O CONSUMISMO INFANTIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS

 

 

Autor: Wanderléia Aparecida Nunes Chechelaky

 

                                                                               Orientador: Michael Dias Corrêa

 

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo apresentar alguns pontos acerca de um assunto ainda pouco debatido pela sociedade, o Consumismo Infantil e suas Consequências. Optou-se por uma pesquisa exploratória de caráter qualitativo; o estudo contou ainda com levantamentos em fontes secundárias, tais como bibliografias específicas, bem como levantamento em fontes primárias – pesquisa de campo, com a realização de entrevistas em profundidade com pessoas da classe B e C da cidade de Manaus-AM. A pesquisa foi realizada em duas etapas: Na primeira foram entrevistadas vinte crianças com idade de dez a doze anos. Em seguida foram realizadas as entrevistas com dez pais. O objeto principal do estudo foi a influência dos comerciais de televisão sobre o processo de decisão de compra do público infantil. As crianças são bombardeadas diariamente pela mídia com milhares de informações direcionadas ao consumo. A partir desse levantamento foi possível identificar que o público em estudo é extremamente consumista, e sem nenhuma preocupação acerca das conseqüências do consumo exagerado. Os resultados das pesquisas comprovaram que os padrões de comportamento do consumidor infantil são diretamente influenciados pela televisão.

Palavras - chave: Comportamento do consumidor. Televisão. Consumo Consciente. Sustentabilidade. Consumismo Infantil.

 

Introdução

Atualmente a mídia tem sido o fator de influênia determinante para o aumento do cosumismo infantil. As empresas de publicidade estão cada vez mais empenhadas em produzir belos comerciais como forma de atrair as crianças ao consumo. De acordo com o  Ministério do Meio Ambiente em parceria com o Instituto Alana na série “Cadernos de Consumo Sustentável”, ninguém nasce consumista. O consumismo é uma ideologia, um hábito mental forjado que se tornou uma das características culturais mais marcantes da sociedade atual.

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                  1Wanderléia Aparecida Nunes Chechelaky, Bacharel em Administração (Faculdades SPEI), MBA Administração e Marketing (Grupo Uninter).

                  2Michael Dias Corrêa, Bacharel em Ciências Contábeis (Universidade Federal do Paraná), Mestre em Contabilidade (Universidade Federal do Paraná), orientador de TCC do Grupo Uninter.

 

As crianças, ainda em pleno desenvolvimento e, portanto, mais vulneráveis que os adultos, não ficam fora dessa lógica e infelizmente sofrem cada vez mais cedo com as graves consequências relacionadas aos excessos do consumismo: desenvolvimento precoce, aumento da geração de resíduos, obesidade, adultização precoce, falta de criatividade, violência, entre outras. Nesse sentido, o consumismo infantil é uma questão urgente, de extrema importância e interesse da sociedade em geral.

Em março de 2007, o IBOPE Mídia divulgou os dados de investimento publicitário no Brasil. Segundo o levantamento, esse mercado movimentou cerca de R$ 39 bilhões em 2006. De acordo com os dados da pesquisa a televisão permanece como a principal mídia utilizada pela publicidade.

Ao cruzar essa informação com o fato da criança brasileira passar em média 4 horas 50 minutos e 11 segundos por dia assistindo à programação televisiva é possível imaginar o impacto da publicidade na infância. No entanto, apesar de toda essa força, a publicidade veiculada na televisão é apenas um dos fatores que contribuem para o consumismo infantil.

Por outro lado crianças são consumidoras em potencial e diariamente são criados novos produtos para esse público. Nesse contexto há algumas pesquisas que analisam como surge o comportamento do consumidor infantil, a exemplo do estudo de Carlson, Grossbart e Walsh (1990) que verificou a comunicação entre mães e filhos, posturas educacionais, o papel da televisão e a socialização consumidora das crianças.

 A socialização segundo o dicionário Aurélio é o processo pelo qual o indivíduo, no sentido biológico, é integrado numa determinada sociedade. Pela socialização o indivíduo se torna pessoa humana, adquirindo os hábitos que o capacitam a viver em uma determinada sociedade. Significa aprendizagem ou educação, no sentido mais amplo da palavra, aprendizagem essa que começa na infância e termina com a morte da pessoa.

