Ubirajara Sá

Quando Seu Abóbora se auto determinou que iria estudar, muitos riram de sua ousadia, pois sabiam que era impossível, já que ele não dispunha mais de tempo para isso. Haja vista que o tempo passara depressa, e o Seu Abóbora já lá ia com a idade avançando sem que sua alma notasse, sem que o seu corpo sentisse, mas todos o olhavam com um olhar de menosprezo, de desdém. Aquela cara de quem diz: pra que esse velhinho ainda quer estudar? Vá procurar outra coisa pra fazer, coroa! Dê lugar aos mais jovens, esses sim, esses é que agora têm que estudar, trabalhar para seguir a vida.

Acontece que Seu Abóbora, homem consciente de que, com a vida que ainda lhe restara, poderia fazer muita coisa. Sabia que a vida não acaba com o corpo. Sabia que poderia fazer muita coisa por muitos. Só ele, o Seu Abóbora, sabia de sua potencialidade. Ele que jamais desanimou de fazer qualquer coisa.

Mas, dessa vez, a coisa pegou. Seu Abóbora agora se sentia meio pra baixo. Alguma coisa tomava conta das suas forças, e ele, aquele cabra valente que topava tudo, que corria atrás do impossível, que desde criança sempre correu atrás das coisas que gostaria de ter, que correu, durante muitos anos, atrás de uma escola. Que várias vezes se pegou com um livro debaixo do braço, pois não tinha tempo para estudar, nem dinheiro para pagar uma escola formal. Pois é, é esse homem que agora se sente fora de prumo, fora d'água como um peixe perdido sobre uma pedra quente.

Engraçado que Seu Abóbora sempre confiara em alguém... Sempre teve por todos, muito carinho e respeito... Mas ele ainda cria em si: pensou baixinho! Depois de tanto lutar na vida, depois de comer o pão que o diabo amassou não iria se deixar abater por qualquer coisa.

Vou à luta! Pensou com os seus botões. Não vou deixar a peteca cair. E assim o fez.

Buscou forças não sei de onde, novamente começou a estudar com "os seus livros", buscou cursos onde pudesse por em pratica os seus conhecimentos, e foi à guerra.

Vocês sabem, muito bem, que o preconceito no Brasil é uma merda. Principalmente se o sujeito é pobre. Pois é, mesmo assim o cara meteu os peitos.

Ainda se vê, nos corredores da vida, quando ele passa, muita gente rosnando baixinho: "o que esse cara quer aqui, minha gente"? Tem até professores que despistam quando Seu Abóbora se dirige a eles para pedir informações.

É, mas Seu Abóbora é retado, mesmo!

-E aí pessoal, tem lugar pra mim nesta sala de aula?

- Olha que eu vou dar trabalho, heim?

- Tudo bem Velhinho, pode chegar que pra você tem um lugar!

Tudo mentira. Ele sabia que não era nada disso. Nem professor, nem aluno, nem ninguém faz fé numa pessoa que tem idade avançada para os padrões brasileiros. Ninguém dá ouvidos pra quem realmente sabe. Nem governo, nem amigos... Ninguém, amigo, ninguém!

Seu Abóbora agora sabe que o mundo é outro: o governo diz que a aposentadoria pra homem, só aos 65. Mas também diz que o homem depois de 60 é idoso. Não pode aposentar, nem pode trabalhar. Morre! Dizem as caras mais novas. Vive! Dizem as caras mais velhas. E quem vai entender quando se está velho? Por isso Seu Abóbora continuará estudando e trabalhando. O resto a morte resolve.