EDNA DAS DORES DE OLIVEIRA COIMBRA







O DESAFIO DE ACEITAR E COMPREENDER A CRIANÇA AUTISTA
(SOB O OLHAR DA TEORIA COMPORTAMENTAL)






Rio de Janeiro
2008




Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Teológica Mundial da Graça de Deus, em cumprimento às exigências do Curso de Mestrado em Psicologia Pastoral lato sensu como requisito parcial a obtenção de título de MESTRE sob a orientação do professor Dr. Sinval Soares Ribeiro.




Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de "Mestre em Psicologia Pastoral" e aprovada em sua fase final pelo programa de Pós-Graduação em Teologia.


Dr. Sinval Soares Ribeiro - Orientador


BANCA EXAMINADORA:
Dra. Sonia Maria Amat - PhD


Dr. Rodrigo Fernando de Souza Moreira - PhD





RESUMO

O presente trabalho consiste na investigação sobre as características, necessidades, aprendizagem e interação da criança autista junto ao meio familiar, social, escolar e religioso. A idéia desta investigação foi concebida pela autora como forma de uma metodologia de trabalho com pesquisadores, teóricos e profissionais que se valem dos métodos e princípios teóricos da Psicologia Comportamental com objetivo de analisar e entender as características específicas do comportamento da criança autista nas áreas afetivas e de relacionamento interpessoal. As dificuldades do ensino e do acompanhamento psicoterapêutico dessas crianças, bem como o desafio de um prognóstico satisfatório em todas as áreas citadas a cima têm mobilizado emocionalmente e despertado a atenção de um número crescente de profissionais de saúde, na tentativa de contribuir para uma maior reflexão a respeito das questões implicadas no processo de aprendizagem da criança autista. Por entender que a proposta da Teoria Comportamental produz relevante troca de experiências, pois privilegia as interações e o desenvolvimento cognitivo no processo de comunicação entre a criança autista e o mundo que a cerca, analisa-se a Teoria Comportamental como recurso psicológico no processo de interação e de desenvolvimento da criança com autismo. Para tal, o presente trabalho caracteriza-se como um estudo qualitativo e esta sistematizado de forma que a revisão da literatura permita aos interessados pelo assunto manter contato com a extensão do problema e o contexto em que a pesquisa está inserida.

Palavras-chave: Comportamento. Aprendizagem. Interação. Habilidades

RESUMEN

El actual trabajo consiste en la investigación en las características, las necesidades, aprender y la interacción del niño del autista al lado de familiares, de sociales, referente a escuela y religioso la manera. La idea de esta investigación fue concebida por el autor como forma de una metodología del trabajo con los investigadores, los teóricos y los profesionales que si son válidos los métodos y los principios teóricos de la psicología de Mannering con el objetivo para analizar y para entender las características específicas del comportamiento del niño del autista en las áreas afectivas y de la relación interpersonal. Las dificultades de la educación y del acompañamiento del psicoterapêutico de estos niños, así como el desafío de un pronóstico satisfactorio en todas las áreas citadas la tapa han movilizado emocionalmente y el despertado la atención de un número de aumento de profesionales de la salud en la tentativa de contribuir para una reflexión más grande con respecto a las preguntas implicó en curso de aprender del niño del autista. Para entender que la oferta de la teoría de Mannering produce el intercambio excelente de experiencias, por lo tanto privilegia las interacciones y el desarrollo del cognitivo en curso de comunicación entre el niño del autista y el mundo que la cerca, lo analiza teoría de Mannering como recurso psicologico en curso de interacción y desarrollo del niño con autismo. Para tales se caracteriza el actual trabajo mientras que un estudio cualitativo y éste sistematizan de la forma esa la revisión de la literatura permite a los partidos interesados para conforme a contacto de la subsistencia con la extensión del problema y del contexto en donde se inserta la investigación.
Palabra-llave: Comportamiento. El aprender. Interacción. Capacidades


DEDICATÓRIA

A Alma dos Diferentes
Artur da Távola


".. Ah, o diferente, esse ser especial! Diferente não é quem pretenda ser. Esse é um imitador do que ainda não foi imitado, nunca um ser diferente.
Diferente é quem foi dotado de alguns mais e de alguns menos em hora,
momento e lugar errados para os outros. Que riem de inveja de não serem
assim. E de medo de não agüentar, caso um dia venham, a ser. O diferente é
um ser sempre mais próximo da perfeição.
O diferente nunca é um chato. Mas é sempre confundido por pessoas menos
sensíveis e avisadas. Supondo encontrar um chato onde está um diferente,
talentos são rechaçados; vitórias, adiadas; esperanças, mortas. Um diferente
medroso, este sim, acaba transformando-se num chato. Chato é um diferente
que não vingou.
Os diferentes muito inteligentes percebem porque os outros não os
entendem. Os diferentes raivosos acabam tendo razão sozinhos, contra o mundo
inteiro. Diferente que se preza entende o porque de quem o agride. Se o
diferente se mediocrizar, mergulhará no complexo de inferioridade.
O diferente paga sempre o preço de estar - mesmo sem querer - alterando
algo, ameaçando rebanhos, carneiros e pastores. O diferente suporta e digere
a ira do irremediavelmente igual: a inveja do comum; o ódio do mediano. O
verdadeiro diferente sabe que nunca tem razão, mas que está sempre certo.
O diferente começa a sofrer cedo, já no primário, onde os demais de mãos
dadas, e até mesmo alguns adultos por omissão, se unem para transformar o
que é peculiaridade e potencial em aleijão e caricatura. O que é percepção
aguçada em: "Puxa, fulano, como você é complicado". O que é o embrião de um
estilo próprio em: "Você não está vendo como todo mundo faz?"
O diferente carrega desde cedo apelidos e marcações os quais acaba
incorporando. Só os diferentes mais fortes do que o mundo se transformaram
(e se transformam) nos seus grandes modificadores.
Diferente é o que vê mais longe do que o consenso. O que sente antes mesmo
dos demais começarem a perceber. Diferente é o que se emociona enquanto
todos em torno agridem e gargalham. É o que engorda mais um pouco; chora
onde outros xingam; estuda onde outros burram. Quer onde outros cansam.
Espera de onde já não vem. Sonha entre realistas. Concretiza entre
sonhadores. Fala de leite em reunião de bêbados. Cria onde o hábito
rotiniza. Sofre onde os outros ganham.
Diferente é o que fica doendo onde a alegria impera. Aceita empregos que
ninguém supõe. Perde horas em coisas que só ele sabe importantes. Engorda
onde não deve. Diz sempre na hora de calar. Cala nas horas erradas. Não
desiste de lutar pela harmonia. Fala de amor no meio da guerra. Deixa o
adversário fazer o gol, porque gosta mais de jogar do que de ganhar. Ele
aprendeu a superar riso, deboche, escárnio, e consciência dolorosa de que a
média é má porque é igual.
Os diferentes aí estão: enfermos, paralíticos, machucados, engordados,
magros demais, inteligentes em excesso, bons demais para aquele cargo,
excepcionais, narigudos, barrigudos, joelhudos, de pé grande, de roupas
erradas, cheios de espinhas, de mumunha, de malícia ou de baba. Aí estão,
doendo e doendo, mas procurando ser, conseguindo ser, sendo muito mais.
A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas
deslumbrantes que eles guardam para os pouco capazes de os sentir entender.
Nessas moradas estão tesouros da ternura humana. De que só os diferentes são
capazes.
Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja
suficientemente forte para suportá-lo depois."

A todos os diferentes em geral, e ao meu neto NATHAN NAUM COIMBRA DA SILVA em especial.













AGRADECIMENTOS
A DEUS

Porque ao me fazer diferente dotou-me de peculiaridade para querer entender o outro, diferente ou não. Porque me deu forças para não incorporar os apelidos criados pelos outros, quem sabe, talvez, tentando burla sua própria diferença. Porque me privilegiou com olhos feitos os de águia para enxergar além das minhas diferenças e sorteou-me com a tarefa de buscar compreender as diferenças alheias. Porque me beneficiou com a constante realização dos meus sonhos e injetou-me o desejo de lutar para que o sonho daqueles que sonham ousar, independente de suas poucas ou muitas diferenças, venha, também, a se concretizar. Porque me bastou com o seu amor para suportar minhas dores, minhas angústias, meus dissabores e ensinou-me a respeitar e valorizar as dores, angústias e dissabores dos outros. Porque estabeleceu a sua Luz na minha vida e me fez brilhar mesmo com a minha diferença. E porque tenho certeza que, por Cristo Jesus, Deus fará do pequeno diferente de hoje, o grande modificador de amanhã;
A todos os meus familiares dotados de alguns mais e alguns menos, que direta ou indiretamente, me incentivaram nessa e em tantas outras jornadas, e
Ao amigo SERGIO ARAÚJO COSTA, que com zelo e paciência, trabalhou na encadernação dos muitos artigos, apostilas, textos e trabalhos acadêmicos impressos.


SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................... 11
2. AUTISMO INFANTIL ......................................................................13
2.1 Conceito ......................................................................................... 13
2.2 Características ............................................................................. 17
2.3 Diagnóstico ................................................................................... 20
2.4 Diagnóstico diferencial ............................................................... 24
2.5 Condições médicas associadas ao autismo ........................ 27
2.6 Prognóstico e intervenção .......................................................... 29
3. A ABORDAGEM PSICOLÓGICA COMPORTAMENTAL........... 31
3.1 Conceito....................................................................................... 31
3.2 Os teóricos e suas contribuições ........................................... 33
3.2.1 Thorndike e as Leis da Aprendizagem ................................... 33
3.2.2 Pavlov e os Reflexos Condicionados ..................................... 34
3.2.3 Watson e os Processos de Pensamento ............................... 35
3.2.4 Tolman e a Teoria da Aprendizagem ....................................... 37
3.2.5 Hull e a Aprendizagem ................................................................ 40
3.2.6 Skinner e a Modificação de Comportamento ......................... 41
3.2.7 Bandura e a Teoria Social Cognitiva ........................................ 45
3.2.8 Rotter e os Processos Cognitivos ............................................ 47
4. OS MÉTODOS, MODELOS E PROGRAMAS DE TRATAMENTO ................................................................................ 52
4.1 Análise Comportamental Aplicada (ABA) ...................... 53
4.2 Sistema de Comunicação Através de Troca de Figuras (PECS) ............................................................................................ 58
4.3 Projeto Portage ............................................................................ 61
4.4 Tratamento e Educação de Crianças Autistas e Portadoras de Problemas de Comunicação (TEACCH)............................................................................................................65
5. A ANÁLISE COMPORTAMENTAL .............................................. 68
5.1 A análise comportamental aplicada na Síndrome do Autismo ............................................................................................................ 69
5.2 A família e a criança na busca de compreensão e interação mútua ............................................................................................... 77
5.3 A criança autista no processo de aceitação e interação ......................................................................................... 85
5.3.1 Dos educadores .......................................................................... 85
5.3.2 Da sociedade ........................................................................... 93
5.3.3 Da comunidade religiosa ......................................................... 95
6. O FUTURO DA CRIANÇA AUTISTA ......................................... 97
CONCLUSÃO ............................................................................... 104
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................... 105
ANEXO "A": O QUE NOS PEDIRIA UMA CRIANÇA AUTISTA .............................................................................................................. 108
ANEXO "B": "A MÚSICA DE LILY" .............................................. 110
ANEXO "C": DEZ COISAS QUE TODA CRIANÇA COM AUTISMO GOSTARIA QUE VOCÊ SOUBESSE ...............................................................111

ANEXO "D": CONSTRUA-ME UMA PONTE ............................. 114
ANEXO "E": DESACERTOS DO COMPORTAMENTO ........... 115
ANEXO "F": "ANTI-ANNE FRANK" ??????????..... 116
ANEXO "G": O AUTISMO ?.?????................................... 117
ANEXO "H": "O MEU CLÃ" ............................................................118


1 INTRODUÇÃO


Na qualidade de pesquisadora tenho estado há alguns anos envolvida em estudos e trabalhos visando à aprendizagem e o entendimento das características comportamentais dos clientes com sintomas neuróticos e/ou psicóticos. Todavia, é o diagnóstico de autismo infantil o que mais tem me levado ao questionamento sobre a real esfera de atuação do profissional de saúde, no qual me incluo, diante dessa síndrome. Questiono também a nossa própria formação, em nível de conhecimentos técnicos, para lidar com os sentimentos de revolta e angústia dos pais e, o que é mais importante, a busca do melhor método de tratamento para atender a esse tipo de clientela.
As necessidades de uma criança são as mesmas, independente de como esteja o comprometimento de sua saúde mental. Conciliar o respeito pelos direitos dessa criança com os interesses da coletividade é responsabilidade de cada um e poderá ser facilitada se todos ? pais, familiares, amigos, professores, e psicólogos ? buscarem desenvolver a compreensão de seu próprio papel.
Portanto, aceitar a criança autista é compreender suas limitações, é vê-la e ouvi-la com os olhos do coração, é lutar para que a mesma não se feche em seu autismo, é levá-la a buscar sua motivação, seu elo com o outro, a esperança da busca pelo equilíbrio e, o mais importante, levá-la ao aprendizado, à troca de experiências, à participação, a interagir somando suas diferenças com as diferenças do outro. E esse aprendizado é respaldado em pesquisas sobre a qualidade da relação cognitiva comportamental da criança autista e torna-se fator determinante na busca para o seu tratamento, pois procura enfocar suas habilidades sociais através de um ambiente de aprendizagem, estabelecendo situações que favoreçam o desenvolvimento da cognição. Quando um ambiente de aprendizagem é modelado de acordo com as reais necessidades da criança têm-se uma maior probabilidade de êxito nos objetivos propostos.
Sei que nenhum método de tratamento é auto-suficiente, entretanto, vejo na investigação comportamental uma tentativa de contribuição para uma maior reflexão a respeito das questões implicadas na educação, aprendizagem e interação da criança autista na comunidade onde está inserida.



2. AUTISMO INFANTIL



"Não. Não tenho caminho novo. O que eu tenho de novo é o jeito de caminhar...
Aprendi. O "caminho me ensinou a caminhar cantando, como convém a mim e aos que vão comigo, pois não vou mais sozinho".
(Thiago de Mello)


2.1 Conceito



Desde épocas remotas, o contato com crianças autistas tem mobilizado estudiosos, médicos, pedagogos e psicólogos a buscarem um consenso quanto à definição de autismo.
Por ser o autismo tão perplexo, muitos autores pesquisaram e pesquisam o autismo, sendo fundamental a importância da contribuição dos mesmos na evolução atual desta síndrome.
Foi Plouller quem introduziu, em 1906, o termo autista no campo da psiquiatria após terminar um estudo com pacientes que tinham o diagnóstico de demência precoce. Porém, esse termo só foi difundido cinco anos mais tarde, através de Bleuler, que definiu autismo como perda de contato com a realidade, causada pela impossibilidade ou grande dificuldade na comunicação interpessoal.
A princípio referiu-se ao autismo como transtorno básico da esquizofrenia, que consistia na limitação das relações pessoais e com o mundo externo.
Em 1943, Leo Kanner, diferenciava o autismo de outras psicoses graves na infância. Utilizando o termo difundido por Bleuler, Kanner separou o termo autismo para designar esta doença, definindo o isolamento extremo, a obsessividade, as estereotipias e a ecolalia como critérios primordiais para o reconhecimento dessa síndrome.
No ano seguinte, Hans Asperger, diferenciou um grupo de crianças com retardo no desenvolvimento, sem outras características associadas ao retardo mental, nomeando de "psicopatia autística" a esta doença.
Em 1947, Bender usou o termo esquizofrenia infantil por considerar o autismo como a forma mais precoce da esquizofrenia.
Já Mahler, em 1952, utilizou o termo psicose simbiótica atribuindo a causa da doença ao relacionamento mãe-filho.
Em 1954, continuando suas pesquisas, Kanner descreve o conjunto de sinais por ele visualizado como uma "psicose" referindo que todos os exames clínicos e laboratoriais foram incapazes de fornecerem dados consistentes no que se relacionava a causa do autismo, diferenciando-o dos quadros deficitários sensoriais, como a afasia congênita, e dos quadros ligados às oligofrenias, novamente considerando-o uma verdadeira psicose.
Rutter, em 1967, considerou a falta de interesse social, a incapacidade de elaboração de linguagem responsiva, a presença de conduta motora bizarra em padrões de brinquedo bastante limitados e o início precoce, antes dos trinta meses, como características fundamentais das evidências empíricas encontradas acerca do autismo.
No mesmo ano, Bettelheim, dentro de uma abordagem psicodinâmica, levanta uma etiologia psicogênica para o autismo. Acredita que o autismo é uma defesa contra um mundo insalubre, e que os pais não permitem que o filho saia desse isolamento. Atribui à dinâmica familiar lugar preponderante na etiologia da doença.
Em 1976, a partir de Ritvo, surgem as primeiras alterações dessa concepção que relaciona o autismo a um déficit cognitivo, considerando-o, não uma psicose, e sim um distúrbio do desenvolvimento. Dessa maneira, a relação Autismo ? Deficiência Mental passa a ser cada vez mais considerada.
WING (1988) apresenta noção de autismo como um aspecto sintomatológico, dependente do comprometimento cognitivo.
Para GILLBERG (1990) o autismo é "uma disfunção orgânica". Acrescenta que o novo modo de ver o autismo é "biológico".
O Conselho Consultivo Profissional da Sociedade Nacional para Crianças e Adultos com Autismo dos Estados Unidos (RITVO e FREEDMAN, 1978) define o autismo como uma síndrome que aparece antes dos trinta meses e que possui as seguintes características: distúrbios nas taxas e seqüências do desenvolvimento; distúrbios nas respostas a estímulos sensoriais; distúrbios na fala, linguagem e capacidades cognitivas; distúrbios na capacidade de relacionar-se com pessoas, eventos e objetos.
Essa definição, mais a de KANNER (1943) e a de RUTTER (1967), formaram a base para os critérios diagnósticos do autismo nas duas principais classificações de transtornos mentais: a CID-9 (Código Internacional de Doenças, da Organização Mundial de Saúde - OMS, 1984) e o DSM-III-R (Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais, da Associação Psiquiatra Americana - APA, 1980). Ambos tinham definições e critérios diagnósticos similares, mas diferenças na conceituação: enquanto a CID-9 (OMS, 1984) conceituava o autismo como um subtipo das psicoses com origem específica na infância, evoluindo para esquizofrenia, o DSM-III-R (APA, 1980) o considerava um tipo de distúrbio global do desenvolvimento, apresentando psicopatologia severa com distúrbios evolutivos precoces, caracterizado por atrasos e distorções no desenvolvimento de habilidades sociais, cognitivas e de comunicação. Com a evolução dos conceitos, o autismo, na CID-10 (OMS, 1993), passou a ser considerado um distúrbio do desenvolvimento, e, no DSM-IV (APA, 1995), os transtornos globais do desenvolvimento (TGD) foram retirados do eixo II (prognóstico pobre) e entraram no eixo I (distúrbios mais episódico e transitório), com a possível implicação de que o autismo passou a ser considerado como distúrbio que responde melhor às intervenções terapêuticas, e seus sintomas podem sofrer maiores variações. Os sintomas necessários para determinar um quadro de autismo foram reduzidos de dezesseis (DSM-III-R ? APA 1980) para doze (DSM-IV ? APA, 1995), dentre quatro critérios diagnósticos principais.
No Brasil, ASSUMPÇÃO Jr. (1995), pesquisador e membro do Grupo de Estudo e Pesquisas do Autismo e outras Psicoses Infantis (GEPAPI) estabelece as seguintes condições para o autismo: a) que o Autismo Infantil Precoce é uma síndrome bem definida, passível de ser observada com pequenas dificuldades no curso dos primeiros anos de vida da criança; b) que sua natureza básica está intimamente relacionada com a Esquizofrenia Infantil e, c) que o Autismo Infantil poderia ser uma manifestação da Esquizofrenia Infantil.