Essa mudança no comportamento do consumidor infantil é reflexo da crescente autonomia e influência no processo de compra da família. Desde que nascem as crianças recebem as influências dos pais e de outros agentes próximos, dando-lhes a conhecer o mundo em que vivem e as regras por que se regem.

 Diante desse cenário, o presente artigo tem como objetivo verificar, comparar e disseminar os dados acerca de um assunto ainda pouco discutido, mas que vem ganhando ênfase nos últimos tempos, o consumismo infantil. Pretende-se através de um estudo mais avançado identificar os fatores que influenciam as crianças ao consumo exagerado e suas conseqüências para o futuro do planeta. È de extrema relevância conhecer, estudar e monitorar constantemente os fatores que influenciam o comportamento do consumidor infantil, pois isso irá possibililitar que hábitos sejam respensados.

Os métodos utilizados para o tratamento do tema foram os seguintes: primeiro realizou-se um levantamento bibliografico sobre o assunto, em seguida foram realizadas pesquisas de campo em duas etapas, a primeira deu-se através de questionários com as crianças e na segunda etapa através de entrevistas com o os pais.

De modo geral buscou identificar as preferências das crianças, o que mais gostam de comprar, que tipo de produtos as atraem, por quais atividades se interessam, suas opiniões sobre as decisões de compra da família, a influência da televisão sobre suas vontades e apelos, a interferência da mídia e da tecnologia, nos seus mais diversos meios, a respeito de suas ações e reações frente a esse aspecto.

Dados sobre o consumismo infantil no Brasil

Pesquisas mostram que as crianças brasileiras estão entre as que mais assistem televisão no mundo com uma média impressionante de mais de 5 horas por dia segundo o levantamento do Ibope (2011). Além do consumo de energia e do sedentarismo infantil, essa exposição excessiva contribui para o consumismo, já que a televisão é o principal canal de veiculação de comerciais que falam diretamente com as crianças. Pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo feita em parceria com o Instituto Alana apontou que 64% de todos os anúncios veiculados nas emissoras monitoradas às vésperas do Dia das Crianças 2011 foram direcionados para o público infantil. 

Além de todos esses problemas relacionados ao consumismo divulgados pela pesquisa, a obesidade infantil é outro fator preocupante que segue num ritmo assustador e já atinge 15% da população infantil brasileira. De acordos com os dados do IBGE (2008), o sobrepeso infantil dobrou nos últimos 34 anos e está intimamente relacionado ao aumento do consumo de alimentos industrializados amplamente divulgado pelo mercado produtor e distribuidor, sem falar a publicidade.

A publicidade de alimentos industrializados como os fast foods, estimula o consumo excessivo e agrava o aumento dos índices de sobre peso e obesidades infantil, 1 em cada 3 crianças de 5 a 9 anos está acima do peso e sobre peso segundo dados da POF 2008 – 2009, produzido pelo IBOPE.

Segundo Dias (2004) “as pessoas estão sujeitas, diariamente, a muitos estímulos, originados em mídias como televisão, rádio, jornais, revistas, outdoors, painéis e Internet ”. Todos estes estímulos podem fazer a pessoa reagir a alguns e a não reagir a outros, dependendo muito da forma pela qual pessoa percebe o estímulo.

Em pesquisa realizada pelo Nickelodeon Business Solution Research (2007), apurou-se que há aproximadamente 48,8 milhões de crianças no Brasil. A tabela apresentada a seguir demonstra os gastos médios, por segmento, realizados no país com esses pequenos consumidores:

Tabela 1 – Gastos médios por segmento

Fast food

R$ 5 bilhões

Brinquedos

R$ 1 bilhão

Publishing (revistas, HQs, figurinhas)

R$ 353 milhões

Cinema (bilheteria)

R$ 200 milhões

DVD infantil

R$ 160 milhões

Parques

R$ 120 milhões

Higiene pessoal, perfumaria e cosméticos

R$ 102,8 milhões

TV por assinatura

R$ 60 milhões

               Fonte: Adaptado de Nickelodeon Business Solution Research (2007)

Essa mesma pesquisa demonstra que crianças acompanham a pessoa responsável nas compras e exercem forte influência sobre ela com relação aos produtos que são adquiridos. Deve-se considerar que a inserção precoce das crianças no universo do consumo pode ter consequências importantes no seu desenvolvimento.

