busca marítima, sobre ilhas e regiões costeiras, da qual fosse identificado o guano, um esterco de aves marinhas, altamente rico em nitrogênio e fosfatos. De tal forma que os EUA se apossaram de 94 ilhas, sendo que 66 destas ilhas foram oficialmente reconhecidas pelo governo daquele país. (FOSTER)
No entanto estas tentativas não foram suficientes para a demanda da produção, o uso do solo e conseqüente diminuição das suas propriedades minerais não se davam de forma sustentável, o agricultor capitalista retira da terra condições básicas, não havendo então, a necessária reposição dos nutrientes disponíveis, senão por uso de fertilizantes, daí o esgotamento do solo.


Com a nossa prodigalidade e espoliação da terra, a cada ano nós vamos perdendo a essência intrínseca da nossa vitalidade... A questão da economia deveria ser, não quanto nós produzimos anualmente, mas quanto da nossa produção anual é poupado do solo. O trabalho empregado em roubar da terra o seu estoque capital de matéria fertilizante é pior do que o trabalho jogado fora. Neste último caso, trata-se de uma perda para a geração presente; no anterior, torna-se uma herança de pobreza para os nossos sucessores. O homem não passa de um inquilino do solo e é culpado de um crime quando reduz o seu valor para outros inquilinos que venham depois dele. (WARING, 1858 apud FOSTER, 2005:216)

Os países de capitalismo central também utilizaram de nutrientes minerais, provenientes de países latinos, como o Peru e o Chile, para enriquecer suas terras. Para Marx, apud FOSTER o fato destes países já importarem adubo orgânico, necessariamente, apontaria para o entendimento que, no capitalismo, as possibilidades de uma agricultura "auto-sustentável" haviam se findado.
Em uma carta enviada a Engels, Marx apud FOSTER 2005 relata que: "eu precisei vasculhar a nova química agrícola da Alemanha, sobretudo Liebig e Schönbein , que é mais importante para este assunto que todos os economistas juntos." Liebig foi capaz de desenvolver "do ponto de vista da ciência natural, o lado negativo, isto é destrutivo, da agricultura (capitalista) moderna. A gênese do capital, não estava apenas para empobrecer o trabalhador, mas também para empobrecer a composição do solo, da qual a este sistema, foge a capacidade de manter os meios de reprodução, das suas condições naturais. (FOSTER)
"Todo sistema agrícola baseado na espoliação da terra conduz a pobreza" (Carey apud FOSTER, 2005:217). E esta pobreza está para a base do próprio sistema que a causa, afinal, havendo a degradação progressiva do solo, e sua exaustão, como proverá condições básicas de sobrevivência, as próximas gerações?

"Se nós não conseguirmos conscientizar melhor o agricultor sobre as condições nas quais ele produz e dar a ele os meios necessários ao aumento da sua produção, as guerras, a emigração, as epidemias, inclusive de fome, vão inevitavelmente criar condições de um novo equilíbrio que vai solapar o bem-estar de todos e finalmente levar à ruína da agricultura". (Liebig, 1862 apud FOSTER, 2005:217)

Além de não conseguirem estabelecerem uma relação sustentável com a "sua" terra, o países de capitalismo central, poderiam facilmente se apropriar de recursos naturais de economias não desenvolvidas. A relação entre os países de capitalismo central e de economias não desenvolvidas estariam apenas, inicialmente, para o interesse econômico da primeira.
O distanciamento da cidade para o campo, através do processo migratório e posterior inchaço das cidades, trouxe as condições para o que Marx apud FOSTER apresenta como "falha irreparável" no metabolismo social. O desenvolvimento do capital tanto na agricultura quanto na indústria, se aliam, para degradar as condições dos homens, através da exploração do trabalho, e para destruir as condições do restante da natureza, através da continuada espoliação da terra.
A degradação da terra não se limita ao campo, ao contrário, as cidades com toda sua produção de lixo, (resultado, não da necessidade do homem, mas do que a sociedade capitalista presume como qualidade de vida, regulada pelo consumo) sua poluição atmosférica, provocada pela emissão de gases poluentes, e a degradação das águas através do sistema de esgoto.
Marx alertava que o trabalho, não seria a única fonte de riqueza material, isto é, dos valores de uso que ele produz. A desapropriação da natureza, seus limites, esteve presente, nas sua preocupações, entendendo que, qualquer modelo posterior ao capitalismo iria de deparar com a escassez de recursos naturais. Era preciso entender que, a riqueza material produzida, não deveria ser exclusiva do trabalho, mas a contribuição da natureza, como essência para a existência desta riqueza. É como se o trabalho fosse "o pai da riqueza material, a terra é a sua mãe." (Petty apud FOSTER, 2005:236)
Marx demonstrou profunda preocupação com a sustentabilidade , ao passo que, a mudança para o socialismo (por exemplo) não levaria, automaticamente, a conquista da relação sustentável com a natureza. Para Marx, a racionalidade do homem com o restante da natureza, havia sido completamente violada, no sistema capitalista. (FOSTER)
A exploração da natureza fora percebida em todas as organizações societárias que "sempre se mostrou tão ativo na destruição das florestas que tudo que foi feito pela sua conservação e produção é completamente insignificante na comparação". Marx e Engels, 1978 apud FOSTER, 2005:232 Na época a tentativa de aproximar a natureza para a cidade se dava na criação de parques e afins, Marx apud FOSTER 2005:233, não pouparia críticas: "os veados nos parques dos bacanas são um rebanho domestico comportado, tão gordo como os vereadores de Londres".
Marx, apud Foster 2005:229 comentaria sobre a poluição das cidades: "Em Londres... eles não conseguem fazer nada de melhor com o excremento produzido por 4,5 milhões de pessoas do que poluir com ele o Tâmisa, a um gasto monstruoso".