2.2 Características


Por ser o autismo uma perturbação do desenvolvimento, suas características são fundamentadas por três grupos de comportamentos, com diversas expressões: disfunções sociais; perturbações na comunicação e no jogo imaginativo; e, interesses e atividades restritas e repetitivas.
Estas manifestações comportamentais devem de algum modo estar presentes desde o nascimento até aos trinta e seis meses de idade, aproximadamente, persistindo e desenvolvendo-se de modos diferentes ao longo do tempo de vida.
KANNER (1943) dá exemplo do bebê autista que não estende os braços para ser levantado pelos pais. E descreve essa ausência de atitudes antecipatórias como sintoma do autismo primário.
O autismo pode coexistir com a debilidade mental, mas é diferente dela. Pode ter múltiplas etiologias relacionáveis com uma disfunção cerebral orgânica. Não há dados que façam concluir sobre traumas psicossociais devido a progenitores psicologicamente menos aptos. Antigas definições implicavam a noção de que os pais de crianças com autismo tinham níveis de educação elevados, o que não é corroborado pelos dados.
Para o CID-10 (OMS, 1993), o que caracteriza a criança autista são os padrões de comportamentos, atividades e interesses restritos, repetitivos e estereotipados.
Para RUTTER (1967) a comunicação e a linguagem são severamente prejudicadas devido a criança autista apresentar dificuldades para participar de jogos imaginativos, falta de compreensão dos gestos, não entender a utilização da linguagem como objetivo de comunicação social e apresentar respostas estereotipadas ou prejudicadas (ecolalia).
Pode haver, se a linguagem for desenvolvida, distúrbios lingüísticos complexos, como uma tendência à verborragia.
O DSM IV (APA, 1995) faz referência a uma hiper ou hiporreação a estímulos sensoriais, como luz, dor ou som. É comum a não identificação de perigos reais como veículos em movimento ou grandes alturas.
AJURIAGUERRA E MARCELLI (1991) salientam que o sorriso social, (no terceiro mês), e a reação de angústia diante do estranho (já no oitavo mês) estão ausentes na criança autista.
MAZET E STOLERU (1990) citam ausência do acompanhamento ocular, evitamento do olhar de outros, olhar periférico e estrabismo na criança com autismo.
GILLBERG (1990) explica que o autismo é hoje considerado como uma síndrome comportamental com etiologias múltiplas em conseqüência de um distúrbio de desenvolvimento. Caracteriza-se por uma dificuldade na interação social visualizado pela inabilidade em relacionar-se com o outro, usualmente combinado com déficit de linguagem e alterações de comportamento.
Em síntese, desde Hermelin e O?Connor (1970), distinguir-se-iam as seguintes características: a) A criança autista apresenta um isolamento específico às outras pessoas. Respondem menos freqüentemente e durante um período mais curto a uma enorme gama de estimulações, incluindo-se nestas, as de natureza social ou quase; b) A curta inspeção visual demonstrada pelas crianças autistas é acompanhada por uma rápida adaptação à luz, a nível cortical. Há, pois uma evidência clara que as crianças autistas atendem à estimulação visual durante um período mais curto que as outras crianças; c) As crianças autistas diferem em relação à estimulação auditiva face às crianças normais e, quando a estimulação auditiva implica aspectos de natureza semântica, o resultado é mais pobre; d) Em tarefa de discriminação visuo-motora, as crianças autistas parecem apoiar-se mais nos índices específicos das respostas motoras. Com a presença destes índices, muitas das tarefas podem ser completadas e, na ausência, não conseguem concretizá-las de um modo tão facilitado e; e) A memória auditiva imediata das crianças autistas parece ser melhor do que à das crianças sem autismo.
WING (1988) sugeriu a hipótese de ser o autismo, parte de um continuum ou spectrum de desordens autísticas. Essas desordens teriam como fator central o prejuízo intrínseco no desenvolvimento para o engajamento na interação social recíproca, o qual é fundamentalmente diferente dos prejuízos descritos nas neuroses ou nos distúrbios de conduta. Esse prejuízo pode ocorrer isoladamente, mas, quase sempre, é acompanhado por prejuízos de outras funções psicológicas.



2.3 Diagnóstico


A classificação é o modo de compreender determinados grupos de acontecimentos. Após o reconhecimento de uma doença, os técnicos podem prognosticar o curso do seu desenvolvimento e indicar um tratamento mais apropriado. Tal como nas doenças físicas, as perturbações do comportamento podem ser identificadas através de procedimentos de classificação, sendo que, cada pessoa portadora de uma perturbação, é ela própria um caso individual, com um único conjunto de problemas.
SOKAL (1974) explica que com um sistema de classificação como instrumento, pode-se usar um processo de identificação ou de diagnóstico, que facilitará a atribuição de categorias organizadas em grupos, e especificadas segundo certas regras.
Para KENDALL (1975) diagnóstico significa exatamente distinguir ou diferenciar os problemas que afligem as pessoas. ACHENBACH (1974) acrescenta que o diagnóstico refere-se a "reduzir a incerteza". Para o diagnóstico de autismo, pelo DSM-IV (1996) são necessários um total de seis (ou mais) itens de (1), (2) e (3), com pelo menos dois de (1), um de (2) e um de (3): (1) prejuízo qualitativo na interação social, manifestado por pelo menos dois dos seguintes aspectos: a) prejuízo acentuado no uso de múltiplos comportamentos não verbais, tais como contato visual direto, expressão facial, postura corporal e gestos para regular a interação social; b) fracasso em desenvolver relacionamento com seus pares apropriados ao nível de desenvolvimento; c) falta de tentativa espontânea de compartilhar prazer, interesses ou realizações com outras pessoas e, d) falta de reciprocidade social ou emocional. (2) prejuízos qualitativos na comunicação, manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos: a) atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem falada (não acompanhada por uma tentativa de compensar através de modos alternativos de comunicação, tais como gestos ou mímica); b) em indivíduos com fala adequada, acentuado prejuízo na capacidade de iniciar ou manter uma conversação; c) uso estereotipado e repetitivo da linguagem ou linguagem idiossincrática e, d) falta de jogos ou brincadeiras de imitação social variados e espontâneos, apropriados ao nível de desenvolvimento. (3) padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades, manifestados por pelo menos um dos seguintes aspectos: a) preocupação insistente com um ou mais padrões estereotipados e restritos de interesse, anormais em intensidade ou foco; b) adesão aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos e não-funcionais; c) maneirismos motores estereotipados e repetitivos e, d) preocupação persistente com partes de objetos.
Atrasos ou funcionamento anormal em pelo menos uma das seguintes áreas, com início antes dos três anos de idade: (1) interação social; (2) linguagem para fins de comunicação social e, (3) jogos imaginativos ou simbólicos. A perturbação não é melhor explicada por Transtorno de Rett ou Transtorno Desintegrativo da Infância.
Anteriormente pelo DSM-III-R (1989) para diagnosticar-se autismo necessitava-se ao menos 8 dos 16 itens seguintes, incluindo-se pelo menos (2) itens do grupo A, (1) do B, e (1) do C: A) Incapacidade qualitativa na integração social recíproca manifestada pelo seguinte: a) acentuada falta de alerta da existência ou sentimentos dos outros; b) ausência ou busca de conforto anormal por ocasião de sofrimento; c) irritação ausente ou comprometida; d) jogo social anormal ou ausente e, e) incapacidade nítida para fazer amizade com seus pares. B) Incapacidade qualitativa na comunicação verbal e não-verbal e na atividade imaginativa, manifestada pelo seguinte: a) ausência de modo de comunicação como balbucio comunicativo, expressão facial, gestos, mímica ou linguagem falada; b) comunicação não-verbal acentuadamente anormal, como no olhar fixo olho-no-olho, expressão facial, postura corporal ou gestos para iniciar ou modular a interação social; c) ausência de atividade imaginativa como representação de papéis de adultos, personagens de fantasia ou animais, falta de interesse em histórias sobre acontecimentos imaginários; d) anormalidades marcantes na produção do discurso, incluindo volume, entonação, estresse, ritmo, velocidade e modulação; e) anormalidades marcantes na forma ou conteúdo do discurso abrangendo o uso estereotipado e repetitivo da fala; uso do "você" quando o "eu" é pretendido; com freqüentes apartes irrelevantes e, f) incapacidade marcante na habilidade para iniciar ou sustentar uma conversação com os outros, apesar da fala adequada. C) Repertório de atividades e interesses acentuadamente restritos, manifestado pelo que se segue: a) movimentos corporais estereotipados como, por exemplo, pancadinhas com as mãos ou rotação, movimentos de torção, batimentos da cabeça, movimentos complexos de todo o corpo; b) insistente preocupação com parte de objetos ou vinculação com objetos inusitados; c) sofrimento acentuado com mudanças triviais no aspecto do ambiente, por exemplo, quando um vaso é retirado de sua posição usual; d) insistência sem motivo em seguir rotinas com detalhes precisos, por exemplo, a obstinação de seguir exatamente sempre o mesmo caminho para as compras e, e) âmbito de interesses marcadamente restritos e preocupação com um interesse limitado, por exemplo, interessado somente em enfileirar objetos, em acumular fatos sobre meteorologia ou fingir ser um personagem de fantasia. D) Início na primeira infância ou infância. Especificar se o início se deu na primeira infância (após os 36 meses de vida).
Pelo CID-10 (1993) encontramos o conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento descrito como: "Grupo de transtornos caracterizados por alterações qualitativas nas interações sociais recíprocas e modalidades de comunicação e, por um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo". Estas anomalias qualitativas constituem uma característica global do funcionamento do sujeito, em todas as ocasiões.
Autismo Infantil - Transtorno global do desenvolvimento caracterizado por: a) um desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes da idade de três anos e b) apresentando uma perturbação característica do funcionamento em cada um dos três domínios seguintes: interações sociais, comunicação, comportamento focalizado e repetitivo. Além disso, o transtorno se acompanha comumente de numerosas fobias, perturbações do sono ou da alimentação, crises de birra ou agressividade (auto- agressão).
Durante os anos 70, estudiosos iniciaram um questionamento que viria a superar a visão do autismo ao grupo das psicoses. Para RUTTER (1985) havia um reconhecimento de que seria necessário distinguir o autismo, das graves desordens mentais surgidas na infância e, as psicoses, cujo aparecimento se faz mais tarde. Isso fez surgir a necessidade de um consenso sobre o diagnóstico do quadro.
Foi RITVO (1976) quem passou a considerar o autismo não mais como um distúrbio do contato afetivo, mas sim um distúrbio do desenvolvimento, associado a um déficit cognitivo. RITVO e FREEDMAN (1978) elaboraram para a National Society for Autistic Children ? NSAC (Sociedade Nacional de Crianças Autistas), uma definição com critérios mais apurados, com o objetivo de homogeneizar os critérios diagnósticos para o autismo. Esta definição enfatizou a base neurobiológica do autismo. Assim, para a "National Society for Autistic Children", o autismo poderia vir a ocorrer em associação com distúrbios que afetam o cérebro, como infecções virais, problemas metabólicos e epilepsia; sendo de extrema importância o diagnóstico diferencial como a deficiência mental, a esquizofrenia, os problemas sensoriais e as afasias receptivas ou expressivas.
Em 1978, Rutter descreveu o transtorno autista como sendo uma síndrome caracterizada pela precocidade de início, invariavelmente antes dos trinta meses de idade, e principalmente pelas perturbações das relações afetivas com o meio, confirmando cientificamente o autismo como sendo uma perturbação absolutamente distinta das demais. Para ele, a criança autista, possuía uma "incapacidade inata" para estabelecer qualquer relação afetiva ou responder aos estímulos do meio.
Portanto, para as crianças com Autismo e outras incluídas nos chamados "Transtornos Invasivos do Desenvolvimento", que têm sua equivalência aproximada ao termo da antiga nomenclatura "Psicose Infantil", deverão ser avaliadas sempre por exames neuropsiquiátricos. Esta necessidade tem sido crescentemente obrigatória nos anos recentes, em função de ter se tornado óbvio que o Autismo e as desordens descritas como "Transtornos de Espectro Autista" estão conceituadas como Síndromes Comportamentais biologicamente determinadas, com etiologias verbais. É importante frisar que o diagnóstico é clínico e não poderá, portanto, ser feito puramente com base em teste e escalas de avaliação.



2.4 Diagnóstico diferencial:



O autismo, embora possa ser visto como uma condição médica e patologizado como uma síndrome, também deve ser encarada como um modo de ser completo, uma forma de identidade profundamente diferente...
(Oliver Sackes)


O conjunto das características que diferenciam o autismo de outras patologias, bem como os seus limites, permite determinar a identidade de uma perturbação. Portanto, com base no DSM-IV (1996) e em autores como AMA (2005), BALLONE (2002), KUPERSTEIS e MISSALGLIA (2005), MARQUES (1998), MESSIAS (1995) e PEREIRA (1996, 1999), o diagnóstico diferencial da perturbação do espectro do autismo deve estabelecer-se com as Perturbações Pervasivas do Desenvolvimento, nomeadamente: Síndroma de Rett, Perturbação Desintegrativa da Infância, Síndroma de Asperger, Esquizofrenia, Perturbação da Linguagem Expressiva, Distúrbio Misto de Expressão e Recepção, e o Atraso Mental. Com base nos autores referidos serão abordadas as características e especificações que auxiliam o diagnóstico diferencial entre elas e o autismo.
Síndroma de Rett: é considerada como portadora de uma etiologia genética. Esta afeta o sexo feminino. Caracteriza-se pelo fato do seu desenvolvimento apresentar um início normal gradual no qual ocorre uma perda das capacidades adquiridas. Como no autismo existe comumente perda da linguagem.
Perturbação Desintegrativa da Infância: é caracterizada pelo desenvolvimento precoce normal, ainda que seja acompanhado por uma desintegração, nos primeiros cinco anos de vida. Quando desta desintegração, ocorre uma perda da linguagem, da necessidade e do prazer de estabelecer contato social, empobrecimento do contato visual, perda de outras formas de comunicação não verbal. No autismo, é no primeiro ano de vida que se observam as perturbações do desenvolvimento.
Síndroma de Asperger: este síndroma surge na DSM-IV em 1994, visto que, anteriormente, a estas crianças, cabia-lhe a denominação de possuir uma personalidade esquizóide. A DSM-IV atribuiu a esse síndroma uma distinção diferenciada do distúrbio autista. Esta distinção baseia-se em aspectos como o fato de o diagnóstico ser mais tardio relativamente ao do autismo, já que os atrasos não são tão evidentes, nem são tão importantes às perturbações da linguagem e da socialização.
Perturbação Evasiva do Desenvolvimento Não Específica: o diagnóstico desta perturbação exige a presença de menos itens e de menor intensidade, além de que apresenta menor compromisso cognitivo e conseqüente atraso mental.
Esquizofrenia: segundo o DSM-IV, o diagnóstico diferencial do autismo com a esquizofrenia infantil fundamenta-se no desenvolvimento normal (ou quase) que é possível identificar durante alguns anos, bem como a presença de sintomas de alucinação que estão ausentes na patologia autista.
Mutismo Seletivo: não é difícil estabelecer o diagnóstico diferencial relativo ao autismo, uma vez que a inibição voluntária da fala se fundamenta num problema de interação social, uma resposta afetiva e intencional, mais do que uma perturbação da linguagem. As crianças com mutismo seletivo possuem competência comunicativa considerada adequada em determinados contextos, o que não ocorre em crianças com autismo.


2.5 Condições médicas associadas ao autismo


Nos dias atuais, o que mais tem merecido a atenção dos investigadores relaciona-se com as temáticas no âmbito da área da genética e no papel dos fatores genéticos que afetam o autismo.
GILLBERG (1989) salienta que embora haja indícios de algum desvio biológico que acompanhe o autismo, não se identificou até o momento nenhum marcador específico. Além disso, algumas alterações neurobiológicas encontradas em autistas também podem aparecer em indivíduos normais, o que dificulta a valorização desses achados Nos casos de autismo em que anormalidades biológicas estejam presentes, SCHWARTZMAN (1995) ressalta que o estabelecimento de relação causal entre elas e o quadro de autismo não pode, entretanto ser afirmado.
Várias condições clínicas têm sido associadas ao autismo e a importância de fatores genéticos investigada. JAMAIN et. al., 2003; MANNING et al. 2004; VINCENT et al., 2000; WASSINK e PIVEN, 2000) explicam que algumas alterações dos cromossomos 7, 15, 22 e X já foram descritas nas crianças autistas. SCHWARTZMAN (idem) salienta que a presença de fatores pré e perinatais envolvidos na gênese do autismo tem sido objeto de estudo de muitos trabalhos.
Algumas condições que podem estar associadas ao Autismo, segundo ASSUMPÇÃO (1993) são: acessos de raiva, agitação, agressividade, auto- agressão, ausência de medo em resposta a perigos reais, catatonia, complicações pré, peri e pós-natais, comportamentos autodestrutivos, déficits de atenção, déficits auditivos, déficits na percepção e controle motor, déficits visuais, epilepsia (Síndrome de West), esquizofrenia, hidrocefalia, hiperatividade, impulsividade, irritabilidade, macrocefalia, microcefalia, paralisia cerebral, respostas alteradas a estímulos sensoriais, retardo mental, temor excessivo em resposta a objetos inofensivos, transtorno de alimentação, transtorno de ansiedade, transtorno de linguagem, transtorno de movimento estereotipado, transtorno de tique, transtorno do humor/afetivos, transtorno do sono.
Além dessas condições, ASSUMPÇÃO (1993), cita algumas síndromes cromossômicas ou genéticas que podem coexistir um quadro de autismo. São elas: acidose láctica, albinismo oculocutâneo, amaurose de Leber, desordem marfan-like, distrofia muscular de Duchene, esclerose tuberosa, fenilcetonúria, galactosemia, hipomelanose de Ito, histidinemia, neurofibromatose tipo 1, seqüência de Moebius, síndrome de Angelman, síndrome de Bouneville, síndrome da Cornélia de Lange, síndrome de Down, síndrome fetal alcoólica, síndrome de Goldenhar, síndrome de Hurler, síndrome de Joubert, síndrome de Laurence-Moon-Biedi, síndrome de Landau-Kleffner, síndrome de Noonan, síndrome de Prader-Willi, síndrome da Talidomida, síndrome de Tourette, síndrome de sotos, síndrome do X-frágil, síndrome de Williams.
Aprofundando-se em seus estudos, ASSUMPÇÃO (idem) chama a atenção para algumas infecções associadas ao autismo: caxumba, citomegalovírus, herpes simples, pneumonia, rubéola, sarampo, sífilis, toxoplasmose, varicela.





2.6 Prognóstico e intervenção


A experiência de se ter um filho autista é deveras angustiante. Para alguns pais o diagnóstico é uma dolorosa surpresa, para outros uma inevitável constatação. FALCÃO (1999) explica que apesar de não existir cura para o autismo é possível reduzir algumas das limitações associadas a esta deficiência. Acrescenta que a intervenção terapêutica pode ajudar a diminuir os comportamentos indesejados e a educação deve ensinar atividades que promovam maior independência da pessoa com autismo.
AARONS & GITTENS (1992) e AMA (2005) explicam que com uma abordagem pedagógica e terapêutica adequada, estas crianças podem vir a desenvolver-se, ainda que de forma diferente das outras crianças.
Independente do tipo de terapia em aplicação existe sempre uma questão do quanto pode uma criança com autismo evoluir. A resposta para esse questionamento é muito complexa, pois essa evolução dependerá da identificação precoce da síndrome, tipo de problema e a sua severidade, eficácia do tratamento e a relação entre os meios de suporte.
AMA (idem) esclarece que assim como o autismo não é identificado por um único sintoma ou comportamento, não há uma abordagem que seja eficiente por si só. Acrescenta que a escolha da abordagem mais adequada deve ser ponderada em função da circunstância do tratamento, conseqüências para a criança e para a família, validade científica, procedimento de avaliação, experiências anteriores, experiências dos terapeutas, tipo de atividades, motivação individual, ambiente, envolvimento familiar, custo, freqüência e local do programa.
Para GORTÁZAR (1989) a intervenção deve fomentar e, inclusive, ensinar explicitamente a produção freqüente de condutas comunicativas sem instigação prévia por parte dos outros, com o objetivo de desenvolver na criança autista uma forma lingüística particular de comunicação.



3. A ABORDAGEM PSICOLÓGICA COMPORTAMENTAL



"Sinta-se parte de uma sociedade que sabe respeitar as limitações. Porque as diferenças não impedem ninguém de continuar a viver com dignidade, de desenvolver atividades, de sorrir, de sonhar. As diferenças não impedem ninguém de voar".
(CORDE)


3.1 Conceito


A abordagem psicológica comportamental tem suas raízes em estudos de aprendizagem, baseados nos princípios da análise experimental do comportamento, propostos por SKINNER (1938, 1953, 1957, 1974), que denomina sua forma de pensar behaviorismo radical. Nesse contexto, comportamento é a interação do homem com o meio ambiente e vice-versa.
Consideram-se comportamentos aqueles publicamente observáveis, bem como os encobertos, os que ocorrem dentro do organismo, como os sentimentos e outros estados subjetivos. Também estes precisam ser analisados para que se possa explicar sua ocorrência.
A terapia comportamental utiliza os princípios básicos do comportamento produzidos pelos trabalhos experimentais para o entendimento do comportamento das pessoas, tanto a nível diagnóstico, como a nível terapêutico. Reforçamento, esquemas, extinção, punição, controle de estímulos, generalização, equivalência de estímulos, controle por contingência, controle por regras verbais, são alguns dos conceitos da abordagem comportamental.
Na concepção behaviorista, educar seria estabelecer "condicionamento" na infância. Segundo MIZUKAMI (1986), no ensino-aprendizagem os comportamentos dos alunos são listados e mantidos por condicionamentos e reforços arbitrários tais como elogios, graus, notas, prêmios, reconhecimento do professor e colegas, prestígio, etc.
No comportamentalismo, o homem é considerado como uma conseqüência das influências do meio ambiente, é considerado como produto do meio (MIZUKAMI, 1986) e este pode ser manipulado. Para que a formulação das relações entre o organismo e seu meio ambiente seja adequada, é necessário considerar três aspectos: a ocasião na qual a resposta ocorreu, a própria resposta e as conseqüências reforçadas. A relação entre esses elementos constitui as contingências de reforço.