A infância está mais curta. Pelo menos no que diz respeito ao consumo. Roupas, aparelhos eletrônicos, cosméticos e jogos eletrônicos estão cada vez mais no topo da lista de preferência da garotada, que com isso vai deixando os brinquedos de lado e entrando mais no universo dos adultos. (RIBEIRO e CASEMIRO, 2007, P. 6 )

O mundo infantil é cheio de fantasias, dessa forma, o apelo que uma propaganda exerce sobre as crianças tem o mesmo efeito de um desenho animado, pois, de acordo com os estudiosos da área, uma criança não consegue distinguir a propaganda do programa a que assiste. Assim, o segmento infantil também passou a ser um grande atrativo para a publicidade, pela influência que as crianças têm sobre os adultos na decisão de compra da família. A publicidade – nas suas mais variadas formas, os meios de informação e a tecnologia também são responsáveis pela formação da personalidade de consumo desse público quando adulto.

Pesquisas demonstram que o consumismo no Brasil nos últimos anos vem crescendo em grande escala. Esse fenômeno é alimentado pelo aumento da renda da população e dos incentivos fiscais oferecidos pelo governo às empresas. De acordo com dados da revista ISTOÉ, de 2003 a 2011, a renda média do brasileiro cresceu 33% e essa revolução, está ocorrendo de maneira mais agressiva do que em outros lugares.

Para o Ministério do Meio Ambiente em parceria com o Instituto Alana, esses dados retratam uma realidade que precisa ser repensada. A criança não deve ser alvo do mercado nem iniciada no mundo do consumo sem que seja educada para isso. Antes de conhecer marcas e produtos, a criança precisa ser preparada para ser cidadã, além de consumidora consciente e responsável.

 

O Comportamento do consumidor Infantil

Segundo Kotler (1998), a área do comportamento do consumidor estuda como pessoas, grupos e organizações selecionam, compram, usam e descartam produtos, serviços, idéias ou experiências para satisfazer suas necessidades e seus desejos. O autor complementa que a cultura é o fator determinante dos desejos e do comportamento de uma pessoa. A criança em desenvolvimento adquire um conjunto de valores, percepções, preferências e comportamentos através da vida familiar e de outras instituições básicas.

Para Karsaklian, (2004, p. 20), o ato de compra não surge do nada, é a motivação que vai conduzir a uma necessidade a qual despertará um desejo. Com base a tal desejo, surgem as preferências por determinadas formas específicas de atender à motivação inicial e essas preferências estarão diretamente relacionadas ao autoconceito.

As decisões de compras podem desenvolver em um processo coletivo, sendo muitas vezes os filhos que escolhem o que os pais devem comprar. Isso pode acontecer devido às mudanças no estágio de vida das famílias, como por exemplo, aquelas em que os pais são jovens e com o primeiro filho, tem um comportamento de compra diferente de casais de mais idade e com mais filhos.

Além desse fator, há também o comportamento de compra em que leva pelo lado emocional. Devido a ausência dos pais e pela rotina do dia a dia, há ainda pais que ao ver algo na vitrine da loja acaba se encantando e comprando para recompensar pela ausência, isso acontece na maioria das vezes com mães de filhos pequenos, afirmação seguida por Ferracciù ( 2002).

 Para Pinheiro et. al. (2006, p. 36), é importante perceber o ciclo de vida familiar e suas implicações para o processo de compra, além disso, em função da modificação dos padrões econômicos, sociais, culturais e educacionais, novos hábitos, divisões de papéis e configurações marcam as famílias contemporâneas.

Nesse mesmo embasamento Montigneaux (2003) afirma que a relação entre pais e filhos, antes marcada pela autonomia, modificam-se pouco a pouco e esse comportamento novo se explica pela mudança dos modelos de educação e pela modificação do relacionamento com a criança.

Esse tipo de comportamento em muitos casos, é devido ao fato de que os pais trabalham fora e a criança passa a maior parte do tempo em casa com seus respectivos tutores e terceiros. E nos momentos livres eles passam a maior parte do  dia assistindo TV, jogando vídeo game ou navegando na internet.

   Com tanta exposição à mídia, as crianças adquirem informação suficiente para gerar um desejo pelo consumo e ter a liberdade de escolher seus próprios produtos, além de serem também influenciadas pela sociedade, modernização das indústrias e pelo convívio com os amigos. Nesse conceito, Underhill (1999) complementa, há ainda o fato de que as crianças consomem mais mídia de massa do que os adultos, com grande parte dela tentando vender-lhes coisas.