2.4 A vulnerabilidade da Natureza: aquecimento global e poluição

A superpopulação da qual Malthus havia referenciado, em dado momento histórico, e sua transferência e acumulação, ocasionou um grande desequilíbrio na ocupação destas cidades, toda via de forma desigual. A migração da grande população rural acabaria por submeter os "empobrecidos no campo", aos espaços da cidade de maior insalubridade, de maior poluição e deficiência do sistema de saneamento, estes últimos, deixando-os em condições vulneráveis as doenças hídricas, por exemplo.
Os rios estiveram sempre próximos a condição humana, visto que, o homem pré histórico, ocuparia regiões próximas aos rios, para desenvolver a agricultura e daí sua reprodução. Já nas civilizações antigas, os homens, não fizeram além do que a adoração e a imploração aos rios. (ALMEIDA, CARVALHO)
A produção de lixo e a falha no sistema de saneamento provocaria, certamente desequilíbrios externos as cidades, estes, também observados pela má utilização dos rios urbanos . Se em Londres, no séc. XIX, não conseguiam fazer nada melhor, com a produção de excrementos da população, de milhões de pessoas, do que poluir o rio da cidade, mais de um século depois, em uma destas colônias de outrora, da qual Marx, dizia ter sido importante fonte de extração de riquezas, indispensável para o novo modo de produção, ainda "não conseguem fazer nada melhor" do que, na tentativa de despoluir o rio, os resíduos gerados pelos restos dos produtos químicos, utilizados neste processo, são novamente despejados no cursor das águas. ( Revista Manuelzão, 2008 nº49 p.10)
A poluição das cidades também levaria a prejuízos desconhecidos, no primeiro momento. O aquecimento global, à exemplo, poderá acarretar em danos irreparáveis, à agricultura, à saúde das populações, à qualidade da águas, e estes danos provocariam, certamente, uma grande desordem social. A agricultura sofrerá danos, tanto pelas modificações do ciclo das chuvas quanto à perda de produtividade do solo, este último, enfatizado pela primeira.
Nas cidades, a alteração do ciclo das chuvas, causara um fenômeno conhecido como estresse hídrico ou enchentes. O aquecimento também afetará a saúde. (Confalonieri, 2002 apud CONRADO, et al.) As mudanças climáticas possuem como causador, o acúmulo de gases na superfície do planeta, impossibilitando assim, a circulação de raios infravermelhos para fora do globo terrestre, a emissão destes gases intensifica a forma de absolver e de reter a energia solar. (BRASIL apud Gonçalves 2007) e toda esta poluição esta atrelada ao modo de vislumbrarmos o consumo.
O ciclo da extração e queima de petróleo e carvão é o principal causador, mas não única a fonte. (CONRADO, et al.) E os efeitos deste fenômeno vão desde o desequilíbrio das épocas de chuvas quanto à extinção de espécies vegetais e animais. O derretimento das geleiras (notificados desde a década de 1960) além de elevar o nível do mar, aumentaria também a emissão de carbono. As águas (e sua ausência) provocará danos às populações, havendo o crescimento do nível do mar, regiões costeiras de água doce poderão facilmente ser submersas.
A qualidade das águas poderá provocar doenças como a cólera, hepatite A e leptospirose, através tanto do consumo, quanto apenas do contato. (CONRADO, et al.) Poderão ser evidenciados conflitos da ordem social, se a disponibilidade de alimentos, também regulado pela indústria (ABRAMOVAY, 1985) estiver em crise, (pelos danos à agricultura) poderá haver grandes conflitos, pelo acesso a estes alimentos.
O aquecimento colocará também a segurança alimentar em risco, além do prejuízo à agricultura, trará também danos à produção de derivados do mar.

