Como diz o ditado popular: “Desgraça pouca é bobagem”. Quando achávamos que a crise do Subprime era o “fundo do poço” e o caso Madoff era “a pá de cal”, somos surpreendidos por mais um golpe financeiro: o caso Stanford.

O golpe
A SEC – Securities and Exchange Commission (Comissão da Bolsa de Valores dos Estados Unidos) acusou o multimilionário texano Robert Allen Stanford de operar um fundo de investimentos fraudulento com o qual captou US$ 8 bilhões junto a investidores.

Stanford alegava que tinha alcançado uma rentabilidade de dois dígitos nos últimos 15 anos, e garantiu às vítimas que os depósitos eram seguros, pois investia principalmente em ativos financeiros "líquidos", o que era mentira, de acordo com a SEC.

Quando os investidores ficaram nervosos com a descoberta da fraude supostamente realizada por Bernard Madoff, o Banco de Stanford informou que não tinha qualquer investimento "direto ou indireto" nos fundos do financista. Contudo, segundo o relatório de acusação da SEC, uma das companhias de Stanford tinha aplicado cerca de US$ 400 mil em uma corretora indiretamente controlada por Madoff e sabia do fato, após ter sido informado por um analista. Contudo, a companhia escondeu a aplicação de seus investidores.

Entre as companhias acusadas de participar da fraude estão a Stanford International Bank, com sede na ilha caribenha de Antígua, a Stanford Group Co., baseada em Houston, nos EUA, e a consultoria Stanford Capital Management, que tiveram parte de seus ativos congelados. Além disso, o grupo Stanford possui vários negócios na América Latina, o que fez com que muitos acionistas ficassem preocupados.

A fraude do Stanford Group não se limitou à venda de certificados de depósito, conforme a SEC. Desde 2005, os consultores do Stanford Group venderam mais de 1 bilhão de dólares de um fundo de investimento que apresentava dados de desempenho falsos.

Allen Stanford é cidadão dos EUA e de Antígua e Barbuda, depois de se ter nacionalizado naquela nação das Caraíbas há 10 anos, segundo a biografia que consta no “site” da empresa. Foi ordenado cavaleiro pelo governo de Antígua em 2006 e usa agora o título de “Sir”.

O Stanford Group tem 19 escritórios nos EUA e mais de 43 mil milhões de dólares sob gestão ou consultoria.

Pânico na América Latina
O anúncio feito pelo governo dos Estados Unidos causou preocupação e uma corrida aos bancos da empresa em países da América Latina e do Caribe.

Em países como Venezuela, México e na ilha caribenha de Antígua e Barbuda (paraíso fiscal onde Stanford tem grandes investimentos), centenas de pessoas correram às agências bancárias ligadas ao grupo para checar suas economias ou retirar dinheiro, com medo de que os ativos dos bancos sejam congelados.

A Venezuela confiscou as operações locais do Stanford International Bank, depois que centenas de investidores se aglomeraram em frente do escritório do banco, em Caracas, na tentativa de recuperar seus investimentos. Stanford era particularmente ativo na Venezuela, tirando vantagem da fuga de capital desencadeada pelas tentativas do presidente Hugo Chávez de fundar o que ele chama de "socialismo do século XXI". Desde que o governo implantou controles de capital em 2003, os venezuelanos vêm procurando meios de tirar seu dinheiro do país. Analistas diziam ontem que o Stanford representava uma opção mais fácil do que os bancos americanos ou europeus, uma vez que ele pedia apenas uma cópia de um passaporte e um endereço para fazer depósitos. O Stanford tinha mais de 70 funcionários dedicados a atrair, a partir de Antigua, depositantes venezuelanos com certificados de depósitos denominados em dólares. Analistas familiarizados com as operações do banco disseram que os depósitos típicos estavam na faixa de US$ 80 mil a US$ 200 mil, mas que poucas empresas estão expostas ao banco.