   Para Araújo (2009), há também o fato de que, o mercado de produtos destinados ao público infantil está em constante crescimento, da mesma forma que os pais compram para presentear os filhos, há o que se diz em relação a eles próprios poderem ir até a loja para comprar, assim começa a surgir o desejo pelo consumo. E quando isso acontece, muitas empresas começam a se interessar e ampliar seu mix de produtos e serviços destinados a atender as crianças e acima de tudo agradar os pais também.

 

Educação para o consumo consciente

 Resultado do aumento da população mundial, o crescimento desenfreado do consumo revela a necessidade de ampliação da produção de massa, da qualidade dos produtos produzidos e, ainda, do desenvolvimento tecnológico, capaz de atender uma sociedade capitalista, em que o consumo diferencia as pessoas pelo que se tem. O modelo econômico adotado pelas sociedades modernas induz seus cidadãos a um alto padrão de consumo.

Nas sociedades de consumo, consumir não envolve somente trocas econômicas – o consumo se inicia com os olhos, pois absorvemos produtos com o olhar cada vez que empurramos um carrinho pelos corredores de um supermercado, assistimos à televisão ou dirigimos ao longo de uma rodovia pontuada por logotipos. Willis (1997, p. 44).

O consumo visual é de tal forma parte de nosso panorama cotidiano que não nos damos conta dos significados inscritos em tal procedimento. Assim, diante de tantas ofertas visuais, percebemos que nos rendemos e acabamos por adquirir produtos muitas vezes desnecessários ou dispensáveis.

Penna (1999, p. 216) ressalta que “o capitalismo moderno deu à luz o consumismo, o qual criou raízes profundas entre as pessoas. O consumismo tornou-se a principal válvula de escape, o último reduto de autoestima em uma sociedade que está perdendo rapidamente a noção de família e convivência social”.

Para que possa colocar os níveis de consumo em posição desejada, e ao mesmo tempo manter atendidas as necessidades de conforto proporcionadas pelas facilidades da vida moderna é necessário considerar como opção de vida o consumo responsável.

O consumo responsável, chamado também de consumo sustentável, nasce da mudança de comportamento dos consumidores e da sociedade em geral. Como causa defendida por muitos, e para que o desenvolvimento econômico siga seu caminho, é preciso considerar mudanças nos padrões de consumo, tendo a sustentabilidade como premissa.

De acordo com a série “Cadernos de Consumo Sustentável”, desenvolvida pelo Ministério do Meio Ambiente em parceria com o Instituto Alana (2012), a sustentabilidade baseia-se na capacidade de uma nação promover o bem estar social desta e das futuras gerações. Para tanto, é preciso consumir de forma responsável os recursos naturais disponíveis, respeitando seus limites e período de regeneração além de diminuir a quantidade de lixo gerado.

Garantir um futuro abundante àqueles que hoje são crianças não depende apenas da mudança de comportamento da atual geração, mas também de educar para o consumo consciente. Esse é o caminho que deve ser trilhado, a busca do desenvolvimento sustentável. Esse processo deve iniciar ainda na infância; desde pequenas, as crianças devem ser estimuladas a descobrir que cada uma de suas ações tem impacto no coletivo e que, no que diz respeito no cuidado com o meio ambiente, isso não é diferente. Antes de serem apresentadas ao mundo do consumo elas também devem aprender valores essenciais à sobrevivência da humanidade, como a solidariedade o senso de responsabilidade com o bem comum, o respeito ao outro e ao meio em que vivem.

Embora esse percurso de aprendizagem sobre o papel de cada um na sociedade pareça absolutamente natural, não é assim que tem acontecido. Um dos maiores desafios é reverter o cenário atual: antes de serem formados para a cidadania devem ser treinados a não consumir de forma desenfreada.

Ao mesmo tempo, o incentivo ao consumo excessivo por parte da mídia sem preocupar-se com a ética e a falta de respeito às legislações ambientais, são apenas alguns dos fatores que contradizem todo o esforço de uma educação para a sustentabilidade.