As modificações climáticas poderão levar a transtornos nas correntes marítimas, as quais deixarão de levar nutrientes as costas da Antártida, prejudicando o crescimento do krill, crustáceo minúsculo que é a base da cadeia alimentar dos oceanos. Isto poderá levar á diminuição da biota marinha e à baixa oferta de alimento a comunidades tradicionalmente consumidoras de pescados e/ou frutos do mar (Novacek e Cleland, 2000 apud CONRADO, et al.)

A criação de gado será afetada pelo aumento de verminoses e parasitoses (Havvell et al, 2002 apud CONRADO, et al.). Haverá secas em algumas regiões e excesso de chuvas em outras. O impacto da mudança climática em países pobres pode ser de vinte a trinta vezes maior do que em países industrializados. Já "nas favelas urbanas, pela deficiente coleta de lixo" e condições de acesso a habitação "e má drenagem, poderão ocorrer surtos de leptospirose". (CONRADO, et al.) Havendo o surto de doentes, haverá sem dúvida o aumento no gasto com a saúde, os doentes não estarão aptos ao trabalho, portanto o aumento do gasto e diminuição de arrecadação, daí a redução do PIB. Estas previsões parecem anunciar, apocalipticamente, o fim do mundo provocado pela ação antrópica.

2.5 O Desenvolvimento Sustentável: A utopia do capital

O sistema capitalista, no mundo globalizado, persiste na legitimação da ordem, diante das ameaças da natureza. Para tanto a apropriação do discurso de Desenvolvimento Sustentável focado em um caráter polêmico e ambíguo, que fora influenciado por diversificadas leituras e consensos apenas pontuais. (MEDEIROS, ALMEIDA)
Esta idéia de desconceituação é fundamental para um processo de desconstrução do pensamento de sustentabilidade da natureza, atendendo a reprodução do capital. A crítica a varias leituras esta na possibilidade de oscilação de sentidos, podendo assim, transitar entre um significado avançado de desenvolvimento, associado à justiça social, somado a participação política e popular, e preservação, até uma leitura conservadora que o torna semelhante ao conceito de crescimento econômico, ao qual se acrescentou uma variável ecológica. (MEDEIROS, ALMEIDA)
Ora, toda via, a reprodução do capitalismo se deu legitimada em função do Estado, assim, facilmente esta "confusão" de leitura tenderia ao interesse de reprodução do sistema de acumulação. O conceito de desenvolvimento esta atrelado ao crescimento do modo de produção e consumo, daí o consumo, criando condições para a apropriação da natureza, tanto na extração de recursos naturais quanto no recebimento de dejetos, através principalmente do lixo das cidades. Há um realce do âmbito econômico, legando a segundo planos aspectos primordiais, enquanto reinventam possibilidades de negociações:

[As economias desenvolvidas] transmitem a imagem de que estão avançados no cuidado ambiental enquanto aumentam seus lucros com a exportação de produtos para a despoluição, controle e monitoramento ambiental e pode-se dizer que, em alguns casos, utilizam a questão ambiental como poderoso argumento propagandista na atividade de vendas comerciais. (MEDEIROS, ALMEIDA)

