O CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E O PRAZO PROPOSTO NO PL 4.209/2001 PARA A CONCLUSÃO DO INQUÉRITO POLICIAL

INTRODUÇÃO

Vivencia-se um período em que a sociedade está cada dia mais incrédula frente ao Poder Público, e essa situação se agrava quando se fala em crimes.

Dentre os problemas existentes no ordenamento jurídico, um deles é com relação ao tempo de duração das investigações criminais. Percebida essa dificuldade, foi criada uma comissão que depois de tempos de estudos a respeito do assunto, elaborou um pré-projeto no qual um de seus objetivos é a finalização do inquérito policial de forma mais célere. Finalizado o texto, o mesmo foi enviado à Câmara dos Deputados, onde permanece até o presente momento.

Apesar do referido Projeto de Lei, que recebeu o número 4.209/2001, propor alterações em diversos pontos isolados do Código de Processo Penal, um dos aspectos de suma importância e que será abordado no presente, é o que trata do prazo para o término do inquérito policial estando o investigado solto, nos processos que tramitam perante a justiça comum estadual.

PRAZO ATUALMENTE EM VIGOR PARA O TÉRMINO DO INQUÉRITO POLICIAL

O prazo que vigora atualmente é aquele estabelecido pelo Código de Processo Penal, em seu art.10[1], determinando que o inquérito policial deverá ser encerrado no prazo de 10 dias se o indiciado se encontrar preso ou no prazo de 30 dias se o indiciado estiver solto.

O mesmo art. 10, em seu parágrafo terceiro, faculta à autoridade policial requerer ao juiz a prorrogação do prazo para o encerramento das investigações.

O Código de Processo Penal, de forma expressa, deixa claro que esse prazo não é fatal, uma vez que a autoridade policial pode remeter os autos do inquérito policial ao juiz no estado que se encontra e motivadamente, dizer que não foi possível concluir as investigações, tendo em vista tratar-se de fato de difícil elucidação.

Observa-se no dia-a-dia que realmente existem casos de dificuldades inúmeras que são humanamente impossíveis de serem investigados no prazo de 30 dias, por isso a importância dessa faculdade que tem a autoridade policial em pedir ao juiz que devolva os autos com o prazo renovado. No entanto, deve ser observado também que algumas investigações policiais se valem dessa faculdade para trabalharem com prazos indefinidos e não são raras as vezes que esses inquéritos se encerram juntamente com a prescrição do fato, ou seja, a prescrição que será apreciada em juízo no momento oportuno, sepulta com todo trabalho realizado até aquele momento.

Um dos riscos decorrente de sucessivas prorrogações é a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa[2] prevista no art. 110, §2º do Código Penal. Se levarmos em conta que a maioria das investigações policiais dizem respeito a fatos que as penas são baixas e conseqüentemente o prazo prescricional é mais exíguo, não será incomum a aplicação da mesma.

Não são raras as vezes que o Poder Judiciário é criticado, mormente porque a sociedade quer ver resultados mais rápidos e ser a investigação criminal um ato demorado na maioria das vezes, agravando a sensação de impunidade.

PRAZO ESTABELECIDO NO PL 4.209/2001 PARA O TÉRMINO DO INQUÉRITO POLICIAL

Com o grande aumento de delitos e conseqüentemente de investigações dos mesmos, o projeto propõe um prazo fixo para o encerramento dessas investigações. A mudança - usando o termo empregado no Projeto – "buscadar maior agilidade à investigação ao mesmo tempo em que tenta diminuir a criminalidade", tendo em vista que a todo momento a sociedade exige das autoridades de nosso país uma resposta ao aumento exagerado da violência. Uma forma de tentar amenizar esse problema, segundo Exposição de Motivos, é finalizar as investigações de forma mais célere, para que essa sensação de impunidade se amenize.

O Projeto de Lei 4.209/2001[3] determina que o inquérito policial deverá ser concluído no prazo de 10 dias no caso de estar o indiciado preso e no prazo de 60 dias caso o indiciado esteja solto, diferentemente do que vigora atualmente que é o prazo de trinta dias podendo ser prorrogado por inúmeras vezes, no caso de indiciado solto.

O objetivo do Projeto de Lei quando determina um prazo que não admite ser prorrogado, é tentar evitar o que vem ocorrendo constantemente, que é a autoridade policial utilizar-se dessa prerrogativa sob o fundamento de que o caso em apuração é de difícil elucidação e por isso o prazo estabelecido pelo juiz foi exíguo para concluir o inquérito, conforme já exposto.

A improrrogabilidade do prazo de sessenta dias é tácita, uma vez que no Projeto de Lei não existe nenhuma disposição expressa dizendo que a mesma não é cabível ou vedada, mas ao mesmo tempo em que não diz nada a esse respeito, deixa claro que o inquérito "em qualquer caso, deverá ser concluído no prazo de sessenta dias"[4]. Como foi utilizado o vocábulo 'deverá' ao invés de 'poderá', interpretando-se o texto de lei frente à Exposição de Motivos, subentende-se não ser cabível a prorrogação do prazo.