3.2 Os teóricos e suas contribuições


3.2.1 Thorndike e as Leis da aprendizagem


Edward Lee Thorndike criou uma abordagem que chamou de conexismo. Segundo ele, se alguém analisasse a mente humana encontraria conexões de força variável entre situações, elementos de situações, respostas, prontidões para responder, facilitações, inibições e direções de respostas. Se todos esses elementos pudessem ser completamente inventariados, revelando o que o homem pensa e faz, e o que o satisfaz e contraria, em toda situação concebível, nada ficaria de fora. Para ele aprender é estabelecer conexões, pois a mente é o sistema de conexões do homem (THORNDIKE, 1931).
A incorporação ou redução de uma dada resposta foi formalizada por Thorndike como a Lei do Efeito: "todo o ato que, numa dada situação, produz satisfação, fica associado a essa situação, de maneira que, quando a situação se repete, o ato tem mais probabilidade de se repetir do que antes". Inversamente, "todo o ato que, numa dada situação, produz desconforto, torna-se dissociado dessa situação, de maneira que, quando a situação se repete, o ato tem menos probabilidade de se repetir do que antes". Uma outra lei formulada e que vai de encontro com esta, é a Lei do Exercício ou Lei do Uso e do Desuso: "toda a resposta dada numa situação particular fica associada a essa situação. Quanto mais é usada na situação, tanto mais fortemente a resposta se associa com ela". Inversamente, "o desuso prolongado da resposta tende a enfraquecer a associação".
Thorndike realizou estudos que implicavam no uso de princípios de condicionamento e reforço para ensinar métodos de solução de problemas ou outras condutas que eram instrumentais para conseguir os objetivos. A base da aprendizagem aceita por Thorndike era a associação entre as impressões do sentido e os impulsos para a ação. Thorndike chama essa associação de "ligação" ou "conexão". Para ele estas ligações ou conexões podem ser fortalecidas ou enfraquecidas pela formação ou rompimento de hábitos.


3.2.2 Pavlov e os Reflexos Condicionados

Em 1903, Ivan Pretrovitch Pavlov publicou o resultado de uma de suas pesquisas a qual chamou de "reflexo condicionado". Essa pesquisa foi resultado de um estudo no qual ele concluiu que um determinado comportamento, daria uma determinada resposta, se estivesse relacionado com uma determinada condição. Para ele, se podem desenvolver reflexos aprendidos podendo assim proceder-se a uma alteração dos comportamentos. Os reflexos aprendidos ou condicionados eram produzidos pela associação de um estímulo novo (estímulo que não produzia inicialmente nenhuma resposta específica) ao estímulo antigo (que já desencadeava o reflexo inato).
Pavlov estudou profundamente a atividade nervosa superior, estabelecendo um conjunto de leis fisiológicas, pois é no córtex cerebral, como ele mesmo explica, que se vão formar, modificar e desaparecer os reflexos condicionados.
Para Pavlov, os processos mentais superiores poderiam ser estudados em termos fisiológicos sem referência à consciência. Por outro lado, o condicionamento tem sido utilizado como uma possibilidade em terapia comportamental.
Ao considerar que a aprendizagem (ou condicionamento) só acontece se o estímulo condicionador for seguido do estímulo não condicionado, Pavlov formula a Lei do Reforço, ou seja, as respostas reforçadas são fortalecidas, enquanto que as respostas que o não são ficam enfraquecidas. Para ele, o que domina o espírito é a atividade do cérebro e, por tal, dedica-se ao estudo da atividade nervosa superior, estabelecendo um conjunto de leis fisiológicas.
Pavlov entende que o condicionamento não se refere somente a situações onde as ações reflexas respondem aos estímulos condicionados, mas também aos estímulos incondicionados que as produzem de forma normal. Para ele, o condicionamento refere-se a qualquer aprendizagem de substituição de estímulos ou aprendizagem de sinais, onde a contigüidade e a repetição são usadas para induzir os aprendizes a generalizar uma conexão estímulo-resposta, já existente a algum estímulo novo. Esse tipo de condicionamento pode ser usado no ensino do vocabulário, por exemplo, mostrando desenhos junto aos seus nomes impressos.


3.2.3 Watson e os Processos de Pensamento


John Broadus Watson concluiu que o comportamento humano era, sob muitos aspectos, semelhante ao comportamento animal. Segundo ele, o comportamento dos organismos complexos responde a situação de acordo com sua rede nervosa, a qual está condicionada pela experiência. Watson se opunha ao método introspectivo de estudo da mente, argumentando não ser ele nem confiável, nem científico. Ele encorajava a rejeição de termos "mente" e "consciência", em favor de ações e ambientes que pudessem ser diretamente observados. Watson acreditava que a psicologia estava passando por um momento decisivo e que deveria concentrar-se no exame de comportamentos públicos e de condições ambientais, a fim de alcançar uma compreensão sólida do indivíduo e das questões afins. Para ele, a hereditariedade é ignorada e apenas se valoriza a influência social.
Watson entendia que se alguém não pudesse observar de três a nove estados de nitidez na atenção, sua introspecção é ruim. Se, por outro lado, um sentimento lhe parecer razoavelmente claro, sua introspecção também é deficiente, uma vez que os sentimentos nunca são claros. Para ele, o comportamento é real, objetivo, prático, ao passo que a consciência pertence ao reino da fantasia. O interesse de Watson estava voltado no comportamento (behavior), não na experiência consciente. Para esse autor o nosso comportamento é uma questão de reflexos condicionados, isto é, de respostas aprendidas por meio do que atualmente se chama condicionamento clássico. Mostramos sociabilidade ou agressão não porque nascemos com um instinto que assim o determina, mas porque aprendemos a agir assim através do condicionamento.
Watson negava que nascemos com quaisquer determinadas capacidades, traços ou predisposições mentais. Tudo o que herdamos é nosso corpo e alguns reflexos; as diferenças quanto à capacidade e personalidade são simplesmente diferenças no comportamento aprendido.
Watson considerava toda a aprendizagem como condicionamento clássico e esse condicionamento, porém, é apenas uma parte do processo de aprendizagem. Devemos não apenas aprender a responder a situações novas; devemos também a aprender respostas novas.
Para esse autor, os métodos de observação seriam a observação, com ou sem uso de instrumentos; os testes; o relato verbal e o reflexo condicionado. No que diz respeito ao relato verbal, Watson alegava que falar era um tipo de comportamento observável. Além disso, limitou os relatos a situações que pudessem ser verificadas como a observação de diferenças de tons, os demais tipos de relatos (imagens mentais, por exemplo) foram excluídos.
Para Watson todo comportamento poderia ser reduzido aos seus constituintes elementares. Seu foco de atenção era as unidades mais amplas de comportamento, ou a resposta total do organismo a uma situação dada. Watson entendia que a aprendizagem do adulto era decorrente dos condicionamentos a que fora submetido na infância. As emoções eram respostas corporais a estímulos específicos. O amor, o medo e a raiva seriam os únicos sentimentos não aprendidos, os demais deles seriam derivados por condicionamentos ambientais.
Watson entendia que o pensamento seria o hábito verbal silenciado pela repressão social, já que os adultos costumavam recriminar as crianças por falarem sozinhas, ou pior, pensarem em voz alta. Sustentava esta idéia porque alguns de seus estudos com crianças mostravam ligeiras vibrações da língua e das cordas vocais durante o ato de pensar.
Já para explicar que o condicionamento pode ser usado para a aquisição de conhecimento, Watson diz que este conhecimento consiste simplesmente em se dizer determinadas palavras, em voz alta ou para si mesmo. A aquisição de conhecimentos é um processo de aprendizagem que produz a seqüência adequada de palavras em resposta a uma questão ou a outro estímulo condicionado. Todo o nosso comportamento, diz Watson, tende a envolver o corpo todo. Manifestamos nossas opiniões com sorrisos ou movimentos de braços, assim como com palavras.



3.2.4 Tolman e a Teoria da Aprendizagem


Edward Chase Tolman usava o termo "expectativa" ao desenvolver uma teoria da aprendizagem que, apesar de considerar os aspectos cognitivos do comportamento, manteve o rigor e a objetividade do behaviorismo. De acordo com a teoria do aprendizado de símbolos de Tolman, um organismo aprende dedicando ou atribuindo signos para uma meta, isto é, o aprendizado é adquirido através do comportamento significativo.
TOLMAN (1932) propôs cinco tipos de aprendizados: aprendizado de abordagem; aprendizado de fuga; aprendizado de evitação; aprendizado escolha-ponto; e aprendizado latente.
Todas as formas de aprendizado dependem da prontidão, meios-fim, isto é, do comportamento orientado para a meta, intermediado por expectativas, percepções, representações e outras variáveis internas ou ambientais. De acordo com Tolman, um novo estímulo (o signo) se torna associado aos estímulos significativos já existentes (o significante) por meio de uma série de pareamentos; não existiu nenhuma necessidade para reforço de modo a estabelecer o aprendizado.
Tolman esclarece que o aprendizado é sempre proposital e direcionado para uma meta, envolvendo frequentemente o uso de fatores ambientais para alcançar uma meta e, os organismos vão selecionar o caminho mais curto ou mais fácil para alcançar uma meta.
No que diz respeito à motivação, Tolman a vê como comportamento intencional em direção a uma meta. Ele sugeriu que as causas motivadoras do comportamento consistem em cinco variáveis independentes: os estímulos ambientais, os impulsos fisiológicos, a hereditariedade, o treinamento prévio e a idade.
Tolman destacou também seis diferentes tipos de aprendizagem: o primeiro tipo de aprendizagem é a formação de catexias. De acordo com a interpretação de Tolman, uma catexia é a tendência de buscar determinadas metas, de preferência a outras, quando se experimenta determinado impulso. Sempre que determinado objeto-meta satisfaz determinado impulso, tende a formar-se uma catexia desse impulso nesse objeto-meta.
O segundo tipo de aprendizagem envolve crenças de equivalência. Trata-se não apenas de crenças segundo as quais, em determinada situação, trará recompensa ou punição, mas cognições de que a situação é equivalente à recompensa ou a punição e, pois, é em si mesma recompensadora ou punitiva.
Estas duas primeiras formas de aprendizagem dependem ambas, das experiências de recompensa ou punição. Este aspecto não está presente, porém, no terceiro tipo de aprendizagem que é a formação de expectativas de campo. Estas expectativas são cognições acerca da maneira como o mundo está configurado, a respeito de "o que leva a quê". Essas expectativas de campo desenvolvem-se através da experiência com o mundo objetivo. Demandas e recompensas podem influenciá-las, indiretamente, modificando o foco de atenção do indivíduo, mas não têm necessariamente conexão nem com as demandas nem com as recompensas.
O quarto tipo de aprendizagem consiste nos modos de cognição de campo que são maneiras de aprender, ou tendências peculiares a pessoas, no sentido de aprender certas coisas mais facilmente do que outras. Em certa medida, naturalmente, são inatas, mas, em certa medida, também são aprendidas. A maneira pela qual se aprende, porém, depende dos modos de cognição de campo.
A quinta variedade de aprendizagem, no sistema de Tolman, é a discriminação de impulsos. Trata-se da capacidade de fazer distinções entre os diferentes impulsos. Esta aprendizagem, naturalmente, tem estreita relação com a aprendizagem de catexias, em que demandas estão relacionadas com objetos-metas.
O sexto e último tipo de aprendizagem são os padrões motores, ou seja, são as habilidades musculares pelas quais um indivíduo realmente atinge as metas e que devem ser levadas em consideração numa teoria completa da aprendizagem. Assim como fez com as causas motivadoras do comportamento, Tolman também buscou explicar a aprendizagem através de quatro variáveis de diferenças individuais: hereditariedade; idade; treinamento e condições endócrinas, medicamentosas ou vitamínicas.


3.2.5 Hull e a aprendizagem


Clark Leonard Hull entendia a motivação como um impulso (drive). Para Hull, o impulso serve para que o organismo busque adaptar biologicamente a condições ambientais específicas diminuindo um estado de necessidade. A teoria de Hull é fisiológica e está relacionada à adaptação do organismo no ambiente, ou seja, ambientes em condições ótimas é igual a organismo bem adaptado e, para se engajar em uma adaptação é necessário motivação. Hull citava a força do hábito como sendo uma persistência do comportamento em função do reforço (condicionamento), e neste sentido, drive é um motor que impulsiona o hábito. Para ele, o reforço é importante, mas sozinho ele não é nada, sendo necessário o impulso para energizar o organismo.
Hull achava que a psicologia comportamental deveria descrever as leis que regem o comportamento automático. As leis estão controladas por princípios e esses são precisos. Hull criou vários postulados sobre a teoria do comportamento: conexões de estímulo-resposta não condicionadas, sendo que o indivíduo tem um preparo orgânico evolutivo para estabelecer essa relação (reflexos), ou seja, tem tendências inatas (aparo biológico) para estabelecer respostas não aprendidas; a recepção de estímulos depende da intensidade, do limiar e do tempo deste estímulo; reforço primário; formação de hábito, motivação primária ou impulso com dois componentes (privação, saciação) e o componente negativo (inanição); incentivo; potencial de reação; comportamento automático adaptativo; princípio da oscilação comportamental (aprendizagem por ensaio e erro); princípio de generalização de estímulos; aprendizagem por discriminação; antecipação do hábito (fuga e esquiva); aprendizagem conjunta que envolve ensaio positivo e negativo (reforçamento e extinção). Vale ressaltar que na teoria hulliana, o impulso não dirige o comportamento, servindo apenas para energizá-lo. A orientação ou condução do comportamento é realizada por estímulos ambientais. A redução do impulso é a base exclusiva do organismo.



3.2.6 Skinner e a Modificação do Comportamento


Burrhus Frederic Skinner desenvolveu o procedimento de modificação de comportamento tanto na área clínica como na área escolar, para transformar comportamentos inadequados ou indesejáveis em outros adequados e desejáveis. O foco é sempre o comportamento manifesto sem haver interesse pelos procedimentos internos ao sujeito ou, o que possa estar passando em sua mente. Skinner não recomendava o uso de punições, pois para ele, o reforço era mais eficaz na instalação e manutenção do comportamento.
SKINNER (1953) contribui muito para a análise experimental do comportamento. Não define psicologia como ciência que estuda o comportamento, mas sim que estuda as relações funcionais. Para ele, o que é importante é descrever o comportamento, as circunstâncias nas quais o comportamento ocorre. Para Skinner, o estímulo discriminativo eram estímulos antecedentes e não impulsos.
Já o ensino para Skinner, corresponde ao arranjo de contingências para uma aprendizagem eficaz. Este arranjo depende de elementos observáveis na presença dos quais o comportamento ocorre, seja uma resposta, um evento antecedente, um evento conseqüente (reforço) e fatores contextuais. Para esse mesmo autor, de acordo com a teoria do reforço, é possível programar o ensino para qualquer comportamento, como o pensamento crítico e a criatividade, desde que seja possível definir previamente o plano final desejado.
Em se tratando de comportamento verbal, Skinner explica que a criança aprende a falar, palavra por palavra, através de reforçamentos sociais sucessivos que obtém dos adultos à sua volta. Este comportamento requer, pois, de, no mínimo, duas pessoas em interação: uma falando e outra ouvindo e reforçando ou extinguindo. Skinner acentua que extinção é um procedimento no qual a resposta dada pelo organismo não desencadeia nenhuma recompensa em várias tentativas, o que acaba por acarretar em sua extinção. Para Skinner, a fala é, pois, um comportamento como outro qualquer, portanto, sujeito as contingências de reforço, de previsão e controle.
A proposta de aprendizagem será estruturada de maneira a dirigir os alunos pelos caminhos adequados que conduzirão ao comportamento final desejado. Ainda segundo Skinner, o comportamento humano é modelado e reforçado, o que implica em recompensa e reforço. Para proceder à análise comportamental do ensino, é necessário considerar os elementos do ensino, bem como as respostas do aluno, pois o ensino é composto de padrões de comportamentos, seguindo objetivos prefixados (MIZUKAMI, 1986).
SKINNER (1986) considera que qualquer ambiente físico ou social, deve ser avaliado de acordo com seus efeitos sobre a natureza humana. Para ele, o conhecimento tem como base a experiência planejada, sendo resultado direto da experiência. Sua preocupação, portanto, não é com a aprendizagem, e sim com o comportamento observável. Para Skinner, quando as pessoas estão aprendendo uma conduta nova, têm mais sucesso se são reforçadas cada vez que dão uma resposta correta. Depois, quando dominam uma nova conduta, a manterão melhor se forem reforçadas de maneira intermitente em vez de sê-lo em todas as ocasiões. Um programa de reforço intermitente ajuda os estudantes a manterem as habilidades sem esperar o reforço contínuo.
Skinner reconhece dois tipos diferentes de aprendizagem. São diferentes porque cada uma envolve um tipo distinto de comportamento: o comportamento respondente e o comportamento operante. Skinner sustenta, porém, que a maior parte do comportamento é de natureza diferente. Este tipo de aprendizagem ele denomina comportamento operante. Enquanto a característica principal do comportamento respondente é que este se dá em respostas a estímulos, a característica do comportamento operante é atuar no ambiente. Skinner fala em comportamento operante como um comportamento emitido pelo organismo, mais do que eliciado por estímulos. A maior parte do comportamento é deste tipo; andar, falar, trabalhar e brincar são constituídos de respostas operantes.
No que diz respeito aos reforçadores de comportamento, Skinner explica que um aspecto importante acerca dos mesmos, tanto positivos como negativos, é que podem ser condicionados. Se um estímulo ocorre repetidamente junto com um reforçador positivo, esse estímulo tende a adquirir a capacidade de reforçar o comportamento. Nesse caso, chama-se reforçador positivo condicionado. Assim também um estímulo que ocorre junto com um reforçador negativo tende a tornar-se um reforçador negativo condicionado.
O tema do reforço negativo evidentemente está relacionado com punição, mas sua exata relação não é óbvia. O reforço negativo resulta da remoção de um reforçador negativo, enquanto a punição envolve a apresentação de um reforçador negativo. Skinner assinala que não se pode confiar muito na punição como forma de evitar a ocorrência de certas respostas. O reforçador aumenta a probabilidade de uma resposta, mas a punição não reduz necessariamente esta probabilidade. Quando reduz, a redução pode resultar de uma dentre três razões: a) o estímulo aversivo usado como punição provavelmente tem efeitos emocionais. Estes efeitos emocionais são comportamentos respondentes. Além de qualquer respondente específico que um estímulo aversivo possa eliciar, provavelmente também elicia respondentes emocionais, mais gerais; b) quando um estímulo neutro é simultâneo a um estímulo aversivo que elicia um respondente, esta situação é uma situação de condicionamento. Quaisquer estímulos que estejam presentes quando a punição ocorre têm a possibilidade, pois, de tornarem-se estímulos condicionados para as respostas emocionais à punição. Esses estímulos condicionados produziriam, então, respondentes emocionais mesmo na ausência da punição original e, c) o terceiro efeito da punição é uma aplicação do reforço negativo baseada nos estímulos aversivos condicionais originários do segundo efeito. Quando o indivíduo se afasta dos estímulos aversivos condicionados, este ato remove esses estímulos e proporciona reforço negativo. Com isso, o indivíduo é reforçado por executar uma resposta que é incompatível com a resposta punida.
De modo geral, Skinner considera a punição um método deficiente de controle do comportamento. Antes de tudo, a punição é enganadora. E, depois, o comportamento emocional que produz provavelmente é indesejável, sob outros pontos de vista. Substituir mau comportamento por choro ou raiva raramente é boa solução.


3.2.7 Bandura e a Teoria Social Cognitiva


Albert Bandura enfatiza o papel do reforço na aquisição e modificação do comportamento. Considera a influência dos processos de pensamento como crenças, expectativas e instruções em seu programa de reforçamento. Para ele, o homem não reage feito um robô às influências externas, mas porque as reações aos estímulos são auto-ativadas. Quando um estímulo afeta o comportamento, o faz porque o sujeito sabe, devido às regras aprendidas em seu grupo social, o que é ou não passível de reforço, age conscientemente antecipando as situações e os comportamentos sociais passíveis de serem reforçados.
A teoria sócio-cognitiva de Bandura (1977) preocupa-se com a aprendizagem que tem lugar no contexto de uma situação social e sugere que uma parte significativa daquilo que o sujeito aprende resulta da imitação, modelagem ou aprendizagem observacional (CRUZ, 1997). Esta teoria representa uma teoria de aprendizagem com largas capacidades de adaptação e aplicação ao contexto escolar. Na sala de aula, a conduta do professor ou a ação de um colega podem facilmente originar uma aprendizagem modelada junto dos alunos. Nesta perspectiva, a aprendizagem é, essencialmente, uma atividade de processamento de informação, permitindo que condutas e eventos ambientais sejam transformados em representações simbólicas que servem como guias de ação (BANDURA, 1996).
De acordo com a teoria social cognitiva desenvolvida por Bandura, quatro processos governam o aprendizado: a atenção (seleção adequada), a retenção (representações cognitivas já existentes), a produção (escolha próxima ao modelo retido) e a motivação (regula a eficácia dos anteriores). Segundo Bandura (idem) apud McCullagh (2003) as crenças de auto eficácia fornecem a maior base para a ação e podem influenciar na escolha da resposta, no esforço e na persistência para atingir os objetivos.
Bandura acredita que ao longo do processo de aprendizagem, um comportamento não precisa ser diretamente reforçado para ser adquirido. Todo ser humano tem capacidade de aprender observando as conseqüências ambientais sobre o comportamento das pessoas a sua volta. Chama esse tipo de aprendizagem como vicariante e o reforço que o possibilitou de vicário. Ou seja, o comportamento pode ser adquirido na ausência do reforço, ainda que o indivíduo espere obter os mesmos tipos de reforçamento que os modelos observados. Por conseguinte, não há, para ele, uma ligação necessária entre um estímulo e uma resposta, ou entre um comportamento e reforço. Ao invés disso, há um sistema que os mede, ou seja, os processos cognitivos da pessoa. Para Bandura, aprendemos sobretudo por modelagem, observando modelos sociais de conduta.
A abordagem de Bandura é um tipo de teoria da aprendizagem social, pois estuda como o comportamento se constitui e se modifica em situações sociais. Segundo ele, as pessoas não agem isoladamente e nem podem escapar às influências que exercem umas sobre as outras. Portanto, para ele, qualquer comportamentalismo que não envolva o estudo das interações sociais é inviável em nossos dias.
Bandura desenvolveu o conceito de auto-eficácia para se referir a auto-estima ou o valor próprio, a sensação ou sofrimento da pessoa em tratar os problemas de sua vida. As pessoas de auto-eficácia elevada possuem, segundo ele, uma percepção positiva de si mesmas, são mais perseverantes e tendem a conseguir seus objetivos. Pessoas com pequena auto-eficácia, sentem-se impotentes e supõem exercerem pouca influência sobre as situações que as afetam. Tendem a ter menos sucesso, o que acaba por reforçar as percepções sobre si mesmas. Bandura acredita que programas de modificação de comportamento podem reverter essa última situação. Para dar um exemplo simples de suas idéias, Bandura acredita que se o comportamento normal é adquirido por modelagens, então, o anormal pode ser modificado da mesma forma. Concentra-se nos aspectos externos do comportamento, no que é observável, e não em supostos conflitos conscientes ou inconscientes anteriores. Tratar o sintoma e tratar o distúrbio para ele é a mesma coisa.
No que diz respeito ao raciocínio, Bandura o amplia a toda situação de aprendizagem e considera que o mesmo pode de início, se fundir com a observação. Ele explica que a referência à conduta das pessoas que servem de modelo é uma forma de aprendizagem fortemente presente nas situações da vida cotidiana. Estes modelos podem ser congêneres ou não: adultos, crianças, etc.; eles podem também corresponder a símbolos, cujo valor social é importante: as palavras; as idéias que são valorizadas socialmente; as imagens; os acontecimentos, etc.