Na esteira das alegações, a autoridade reguladora do mercado de valores mobiliários do Peru suspendeu as operações da subsidiária do Stanford Group Usa em Lima, como medida "preventiva". A corretora peruana, com ativos líquidos de cerca de 6,8 milhões de sóis novos (US$ 2,1 milhões), não vai operar durante 30 dias sob a ordem imposta pela Comissão Supervisora Nacional de Companhias e Valores Mobiliários (Conasev).
No Panamá, a autoridade que regula a atividade bancária anunciou a tomada do controle da filial do Stanford Financial Group no país.

Já a filial do grupo na Colômbia suspendeu suas operações, com a autorização da Superintendência Financeira do país. Segundo um comunicado divulgado pelo órgão, a Stanford S.A. só poderá utilizar os recursos em seu poder para cumprir operações e compromissos pendentes.

No Equador, uma subsidiária local do grupo anunciou que deverá suspender suas operações na Bolsa de Quito por trinta dias. A filial do grupo no país, no entanto, afirmou que os investidores domésticos não serão afetados pelo escândalo que atinge a companhia nos Estados Unidos, já que ela seria independente da sede americana.

Já na Cidade do México, dezenas de investidores reivindicaram suas economias em frente aos escritórios da Stanford Financial, que mantém suas operações encerradas. Mesmo assim, a mexicana Stanford Fondos divulgou um comunicado onde afirma que o "Stanford International Bank é uma entidade diferente do mesmo grupo".

Ligações políticas e a conduta da SEC causam embaraço
Em 2007, quando a SEC descobriu que o Stanford Group não tinha o capital líquido necessário para atuar como corretora, a empresa pagou US$ 20 mil para encerrar a questão. Mais tarde, no mesmo ano, foi censurada e desembolsou outros US$ 10 mil para se livrar da acusação de fornecer "informações enganosas, injustas e parciais" sobre os seus certificados de depósito, como indicam os registros da FINRA - Financial Industry Regulatory Authority, braço da SEC que monitora Wall Street.

No final de 2008, o grupo Stanford pagou US$ 30 mil para resolver uma terceira onda de acusações da FINRA, desta vez por não reportar como deveria os métodos de pesquisa e de avaliação de determinados títulos. Segundo um resumo das violações postado no site da FINRA, há dois anos a companhia distribuiu material de vendas que não revelava sua afiliação a um banco relacionado, tendo "falhado em apresentar um tratamento justo e equilibrado dos riscos e benefícios potenciais" dos instrumentos que comercializava como certificados de depósito.

Com a emergência de novos detalhes sobre o histórico da companhia, a corte do Stanford Group aos legisladores de Washington também começou a entrar em foco. Durante anos, Allen Stanford e as entidades a ele associadas injetaram rios de dinheiro no Congresso, via doações a campanhas, viagens e conferências em resorts. Não há provas de que isso tenha influenciado o julgamento dos reguladores, mas, segundo o Center for Responsive Politics, o empresário, juntamente com seus funcionários e lobistas, doou US$ 2,4 milhões a campanhas políticas desde 2000. Os maiores beneficiados incluíram o senador democrata Bill Nelson, que recebeu US$ 45,9 mil, e o senador republicano John McCain, com US$ 28,15 mil. Mas cerca de dois terços do total foram para os democratas, diz a entidade.

Os registros financeiros das campanhas também mostram que, em 2008, Allen Stanford doou pelo menos US$ 28 mil aos comitês controlados pelo deputado democrata Charles B. Rangel, campeão em leis que favorecem os interesses econômicos de países e habitantes do Caribe.

As viagens foram outro recurso da corte aos legisladores. Logo após a eleição de 2004, por exemplo, o Stanford Group levou o senador republicano texano John Cornyn, juntamente com a mulher, para uma viagem de três dias a Antigua e Barbuda - ou melhor, para uma "missão de apuração do status das indústrias locais de serviços financeiros", como registrou a LegiStorm, que monitora as transgressões éticas do Congresso.

Uma vida de luxos e mordomias
Entre os ativos do empresário, está uma frota de aviões, um iate com 40 metros de comprimento e várias propriedades.

"Ele possui restaurantes, aviões e até uma ilha nas Caraíbas", lê-se nos documentos de um processo judicial que Stanford enfrentou no ano passado.

Através da sua empresa Aviation LLC, o empresário tem à sua disposição uma frota de aviões particulares que inclui dois aparelhos ‘Gulfstream''''G-IV, e mais quatro jatos.