Outro motivo que levou à escolha do prazo improrrogável foi o fato de que quanto mais tempo levar o inquérito policial para ser relatado, mais as provas irão se deteriorando ao longo do tempo e a cada dia que a conclusão da investigação se distancia da data de ocorrência do fato, maiores são as dificuldades para sua elucidação.

Percebe-se que tanto as Delegacias de Polícia quanto o Poder Judiciário vivem sobrecarregados de inquéritos policiais aguardando serem relatados. Assim, o prazo de sessenta dias para sua conclusão busca diminuir a quantidade de inquéritos policiais em trâmite porque supostamente serão encerrados dentro do prazo proposto pelo Projeto de Lei.

As finalidades do Projeto de Lei ficam bem claras em sua Exposição de Motivos, conforme passagem abaixo:

"Como é notório, uma das causas da demora na finalização do processo penal e, conseqüentemente, da impunidade, é a forma obsoleta como se desenvolve a investigação criminal, da excessiva burocratização do inquérito e a superafetação de prazos por ela provocada." [5]

(...) vale ressaltar que o Projeto representa, sobretudo, uma tentativa séria e vigorosa de agilização da investigação criminal – primeira e importantíssima fase da persecutio criminis, - consoante a mais moderna orientação do processo penal, que não pode mais atrelar-se à triste realidade brasileira atual de manifesta inaptidão para a produção dos importantes efeitos aos quais se destina.[6]

Percebe-se da Exposição de Motivos, que o legislador procurou não se afastar de seu norte, que é tornar mais célere a investigação criminal. Uma das formas de dar celeridade e buscar a impunidade foi estabelecer prazos fatais para o encerramento das investigações criminais para que assim os inquéritos não fiquem tramitando durante meses e não raramente durante anos como vem ocorrendo.

CONCLUSÃO

Vivenciamos um período de crise legislativa no qual a maioria dos problemas que ocorrem, especialmente quando se fala em criminalidade, a sociedade como um todo diz que são decorrentes de leis benevolentes demais ou por falta de aplicabilidade das mesmas, desaguando, conseqüentemente, em uma elaboração cada vez maior de leis para dar resposta a algum fato ocorrido.

O que o legislador está tentando fazer, no que diz respeito à investigação criminal, mais especificamente quanto à sua duração, é propor mudanças pontuais na legislação em vigor, criando prazos fixos que não admitem ser prorrogados.

O prazo para o término das investigações criminais deve ser melhor utilizado, tendo em vista que não são raras as vezes que recorre-se a essa faculdade para justificar a desídia da autoridade policial em alguns casos específicos e obviamente sua regulação legal depende de melhorias. Resta claro que da forma como são utilizadas as prorrogações de prazo, devido não haver um limite temporal e também não ser exigida da autoridade policial a demonstração de que realmente aquela investigação é de difícil elucidação, há necessidade de mudanças.

Mas da forma como o projeto de lei 4.209/2001 está propondo alterar o Código de Processo Penal, o problema não será resolvido porque o prazo improrrogável fatalmente não será obedecido na maioria das investigações, tendo em vista as inúmeras barreiras que são postas frente às mesmas.

A apuração de infrações penais é complexa e não deve estar cerceada por um prazo improrrogável porque imprevistos podem aparecer a qualquer momento, até mesmo porque não resolverá em nada marcar um prazo fatal se ele não será obedecido. Ao invés de se estipular um prazo que não admite ser prorrogado, poderia o Projeto de Lei sugerir esse prazo de sessenta dias como regra geral e abrir exceção nos casos de maior complexidade devidamente demonstrada, podendo então o inquérito policial ser finalizado em prazo superior ao estipulado ou fixar um prazo maior e único, para que assim possa ser obedecido e não adentre no ordenamento jurídico como norma natimorta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] Art. 10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contando o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

§1º. A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará os autos ao juiz competente.

§2º. No relatório poderá a autoridade indicar testemunhas que não tiverem sido inquiridas, mencionando o lugar onde possam ser encontradas.

§3º. Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz.

[2] Para o referido cálculo prescricional leva-se em conta o prazo decorrido entre o dia da ocorrência do fato delituoso e o dia do recebimento da denúncia ou da queixa. Se entre esses marcos houver transcorrido o período de tempo referido na legislação penal como caracterizador da prescrição, deverá haver a extinção da punibilidade, em face da prescrição retroativa, ou seja, extingue-se a pretensão punitiva do Estado.

[3] Art. 10. O inquérito policial, em qualquer caso, deverá ser concluído no prazo de sessenta dias, contados do conhecimento da infração penal pela autoridade policial, salvo se o indiciado estiver preso, quando o prazo será de dez dias.

§1º. Excedido qualquer dos prazos assinados à polícia judiciária, o ofendido poderá recorrer à autoridade policial superior ou representar ao Ministério Público, objetivando a finalização do inquérito e a determinação da responsabilidade da autoridade e de seus agentes.

§2º. As diligências que dependerem de autorização judicial serão requeridas ao juiz competente pelo Ministério Público, autoridade policial, ofendido, investigado ou indiciado.

[4] Projeto de Lei nº 4209/2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à investigação criminal, e dá outras providências.

[5] Projeto de Lei nº 4209/2001. Altera dispositivos do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal, relativos à investigação criminal, e dá outras providências.

[6] Idem.