Para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 1998, p.65), o consumo sustentável é o fornecimento de serviços e de produtos que preencham as necessidades básicas e deem uma melhor qualidade de vida, ao mesmo tempo em que se diminui o uso de recursos naturais e de substâncias tóxicas, assim como as emissões de resíduos e de poluentes durante o ciclo de vida do serviço ou do produto, com a ideia de não se ameaçar as necessidades das gerações futuras.

Pensando nisso em 2006 o Instituto Akatu desenvolveu uma cartilha acerca do consumo consciente que tem sido muito útil para a educação das crianças. Ela apresenta doze princípios básicos que, se bem entendidos e trabalhados pelas organizações, podem trazer benefícios tanto do ponto de vista da organização social e manutenção dos recursos quanto do ponto de vista do consumidor. Dentre os principais destaca-se alguns princípios que orientam as pessoas ao consumo consciente como: considerar os seus níveis de consumo e o impacto de seu consumo no meio ambiente e na sociedade, separar o lixo, não consumir produtos piratas ou contrabandeados, cobrar dos organismos públicos sobre ações que viabilizem a prática o consumo consciente, avaliar os princípios e fazer escolhas pelo consumo consciente, dentre outros.

Para o Instituto Akatu (2006), a criação dos "Doze Princípios do Consumidor Consciente", é resultado de cinco anos de estudos, mobilizações e desenvolvimento de metodologias, para serem aplicados no dia-a-dia do cidadão que não pensa apenas na sua satisfação na hora de fazer escolhas. E que sabe que uma mudança no padrão de consumo da sociedade é urgente.

Sair do paradigma da abundância, que ainda prevalece, para a consciência da escassez. Adotar novos estilos de vida, combater os desperdícios, repensar os conceitos de qualidade de vida e felicidade. Rever valores.

Estes são os principais desafios que os cidadãos de hoje deverão enfrentar na construção de uma nova sociedade de consumo, mais sustentável, na qual a satisfação das necessidades humanas caminhe junto à preservação dos recursos naturais do planeta.

O papel da família no combate ao consumismo infantil

Vive-se num mundo em que possuir é parte de nossas escolhas. Porém, cabe às famílias e profissionais que lidam com a infância repensar o rumo tomado quanto à postura diante do apelo consumista. Vale a pena pensar e ponderar para, depois, transmitir a elas que a felicidade ou caráter de uma pessoa não está na quantidade de objetos que ela possui e, sim, no afeto que cada objeto ganho ou conquistado pode representar.

O papel da família e da escola é educar as crianças para um consumo consciente, que possibilite a elas, no futuro, serem adultos felizes, desejando apenas o que realmente é necessário e não o que a sociedade insinua que é preciso ter. É possível observar que até este momento as crianças são reflexos das atitudes dos pais que muitas das vezes utilizavam-se do consumo como recompensa e até mesmo para oferecer a eles o que os mesmos não tiveram.

Para Mário Sérgio Cortella, filósofo e professor da PUC-SP, a mídia tem, sim, influencia no estímulo ao consumo, mas não é a única culpada. A escola e até mesmo a família podem exercer esse papel".

Já o psicólogo Yves de La Taille, também professor e pesquisador da USP, cita que a resposta a esse problema está na existência de uma valorização da chamada "cultura da vaidade". As crianças vivem, desde cedo, em meio à valorização do "ter" em vez do "ser". Principalmente a partir dos três anos de idade.

 Os prejuízos dessa cultura para o desenvolvimento da criança são muitos. "Destruição da criatividade, erotização precoce e estresse", afirma Susan Linn, professora de Psiquiatria de Harvard. "Hoje em dia, as brincadeiras são roteirizadas, como um filme que as crianças vêem muitas vezes. Elas não são incentivadas a pensar por si mesmas e a inventar seus próprios brinquedos, pois grande parte deles já vem com um chip de computador inserido, com tudo programado".

Seria possível, então, ensinar as crianças a resistir a esse consumo? Para Cortella, a resistência começa em casa. "A criança só vai ser um consumidor desvairado se os pais estimularem esse comportamento". La Taille também defende essa idéia. "Ninguém nasce consumidor. Só que algumas crianças, aos 10 anos de idade, já têm mais objetos do que qualquer adulto", afirma o psicólogo. De acordo com especialistas, até os 12 anos de idade, as crianças não têm capacidade de distinguir entre o que é bom ou ruim. Assim, não devem esperar que eles se defendam do marketing.