3.2.8 Rotter e os Processos Cognitivos


Julian Rotter começou a interessar-se pelo papel do reforço na aprendizagem por entender que o comportamento era influenciado não só pelo valor atribuído ao reforço, mas também pela representação que o sujeito fazia da relação entre este e o seu comportamento.
Rotter iniciou uma investigação sobre a natureza do reforço eficaz, tendo sustentado que este só opera quando percebido pelos sujeitos como relacionado com o seu próprio comportamento.
ROTTER (1975) esclarece que a teoria da aprendizagem social é uma teoria molar da personalidade que procura integrar duas correntes diferentes, mas significativas, da psicologia americana: as teorias de estímulo - resposta ou do reforço e, as teorias cognitivas ou de campo. É uma teoria que procura lidar com a complexidade do comportamento humano, sem deixar de utilizar conceitos definidos operacionalmente e hipóteses testáveis empiricamente.
BERNSTEIN & NIETZEL (1980) explicam que a teoria da aprendizagem social de Rotter constitui uma das principais abordagens cognitivo-comportamental, que contribuiu para diluir as fronteiras rígidas existentes entre as teorias cognitivas e as teorias behavioristas.
Em termos gerais, esta teoria utiliza quatro conceitos básicos na avaliação e previsão do comportamento: potencial de comportamento, expectativa de reforço, valor de reforço e especificidade da situação psicológica.
O potencial do comportamento refere-se à probabilidade de ocorrência de um dado comportamento numa situação ou conjunto de situações. Este potencial não é estático, pois, à medida que o sujeito encontra novas experiências vão-se alterando as suas expectativas e valores do reforço, o que gera alterações no comportamento.
A situação psicológica refere-se a qualquer componente da situação ou a sua totalidade, à qual o sujeito reage. BARROS et al., (1993) esclarece que nessa interação importa atender ao modo como este percebe ou vivências as situações.
A expectativa do reforço refere-se à probabilidade, que é avaliada pelo sujeito, de que um determinado reforço ocorrerá em função de um comportamento específico da sua parte, numa dada situação ou conjunto de situações. Cada situação, através dos indícios que fornece, desencadeia expectativas de reforço relativamente a comportamentos específicos. A importância e o significado atribuídos a esses indícios dependem das experiências prévias e de determinantes culturais. Assim, a expectativa individual de que um dado comportamento conduzirá a um determinado reforço depende da forma como a situação é caracterizada e avaliada. Também o valor de reforço pode variar de acordo com a situação em que ocorre: um sujeito pode esperar ser recompensado por um comportamento numa certa situação e não noutra. Igualmente, o valor atribuído a um reforço pode ser elevado numa situação e relativamente baixo noutra (PHARES & ROTTER, 1967).
Se avaliarmos o impacto de uma teoria pelo número de estudos que gera, teremos de considerar a teoria da aprendizagem social de Rotter, na qual o conceito lócus de controlo ("lugar" de controle) é central, como uma das que mais influência tem exercido em vários domínios da investigação psicológica (BARROS, 1991).
De acordo com DUBOIS (1987, in BARROS et al., 1993) os conceitos que estão na base da teoria da aprendizagem social de Rotter, podem ser derivados de seis postulados: a) quer as variáveis de personalidade, quer as características do meio, consideradas individualmente, não explicam o comportamento. É preciso considerar a "interação do sujeito com seu ambiente significativo" ou situação psicológica, que se deve entender como subjetiva uma vez que é avaliada por um sujeito (ROTTER, 1954); b) os comportamentos sociais são aprendidos e não determinados biogeneticamente; c) a personalidade é construída através de experiências variadas vivenciadas pelo sujeito; d) as variáveis situacionais ou específicas (características particulares da situação) e as variáveis disposicionais ou gerais (características inerentes ao sujeito) são importantes; e) de modo a controlar as situações, os comportamentos orientam-se por objetivos, e f) a probabilidade de um comportamento depende "não só da importância dos fins ou dos reforços, mas também da antecipação ou da expectativa acerca desses fins".
Assim, a teoria da aprendizagem social descreve o comportamento como uma função das expectativas, do valor do reforço e do impacto das situações psicológicas, pondo em relevo a cognição e o comportamento, as expectativas e os reforços, as características individuais e as influências situacionais (BARROS, 1991).
Assim, para Rotter, as expectativas numa situação precisa baseiam-se na percepção do sujeito da probabilidade de reforço do seu comportamento graças às satisfações materiais ou emocionais ligadas ao sucesso. A probabilidade de sucesso depende do conceito de competência do sujeito e da sua avaliação de dificuldade da tarefa (Cf. FONTAINE, 1987).
RIBEIRO (2000) explica que o conceito lócus de controlo refere-se às expectativas generalizadas de controle interno e externo sobre o reforço, que são definidas por ROTTER (1966) da seguinte forma: "Quando um reforço é percebido pelo sujeito como se seguindo a uma ação sua, mas não sendo inteiramente contingente a essa ação, é normalmente percebido como o resultado de sorte, acaso, destino, sob o controle do poder de outros, ou como imprevisível, dada a grande complexidade das forças que o envolvem. Quando um acontecimento é interpretado deste modo por um sujeito, diz-se que possui uma crença de controle externo. Se o sujeito percebe que o acontecimento é contingente ao seu próprio comportamento ou à características suas, relativamente permanentes, então, diz-se que apresenta uma crença de controle interno".
RIBEIRO (2000) ressalta que enquanto o locus de controlo interno se refere à percepção de controle pessoal sobre o resultado da situação ou o reforço e, por isso, tende-se a percebê-lo como resultante das próprias ações, o locus de controlo externo refere-se à percepção da falta de controle pessoal sobre a situação ou de que o resultado não é ou não está dependente do próprio comportamento, e por isso, há uma tendência a percebê-lo como resultante de fatores exteriores como sorte ou acaso. Os sujeitos podem ser classificados ao longo de um continuum desde uma internalidade extrema a uma externalidade extrema.
RIBEIRO (idem) acrescenta que no que concerne a "vantagem" da internalidade sobre a externalidade, apesar de o próprio ROTTER (1966) ter sugerido que os internos tendem a desenvolver mais esforços de realização, a estar mais atentos aos aspectos do meio ambiente que fornecem informações úteis para o seu futuro comportamento, a atribuir maior valor as competências ou reforços de realização e a mostrarem-se mais resistentes as tentativas sutis para influenciar, do que os externos, pensar em promover a internalidade em detrimento da externalidade, é partir da hipótese de que é melhor ser interno do que externo o que nem sempre acontece. Em alguns casos, uma forte internalidade pode conduzir, por exemplo, a acentuados sentimentos de culpa se as coisas correm mal (PHARES, 1978).
Da dependência de fatores exteriores, o sujeito pode ou não desenvolver gradualmente um controle e domínio sobre si e sobre os outros. ROTTER (1966) considera que um antecedente importante para a externalidade é a incapacidade da criança de antecipar a disciplina dos pais devido a: inconsistências no comportamento dos pais; inconsistências entre os pais; e inabilidade para perceber alguma consistência que possa de fato existir.



4. OS MÉTODOS, MODELOS E PROGRAMAS DE TRATAMENTOS


Impedir que uma criança, independente do grau do seu comprometimento (físico, intelectual ou mental) tenha uma "ponte" para que possa compartilhar sua comunicação, verbal ou não-verbal, com o outro e toda a experiência que esse compartilhamento proporciona é privá-la de viver em sociedade, é tirá-la o sentido de "ser um com o outro".
Na área da saúde mental, SARACENO (1999) afirma que qualquer patologia, independente de suas causas, pode trazer prejuízos aos indivíduos, muito mais por seu caráter segregador e excluente, visto que as pessoas não sabem como lidar com ela, afastando-se de seus portadores, do que pela sua própria sintomatologia.
No caso da criança autista, as características próprias do autismo levam-na a dificuldades iniciais de comunicação que prejudicam sua interação em um grupo. Não motivá-la a superar essas dificuldades é reforçar o quadro de suas incapacidades: de comunicação, de percepção, de interação. Incapacidades essas que, na maioria das vezes, percebe-se serem reforçadas por mitos e por desconhecimento de pais, professores e até mesmo profissionais da área da saúde.
Assim sendo, as intervenções sobre as dificuldades da criança autista são primordiais para se alcançar melhor qualidade de vida não só para a própria criança, como também, para os seus familiares.
HOWLIN (2003) entende que as intervenções precoces são fundamentais para que se previnam os sintomas secundários do transtorno que, após estabilização, ficam mais difíceis de serem modificados.
Para MUNDY & STELLA (2000), focalizar o tratamento em um ou dois comportamentos denominados pivôs, ou seja, considerados centrais para o agravamento do transtorno, pode levar à importantes mudanças no resto dos prejuízos do transtorno.


4.1 Análise Comportamental Aplicada (ABA)


A Análise Comportamental Aplicada utiliza-se de métodos baseados em princípios científicos do comportamento para construir repertórios socialmente relevantes e reduzir repertórios problemáticos (COOPER, HERON & HEWARD, 1989). Freqüentemente, a população indicada para receber serviços oferecidos pelo analista comportamental apresenta repertórios "falhos", ou seja, apresenta uma ausência de comportamentos relevantes, sejam eles sociais (contato visual, habilidade de manter uma conversa, verbalizações espontâneas), acadêmicos (pré-requisitos para leitura, escrita, matemática), ou de atividades da vida diária (habilidade de manter higiene pessoal, de utilizar o banheiro). Ainda, essa mesma população apresenta alguns comportamentos em "excesso", ou seja, emitem comportamentos tais como agressões, estereotipias, autolesões, agressões verbais, fugas. A Análise Comportamental Aplicada oferece, portanto, ferramentas valiosas para a educação da criança autista.
O Guia de Intervenções para pessoas que prestam serviços e para famílias que têm crianças com autismo (2002) explica que a análise de comportamento é o estudo de comportamentos, mudanças em comportamentos e as causas da mudança. Acrescenta que a Análise Aplicada do Comportamento (ABA) é a ciência da aplicação do que é da análise de comportamento para entender a relação entre o comportamento e as condições. O analista de comportamento usa a revisão de dados para desenvolver teorias sobre a razão porque certos tipos de comportamentos ocorrem num contexto particular e depois cria intervenções para alterar os comportamentos. Informação obtida da análise de comportamentos então, é usada para modificar o comportamento sistematicamente de propósito.
O Guia de Intervenções (idem) enfatiza quatro elementos da Análise Aplicada de Comportamentos: a) antecedentes (o que acontece antes do comportamento alvo de avaliação); b) comportamento (que é visto e medido); c) conseqüências (como reforços) e d) contexto (as condições do ambiente: como pessoas, lugares, materiais, atividades).
Desde 1970, a ciência ABA tem sido usada para criar programas para crianças com autismo que ensinam habilidades específicas numa seqüência especializada com o objetivo de aumentar ou melhorar a socialização, a comunicação e o funcionamento geral de adaptação.
No Guia Prático de Autismo (AMA, 2001), a Análise Aplicada do Comportamento é explicada como um tratamento comportamental analítico do autismo que visa ensinar à criança habilidades que ela não possui, através da introdução destas habilidades por etapas. Cada habilidade é ensinada, em geral, em esquema individual, inicialmente apresentando-a associada a uma indicação ou instrução.
O Guia Prático de Autismo (idem) esclarece que os dois pontos importantes na ABA é tornar o aprendizado agradável para a criança e, ensinar a criança a identificar os diferentes estímulos.
CAMARGOS et el., (2005) entendem que para oferecer uma educação baseada na Análise Comportamental Aplicada o analista parte dos pressupostos que os comportamentos observados são vistos como passíveis de serem modificados, e a emissão de comportamentos considerados inadequados não é vista como sintoma de uma doença. A ausência de comportamentos não é vista como imutável. O diagnóstico é visto como procedimento necessário na busca de recursos financeiros, mas não dita a prática do analista do comportamento.
Para CAMARGOS et al., (idem) a principal característica do trabalho realizado pelo analista do comportamento é o comprometimento com a premissa de que todo comportamento possui uma função (causa). A emissão de comportamentos pode produzir diversas conseqüências, e baseados na relação entre a situação em que o comportamento é emitido, o comportamento em si, e a conseqüência de tal comportamento, podemos investigar o que mantém tal comportamento, ou seja, qual é a sua função.
A análise do comportamento pressupõe, portanto, que é fundamental conhecer a (s) variável (is) que mantém um comportamento, e a partir desse conhecimento, propor formas alternativas de se conseguir a mesma conseqüência com um comportamento diferente.
CAMARGOS et al., (2005) pontuam que descobrir quais são as variáveis que mantém a criança se comportando de determinada maneira não é uma tarefa simples e nem a única a ser desempenhada pelo analista do comportamento. Ensinar formas alternativas de comunicação, ou seja, formas mais aceitável de se obter o mesmo que se vinha obtendo via comportamento inadequado é, sem dúvida, mais uma das responsabilidades do analista.
Esses autores chamam a atenção para o fato de que descobrir qual a função de um comportamento que observamos, ou seja, entender o porquê da emissão daquele comportamento (análise funcional) é uma tarefa que pode ser realizada de diferentes maneiras. O modo mais científico, e, portanto mais preciso, tem sido denominado "análise funcional experimental" ou "análise funcional análoga". Esse tipo de análise ocorre em um ambiente controlado e similar a um experimento.
A idéia básica desta metodologia é a de que é possível criar um ambiente controlado em que todos os comportamentos são imediatamente seguidos por uma determinada conseqüência. As conseqüências apresentadas são alternadas (atenção, acesso a objeto preferido, fuga/esquiva) e o experimentador busca uma uniformidade no padrão de respostas/comportamentos.
Existem outros procedimentos cujo objetivo também é o de determinar a função de um comportamento específico. Esses são procedimentos menos experimentais, mas que apresentam as vantagens de não necessitarem de treinos extensivos podendo ser trabalhados no dia-a-dia da criança.
CAMARGOS et al., (2005) acentuam que uma vez determinada a função de um comportamento inadequado, o analista do comportamento deve ensinar comportamentos alternativos que possam gerar as mesmas conseqüências que o comportamento inadequado gerava. Por exemplo, se descobrimos através de uma análise funcional, que um aluno emite comportamentos de autolesão (tais como mordidas na mão) e como conseqüência escapa das atividades propostas, podemos ensiná-lo a entregar ao professor um cartão pedindo um intervalo, ou ainda, um cartão pedindo uma tarefa mais fácil.
Esses autores lembram que caberá ao analista do comportamento, a tarefa de preparar o ambiente de forma que as novas habilidades possam ser ensinadas. O analista do comportamento investiga quais são as habilidades presentes (repertório da criança) e quais são os pré-requisitos para ensinar habilidades subsequentes. Para que o ensino de novas habilidades seja efetivo, o analista do comportamento terá que estudar minuciosamente os procedimentos de ensino propostos pela Análise de Comportamento Aplicada e adaptar individualmente cada procedimento.
CAMARGOS et al., (2005) comentam que o uso da Análise Comportamental Aplicada voltada para a educação especial caracteriza uma prática científica que se baseia em quatro passos fundamentais: a) a avaliação do repertório inicial da criança, que serve para estabelecer uma linha de base, ou seja, para identificar o que o aluno sabe e o que não sabe, e ao mesmo tempo, para identificar que comportamentos inadequados o aluno emite; b) uma vez realizada a avaliação inicial, o profissional deve seguir os passos de definição dos objetivos a serem alcançados; c) elaboração de procedimentos e, d) avaliação do progresso.
Destacam ainda, que o processo não se encerra após o 4º passo. O tratamento de crianças diagnosticadas com transtornos invasivos do desenvolvimento (TID), quando baseado na Análise Comportamental Aplicada, caracteriza-se, assim como tal abordagem, pela constante mudança, experimentação e registro do que é observado.


4.2 Sistemas de Comunicação Através de Troca de Figuras (PECS)


A importância da comunicação é muito mais do que simplesmente falar um com o outro. A comunicação objetiva que, aquele que quer comunicar-se, use método verbal e não verbal para se fazer entender. A criança comunica suas necessidades muito antes de saber falar: chora se está com fome ou se há algum desconforto, aponta um objeto, levanta os braços para que a peguem e essa comunicação é entendida pelo adulto.
A criança autista, seja verbal ou não-verbal, tem que desenvolver um tipo de comunicação para ter sucesso social. Tem que comunicar de algum modo para outros a perceberem. Analisando um sistema de comunicação alternativa que facilite a interação da criança, o Guia de Intervenções para pessoas que prestam serviços e para famílias que têm crianças com autismo (2002), cita o Sistema de Comunicação de Troca de Fotografias (PECS) como um facilitador para se entender a criança com uma linguagem verbal limitada.
O PECS começa ensinando a criança a trocar de desenhos ou gravuras com um adulto, quando necessita pedir algo. Esse sistema de comunicação continua a ensinar a descriminação de símbolos e a seguir, junta-os para formar frases completas. Muitas das crianças mais novas, com este sistema PECS, começam a desenvolver mais a fala. Alguns analistas do comportamento chegam à conclusão de que os letreiros provocam mais a fala porque, cada palavra tem um movimento. O Guia de Intervenções (idem) esclarece que se a criança utiliza um sistema alternativo de comunicação ou não, as seguintes habilidades devem estar incluídas no currículo de comunicação da criança com distúrbios do espectro do autista: olhar para a pessoa quando se chamar pelo nome; olhar para os objetos quando assinalados; responder a quem fala; usar contato de olhar para manter interação; imitar simples ações, sons, canções, e teatro com os dedos; chamar à atenção; usar um objeto quando se quer algo; apontar; combinar o apontar e o olhar para alguém quando se quer algo; saber pedir "mais"; dizer a alguém que "está pronto"; dizer que "não" ou negar; cumprimentarem-se; dizer que "sim" ou concordar; nomear algo; nomear pessoas; e descrever o que os outros estão a fazer.
O Guia Prático de Autismo (AMA, 2001) salienta que o PECS foi desenvolvido para ajudar crianças e adultos autistas e com outros distúrbios de desenvolvimento a adquirir habilidades de comunicação. O sistema é utilizado primeiramente com indivíduos que não se comunicam ou que possuem comunicação, mas a utilizam com baixa eficiência. Enfatiza, ainda, que o objetivo do PECS é ajudar a criança a perceber que através da comunicação ela pode conseguir muito mais rapidamente as coisas que deseja, estimulando-a assim a comunicar-se, e muito provavelmente a diminuir drasticamente problemas de conduta. Enfatiza, também, que o PECS tem sido bem aceito em vários lugares do mundo, pois não demanda materiais complexos ou caros, é relativamente fácil de aprender, pode ser aplicado em qualquer lugar e quando aplicado apresenta resultados inquestionáveis na comunicação através de cartões em crianças que não falam, e na organização da linguagem verbal em crianças que falam, mas que precisam organizar esta linguagem.
A Associação do Panamá de Pais e Amigos de crianças Autistas (APPAA, 2005) explica que o PECS é um processo terapêutico constituído por algumas etapas seqüenciais que se interligam. A primeira diz respeito ao intercâmbio físico, onde os terapeutas evitarão os incentivos verbais, respondendo como se a criança tivesse falado. A segunda é o desenvolvimento da espontaneidade, onde serão permitidas pequenas brincadeiras com o objeto desejado da criança (brinquedo ou alimento). A terceira é a discriminação de fotografias, permutando as imagens no quadro de aprendizagem para que não haja rotinização. A quarta é a estruturação da oração, levando a criança a solicitar artigos presentes e não presentes utilizando uma frase constituída por várias palavras que observa num livro. A quinta é a resposta por parte da criança à pergunta "o que queres", em que o terapeuta iniciará uma questão acompanhada pela presença visual da frase "Eu quero" no quadro de comunicação. E finalizando, a sexta é a resposta e o comentário espontâneo da criança de modo apropriado às questões como "o que queres?" "o que vês?", "o que tens?" e a outras perguntas semelhantes quando estas são feitas de maneira aleatória.