O multimilionário, sua ex-companheira e os seus dois filhos também costumavam viver no Castelo de Wackenhut, uma mansão de 57 quartos em Miami. No entanto, Stanford e a família optaram por ir viver numa casa de 3.650 metros quadrados em 2004, que alugavam pela soma de 25 mil dólares por mês. O castelo foi demolido no ano passado.

Depois da separação da sua companheira, o multimilionário pagou 673 mil euros por ano em despesas de habitação, alimentação e educação para garantir que os seus filhos mantinham o seu "estilo de vida luxuoso e privilegiado", indicam os documentos judiciais, que informam a disponibilização de uma limusine e motorista 24 horas por dia, sete dias por semana.

"Tudo o que as crianças precisavam de fazer era pegar no telefone e dizer, ‘por favor venham-me buscar à escola'''', ‘por favor levem-me ao ginásio'''', ‘levem-me para as minhas partidas de tênis'''', e haveria sempre um motorista para as transportar", lê-se no mesmo documento, que acrescenta que Stanford também ofereceu cinco mil euros em presentes aos professores da academia privada que os filhos frequentam.

As crianças receberam também presentes de Natal e férias no valor de 60 mil euros, tendo sido colocados ainda 700 mil euros para cada uma numa conta bancária gerida por um tutor.

Um pouco de história da família Allen
As raízes da fortuna da família Stanford foram plantadas durante a Grande Depressão, em 1932, quando o avô de Allen Stanford, Lodis, um barbeiro e vendedor de seguros, fundou a sua própria seguradora.
A vocação de Allen para os negócios revelou-se cedo. Aos 13 anos, na sua cidade natal, Mexia, Texas, ofereceu-se para limpar terrenos florestais destinados à construção. Em troca pediu a madeira das árvores, que vendeu como lenha, lucrando 400 dólares. Segundo um amigo, a quantia, uma pequena fortuna em 1963, sobretudo para uma criança, ofereceu-a a uma família que perdeu a casa num incêndio.

A faceta filantrópica manteve-a intacta e hoje está ligado a várias instituições de caridade, com destaque para o St. Jude Children’s Research Hospital, em Memphis, Tennessee.

Os primeiros milhões foram ganhos com o pai, nos anos 80, no ramo imobiliário. Os lucros permitiram criar uma empresa de gestão de investimentos, cuja chefia Allen herdou em 1993. A partir daqui começou a expansão global dos negócios.

Antes da descoberta da fraude Stanford ocupava o 205º lugar na lista dos mais ricos dos EUA, com fortuna de 2,2 bilhões e gestão sobre bens no valor de 50 bilhões.

Depois de se tornar cidadão de Antígua e Barbuda, Caraíbas, onde sediou o Stanford International Bank, pérola do império, ganhou o título de cavaleiro em 2006 naquele país, o primeiro norte-americano a receber tal distinção.

De fato, o multimilionário tem sido uma importante fonte de prosperidade económica para este pequeno país das Caraíbas, onde detém o restaurante ‘Sticky Wicket'''' na capital do país com bifes a partir de 29 euros. Stanford também controla os bancos Bank of Antigua e Stanford International Bank, bem como a empresa imobiliária Stanford Cricket Ground.

Sir Allen, como é conhecido, começou também a se interessar pelo mundo dos esportes, investindo na popularização do cricket nas Caraíbas e nos Estados Unidos e patrocinando o golfe, o pólo, a vela e o tênis.
Reside há anos nas Ilhas Virgens americanas e havia desaparecido sem deixar rastro logo no início do escândalo. Felizmente foi encontrado na região da Virginia, e formalmente acusado de fraude em certificados e depósitos do Stanford Financial Group. É ainda suspeito de lavagem de dinheiro do Cartel do Golfo, associação criminosa do norte do México.

Moral da história
Pois é meu caro investidor internacional, você que estava feliz por ter passado incólume da implosão do subprime e da explosão dos fundos de Madoff, espero que tenha escapado de mais uma. Pois como diz um outro ditado popular: “Nada está tão ruim que não possa piorar”.

Bibliografia:
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