Se até os adultos, são suscetíveis, imagine as crianças", afirma Susan, que defende a proibição da propagada para crianças até essa idade. Eles acreditam, ainda, que os pais não estão conseguindo desempenhar a responsabilidade em controlar o impulso consumista dos filhos. Para ela a ajuda do governo é essencial.

No Brasil, há uma série de projetos de lei que defendem a regulamentação da publicidade destinada ao público infantil, mas a questão ainda é polêmica.  Regina de Assis, diretora da produtora de mídia Multirio, afirma que há órgãos reguladores da publicidade no país, como o CONAR (Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária), mas que estes precisam ser mais explícitos. "As regulamentações precisam funcionar. E para isso, é fundamental que se fale mais sobre o assunto", afirma.

Segundo dados da Revista Crescer (2011), no Brasil não existe uma legislação específica, mas desde 2006 são proibidas propagandas - em todos os meios de comunicação - com apelos como "Peça para a mamãe comprar" ou que façam alusão à superioridade ou inferioridade que o produto possa oferecer. Mas não há classificação indicativa prévia mostrando o assunto que vai ser tratado nem restrição do horário. Está em discussão no Congresso Nacional como essa legislação poderia ser elaborada. Para Canela, esse é um direito de todo cidadão. A saída é que os pais fiquem mais atentos ao que as crianças assistem, brincam, ou jogam. E não apenas na televisão; computadores, games e celulares são outros meios de fazer a publicidade chegar até as crianças, sem falar em programas com conteúdos inapropriados para determinadas faixas etárias.

De acordo com as pesquisas foi possível identificar que há várias discussões, mas não há nada de concreto acerca da proibição da propaganda para as crianças até 12 anos de idade. Porém alguns psicólogos acreditam que para não ter uma geração de filhos consumistas é preciso criar meios para protegê-los.

Sendo assim, sugere-se que enquanto não há uma legislação para isso; a família é a responsável pela conscientização dos filhos para um consumo mais responsável. A conscientização não é uma tarefa fácil, exige disciplina e força de vontade, entretanto é imprescindível para a sustentabilidade do planeta.

Metodologia da pesquisa

Optou-se por trabalhar com a pesquisa qualitativa, por meio de estudo exploratório, através de questionários, entrevistas em profundidade e de observações.  Foram entrevistadas vinte crianças com idade entre 10 a 12 anos e dez pais, pertencentes às classes B e C da cidade de Manaus-AM.

O processo de coleta realizou-se em duas etapas: a primeira contou com a aplicação de questionários, distribuídos e recolhidos pessoalmente com as crianças, em seguida foram entrevistados os pais.

O estudo contou ainda com levantamentos em fontes secundárias, tais como bibliografias específicas, bem como levantamento em fontes primárias – pesquisa de campo, com a realização de entrevistas em profundidade.

“A Metodologia é parte de uma ciência que estuda os métodos aos quais ela se liga ou de que se utiliza: metodologia lingüística”. Dicionário Aurélio.

Segundo Pedro Demo, (1996), a proposta atual da metodologia tem como pressuposto crucial a convicção de que o aprendizado pela pesquisa é a especialização mais própria da educação escolar e acadêmica da necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana para professor e aluno.

Assim, a metodologia corresponde a um conjunto de procedimentos a ser utilizado na obtenção do conhecimento. É a aplicação do método, por meio de processos e técnicas, que garante a legitimidade científica do saber obtido.

Resultados

   Os resultados das pesquisas mostraram que a maioria das crianças entrevistadas passam mais de cinco horas em frente à TV, ou seja, das vinte crianças entrevistadas quinze disseram que assistem televisão mais de 5 horas por dia, e passam mais de três horas na internet. Das vinte crianças dezesseis disseram que costumam ir às compras com os pais e dezoito delas informou que sempre pedem que os pais comprem algo para elas.  Na opinião delas o meio que mais influencia o processo de consumo são os comerciais de TV, das vinte crianças pesquisadas treze citaram os comerciais de TV como o vilão para o estimulo ao consumo.

Das vinte crianças entrevistadas quatorze possui um aparelho celular. Todos têm acesso à internet seja através do computador na escola, em casa ou de meios eletrônicos como é o caso do celular. A alta na posse de celulares entre as crianças está relacionada aos esforços das operadoras em estimular o seu uso através de planos acessíveis e aos apelos da propaganda por parte da mídia.