4.3 Projeto Portage


CAMARGOS et el., (2005) assinalam que o Projeto Portage é um projeto amplo de treinamento domiciliar aos pais e dirigidos à educação pré-escolar que teve início em 1969. Ele foi elaborado para desenvolver, programar e demonstrar um programa modelo para crianças em idade pré-escolar, habitantes da área rural de Wisconsin (EUA). Trata-se de um programa de ensino domiciliar que busca envolver os pais na educação de seus filhos, oferecendo-lhes treinos sobre o que ensinar, como ensinar, o que reforçar e como observar e registrar comportamentos. Esses autores realçam que o Projeto Portage é composto por três elementos complexos e distintos: a) uma proposta de procedimento de treino domiciliar; b) um currículo para avaliação e ensino de crianças com necessidades especiais ("Guia Portage de Educação Pré-Escolar") e, c) um Programa de Treinamento de Pais.
CAMARGOS et al., (2005) descrevem que as intervenções do Projeto Portage ocorrem na casa da criança e o ensino é realizado pelos pais. Um profissional treinado é designado para cada criança e família, visitando-as, uma vez por semana, durante mais ou menos uma hora e meia, trabalhando em atividades que desenvolvam a cognição, a motricidade, o autocuidados, a linguagem, a socialização e a estimulação da criança.
Esses autores acrescentam que o profissional antes de tudo busca coletar dados de linha de base para que possa determinar o quanto a criança pode desempenhar as atividades propostas. Essa informação será comparada ao desenvolvimento da criança após uma semana de treino realizado pelos pais nas atividades designadas pelo profissional. Se nessa comparação (avaliação) a criança obtiver um número de acertos acima de 80% em qualquer uma das atividades treinadas, ela será considerada aprendida e deverá ser incorporada na rotina diária da criança. Se a criança apresentar uma qualidade de acertos menor que 80% na atividade, o professor deverá, junto com os pais, analisar as razões e, se necessário, alterar o procedimento de treino, deixando a atividade para ser ensinada por mais uma semana.
Para facilitar as decisões sobre o que ensinar à criança e como planejar as atividades de ensino, CAMARGOS et al., (2005) fazem menção da utilização do Guia Portage de Educação Pré-Escolar e explicam que o mesmo é composto de: a) um inventário comportamental (denominado Inventário Portage) que lista 580 comportamentos divididos em seis áreas de desenvolvimento: cognição, autocuidados, socialização, linguagem, desenvolvimento motor e estimulação infantil; b) um conjunto de cartões descrevendo o comportamento e sugerindo estratégias de ensino, atividades, materiais a serem utilizados e análise de tarefa para cada um dos 580 comportamentos e, c) um manual contendo instruções de como utilizar o inventário e os cartões de ensino além de informações sobre treinamento.
CAMARGOS et al., (2005) mencionam que o inventário comportamental da criança (Inventário Portage) é utilizados para apontar os comportamentos que uma criança específica sabe realizar nas diferentes áreas de desenvolvimento, levando em consideração as seguintes variáveis: a idade, o interesse, o ambiente domiciliar, as prioridades dos pais e as deficiências motoras e sensoriais da criança.
Com relação ao Programa de Treinamento dos Pais, oferecido pelo Projeto Portage, CAMARGOS et al., (idem) citam que os procedimentos e materiais descritos nesse programa são baseados na análise experimental do comportamento e visam habilitar os pais para técnicas mais adequadas de ensino e de manejo do comportamento da criança. Explicam que o programa é composto por: a) um inventário comportamental dos pais, desenvolvido para lhes facilitar o planejamento e a avaliação de programas de ensino, constituído por 82 itens objetivando facilitar o ensino de diferentes habilidades às crianças, bem como a lidar com os possíveis comportamentos inadequados; b) um manual para o professor contendo sugestões para utilizar o inventário comportamental de pais e realizar o ensino de habilidades e, c) um livro de leituras para os pais oferecendo-lhes, em linguagem acessível, princípios da análise comportamental (reforçamento, modelagem, encadeamento, etc.).
Desse modo, no processo de ensino de habilidades de manejo de comportamento infantil, o professor deve avaliar as habilidades de interação dos pais com seus filhos, prescrever-lhes objetivos de ensino, dar-lhes modelo do comportamento adequado, solicitar-lhes que pratiquem o comportamento, oferecendo-lhes feedback sobre essa atuação, reforçar-lhes os acertos, registrar-lhes suas respostas e tornar-se-lhes disponíveis para possíveis consultas.
Estudos descritos na literatura indicam que o Projeto Portage tem sido um modelo útil de intervenção precoce, propiciando as crianças autistas um ganho significativo. Ele foi traduzido para 37 línguas e introduzido em mais de 78 países atendendo diferentes populações.
Para CAMERON (1986), o Projeto Portage tem sido uma plataforma na qual se fundamentam muitos programas de intervenção precoce existente hoje. Seu uso, em termos de pesquisa e intervenção, foi introduzido no Brasil, mais especificamente na Universidade Federal de São Carlos, no final da década de setenta por Williams.
WILLIAMS e AIELLO (2001) operacionalizaram cada um dos 580 comportamentos do inventário comportamental da criança (Inventário Portage) propondo-lhes definições, critérios, especificação das condições de avaliação e descrição do material a ser utilizado. A necessidade de tal operacionalização surgiu da experiência de utilizar o Inventário Portage original e obter baixos índices de fidedignidade entre os observadores ao avaliar o repertório de crianças. Dessa forma, frisam CAMARGOS et al., (2005) a operacionalização do Inventário Portage permite que ele seja usado como um instrumento para: a) realizar avaliação sistemática do repertório de crianças vulneráveis a diversos riscos ou consideradas especiais; b) orientar pais ou familiares para oferecerem uma estimulação compatível com as necessidades da criança; c) capacitar o profissional que executará a avaliação das crianças e orientação dos pais e, d) indicar ao profissional se suas intervenções junto à criança ou família estão surtindo os efeitos esperados.


4.4 Tratamento e Educação de Crianças Autistas e Portadoras de Problemas de Comunicação (TEACCH)


O TEACCH foi desenvolvido nos anos 60 no Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade da Carolina do Norte, Estado Unidos, e atualmente é utilizado em várias partes do mundo. Foi idealizado e desenvolvido pelo Dr. Eric Schopler, e atualmente tem como responsável o Dr. Gary Mesibov.
Na década de 70, Schopler e Reichler, elaboraram o Perfil Psicoeducacional (PEP), revisado em 88 ? PEP-R, com o objetivo de avaliar as habilidades de crianças autistas e/ou com distúrbios do desenvolvimento correlato. É um inventário de comportamentos e habilidades, concebido para identificar padrões de aprendizagem irregulares, em crianças de 0 a 12 anos. Oferece informações sobre imitação, percepção, desenvolvimento motor, integração olho-mão, desempenho cognitivo e cognitivo verbal.
CAMARGOS et al., (2005) concordam que a missão do TEACCH é capacitar indivíduos com autismo a atuar com o maior grau de sentido e independência possível na comunidade e o objetivo máximo é apoiar o portador de autismo em seu desenvolvimento para ajudá-lo a conseguir chegar à idade adulta com o máximo de autonomia possível. Isto inclui ajudá-lo a compreender o mundo que o cerca através da aquisição de habilidades de comunicação que lhe permita relacionar-se com outras pessoas, oferecendo-lhe, até onde é possível, condições de escolher de acordo com suas próprias necessidades.
Esse autor e seus colaboradores discorrem que a meta fundamental do TEACCH é o desenvolvimento da comunicação e da independência e o meio principal para isso, é a educação. Adicionam que avaliação é a ferramenta para a seleção de estratégias e que as mesmas deverão ser estabelecidas individualmente.
CAMARGOS et al., (idem) clareiam que ao contrário de métodos comportamentais, o TEACCH não ataca os problemas de comportamento diretamente, mas tenta analisar e eliminar as suas causas. Lembram que isto não quer dizer que técnicas de modificação de conduta sejam completamente eliminadas do método, mas que estas são utilizadas em situação de risco, nos casos em que medidas tomadas de acordo com o critério anteriormente descrito não tenham sido eficazes.
O Guia Prático para Autismo (AMA, 2001) acrescenta que o TEACCH se baseia na organização do ambiente físico através de rotinas organizadas em quadros, painéis ou agendas e sistemas de trabalho, de forma a adaptar o ambiente para tornar mais fácil para a criança compreendê-lo, assim como compreender o que se espera dela. O Guia Prático também entende que através da organização do ambiente e das tarefas da criança, o TEACCH visa desenvolver a independência da criança de modo que ela necessite do professor para o aprendizado, mas que possa também passar grande parte de seu tempo ocupando-se de forma independente. Sintetiza, explicando que o método TEACCH utiliza uma avaliação chamada PEP-R (Perfil Psicoeducacional Revisado) para avaliar a criança, levando em conta os seus pontos fortes e suas maiores dificuldades, tornando possível um programa individualizado.
A Associação dos Amigos do Autista de Sorocaba (AMAS, 2001) assinala que os objetivos das intervenções educacionais para crianças com autismo serão diferentes, a depender do grau de comprometimento nas diversas áreas de atuação. Lidando com prejuízos cognitivos importantes, o investimento do profissional deverá ser direcionado, mais especificamente, na busca do aumento da comunicação e interações sociais, na diminuição das alterações comportamentais (estereotipias, hiperatividade, etc.), na maximização do aprendizado e independência nas atividades de vida diária.
A Associação do Panamá de Pais e Amigos de crianças Autistas (APPAA, 2005) realça que o TEACCH não é apenas uma simples abordagem ou método, mas sim um programa que procura responder às necessidades dos autistas, recorrendo aos melhores métodos e abordagens atualmente conhecidos para educar e proporcionar o nível máximo de autonomia que os autistas possam alcançar. Isto inclui ajudá-los a compreender o mundo que os rodeia, a aquisição de competências comunicativas que possibilitem o seu relacionamento com os outros, bem como torná-los capazes de fazer opções na sua própria vida.
VATAVUK (2005) salienta que os princípios adotados pelo TEACCH relativos à natureza e tratamento do autismo têm sido constantemente reavaliados face aos avanços ocorridos. Os princípios orientadores atuais são: a) promover a adaptação de cada criança melhorando as suas capacidades através de técnicas educacionais e aceitando os défices, planeando estruturas ambientais de compensação; b) capacitar os pais e outros membros da família para que atuem como co-terapeutas, destacando-se a avaliação cuidadosa de cada indivíduo (envolve processos de avaliação formal e informal); c) desenvolver nos profissionais uma visão holística do problema e das capacidades de cada criança e, d) capacitar os profissionais que trabalham com autistas nas seguintes áreas internas: avaliações da criança em diferentes situações; envolvimento dos pais em colaboração com a família; ensino estruturado; manejo de comportamento; desenvolvimento e aquisição de comunicação espontânea; aquisição de capacidades sociais; promover a área de independência e vocacional desenvolver capacidades de lazer e recreação.
VATAVUK (idem) assinala que os princípios iniciais da abordagem TEACCH partiram de uma visão interacionista, do relativismo do comportamento e da individualização do tratamento. Acrescenta que o programa psico-educacional TEACCH destaca-se por defender o envolvimento dos pais, num processo de desenvolvimento tripartido entre a casa, a escola e a comunidade, e pela aposta na manutenção da prioridade do serviço nas áreas de pesquisa, capacitação de profissionais e conscientização da comunidade.
SCHOPLER (1991) afirma que a proposta do TEACCH é transcultural, que pode ser transferida para outros países com as devidas adaptações. No relatório anual do TEACCH (1991-1992), é comentado que muitos países têm adotado legislação dando direitos a oportunidades educacionais para todas as crianças, e tem tornado a proposta como modelo de atendimento.
AIELLO (2001) reconhece que o TEACCH é um programa que busca trabalhar os déficits da criança autista por meio da estrutura e organização do ambiente. Assinala que vários autores falam da importância da participação familiar no processo educativo de seus filhos especiais e os bons resultados obtidos pelo treino domiciliar de pais (Gallagher, 1998, Williams & Aiello 2001, 1991, Kosloff 1999).



5. A ANÁLISE COMPORTAMENTAL


A terapia comportamental tem suas raízes em estudos de aprendizagem, baseados nos princípio da análise experimental do comportamento, propostos por SKINNER (1938, 1953, 1957, 1974). Estes princípios se originam a partir de pesquisas de laboratório e analisam as relações entre as ações do organismo e seu ambiente.
WINDHOLZ e MEYER (1994) explicam que a terapia comportamental utiliza os princípios básicos do comportamento produzidos pelos trabalhos experimentais para o entendimento do comportamento das pessoas, tanto a nível diagnóstico, como a nível terapêutico. Entender os princípios que estão atuando fornece a estrutura necessária para se desenvolver as práticas terapêuticas e o entendimento do por que certa prática, usada pelo terapeuta, funciona ou não.


5.1 A análise comportamental aplicada na Síndrome do Autismo


GORTÁZAR (1989) salienta que pessoas com autismo normalmente apresentam graves dificuldades para tomar iniciativas na comunicação; apresentam problemas para a comunicação espontânea, tanto verbal como não verbal. Acrescenta que a intervenção deve assegurar a generalização dos objetivos às situações diferentes, pessoas diferentes, mediante sua programação específica. Enfatiza que uma das características mais típica e específica da síndrome autista é a dificuldade severa para generalizar as habilidades adquiridas. As aprendizagens alcançadas, geralmente, se mantêm exclusivamente em frente aos estímulos discriminativos.
PEREIRA (1996) anui que tem sido muito variada a gama de modelos de intervenção e de terapias que são aplicadas às pessoas com autismo. De entre esses, o grande ênfase, desde os anos setenta até aos anos noventa, é o de usar métodos psico-educacionais com base em variadas teorias da psicologia da aprendizagem, mas sobretudo, as teorias da aprendizagem vicariante, e operante. Esse autor assinala que o comportamento da criança é visto como uma resposta às situações de estimulação externa, estas, mais facilmente detectáveis, e internas, nem sempre manipuláveis. O tratamento é orientado para a aprendizagem de novos comportamentos, progressivamente mais adaptativos para a criança, assim como para a diminuição de excessos comportamentais, comportamentos que, como se sabe, são freqüentes e que seria desejável a criança não expressar tanto ou tão intensamente.
PEREIRA (idem) pontua que o tratamento é assim visto como um processo de estabelecimento ou reestabelecimento de novos comportamentos, progressivamente e mais complexamente organizados. Esses modelos de comportamentos são concebidos para poder ensinar a criança os padrões necessários à sua participação na comunidade natural, padrões comportamentais estes, que são também desejáveis a uma melhor realização dos seus potenciais intelectuais e emocionais. Esse autor admite que um número considerável de técnicos ainda sente que, apesar da criança autista ser deficiente deste praticamente o início do seu nascimento, o meio pode não fornecer muito do que a criança precisa.
O Guia de Intervenção para pessoas que prestam serviços e para família que têm crianças com autismo (2002) explica que pela natureza da desordem, nós sabemos que as crianças com autismo usam pouco do seu próprio tempo em determinado envolvimento, apropriado para alcançar o objetivo do comportamento. A tendência deles é estar desligado do que vai à volta deles ou fixados em específico aspectos de objetos ou pessoa. Isto limita as crianças com autismo de descobertas e aprendizagem. A maior parte das crianças aprende sendo interativas com o próprio ambiente, através de observação e limitação. Estas oportunidades de desenvolvimento talvez sejam perdidas para as crianças com Distúrbio do Espectro Autista (ASD).
O Guia de Intervenção (idem) acentua que esse envolvimento refere-se ao montante de tempo que a criança está ativamente interativa com os outros. O objetivo da intervenção para a criança ASD é aumentar o montante de tempo que ela está envolvida através do dia, para obter os resultados identificados. O Guia assinala que essa intervenção é baseada num currículo desenvolvido para responder as necessidades especiais das crianças com autismo. Ele cita que as áreas essenciais para um currículo especial para uma criança com autismo devem incluir o seguinte: a) manter-se ativo no ambiente, especialmente com outras pessoas e em oportunidades de aprendizagem; b) imitação verbal e física. A imitação é vista como um instrumento fundamental na aprendizagem; c) usar a comunicação verbal e não verbal como, por exemplo, gestos, vocalizações e palavras; d) compreender e usar linguagem para comunicar; e) brincar apropriadamente com brinquedos; f) interação com outros em situações de brinquedos; instrução; g) interação recíproca; h) interação espontânea; i) tomar decisões e, j) seguir rotinas diárias e variáveis.
O Guia de Intervenção (2002) salienta que comportamentos provocadores são dirigidos usando um apoio positivo de comportamento. Estes métodos positivos de apoio são um conjunto de princípios que se baseiam na maneira como pensamos e como respondemos à criança e aos seus comportamentos. Os princípios baseiam-se na apreciação dos pontos fortes e dos pontos fracos de cada criança. Praticar métodos positivos de apoio significa conhecer bem a criança e saber que o comportamento de cada uma tem motivo e que este comportamento é uma forma de comunicação. Isto requer reconhecer que todas as crianças crescem e respondem melhor quando são respeitadas e apoiadas a tomarem decisões.
Para esse Guia de Intervenção, as dificuldades de comportamentos demonstrados por crianças com ASD são complexas e podem até criar alguma frustração e confusão àqueles que lidam com a criança todos os dias. O comportamento pode vir na forma de agressão, birra, afastamento, repetição ou atos estereotipados. O Guia considera que alguns desses comportamentos acontecem com as crianças que estão a crescer tipicamente. Nas crianças com autismo, vemos comportamentos que prejudicam o desenvolvimento. Embora alguns comportamentos ocorrem por motivos médicos ou outras razões, a maioria ocorrem devido a (o): a) mal-entendimento social; b) comunicação frustrada; c) desconforto ao ambiente físico; d) ansiedade e, d) preocupações ou interesses intensos.
Esse mesmo Guia de Intervenções destaca que antes de fomentar um plano para resolver o problema de comportamento, tem que haver uma avaliação completa de tal comportamento. Esta avaliação é feita por uma equipe de intervenção que ajuda aos que cuidam da criança, a compreender o que se sucede com a mesma antes do comportamento ocorrer. A intenção desta avaliação é de responder a certas perguntas, tais como: "Por que é que este comportamento acontece?" "Quando é que acontece este comportamento?" "Qual é a função deste comportamento?" "Será que o comportamento é precedido por condições biológicas, ambientais, sensórias e/ou emocionais?" A avaliação também irá tomar nota do que acontece a seguir ao comportamento. "Como é que as pessoas reagem ao comportamento"? A avaliação ajuda a família a compreender como a maneira que eles lidam com o comportamento também pode aumentar ou diminuir a agressividade do comportamento.
Outra contribuição desse Guia de Intervenções é no sentido de orientar para o fato de que além das dificuldades de comunicação, as crianças com ASD também têm falta de habilidade de interação e de brincadeiras. A intervenção na criança com ASD tem que atingir especificamente estas habilidades.
Antes de focar na interação social da brincadeira, a criança necessita saber como brincar com brinquedos adequadamente. Normalmente as crianças começam a brincar sozinhas com brinquedos. Para aumentar o seu sucesso enquanto brinca, o ambiente necessita ser organizado. Logo que a criança comece a ficar mais habituada no seu uso de brinquedos, ela irá usar os brinquedos mais simbolicamente. Isto incluirá a imitação como o dar de beber a boneca ou a falar num telefone de plástico.
Esse Guia de Intervenção acentua que na realidade, as estratégias de intervenção que funcionam melhor com crianças autistas são as que satisfazem as necessidades da criança. Um bom plano irá ter em consideração as necessidades de desenvolvimento e o tipo de aprendizagem de cada criança. Uma criança terá que receber uma instrução mais direta e elevada, e outra criança poderá ter que receber uma menos direta. As crianças com ASD aprendem de maneira complexa. As suas necessidades, como o autismo, transformam-se ao desenvolver-se.
CRUZ (2000), para complementar a argumentação do Guia de Intervenção (2002) chama a atenção para a importância de considerarmos as competências e os estilos próprios de cada criança, bem como de os respeitamos durante o processo de aprendizagem.
MACHADO (2000) reforça que os pais devem ser orientados a usarem "prompts" (sinais) consistentemente, variando daqueles que são extremamente diretivos àqueles que têm um grau mínimo de direcionamento. Como as crianças autistas freqüentemente ainda não aprenderam a tomar seu turno numa interação, os "prompts" devem ser altamente diretivos num primeiro momento, tal como a assistência física para a criança acenar tchau ou dizer à criança o que se espera que ela diga. Esses "sinais" são tratados com o significado de suporte para a participação contínua da criança numa interação, deixando-a saber, exatamente, o que é esperado que ela faça com o objetivo de tomar seu turno na interação. O objetivo é diminuir gradualmente os "prompts" altamente diretivos ou substituí-los por outros menos diretivos. Por ser uma expressão difícil de ser traduzida para o português, o termo "prompt" foi mantido originalmente, poderíamos pensar em "incitadores" de interação.
MACHADO (idem) explica que devido as crianças autistas adquirem as funções da linguagem uma de cada vez e numa ordem de emergência previsível, os pais devem ser orientados a enfocar primeiro, o encorajamento de suas crianças a fazerem requisições tanto para obter fins ambientais (como pedir comida ou pedir aos pais para assoprar bolas) quanto para alcançar fins sociais (como completar parte de uma rotina social). Reforça que os pais podem conseguir isto manipulando o ambiente para obrigar a criança a fazer requisições, oferecendo escolhas, dando coisas aos poucos, sendo criativamente malicioso (servindo sorvete sem uma colher ou esquecendo propositadamente uma parte esperada de uma rotina, por exemplo).
MACHADO (2000) lembra que apoios visuais são importantes com crianças autistas porque sua compreensão visual é quase sempre superior do que a compreensão auditiva, portando os apoios visuais podem ajudar estas crianças a focalizar e compreender melhor. Figuras e gravuras podem ser usadas como uma forma de aumentar a compreensão e ajudar a diminuir a dependência das crianças de "prompts" (sinais) verbais.
Essa autora enfatiza que crianças autistas são pensadores concretos que têm dificuldade em interpretar a linguagem abstrata. Assim sendo, não é suficiente apresentar apenas a linguagem para elas. "Estórias Sociais" precisam ser adicionadas para ensiná-las sobre o que significa sentir-se feliz, triste, chateado ou assustado, por exemplo. Dando continuidade, essa mesma autora endossa que crianças autistas não se saem bem em brincadeiras com bonecas e jogos de "faz-de-conta". Nos primeiros estágios elas se saem melhor em brinquedos que tem funções específicas, como por exemplo, quebra-cabeças e jogos de encaixe. Freqüentemente elas precisam da direção dos adultos para ensiná-las a usar estes brinquedos apropriadamente. O próximo objetivo é o adulto criar oportunidades para a interação social e comunicação através da brincadeira.
MACHADO (2000) destaca que os pais precisam encontrar uma boa interação com os brinquedos para engajar suas crianças na brincadeira. O jogo de "faz-de-conta" das crianças autistas é freqüentemente aprendido mecanicamente (adquirido por repetição). Desta forma, os pais precisam primeiro direcionar as brincadeiras das crianças e, então, criarem novos cenários.
ORRÚ (2005) ressalta que pessoas com autismo manifestam dificuldades para manter relações. Aqui, o termo "relações" abrange desde um determinado indivíduo, objeto e, até mesmo, determinados momentos ou situações em que se encontram inseridas. Para tanto, é importante que a criança tenha previsibilidade dos acontecimentos diários. Isto não quer dizer que, por um dado motivo, o educador não possa fazer alterações em seu planejamento.
ORRÚ (idem) cita que o educador que faz uso das agendas individuais, organiza o dia de sua criança na ordem dos acontecimentos utilizando símbolos visuais como "pistas" para a previsibilidade e compreensão significativa do que ocorrerá. Para a criança não verbal, esse recurso é como uma ferramenta, uma prótese, pois, devido a sua maior habilidade de compreensão visual, os objetos e situações dispostas a partir de símbolos visuais adquirem um significado mais expressivo. ORRÚ explica que no momento em que o educador percebe que houve, por parte da criança, a internalização significativa do estímulo apresentado com o símbolo visual e com a palavra sonoramente emitida, o educador passa a explorar as mesmas situações ou objetos (estímulos) diminuindo a apresentação visual dos símbolos. Esta atuação tem se revelado relevante no processo de modificabilidade para a independência e autonomia da criança, além de estimular sua verbalização.
Para ORRÚ (2005) um fator de suma importância é a observação constante do educador para a criança e seu modo de interagir com os símbolos visuais. Nem todas as pessoas com autismo manifestam boa tolerância para com esse recurso ou para com as formas citadas de sua utilização.