As relações econômicas e políticas proporcionam um controle social demasiado, assim a atuação do Estado na implementação de políticas que protejam o mercado. Estas ações, em um mundo globalizado, facilitaria a criação de distorções sobre a conceituação de sustentabilidade da natureza. É preciso questionar o modelo de sustentabilidade legitimado pelo sistema capitalista.
A concepção de sustentabilidade sob uma perspectiva democrática, tenderia a uma reformulação econômica e posterior superação da desigualdade. Seria um erro não orientar a questão social sobre a questão ambiental, pois a resolução de ambas precisa ser encaminhada simultaneamente. (NOVICK, 2009)
As conferências mundiais sobre mudança climática parece se atentar mais para a troca de interesses entre os países do norte (países ricos) e sul (países pobres), onde o primeiro deseja uma omissão de responsabilidade já o segundo se interessa por investimentos para mitigar a pobreza, e pela promessa de transferência de tecnologia, assim, uma mera conciliação de interesses. Na conferência realizada em 1992 (Rio 92), em dado momento de crescimento do neoliberalismo, ficou bem definido que o desenvolvimento sustentável, seria alcançado por via do mercado. (NOVICK, 2009)
Portanto a sustentabilidade da natureza defendida pelo capitalismo, nada mais é do que um crescimento econômico, pautado na produção e consumo, com uma leve característica de preservação ambiental, na medida em que esta preservação não se torne ameaça diante da reprodução do sistema de acumulação, e este, só foi possível mediante a desconceituação de sustentabilidade. Enquanto isto a poluição e consumo ficam como resultado da qualidade de vida capitalista.
É preciso criar meios para que a sustentabilidade, amplie seu alcance para além das relações capitalistas, que adote um mecanismo de desenvolvimento englobando a superação da desigualdade. Sustentável esta na forma como se da a apropriação e uso da natureza e não meramente no aproveitamento dos recursos, não faz sentido o desenvolvimento sustentável, em que o homem e a natureza ainda sejam vistos como fonte inesgotável do processo de acumulação, tanto pela exploração do trabalho de um quanto pela espoliação e uso desenfreado do outro.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Abordar o tema meio ambiente requer entender que este se dá enquanto uma expressão da questão social, embasada nas relações homem, natureza e capital, pois, diante das pesquisas realizadas esta questão foi identificada, e só assim vemos a importância de relacioná-la a outra, identificando as relações existentes entre elas.
Neste contexto percebemos que a questão ambiental passa de uma simples relação de preservação, a uma questão onde se deve compreender a ótica de acumulação do capital, do consumismo, das tecnologias em massa, que podem levar a gerar as questões sociais. Identificamos que a questão social passou por um reordenamento do capital e com isso o Serviço Social tomou novos rumos, passou a assumir um papel fundamental para a sociedade, onde surge novas modalidades para o profissional. No caso aqui abordado a questão ambiental.
Este também parte do interesse de realização de pesquisa bibliográfica, da qual evidenciasse a espoliação da natureza. Para tanto a concepção de materialismo, proveniente do pensamento da antiguidade, fora indispensável para tal abordagem, o antagonismo com a religiosidade está observado no desenvolvimento do texto, dando sentido, a história e distanciamento do homem com o restante da natureza, o aumento das transações comerciais no período feudal, aliado as conquistas de riquezas, foram também passos importantes.
O aproveitamento do tempo para a produção, a eliminação do trabalho vivo através da inovação da maquinaria e a ânsia da acumulação foram base de sustentação para uma profunda transformação social, pautada na forma de produzir e consumir bens.
Através da migração compulsória da população do campo para as cidades, se deu inicialmente, o distanciamento de ambos. O trabalhador empobrecido no campo tanto pela inovação tecnológica aplicada a agricultura quanto pelo arrendamento fundiário , possibilitaria uma migração maciça, devido à disponibilidade de empregos da indústria, da cidade. A superpopulação malthusiana estaria em processo contínuo de deslocamento para as cidades, gerando um desequilíbrio para mesma.
Os desequilíbrios na formação das cidades foram possível, tanto por sua divisão de territórios, regulado pelo mercado imobiliário, quanto pelo acesso aos bens urbanos, como exemplo, os parques e os "espaços verdes", todavia distribuída de forma desigual .
O trabalho influenciado pela sua divisão e diretrizes do modelo de acumulação levaria o trabalhador à completa segregação sobre os meios de produção, assim a alienação do trabalho. Para Marx a alienação do trabalho se forma na mesma medida em que a alienação da natureza, promovendo graves distorções ao ciclo natural da vida, como a degradação do solo (e conseqüente capacidade improdutiva) e o prejuízo da qualidade das águas, este como agravante da situação de saúde das populações. Enquanto, o consumo é cultuado como qualidade de vida. A impossibilidade de manter as condições de fertilidade do solo, na capacidade da larga produção agrícola é o que inicialmente caracteriza a insustentabilidade da agricultura capitalista.
Concluímos que o assistente social tem na questão ambiental um campo de trabalho, onde pode atuar de várias formas, mas que ainda, ocorre timidamente, se comparado a outros campos de intervenção e também principalmente em relação à publicação de artigos relacionados a temática.
Buscamos compreender a particularidade entre o capitalismo e as mudanças ocorridas na sociedade e no mundo do trabalho. A partir desta, foram surgindo outros fatores, decorrente deste sistema, como as desigualdades, a exploração do trabalho, questões políticas e econômicas, degradação ambiental, crises financeiras e conflitos mundiais. O tema aqui problematizado aborda as dinâmicas criadas e recriada pelo capitalismo de acordo com suas necessidade. O capitalismo por sua vez, adota um discurso conservacionista, capaz de inserir uma mínima preocupação com o uso e degradação da natureza, atualmente conhecido como desenvolvimento sustentável.










Duelo a Garrotazos, de Goya.

No entanto a "necessidade" de manutenção do sistema vigente acarretam danos irreparáveis. Na ilustração acima, o "celebre quadro de Goya" (apud ALMEIDA, CARVALHO) reflete a intenção deste trabalho, da qual a natureza seria o palco dos conflitos, enquanto os homens violentam-se mutuamente, e ambos se afundam em um lago movediço, sem a menor possibilidade de conciliação, tanto entre si, quanto pela natureza, dando condições para imaginarmos a ruína de todos, inseridos em uma histórica "...ciranda de valores trocados pelo deus, dinheiro "(...).