Na segunda etapa a pesquisa foi realizada com os pais e possibilitou confirmar algumas informações citadas pelas crianças. De acordo com os dez pais entrevistados os produtos mais consumidos pelos seus filhos são alimentos e aparelhos eletrônicos (celular). Os pais apontaram, espontaneamente, alguns pedidos que os filhos costumam fazer, chocolate e celular foram os mais mencionados.

Seis dos dez pais entrevistados afirmaram serem influenciados pelos filhos na hora da compra. Sete deles informaram ainda que os filhos sempre vão às compras e normalmente pedem algo. De acordo com a pesquisa todos informaram que o fator que mais influencia seus filhos ao consumo é a televisão; por meio de comerciais e propagandas direcionados ao público infantil.

Outro dado relevante é que as pesquisas de campo foram realizadas com  crianças e pais pertencentes às classes B e C, o que apontou que o fator renda não interfere no poder de consumo dessas pessoas devido às facilidades na aquisição de produtos. Por outro lado, com os rendimentos da população em alta, aumento do salário mínimo, crédito facilitado e dólar barato permitiram que uma parcela dos brasileiros saltasse das classes D e E para a C.

A pesquisa possibilitou comprovar que a televisão é meio mais influente no comportamento do consumidor infantil e que as crianças pesquisadas são extremamente consumistas, e não estão preocupadas com os problemas causados pelo consumo inconseqüente. Atualmente o produto mais consumido e desejado por pelo público estudado é o celular.

Os resultados das pesquisas de campo foram satisfatórios, pois possibilitou comparar alguns dados e confirmar as informações obtidas através das fontes secundárias.

Foi possível identificar as preferências das crianças, o que mais gostam de comprar, que tipo de produtos as atraem, por quais atividades se interessam, a influência da televisão sobre suas vontades e apelos, a interferência da mídia e da tecnologia, nos seus mais diversos meios, a respeito de suas ações e reações frente a esse aspecto.

Conclusão

 

O estudo possibilitou aprofundar o conhecimento a respeito de um assunto que é ainda é pouco estudado, porém de grande relevância e de interesse de todos. Vivemos em uma sociedade em que é mais importante ter do que ser. O consumo desenfreado tem proporcionado vários problemas à sociedade e ao meio ambiente.

Segundo dados da ONU (2011), a população mundial já chega a sete bilhões de pessoas. Caso continuem sendo estimuladas a consumir sem refletir sobre suas escolhas haverá um impacto negativo ainda maior em problemas que já afetam a sociedade. Se e o consumismo continuar nesse ritmo o planeta não terá recursos suficientes para atender a demanda das gerações futuras.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Alana (2012), essa nova realidade exige reflexões profundas. Muitas vezes encontramos respostas na educação – conceito amplo e de responsabilidade compartilhada, que não se dá só em casa ou na escola, mas também nas ruas e nas diversas mídias.

As crianças, nesse sentido são a porta de entrada para um futuro mais sustentável. Se aprenderem a agir e a consumir com consciência, serão importantes transformadores sociais. Mas crianças estão sendo formadas para isso? Nas escolas, as iniciativas ainda são muito tímidas, com atividades pedagógicas voltadas principalmente para a educação ambiental.

   É preciso ir além e reforçar a relação entre o consumo e o meio ambiente, tratando do impacto de nossas escolhas para o planeta e do dano que nosso atual modelo de consumo já causou.

   A questão do Consumismo infantil não se restringe apenas à esfera da família. Todos nós temos o dever de garantir às crianças bem-estar, saúde, educação, moradia, alimentação, cultura e lazer, como determina o artigo 227 da Constituição Federal.

   Também todos nós temos o direito de viver em um meio ambiente ecologicamente equilibrado, de onde deriva o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. São questões que passam, necessariamente, pela mudança de nosso processo de comportamento de consumo.

   Para tanto, cada um tem um papel fundamental no que diz respeito à educação para o consumo sustentável, pois não abrange somente a compreensão da força do indivíduo como consumidor, mas as mudanças que podem causar com seu poder de escolha. Os valores relacionados ao consumo precisam evoluir do “ter pelo status” para o “ter aquilo que é necessário para o bem-estar”. A mudança do olhar sobre o consumo é um grande desafio que precisa ser vivenciada por todos.

 

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