5.2 A família e a criança na busca da compreensão e interação mútua


CAPELATTO (1989) conceitua família como um conjunto de pessoas que se unem pelo desejo de estarem juntas, de construírem algo e de se complementarem. Acrescenta que é através dessas relações que as pessoas podem se tornar mais humanas aprendendo a viver o jogo da afetividade de maneira adequada. A família é o âmbito em que a criança vive suas maiores sensações de alegria, felicidade, prazer e amor, o campo de ação no qual experimenta tristezas, desencontros, brigas, ciúmes, medos e raiva.
Para CAPELATTO (idem) é na família que se aprende a linguagem mais complicada da vida: a linguagem da afetividade, amor acompanhado de medo, raiva, ciúmes... "Saber que pertence a alguém e a um lugar proporciona ao indivíduo o referencial de valor".
Assumpção & Sprovieri (1991 cit. por CAMARGOS et al., 2005) afirmam que há evidências suficientes comprovando que "o sistema familiar deve ser considerado como unidade de cuidados profissionais em seu sentido mais amplo". Mudanças, por menores que sejam, em qualquer parte do sistema familiar, afetam sua totalidade e demanda manobras de adaptação para viver um novo estado de equilíbrio dinâmico.
CAMARGOS et al., (2005) acrescentam que "a família representa, a matriz de identidade do indivíduo, o sistema nucleador de experiências do ser humano, responsável pelo crescimento e pelos níveis de desempenho ou falha". Portanto, como afirma ACKERMAN (1986) "a família constitui a unidade básica de doença ou de saúde".
WINNICOTT (1978) estudou mais profundamente o relacionamento familiar introduzindo o fator ambiente como "componente de importância fundamental para o crescimento e desenvolvimento da criança".
SIMEONSSON (1988) atribui aos pais o papel de professores, de prover cuidados de saúde, de líder moral/ético e o papel de cuidar da casa. "A criança é o alvo a quem a família deve sustentar e um membro do sistema familiar". Acrescenta que "aos irmãos cabe o papel de modelo, de substituto dos pais e de companheiro de jogo e, aos avós, é atribuído o papel de conselheiro, educadores do neto e um recurso da família".
Numa família de uma criança com necessidades especiais (NE) esta atribuição de papéis pode não estar tão bem delimitada. Essas crianças, a maior parte das vezes, exigem cuidados ou tarefas adicionais, com conseqüências para a própria criança, como por exemplo, sucessivas hospitalizações, procedimentos médicos intrusivos e pouco usuais, conseqüências sociais associadas à separação da família e a exposição a um largo número de adultos não familiares desde muito cedo (Battle, 1974 cit. por SIMEONSSON, 1988).
Na vida familiar, várias relações dinâmicas se estabelecem e a criança, ao mesmo tempo em que sofre a influência de pais e irmãos, também é um agente de modificações dessa estrutura. Cada família é constituída por uma dinâmica própria de sobrevivência cujo funcionamento é alterado significativamente quando emerge uma condição especial de doença crônica, malformação congênita ou deficiência dentro deste âmbito. Tal pode ser o impacto para uma família quando toma conhecimento de que um de seus membros esta "doente", que se dá extrema importância à forma como essa notícia é transmitida pelos profissionais de saúde (Zimerman, 1999, cit. por FÁVERO 2005).
Segundo Hammer & Turner (1996, cit. por TURNER, 2000) o processo de ajustamento dos pais à uma criança com NE é afetado por fatores como o estatuto socioeconômico, a disponibilidade e o uso dos sistemas de apoio, a estabilidade entre o casal, a constelação da família, a saúde psicológica dos pais, as crenças religiosas e culturais, a natureza e visibilidade do problema e as estratégias dos membros da família para lidar com ele. Os autores defendem também que os pais sentem necessidades pessoais, necessidades da família e necessidades de carreira ocupacional.
Para os pais de crianças com NE, os cuidados com a criança, resultam num aumento de responsabilidades financeiras, sobrecarga para o prestador de cuidados, de restrições no estilo de vida familiar e nas oportunidades de carreira, que por sua vez, são condições que podem levar a um aumento de estresse e do funcionamento psicológico. Sendo crucial, que estas famílias tenham apoio e recursos especiais, oportunidades para ter um dia livre para haver um balanço entre as necessidades da criança e as suas próprias necessidades.
HORNBY (1991) refere-se ao fato de que logo a seguir ao nascimento de uma criança com necessidades especiais (NE), os pais sentem necessidade: necessidade do diagnóstico do problema da sua criança, necessidade de obter informação compreensível, exata e atualizada sobre a NE, necessidade de receber apoio emocional, e necessidade de conhecer outros pais de crianças com NE parecidas.
Ainda neste contexto, SIMEONSSON (2000) reforça a idéia que as famílias de crianças com NE sentem necessidades complexas, momentâneas ou contínuas, em diferentes dimensões: necessidades de informação, necessidade de suporte, necessidades de explicação aos outros, necessidades de serviços da comunidade, necessidades financeiras e necessidades sobre o funcionamento da família.
PEREIRA (1996) explica que por força da influência de algumas teorias sobre o comportamento humano, durante muitos anos, muitos profissionais supunham que os problemas das crianças autistas, emocionalmente perturbadas, eram causados pelos pais. Por estas razões, em vez dos apoios serem dirigidos para o modo de ajudar estes pais a lidarem melhor com os seus filhos, chegou a pensar-se que eram eles próprios que deveriam beneficiar-se de apoio terapêutico. Acrescenta que esta idéia, de que a causa dos problemas das crianças autistas são os próprios pais, está já, suficientemente criticada, não havendo sequer uma evidência clara e indiscutível que assim seja.
PEREIRA (1996) realça que isto não quer dizer que não haja certos aspectos do comportamento dos pais que influenciem o desenvolvimento do comportamento dos filhos: haverá sempre; não há, contudo, dados suficientemente poderosos para poder relacionar tal fato com a patogenia do autismo.
ALMEIDA (2005) destaca que a capacidade dos pais compreenderem seus filhos, de os tratarem como seres autônomos, depende da relação precoce que estabeleceram com seus próprios pais, a forma como vivenciaram sua infância e a imagem que criaram de si próprios como pais.
FÁVERO (2005) comenta que várias abordagens reconhecem a necessidade de um trabalho não só com a criança autista, mas também com os membros da família.
ALMEIDA (idem) frisa que é significativo o papel de todos na tentativa de fazer com que os pais aceitem a criança porque, de outro modo, a criança tornar-se-á mais problemática e a vida social da família será parcial ou totalmente destruída. Essa autora explica que a criança que é aceita e amada como ela é, com suas incapacidades, quaisquer que elas sejam, conhecerá o crescimento de sua personalidade num ambiente favorável.
Segundo Amy (2001, p. 91 cit. por FÁVERO, 2005), o anseio dos pais é o de encontrar um espaço que possa fornecer acolhimento terapêutico e educativo que, "ao ajudar seus filhos, permita-lhe continuar sua vida, trabalhar e dar aos outros filhos, quando eles existem, o tempo e o amor necessários". O contato com outros pais se mostra necessário para uma troca de experiências e vivências com a finalidade de evitar a repetição de erros, de dificuldades ou problemas (Gauderer, 1987, cit. por FÁVERO, 2005).
CAMARGOS et al., (2005) pontuam que a família do portador de transtornos invasivos do desenvolvimento tem sido objeto de alguns estudos, entre eles os de Cohen & Warren (1985), Trute (1988), cujo objetivo se prende à melhor forma de compreender o sistema relacional para ajudá-lo a superar os problemas de inter-relacionamento ou, ainda, para facilitar a convivência.
ALMEIDA (2005) cita que se as atividades forem desenvolvidas em conjunto (família, escola, técnicos e sociedade), por meio de programas educativos com apoio afetivo, a deficiência não passará a ser a maior característica de identificação da família. A autora cita alguns pontos fundamentais para que ocorra uma intervenção eficaz: a) É importante que se dê atenção especial a angústia sentida pelos pais, ajudando-os e apoiando-os; b) Ninguém deseja um filho deficiente; todos querem filhos saudáveis, simpáticos e inteligentes, que se saiam bem na sociedade competitiva em que vivem; c) A agonia dos pais é geralmente grave. No início as sensações de culpa, de vergonha, de desespero e de auto-piedade podem ser opressivas; d) Isto pode levar à total rejeição da criança ou à negação de que haja qualquer coisa errada com ela; e) O modo como os pais se ajustam a essa situação é crucial para o futuro e bem-estar da criança e para toda a família e, f) Por vezes, os pais que sofrem grave sensação de culpa podem aliviar sua angústia tentando corrigir os erros feitos à sua criança, punindo-se, dedicando toda a vida a uma incansável escravidão ao cuidado da criança, ou podem projetar a culpa sobre os médicos, assistentes sociais e professores, acusando-os de negligência ou outros erros.
ALMEIDA (2005) esclarece que a criança especial tem as mesmas necessidades emocionais que as outras crianças. Ela necessita de amor, sem ser sufocada com cuidados ou ser sujeita à supertolerância. Para essa autora a criança especial deve ter oportunidades para realizações, autocontrole e o direito de alcançar um lugar de adulto, independente, na sociedade. Finalizando, acrescenta que a criança precisa da experiência dos pais, que a ajudarão a construir a confiança em si própria.
MACHADO (2000) salienta que é preciso que os pais aprendam primeiro a avaliar seu próprio comportamento e percebam as reações de sua criança. A grande vantagem dos pais aprenderem a avaliar os próprios filhos é que eles passam a ajustar suas expectativas a um patamar mais real. O isolamento da criança autista e a falta de resposta para as pessoas do seu ambiente, podem ter outro impacto para seus pais.
Para essa autora, as rotinas altamente estruturadas devem ser o contexto inicial para a promoção da interação. Isto inclui rotinas sociais, rotinas diárias e rotinas de atividades estruturadas. É preciso ajudar os pais a estabelecerem uma rotina que tenha papéis claramente definidos, uma seqüência previsível de eventos, que seja quebrada em pequenos passos para construir oportunidades repetitivas para a criança responder. Os pais devem marcar cada passo por frases ou jargões consistentes e deve repeti-los tão freqüentemente quanto possível.
O Guia de Intervenções para Pessoas que Prestam Serviços e para Família que têm Crianças com Autismo (2000) salienta que enquanto pais tentam ajudar outros pais com este enorme desafio é importante saber, e aceitar, que você e a sua família precisam de apoio em várias áreas, desde assuntos emocionais até a compreender a informação recebida. O Guia de Intervenções alerta que a vida de cada membro da família irá ser alterada. "Emoções vão estar altas. Tentando aprender como se lida com Distúrbio do Espectro Autista (ASD) e compreender o que o diagnóstico de ASD significa, vai durar muito tempo". O Guia de Intervenções pontua que alguns dias, semanas e meses vão ser melhores do que outros. "Decisões continuarão a ser tomadas. É importante saber que há muita ajuda acessível dependente das suas necessidades e as da sua família". O Guia de Intervenção é claro ao orientar para que os pais não hesitem em pedir ajuda. "No início poderá ser cansativo ou impressionante... então, comece com os recursos com que se sente confortável e que são fáceis de usar".
CRUZ (2000) argumenta que é fundamental perceber quais são os estilos cognitivos dos nossos filhos, ou seja, para além de perceber o que é que os nossos filhos gostam de fazer, é importante entender o que é que eles conseguem fazer e quais são as competências envolvidas. Explica que devemos preocupar-nos mais com o modo como os nossos filhos aprendem e resolvem os problemas, do que com o produto dessa aprendizagem e resolução, pois enquanto os processos permanecem e são generalizáveis, o produto esgota-se nele próprio.
CRUZ (2000) sinaliza que é aconselhável não comparar os nossos filhos com médias frias e impessoais. Pelo contrário, pontua que devemos procurar perceber quais são as suas características particulares e intrínsecas, de modo a podermos perspectivar, de um modo afetivo e personalizado, a sua evolução, tendo-os como referências de si próprios.
CRUZ ressalta que existem vários momentos no desenvolvimento, bem como diferentes domínios em desenvolvimento, pelo que se torna fundamental perceber qual é o momento de desenvolvimento e que domínios estão envolvidos em determinado período da vida dos nossos filhos, para podermos organizar as exigências, as solicitações e as expectativas em função das suas competências, necessidades e interesses variados. Finaliza explicando que as competências intelectuais dos nossos filhos são modificáveis. Portanto, é necessário ser otimista em relação a essa modificabilidade e estimulá-la.


5.3 A criança autista no processo de interação e aceitação


5.3.1 Dos educadores


A atual Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional (LDB), Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, trata, especificamente no capítulo V, da Educação Especial. Define-a como "modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para pessoas portadoras de necessidades educativas educacionais com necessidades educacionais específicas".
As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, no seu artigo 2º orienta os sistemas para a prática da inclusão: "Os sistemas de ensino devem matricular a todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando às condições necessárias para uma educação de qualidade para todos". O Plano Nacional de Educação destaca no seu capítulo da Educação Especial, que o grande avanço que a década da educação deveria produzir seria a construção de uma escola inclusiva que garantisse o atendimento à diversidade humana.
SUPLINO {21--} explica que a proposta de educação inclusiva (Tratado da Guatemala, 1991; Declaração de Salamanca, 1940) declara que todos os alunos devem ter a possibilidade de integrar-se ao ensino regular, mesmo aqueles com deficiências sensoriais, mentais, cognitivas ou que apresentem transtornos severos de comportamento, preferencialmente sem defasagem idade-série. A escola, segundo essa proposta, deverá adaptar-se para atender as necessidades destes alunos inseridos em classes regulares.
ALMEIDA (2005) declara que é preciso não se perder de vista a importante observação de que nem todo portador de deficiência requer ou requererá serviços de Educação Especial, ainda que possa necessitar de tratamento de intervenção terapêutica (habilitação ou reabilitação) em razão de suas condições físicas ou mentais.
O Centro de Informações Multieducação (cit. por ALMEIDA, 2005) define que Portadores de Necessidades Educativas Especiais (PNEE) são os portadores de deficiência física, mental, auditiva e visual, portadores de altas habilidades, e os portadores de condutas típicas de síndrome.
Já CAMARGOS et al., (2005) explicam que o atendimento pedagógico da criança portadora de distúrbios severos do comportamento requer uma estrutura muito bem preparada, desde os espaços e equipamentos até à equipe especializada. Acentuam que para que haja consistência no trabalho desenvolvido é preciso que haja um bom embasamento teórico e uma filosofia educacional que o inspire.
Para esses autores, a programação de atividades não pode restringir-se a objetivos voltados para conteúdos programáticos escolares, mas deve estar inicialmente voltada para a melhoria da qualidade de vida da criança, através de uma melhora de comportamento que facilite sua integração na família e na sociedade.
Esses autores ressaltam que as estratégias adotadas para a manipulação dos problemas de comportamento, não só tem que estar coerentes com a filosofia educacional da Escola, mas também não podem prejudicar o processo terapêutico. Salientam que os terapeutas, psiquiatras e psicólogos, têm como foco de seu trabalho as causas geradoras dos distúrbios; com essa finalidade realizam um trabalho que pode ser mais profundo e demorado, mas os educadores lidam com os comportamentos de superfície e tem que enfrentar as emergências que ocorrem no cotidiano da criança limitada.
CAMARGOS et al., (2005) acentuam que, para que a atuação educacional não seja uma violência contra a condição limitada da criança com distúrbios do comportamento, "deve-se respeitar suas possibilidades de realização pessoal e sua forma de expressão". Ressaltam, ainda, que "esta posição requer não apenas conhecimento sobre a patologia, mas também sensibilidade para identificação de elementos essenciais à preservação da integridade e do auto-conceito da criança".
Bereohff, Leppos e Freire (1994, cit. por CAMARGOS et al., 2005) declaram que "educar uma criança autista é uma experiência que leva o professor a questionar suas idéias, seus princípios e sua competência profissional".
Rivière (1991, cit. por CAMARGOS et al., 2005) acrescenta que "esta tarefa educativa é provavelmente a experiência mais comovedora e radical que pode ter o professor. Esta relação põe à prova, mais que nenhuma outra, os recursos e habilidades do educador".
BORGES (2000) ressalta que cada vez mais cabe à escola prever respostas educativas de forma a educar com sucesso as crianças, incluindo as com patologias graves. Para essa autora "depende de todos nós a construção de uma escola física e humana diferente, onde todos se respeitem e preconizem os valores de cada um".
Essa autora explica que os professores devem trabalhar em conjunto, tentando desenvolver estratégias quer a nível de formação inicial, quer da forma contínua, "ajudando-se mutuamente a adotar práticas, que tenham em conta todos os alunos da classe, incluindo os que têm dificuldades de aprendizagem".
ALMEIDA (2005) vê expectativas de que as instituições educacionais valorizem cada vez mais o trabalho da equipe multidisciplinar e que possam ver a pessoa com autismo como um ser bio-psico-histórico-cultural, procurando estratégias interventivas para a superação das dificuldades encontradas.
Para ALMEIDA o primeiro passo para a integração passa pela escola; é através dela que a sociedade adquire, fundamenta e modifica conceitos de participação, colaboração e adaptação. Frisa que o professor só estabelece um vínculo com as crianças autistas e suas respectivas famílias "quando não perde o encantamento com as crianças e os adolescentes". Para essa autora, os profissionais da Educação devem ser "eternos sonhadores".
Gallagher & Wiegerink (1976), citados ibidem (1998:422), citados por BORGES (2000) resumiram, num estudo, todos os conhecimentos existentes, até à época, sobre a temática do Autismo e suas conclusões continuam adequadas como se pode verificar nos pontos seguintes: a) As crianças autistas são educáveis; b) Suas características singulares de aprendizagem devem-se a deficiências cognitivas básicas no processamento de informações; c) Essas deficiências podem ser compensadas, em parte, por programas educacionais cuidadosamente estruturados, com seqüências específicas de aprendizagem desenvolvente e intensificação de estímulos reforçadores; d) Os programas educacionais estruturados devem começar desde cedo, tendo os pais ou pais substitutos como primeiros professores; e) Os programas de educação especial para essas crianças são plausíveis e, a longo prazo, menos custoso do que os cuidados institucionais e, f) O oferecimento de programas educacionais adequados para essas crianças não é uma manifestação de generosidade pública, mas, ao contrário, uma reflexão de que essas crianças também têm direito evidente a educação adequada.
Shwartzman et al. (1995:236, cit. por BORGES, 2000) recomendam aos profissionais que trabalham com crianças autistas que, independentemente da causa, é importante conhecer a extensão das diferenças, pois elas só se poderão desenvolver dentro de uma estrutura, competência, ritmo e padrão particular de funcionamento. "Ela deverá ter a oportunidade para fazer o que está apta a realizar, de forma hierárquica e paulatina".
Assim, como diz Rogé, B. (1988:66, citado por BORGES - 2000) "As crianças autistas podem receber uma educação apropriada, dado que as pequenas estruturas, especialmente previstas para elas, permitem prepara-lhes um meio adequado, no qual poderão beneficiar de uma pedagogia individualizada".
ALMEIDA (2005) explica que cabe a todos os intervenientes no processo educativo, em equipe, ajudar a promover e a desenvolver uma ação dinâmica, a fim de englobar todos os que participam na vida da criança num projeto comum, que é o seu bem-estar. A autora acentua que "o ser humano é portador de dignidade e merecedor de respeito. Assim, a sua integração requer promoção das qualidades próprias de um indivíduo, sem estigma e sem segregação".
Para essa autora o trabalho com as pessoas autistas é extenso e deve ser tanto no sentido de ajudá-la a desenvolver formas de interação, percepção do mundo e da comunicação, quanto com a preocupação de fornecer-lhe elementos culturais que contribuam para seu desenvolvimento como sujeito histórico e social. Ela acrescenta que "as interações que a criança autista consegue estabelecer com situações diferenciadas e inusitadas, propiciam-lhe vivenciar ricas experiências de aprendizagem". ALMEIDA alerta que para isso ocorrer "é preciso que todos atentem para essas pessoas não como seres inferiores e limitados, mas como seres que aprendem de maneira diferente das normas e dos padrões estabelecidos pela sociedade dos "normais"".
MACHADO (2000) acentua que uma vez que a interação social é o ponto crucial das dificuldades que as crianças autistas encontram, os pais devem ser aconselhados a colocarem suas crianças num ambiente de pré-escola estruturado, o mais rápido possível, para dar a elas a vantagem dos modelos de seus pares.
Essa autora ressalta que os pais precisam saber os passos que as crianças devem seguir no aprendizado de brincar com os outros: inicialmente são indiferentes aos outros, depois passam a observá-los, começam a brincar em paralelo e, finalmente, brincam em participação conjunta. As atividades que são colaborativas e possuem um produto final encorajam mais as interações com outras crianças do que as atividades em aberto.
ORRÚ (2005) salienta que uma das responsabilidades do educador é a de intervir na vida humana por meio da reflexão e da ação reflexiva, geradoras de estratégias pedagógicas para o bem comum do educando. Para ela se é impossível fazer de conta que o autismo não existe, certamente "podemos, enquanto educadores, nos dispormos à busca de maneiras inovadoras, facilitadoras, diferenciadas e produtivas para a construção de uma melhor qualidade de vida para a pessoa com autismo".
ORRÚ frisa que "somente será possível tal ação, se nos despojarmos dos pré-conceitos estabelecidos como definidores de destinos". Ressalta que é imprescindível que o educador e qualquer outro profissional que trabalhe junto à pessoa com autismo seja um conhecedor da síndrome e de suas características inerentes. Porém lembra que tais conhecimentos devem servir como sustento positivo para o planejamento das ações a serem praticadas e executadas e não como desculpas para o abandono à causa. Tomando as palavras de Rivière (1984):

Esta tarefa educativa é provavelmente a experiência mais comovedora e radical que pode ter o professor. Esta relação põe à prova, mais do que nenhuma outra, os recursos e as habilidades do educador.


Para CAMARGOS et al., (2005) as respostas para esses questionamentos está na relação professor/aluno, por ser essa relação à essência da educação e a determinante da qualidade do processo educativo.
ORRÚ (2005) salienta que para promover a educação à pessoa com autismo, é preciso, antes de tudo, promover transformação na vida pessoal e profissional do educador como forma de inovar o processo educativo junto ao aluno com autismo Ela comenta que mesmo que o educador se mantenha dedicado ao aprender através de conhecimentos científicos e por meio de sua prática reflexiva, momentos de incertezas podem surgir.
ORRÚ explica que o êxito alcançado com essa nova proposta de trabalho com alunos autistas é conseqüência do trabalho realizado pelo professor. Para ela, a chance de recolher o aluno com autismo do isolamento que o caracteriza depende da qualidade da relação do educador com o mesmo. Por isso, é importante que o educador contenha uma revelação e expressão interessante, de modo a cativar esse aluno.
ORRÚ (2005) argumenta que "esta não é uma tarefa fácil para o educador, no entanto, também não é impossível de ser realizada. O universo da educação de um aluno com autismo é, deveras, complexo para o abordarmos de forma singela". Finaliza ressaltando que "toda pessoa que se forma para assumir a responsabilidade de ser um educador precisa ser compromissada com a causa que faz dela um profissional". Porém, continua ela, "o educador que recebe um aluno com autismo em sua sala de aula necessita exercitar e preservar algumas características em sua personalidade como parte indissolúvel de seu compromisso com a educação".
O Guia de Intervenção (2000) ressalta que "é tarefa e desafio da escola assumir efetivamente, em parceria com os pais (família em geral), a função de proporcionar aos alunos, inclusive os alunos autistas, oportunidades de evoluir como seres humanos". Para isto, continua o Guia de Intervenção, o trabalho pedagógico e educacional é cuidar da formação dos alunos, fazendo-os cumprir regras, impondo-lhes limites, e acima de tudo acreditando em seu potencial.


5.3.2 Da sociedade


ALMEIDA (2004) explica que é através de ações de sensibilização da sociedade, convivência na diversidade humana, dentro das escolas, das empresas e dentro de políticas públicas que se alicerçará o processo de inclusão da criança com necessidades especiais. Acrescenta que o desenvolvimento da consciência da cidadania não pode restringir-se à questão de direitos e deveres da pessoa em geral, mas deve abranger as questões referentes aos grupos excluídos ou rejeitados pela sociedade.
ALMEIDA pontua que a convivência na diversidade humana pode enriquecer nossa existência desenvolvendo, em variados graus, os diversos tipos de inteligência que cada um de nós possui. Acentua que o fato de cada pessoa interagir com tantas outras pessoas, todas diferentes entre si, em termos de atributos pessoais, necessidades, potencialidades, habilidades, etc. é à base do desenvolvimento de todos para uma vida mais saudável, rica e feliz.
SILVA (2005) comenta que cabe aos pais viabilizar o processo de inclusão de seus filhos, a priori no ambiente familiar onde o autista está inserido, para que posteriormente esta inserção ocorra no convívio dos amigos, na comunidade, na escola, e por fim na sociedade. Para enfatizar esta proposta, a afirmação dos autores MCHale, Simeonsson e Sloan apud Gomes, Zanchettin e Bosa (2004), onde diz que as "reações do irmão com desenvolvimento típico (normal) são positivas quando os pais e os amigos aceitam a condição do irmão deficiente".
Para que tal proposta se concretize também no contexto social como um todo, STAINBACH & STAINBACK (1999) sugerem que os pais, que lutam para proteger os filhos dos outros através do silêncio precisam interromper o ciclo de ignorância da sociedade, assumindo um risco e compartilhá-los com os demais, permitindo aos outros, acesso as informações e a apreciação que já possuem, para que possam participar um pouco dos dons e das realizações de seus filhos.
ORRÚ (2005) assinala que o pré-conceito, baseado nos aspectos sintomáticos da síndrome, exclui a pessoa autista do direito à vida junto com outras pessoas sem o autismo. Como exemplo, cita a tendência ao isolamento como uma das características do autismo. "Será correto afirmar que por meio da influência desta característica todos os autistas não devem, não podem ou não conseguem viver próximos a outras pessoas"?
ORRÚ explica que quando percebermos que dentre muitas coisas que precisam passar a ter significado para o autista, muitas outras também precisam ser apropriadas e compreendidas por nós, é que "transformamos a condição de excluído em seu mundo para incluído em nosso mundo. Deste modo, teremos modificado as nossas próprias vidas, pois nos abrimos para uma nova concepção de mundo".


5.3.3 Da comunidade religiosa


A Campanha da Fraternidade (CF) 2006 cujo tema foi "Levanta-te, vem para o meio!" assinalou que as sociedades construíram termos e expressões para designar, caracterizar e diferenciar as pessoas com deficiência. A lista é enorme: paralítico, anormal, mongolóide, alienado, aleijado, portador de necessidades especiais, coxo, manco, especial, cego, inválido, surdo-mudo, imperfeito, retardado, débil mental, excepcional, etc. Esses termos foram incorporados pela cultura, encontram-se presentes nos dicionários atuais e até no texto bíblico. Todas essas palavras e rótulos expressam posicionamentos diante dessas realidades humanas, em diversos contextos históricos e culturais, mais ou menos preconceituosos.
A CF pontuou que bem-intencionadas ou rotuladas, essas expressões podem ser conceitos ou preconceitos. Elas retratam a dificuldade de se nomear, não somente um evento biológico ou acidental, mas todo um relacionamento afetivo e social com o outro, em sua diferença e alteridade. A palavra cego, comum nos Evangelhos, pode ser vista como ofensa por quem prefere o termo "deficiente visual". A palavra surdo, também, para quem o termo "deficiente auditivo" seria mais adequado. "A expressão deficiente mental não é bem recebida por quem prefere o termo "especial", "excepcional", ?deficiente intelectual ou cognitivo". Outros abominam a expressão "portador" de necessidades especiais ou de alguma síndrome. Julgam que a pessoa não porta, nem carrega nada. Ela simplesmente é assim.
A CF destacou que cada época introduz novos termos para designar as pessoas com deficiência e condena os termos anteriores. Muitas vezes, a semântica amaciada, pretensamente não discriminatória e bem intencionada acaba escondendo, e não explicitando uma condição humana pessoal irredutível e bem específica. Está-se diante de uma realidade diferenciada, inegável. Mesmo quando os termos empregados parecem ser ou pretendem parecer politicamente corretos. Acrescentou que "não se trata de criar uma cultura da deficiência, um modelo deficitário como parâmetro de vida para as pessoas especiais. Cada um é muito maior do que suas deficiências e suas circunstâncias".
A CF explica que uma pessoa não deve ser reduzida, nem identificada com seus limites sensoriais, mentais ou motores. Mas ela também não pode ser entendida e acolhida sem eles. Hoje, a tendência é para uma suavização dos termos. A busca sempre renovada de expressões mais adequadas, socialmente positivas, para designar essas condições diferenciadas, não deve ser a ocasião de uma nova alienação. "Um dos primeiros passos para transformar em graça o que deveria tornar-se uma desgraça, está na capacidade de nomear, sem subterfúgios, as realidades vividas, mesmo se indesejadas".
O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Odilo Pedro Sherer, ao conceder entrevista sobre a Campanha da Fraternidade (CF) 2006 acentuou que o objetivo geral da CF é voltar à atenção para as pessoas com deficiência, tomar consciência de sua existência, das condições em que vivem, de suas necessidades e, à luz da Palavra de Deus, suscitar maior fraternidade e solidariedade em relação a elas, promovendo sua dignidade e seus direitos. Acrescenta que isso significa também "dar voz às pessoas com deficiências, denunciar preconceitos e discriminações, promover iniciativas que façam avançar políticas públicas voltadas para a efetiva inclusão das pessoas com deficiência em todos os âmbitos da convivência social". Dom Sherer assinala que a meta final de todas essas iniciativas é "a promoção da cultura do respeito e da solidariedade em relação a esses irmãos e irmãs". Dom Sherer frisou que a CF de 2006 parte do pressuposto que todas "as pessoas têm a mesma dignidade e, por isso, ninguém deve ser desprezado ou discriminado". O valor do ser humano e o motivo último do respeito que lhe é devido não estão na perfeição física, na capacidade produtiva ou na habilidade da sua afirmação social, econômica, cultural ou política, mas antes e acima de tudo, no próprio fato de ser uma pessoa, um ser humano. Dom Sherer lembra que a presença de pessoas com deficiências em nosso meio é um permanente questionamento à lógica da competição, da eficiência, da perfeição estética a todo custo, do sucesso, do poder econômico. "Esta lógica das vaidades, que orienta com freqüência o convívio social, acaba privilegiando sempre os mais fortes e desprezando quem não satisfaz a certos padrões e expectativas".
Dom Sherer salienta que é importante interessa-se, buscar informações, promover reflexões em vários níveis sobre o assunto em questão, participar de debates, apoiar e promover iniciativas que levem a definir e decidir políticas públicas voltadas para a inclusão social das pessoas com deficiência. Realça que "essas pessoas não são apenas números e cifras abstratas, são seres humanos concretos que esperam por uma visita, bem como suas famílias e as organizações que prestam assistências aos vários tipos de pessoas com deficiência".




6. O futuro da criança autista


Pressionados de tal forma pela dificuldade de comunicação que é peculiar à criança autista, não é de admirar que a mesma fique confusa e em muitos casos descarregue sua ansiedade e frustrações nos pais e professores, que, por sua vez, ficam confusos e desorientados diante do descontrole comportamental apresentado pela criança.
Mas como evitar que isso aconteça ou como diminuir a ocorrência de tal situação?
Se há por parte dos pais e familiares e, dos professores e profissionais que cuidam da criança uma compreensão do comportamento autístico, certamente esse fator ajudará a esclarecer a relação entre muitos aspectos desses comportamentos e contribuirá para o desenvolvimento da criança e para o seu processo de aprendizagem, bem como, para o processo de aceitação e interação de suas características junto ao outro, levando-a a se assumir e enfrentar as exigências da vida, desafiando dia após dia os conceitos ou pré-conceitos que irão acompanhá-las seja no âmbito escolar, social ou profissional.
Contribuindo neste contexto, ALMEIDA (2005) destaca que ser autista é acima de tudo uma forma de ver e compreender o mundo. Acrescenta que "é preciso que construamos e compartilhemos nossa travessia com lucidez de quem sabe não carregar verdades absolutas ou razões eternas". Reconhece que o autismo é ainda muito desconhecido e há muito a ser feito para ajudar as crianças e os adultos autistas e seus familiares. Ressalta que "há esperança de que a ciência permita que nós possamos um dia descobrir como "reencontrar" essas pessoas, tão escondidas no fundo delas mesmas".
Já AXLINE (1973) afirma que "cada ser humano tem seu próprio caminho" e que toda criança precisa de tempo para explorar seu mundo, a seu modo". Explica que embora algumas vezes possamos controlar em parte o ambiente à nossa volta, nada mais decisivo que aprender a utilizar nossas infinitas forças interiores. "Com ela carregamos a segurança ao nosso redor". Entende que quando a liberdade de iniciativas se abre para um indivíduo, sua escolha recai sobre as atividades em que se sente mais seguro. Qualquer exclamação de surpresa ou elogio pode ser interpretada como indicadora da direção a seguir.
BORGES (2000) reforça que é "preciso que a criança seja amada e aceita como ela é, com suas incapacidades, quaisquer que elas sejam". A aceitação permitirá que a personalidade da criança cresça no ambiente favorável. Assinala que "qualquer criança alcançará mais facilmente e terá uma satisfatória função social de adulto, se crescer numa família feliz, satisfeita e unida".
GILLBERG (2005) nos chama a atenção para o fato de que as pessoas com autismo precisam ser entendidas como pessoas e terem uma abordagem ampla e completa. Para ele não há um conceito terapêutico que sirva para todas as crianças, portando deve ser explorado um conjunto de possibilidades. GILLBERG lembra que o mais importante é que as pessoas que se relacionam com a pessoa com autismo conheçam muito mais sobre o autismo e que os professores saibam quais são suas principais características.
Para completar o que diz Gillberg, FACION (2002) ressalta que quanto maior for o nível de experiência de uma criança com autismo, possivelmente serão menores os comportamentos exacerbados. Sendo assim, propõe-se, por exemplo, a construção de um programa terapêutico com a finalidade de desenvolver a autonomia nas atividades práticas do dia-a-dia, portanto, na busca de uma estruturação de comportamentos desejados.
FACION (2002) é claro ao emitir sua opinião no sentido de que para cada criança é necessário esboçar um conceito terapêutico individual e integrativo, ou seja, não conseguimos, até hoje, indicar um conceito que tenha uma validade generalizada ou ideal. Reconhece que o impacto emocional dos pais, dos outros familiares, dos terapeutas, dos professores e etc. que convivem com pessoas que apresentam estes graves problemas de comportamento é muito elevado. Admite que não existe ainda um tratamento específico que elimine as bases fisiológicas irregulares ou anormais do autismo. O tratamento limita-se a modificar e minimizar determinados sintomas, como a hiperatividade, as estereotipias, a hétero e auto-agressividade, a irritabilidade, transtornos alimentares e do sono, considerando também a importância da rapidez do diagnóstico e do tratamento para que o paciente possa estar, o quanto antes, mais capacitado para participar dos programas de atividades e terapias psicossociais.
ALMEIDA (2005) ratifica a opinião de FACION ao assinalar que "investimento pessoal, capacitação e informação e união de esforços são os elementos fundamentais para que se possa ter e desenvolver uma prática educacional adequada e eficaz".
O Guia Indianópolis COMVIDA Associação Beneficente (2005) alerta que os pais precisam brincar com a sua criança autista e dar oportunidade para que ela se torne cada vez mais independente. O Guia COMVIDA explica que crianças com necessidades especiais precisam de suporte constante e encorajamento de toda a família, mãe, pai, irmãos, irmãs. Salienta que é necessário certificar-se que se está completamente informado sobre como estimular o desenvolvimento e a independência da criança.
No que se refere ao contexto educacional, FERREIRA (2002, cit. por DUTRA 2005) relata práticas de violação dos direitos das crianças e dos jovens com deficiência, identificando que: a) escolas e professores não se sentem preparados para receber alunos com deficiência nas classes comuns do ensino regular; b) famílias que não desistem da escolarização para seus filhos, tendem a buscar escolas especiais ou particulares; c) nas escolas privadas também há uma tendência para não aceitar crianças com deficiência alegando não estarem preparadas e muitas, quando recebem, cobram taxas extras; d) crianças de escolas especiais integradas em escolas regulares tendem a retornar alegando discriminação; e) famílias consideram que as escolas regulares não são ambientes seguros para seus filhos; f) crianças aceitas nas escolas regulares tendem a abandonar porque as mesmas não respondem às suas necessidades e, g) a educação ofertada a estes alunos é no geral, de pouca qualidade, mantendo-se no âmbito de atividades da educação infantil. Outro aspecto relevante da pesquisa se refere aos dados que revelam que muitas crianças são incluídas com sucesso nas escolas regulares, com apoio da escola e dos professores.
DUTRA (2005) ressalta que a transformação dos sistemas educacionais para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, significa uma mudança na gestão da educação que possibilite o acesso às classes comuns do ensino regular e a ampliação da oferta de atendimento educacional especializado que propicie a eliminação de barreiras.
Já SUPLINO {21?} acrescenta que apesar de muitos dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento terem sido descritos na literatura há muitas décadas como, por exemplo, o Autismo e a Síndrome de Asperger que foram relatados pela primeira vez há mais de 60 anos, continuam desconhecidos de grande parte da população brasileira. Mesmo os educadores que por vezes já ouviram os termos serem citados, ignoram as discussões sobre sua gênese e não estão familiarizados com as principais características destes transtornos. Assinala que atualmente existem alunos portadores de autismo freqüentando, em sua maioria, escolas especiais ou classes especiais de condutas típicas, dentro das escolas regulares. Há umas poucas iniciativas de inclusão desses alunos em classes regulares. Destaca que neste último caso, a inclusão tem sido efetivada sob quatro condições: a) o aluno freqüenta a classe regular todos os dias, durante o tempo total da aula; b) o aluno freqüenta a classe regular todos os dias, em horário parcial; c) o aluno freqüenta a classe regular algumas vezes na semana, durante o tempo total da aula e, d) o aluno freqüenta a classe regular algumas vezes na semana, em horário parcial.
Para SUPLINO {21--} praticamente na totalidade dos casos, tais alunos fazem uso de recursos especializados de apoio, como escolas de educação especial, fonoaudiologia, dietas especiais, terapia ocupacional, entre outros.
BORGES (2000) contribui ao afirmar que não devemos esquecer o papel dos pais, que na sua dedicação aos seus filhos estão muitas vezes sozinhos, confusos e mal informados, lutando com a desilusão, o desapontamento, o desespero e obstáculos aparentemente intransponível.
No que diz respeito à criança, AXLINE (1973) considera que a mesma adquire seus sentimentos de segurança a partir de conhecimentos previsíveis e limitações reais. Para ela, o valor de qualquer processo terapêutico bem sucedido depende do equilíbrio mantido entre o que a pessoa traz para a sessão e o que dela leva. Acredita que na verdade, nunca sabemos quanto do que apresentamos a uma criança é por ela aceito. Cada uma tem seu próprio caminho para integrar o novo conhecimento em sua estrutura de experiências, na qual se apoia na busca e construção de seu mundo. Para ela, o valor terapêutico é baseado na experiência da própria criança, como um ser capaz, como uma pessoa responsável em um relacionamento que tenta comunicar-lhe duas verdades básicas: que ninguém conhece realmente tanto do mundo interior de um ser humano quanto o próprio indivíduo; e que a liberdade responsável cresce e desenvolve a partir do interior da pessoa. Assinala que a criança deve, antes de tudo, aprender a respeitar a si mesma e a experimentar um sentimento de dignidade que desabrocha de seu crescente auto-entendimento. Só então lhe será possível apreciar com autenticidade as personalidades, direitos e diferenças dos outros.
Objetivando levar os pais, educadores e cuidadores da criança autista, à reflexão de que "é possível vislumbrar um futuro próspero para a sua criança especial", transcrevo as "regras sociais" escritas por ELLEN NOTTOHM:



CONCLUSÃO


A análise efetuada à teoria comportamental permitiu-nos registrar aspectos conceituais sobre a melhor maneira de compreender e ajudar a criança autista. Este é mais um referencial que pode contribuir para que os pais, professores e profissionais da saúde, dentre eles o psicólogo, mobilizem recursos para minimizar as dificuldades dessas crianças no que diz respeito a sua comunicação e interação com o outro.
Esperamos que este trabalho colabore para suscitar críticas e questionamentos de outros profissionais, com o propósito de dar continuidade à investigação a respeito do autismo, objetivando educar a criança autista e inseri-la na sociedade.
Estamos seguros de que não foram por nós suficientemente focalizados, nem qualitativa nem quantitativamente todos os assuntos referentes ao autismo infantil. Assumimos isso.
Um dos nossos objetivos foi destacar o que nos pareceu mais relevante para ajudar os pais e todos os envolvidos no dia a dia da criança autista, na busca da compreensão, aceitação, desenvolvimento, integração e respeito da criança como um ser TOTAL.
Se esse objetivo foi atingido, damo-nos por satisfeitos e certos de termos chegado ao fim da tarefa que nos propusemos.







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ANEXO "A"

O que nos pediria um autista?
Ajuda-me a compreender. Organiza meu mundo e ajuda-me a prever o que vai acontecer. Dá-me ordem, estrutura, e não um caos.
Não fiques angustiado comigo, pois isto também me angustia. Respeite meu ritmo. Se compreenderes minhas necessidades e meu modo especial de ver a realidade, não terás dificuldades de te relacionares comigo. Não te deprimas; o normal é eu progredir e me desenvolver cada vez mais.
Não fale muito nem depressa demais. Para ti as palavras voam como plumas, não pesam para ti, mas para mim podem ser uma carga muito pesada. Muitas vezes não é esta a melhor maneira de te relacionares comigo.
Como todas as demais crianças, e como os adultos, sinto necessidades de partilhar o prazer e gosto de fazer bem as coisas, embora nem sempre o consiga.
Preciso de mais ordem do que tu e mais do que tu preciso de prever as coisas no meu meio.
Precisamos negociar meus rituais de convivência.
Para mim é difícil compreender o sentido de muitas coisas que me pedem para fazer. Ajuda-me a compreender. Procura pedir-me coisas que tenham sentido completos e decifráveis para mim. Não deixes que eu me embruteça e fique inativo.
Não te envolvas demais comigo. Às vezes as pessoas são muito imprevisíveis, barulhentas demais e excessivamente animadoras. Respeite as distâncias de que preciso, mas sem me deixares sozinho.
O que eu faço não é contra ti. Quando fico irritado ou me firo; quando quebro alguma coisa ou me agito demais; quando tenho dificuldade de fazer o que me pedes, não estou querendo te aborrecer. Porque tenho um problema de intenções. Não me atribuas más intenções!
Meu desenvolvimento não é irracional, embora não seja fácil de entender. tem sua própria lógica, e muitas das condutas que chamas de "alteradas" são formas de enfrentar o mundo com minha forma especial de ser e perceber. Faça um esforço para me compreenderes.
As outras pessoas são muito complicadas. Meu mundo não é complexo nem fechado, é um mundo simples. Embora possa parecer estranho o que te digo, meu mundo é tão aberto, tão sem embustes e mentiras, tão ingenuamente exposto aos outros que é difícil penetrar nele. Não vivo numa "fortaleza vazia", mas numa planície tão aberta que pode parecer inacessível. Sou muito menos complicado do que as pessoas que consideras normais.
Não me peças sempre as mesmas coisas, nem exijas de mim as mesmas rotinas.
Não sou apenas autista. Sou também uma criança, um adolescente ou um adulto. Partilho muitas coisas das crianças, dos adolescentes e adultos que chamas de "normais". Gosto de brincar e de me divertir, gosto de meus pais e das pessoas que me cercam; fico contente quando faço bem as coisas. Na minha vida há mais o que partilhar do que separar.
Vale a pena viver comigo. Posso te proporcionar tanta satisfação como às demais pessoas. Pode acontecer um momento em tua vida em que eu, autista, seja tua maior e melhor companhia.
Não me agrides quimicamente. Se te disserem que eu preciso tomar um medicamento, providencie o acompanhamento periódico de um especialista.
Nem meus pais nem eu temos culpa do que se passa comigo. Tampouco são culpados os profissionais que me ajudam. Não adianta culpar uns e outros. Às vezes minhas reações e condutas podem ser difíceis de entender ou de suportar, mas não é por culpa de ninguém. A idéia de "culpar" não faz mais do que produzir sofrimento com relação a meu problema.
Não me peças constantemente coisas que estão fora de meu alcance, de minha possibilidade. Pede-me, porém, as que sou capaz de fazer. Ajuda-me a ter mais autonomia, para compreender melhor, comunicar-me melhor, mas não me ajude demais.
Não precisas mudar completamente sua vida pelo fato de viver com uma pessoa autista. A mim nada aproveita o estares mal, que te feches e te deprimas. Preciso de estabilidade e de bem-estar emocional em torno de mim para me sentir melhor. Não penses tampouco que eu tenha culpa do que se passa comigo.
Ajuda-me com naturalidade, sem tornar essa ajuda uma obsessão. Para me ajudar precisas de ter teus momentos de repouso ou de te dedicares a tuas próprias atividades. Fica perto de mim, não te vás, mas não te sintas sob o peso de uma carga insuportável. Na minha vida tem havido momentos difíceis, mas posso estar cada vez melhor.
Aceita-me como sou. Não condicione tua aceitação a que eu deixe de ser autista. Sê otimista, sem te tornares "romântico". Minha situação em geral tende a melhorar, embora por enquanto não tenha cura.
Embora me seja difícil comunicar-me ou compreender as sutilezas sociais, na realidade tenho algumas vantagens em comparação com os que tu chamas de "normais". Tenho dificuldade de me comunicar, mas não costumo enganar. Não compreendo as sutilezas sociais, mas tampouco tenho duplas intenções ou sentimentos perigosos tão comuns na vida social. Minha vida poderá ser satisfatória se for simples, ordenada e tranqüila, desde que não me faças constantes exigências e só me peças as coisas mais difíceis para mim. Ser autista é um modo de ser, embora não seja o comum. Minha vida como autista pode ser tão feliz e satisfatória como a tua vida "normal". Nessas vidas podemos vir a nos encontrar e a partilhar muitas experiências.
(Angel Rivière Gómez, Assessor Técnico de APNA ? Madri ? Espanha).










ANEXO "B"

(Os pensamentos da menina Lily - 10 anos de idade - colocados em forma de poema por Lily Merrick e Carol Affholder - musicoterapeutas ? EUA).

Lily?s song ("A música de Lily")

Por favor, divida suas brincadeiras comigo, gosto de sorrir com você "Venha, puxe uma cadeira e sente-se por um momento
Porque eu quero dividir alguns pensamentos com você
Há uma parte de mim que gostaria de dividir com você
Dê-me apenas alguns momentos para dizer...
Sou como qualquer outra pessoa
Posso não parecer igual a você
Posso fazer algumas coisas bem diferentes
Mas por dentro eu penso e sinto como outras garotas da minha idade.
Sou parte de uma família, com uma mãe, um pai e irmão também
Meus avós são especiais para mim e da mesma forma que os seus
Minha lista de coisas favoritas para fazer: gosto de sair com os amigos,
fazer compras, comer e ir ao cinema. Você não quer vir comigo?
Eu gosto quando você fala comigo e me inclui em seu dia
Veja em meus olhos e eu lhe direi a verdade
As pessoas dizem que tenho um sorriso bonito e eu gosto de ver o seu
sorriso também
Algumas vezes pode ser difícil dizer que entendo de verdade o que se passa ao meu redor, mas eu lhe escuto mesmo assim.
Então, por favor, lembre-se disso meu amigo, as coisas nem sempre são como você vê
São sentimentos lá no fundo que são todos parte de mim".

(Associação Brasileira de Síndrome de Rett de São Paulo - ABRE-TE/SP)



















ANEXO "C"
Dez coisas que toda criança com autismo gostaria que você soubesse
(tradução livre - Andréa Simon)
(retirado do site: http://www.autimismo.com.br/)

" Antes de tudo eu sou uma criança.
Eu tenho autismo. Eu não sou somente "Autista". O meu autismo é só um aspecto do meu caráter. Não me define como pessoa. Você é uma pessoa com pensamentos, sentimentos e talentos. Ou você é somente gordo, magro, alto, baixo, míope. Talvez estas sejam algumas coisas que eu perceba quando conhecer você, mas isso não é necessariamente o que você é. Sendo um adulto, você tem algum controle de como se auto-define. Se quer excluir uma característica, pode se expressar de maneira diferente. Sendo criança eu ainda estou descobrindo. Nem você ou eu podemos saber do que eu sou capaz. Definir-me somente por uma característica, acaba-se correndo o risco de manter expectativas que serão pequenas para mim. E se eu sinto que você acha que não posso fazer algo, a minha resposta naturalmente será: Para que tentar?

A minha percepção sensorial é desordenada.
Interação sensorial pode ser o aspecto mais difícil para se compreender o autismo. Quer dizer que sentidos ordinários como audição, olfato, paladar, toque, sensações que passam desapercebidas no seu dia a dia podem ser doloridas para mim. O ambiente em que eu vivo pode ser hostil para mim. Eu posso parecer distraído ou em outro planeta, mas eu só estou tentando me defender. Vou explicar o porquê uma simples ida ao mercado pode ser um inferno para mim: a minha audição pode ser muito sensível. Muitas pessoas podem estar falando ao mesmo tempo, música, anúncios, barulho da caixa registradora, celulares tocando, crianças chorando, pessoas tossindo, luzes fluorescentes. O meu cérebro não pode assimilar todas estas informações, provocando em mim uma perda de controle. O meu olfato pode ser muito sensível. O peixe que está à venda na peixaria não está fresco. A pessoa que está perto pode não ter tomado banho hoje. O bebê ao lado pode estar com uma fralda suja. O chão pode ter sido limpo com amônia. Eu não consigo separar os cheiros e começo a passar mal. Porque o meu sentido principal é o visual. Então, a visão pode ser o primeiro sentido a ser super-estimulado. A luz fluorescente não é somente muito brilhante, ela pisca e pode fazer um barulho. O quarto parece pulsar e isso machuca os meus olhos. Esta pulsação da luz cobre tudo e distorce o que estou vendo. O espaço parece estar sempre mudando. Eu vejo um brilho na janela, são muitas coisas para que eu consiga me concentrar. O ventilador, as pessoas andando de um lado para o outro... Tudo isso afeta os meus sentidos e agora eu não sei onde o meu corpo está neste espaço.

Por favor, lembre de distinguir entre não poder (eu não quero fazer) e eu não posso (eu não consigo fazer).
Receber e expressar a linguagem e vocabulário pode ser muito difícil para mim. Não é que eu não escute as frases. É que eu não te compreendo. Quando você me chama do outro lado do quarto, isto é o que eu escuto "BBBFFFZZZZSWERSRTDSRDTYFDYT João". Ao invés disso, venha falar comigo diretamente com um vocabulário simples: "João, por favor, coloque o seu livro na estante. Está na hora de almoçar". Isso me diz o que você quer que eu faça e o que vai acontecer depois. Assim é mais fácil para compreender.

Eu sou um "pensador concreto" (CONCRETE THINKER). O meu pensamento é concreto, não consigo fazer abstrações.Eu interpreto muito pouco o sentido oculto das palavras. É muito confuso para mim quando você diz "não enche o saco", quando o que você quer dizer é "não me aborreça". Não diga que "isso é moleza, é mamão com açúcar" quando não há nenhum mamão com açúcar por perto e o que você quer dizer é que isso é algo fácil de fazer. Gírias, piadas, duplas intenções, paráfrases, indiretas, sarcasmo eu não compreendo.

Por favor, tenha paciência com o meu vocabulário limitado.
Dizer o que eu preciso é muito difícil para mim, quando não sei as palavras para descrever o que sinto. Posso estar com fome, frustrado, com medo e confuso, mas agora estas palavras estão além da minha capacidade, do que eu possa expressar. Por isso, preste atenção na linguagem do meu corpo (retração, agitação ou outros sinais de que algo está errado). Por um outro lado, posso parecer como um pequeno professor ou um artista de cinema dizendo palavras acima da minha capacidade na minha idade. Na verdade, são palavras que eu memorizei do mundo ao meu redor para compensar a minha deficiência na linguagem. Porque eu sei exatamente o que é esperado de mim como resposta quando alguém fala comigo. As palavras difíceis que de vez em quando falo podem vir de livros, TV, ou até mesmo serem palavras de outras pessoas. Isto é chamado de ECOLALIA. Não consigo compreender o contexto das palavras que estou usando. Eu só sei que devo dizer alguma coisa.

Eu sou muito orientado visualmente porque a linguagem é muito difícil para mim.
Por favor, me mostre como fazer alguma coisa ao invés de simplesmente me dizer. E, por favor, esteja preparado para me mostrar muitas vezes. Repetições consistentes me ajudam a aprender. Um esquema visual me ajuda durante o dia-a-dia. Alivia-me do stress de ter que lembrar o que vai acontecer. Ajuda-me a ter uma transição mais fácil entre uma atividade e outra. Ajuda-me a controlar o tempo, as minhas atividades e alcançar as suas expectativas. Eu não vou perder a necessidade de ter um esquema visual por estar crescendo. Mas o meu nível de representação pode mudar. Antes que eu possa ler, preciso de um esquema visual com fotografias ou desenhos simples. Com o meu crescimento, uma combinação de palavras e fotos podem me ajudar mais tarde a conhecer as palavras.

Por favor, preste atenção e diga o que eu posso fazer ao invés de só dizer o que eu não posso fazer.
Como qualquer outro ser humano não posso aprender em um ambiente onde sempre me sinta inútil, que há algo errado comigo e que preciso de "CONSERTO". Para que tentar fazer alguma coisa nova quando sei que vou ser criticado? Construtivamente ou não é uma coisa que vou evitar. Procure o meu potencial e você vai encontrar muitos! Terei mais que uma maneira para fazer as coisas.

Por favor, me ajude com interações sociais.
Parece que não quero brincar com as outras crianças no parque, mas algumas vezes simplesmente não sei como começar uma conversa ou entrar na brincadeira. Se você pode encorajar outras crianças a me convidarem a jogar futebol ou brincar com carrinhos, talvez eu fique muito feliz por ser incluído. Eu sou melhor em brincadeiras que tenham atividades com estrutura começo-meio-fim. Não sei como "LER" expressão facial, linguagem corporal ou emoções de outras pessoas. Agradeço se você me ensinar como devo responder socialmente. Exemplo: Se eu rir quando alguém cair do escorregador não é que eu ache engraçado. É que eu não sei como agir socialmente. Ensine-me a dizer: "você esta bem?

Tente encontrar o que provoca a minha perda de controle.
Perda de controle, "chilique", birra, malcriação, escândalo, como você quiser chamar, eles são mais horríveis para mim do que para você. Eles acontecem porque um ou mais dos meus sentidos foi estimulado ao extremo. Se você conseguir descobrir o que causa a minha perda de controle, isso poderá ser prevenido - ou até evitado. Mantenha um diário de horas, lugares pessoas e atividades. Você encontrar uma seqüência pode parecer difícil no começo, mas, com certeza, vai conseguir. Tente lembrar que todo comportamento é uma forma de comunicação. Isso dirá a você o que as minhas palavras não podem dizer: como eu sinto o meu ambiente e o que está acontecendo dentro dele.

Se você é um membro da família me ame sem nenhuma condição. Elimine pensamentos como "Se ele pelo menos pudesse?" ou "Porque ele não pode?" Você não conseguiu atender a todas as expectativas que os seus pais tinham para você e você não gostaria de ser sempre lembrado disso. Eu não escolhi ser autista. Mas lembre-se que isto está acontecendo comigo e não com você. Sem a sua ajuda a minha chance de alcançar uma vida adulta digna será pequena. Com o seu suporte e guia, a possibilidade é maior do que você pensa. Eu prometo: EU VALHO A PENA. E, finalmente três palavras mágicas: Paciência, Paciência, Paciência. Ajuda a ver o meu autismo como uma habilidade diferente e não uma desabilidade. Olhe por cima do que você acha que seja uma limitação e veja o presente que o autismo me deu. Talvez seja verdade que eu não seja bom no contato olho no olho e conversas, mas você notou que eu não minto, roubo em jogos, fofoco com as colegas de classe ou julgo outras pessoas? É verdade que eu não vou ser um Ronaldinho "Fenômeno" do futebol. Mas, com a minha capacidade de prestar atenção e de concentração no que me interessa, eu posso ser o próximo Einstein, Mozart ou Van Gogh. Eles também tinham autismo.

O que o futuro tem guardado para crianças autistas como eu, está no próprio futuro. Tudo que eu posso ser não vai acontecer sem você sendo a minha base. Pense sobre estas "regras" sociais e se elas não fazem sentido para mim, deixe de lado. Seja o meu protetor seja o meu amigo e nós vamos ver até onde eu posso ir. CONTO COM VOCÊ".






ANEXO "D"


Construa-me uma ponte

Eu sei que você e eu nunca fomos iguais.
E eu costumava olhar para as estrelas à noite.
E queria saber de qual delas eu vim.
Porque eu pareço ser parte de um outro mundo
E eu nunca saberei do que ele é feito.
A não ser que você me construa uma ponte, construa-me uma ponte,
Construa-me uma ponte de amor.
Eu quero ser bem sucedido.
E tudo o que preciso é de uma ponte
Uma ponte construída de mim até você.
E eu estarei junto a você para sempre,
Nada poderá nos separar.
Se você me construir uma ponte, uma pequenina ponte, minúscula ponte,
De minha alma, para o fundo de seu coração.

McKean (Autista, 32 anos, escritor.



























ANEXO "E"




Desacertos do comportamento

(Ubiratan D?Ambrosio)

"O comportamento humano revela um inaceitável índice de arrogância, prepotência, fanatismo, ganância, inveja, presunção e tantas outras manifestações de desacerto.
O ser humano tem se perguntado:
QUEM É?
E se vê como o favorito de algum deus.
O QUE É?
E se vê como um sistema complexo de músculos, ossos, nervos e humores.
COMO É?
E se explica como uma anatomia com vontade.
QUANTO É?
E se acredita sem limitações à sua vontade e ambição.
Mas evita perguntar POR QUE É?
É necessário reconhecer o valor intrínseco do indivíduo: VALE PORQUE É NÃO PELA MANEIRA COMO É, e a essencialidade do outro, para que o indivíduo POSSA SER".

























ANEXO "F"


"Anti-Anne Frank"

Esta criança esquálida,de riso obsceno e olhares alucinados,
Nunca apertou nas mãos a fria face pálida,
Nunca sentiu, na escada, as botas dos soldados,
Nunca enxergou as lágrimas que aniquilam e esgotam,
Nunca empalideceu com o metralhar dum tanque,
nem rastejou num sótão, nem se chama Anne Frank.
Nunca escreveu diário nem nunca foi à escola,
nem despertou o amor dos editores piedosos.
Nunca estendeu a mão em transes dolorosos,
a não ser nos primores da técnica da esmola.
Batem-lhe, pisam-na, insultam-na, sem que ninguém se importe.
E ela, raivosa e pálida,
morde, estrebucha, cospe, odeia até à morte.
Pobre criança esquálida!
Até no sofrimento é preciso ter sorte.

(Antonio Gedeão - "Anti-Anne Frank"
in Poesia Completa, Ed. João Sá Costa, Ltda
1ª edição de 1996)



























ANEXO "G"


O Autismo

"O Autismo não é algo que uma pessoa tenha, ou uma concha na qual ela esteja presa. Não há nenhuma criança normal escondida por trás do Autismo. O Autismo é um jeito de ser, persuasivo; colore toda a experiência, toda sensação, percepção, pensamento, emoção e encontro, todos os aspectos da existência. Não é possível separar o Autismo da pessoa. E se o fosse, a pessoa que você deixaria não seria a mesma com a qual você começou. Os autistas são estrangeiros em quaisquer sociedades. NÃO CHOREM POR NÓS".
(Jim Sinclair)



































ANEXO "H"


O meu clã

"O meu clã, grupo, bando, ou como lhe queiram chamar,
é o dos deficientes (também nos podiam chamar "suficientes", mas quiseram
batizar-nos assim, assim seja)
... Mas o pior foi quando entrei para a escola primária ... Sim foi aí que me apercebi da minha diferença quando um engraçadinho me apelidou de "perna de pau" e "fraldinhas".
Conclusão: eu era mesmo diferente ... e aquelas crianças confundiram-me com um E.T. que, vindo de Plutão aterrara naquela escola".
(Revista Educação, 1995: 60)