1- Introdução       

A questão acerca do tratamento oferecido ao capital estrangeiro tem sido alvo de grandes discussões. A própria Constituição, em seu art. 171, trazia um conteúdo bastante polêmico em relação ao assunto, fazendo distinção entre empresa brasileira e empresa de capital nacional, bem como permitindo a adoção de medidas protecionistas a favor de empresas brasileiras de capital nacional, afrontando o princípio da livre concorrência.

 Embora tal disposição tenha sido revogada pela Emenda Constitucional n° 6, de 1995, o capital estrangeiro ainda é bastante limitado. Existe um grande receio de que a abertura da economia aos investimentos estrangeiros coloque em risco a soberania nacional e prejudique os investimentos internos.

O objetivo deste estudo é analisar o que vem a ser o capital estrangeiro, e os efeitos da sua entrada em território nacional. 

 

2- Conceito e regulamentação

O art. 172 da CF/88 remete à legislação ordinária, com base no interesse nacional, a disciplina do capital estrangeiro, o incentivo dos reinvestimentos e a regulação de remessa de lucros.

A Lei 4131/62 foi promulgada com este objetivo, qual seja, disciplinar a aplicação do capital estrangeiro e as remessas de valores para o exterior. Segundo o seu art. 1º, são considerados estrangeiros os capitais (recursos financeiros, bens, máquinas ou equipamentos) pertencentes às pessoas físicas ou jurídicas, residentes, domiciliadas ou com sede no exterior, introduzidos no país para aplicação em atividades econômicas. Já o art. 2º estabelece a igualdade de tratamento do capital nacional e do estrangeiro.

 

3- Modalidades

 Os investimentos estrangeiros no sistema jurídico brasileiro são classificados em: investimentos externos diretos; empréstimos e financiamentos externos; e, investimentos indiretos ou em portfólio.

  •  Investimento externo direto

 De acordo com a Lei 4.131/62, o investimento estrangeiro decorre do ingresso de divisas no país para aplicação em atividades econômicas; ou, do ingresso de bens, máquinas e equipamentos, sem dispêndio inicial de divisas, destinados exclusivamente à produção de bens ou serviços, sendo que sua titularidade será sempre de um investidor, pessoa física ou jurídica, residente, domiciliada ou com sede no exterior.

O art. 1º da referida lei apresenta três elementos básicos para a definição do investimento externo direto: a) o ingresso do capital estrangeiro, correspondente à sua introdução no país; b) a finalidade, que é restrita a aplicação em atividades econômicas; e c) a procedência (do exterior), sem qualquer menção à nacionalidade do investidor. Neste sentido, o investimento externo direto está associado a uma atividade econômica (negócio), realizado mediante a aquisição por não residente de participação societária de empresas sediadas no país ou filiais de empresas estrangeiras aqui autorizadas a funcionar, desde que tal aquisição ocorra fora da bolsa de valores ou balcão organizado.

 

  • Empréstimos e financiamentos externos

 Os empréstimos e financiamentos externos são caracterizados pela concessão por não-residente de recursos financeiros à residente no país. A lei expressamente autorizou o financiamento de bens, máquinas e equipamentos destinados exclusivamente à produção de bens ou serviços, podendo ser contratados de modo direto entre credor e devedor, ou por meio de emissão de títulos de dívida no exterior.

Para obter o registro do capital ingressado no país, os empréstimos precisam de autorização prévia do Bacen. O registro de capitais estrangeiros, sob o ponto de vista da política monetária nacional, possibilita: a) o controle cambial, visto que possibilita a autoridade monetária um maior conhecimento sobre o fluxo de entrada e saída de recursos do país; e b) o conhecimento da dinâmica dos investimentos estrangeiros no país, bem como o funcionamento das empresas receptoras, por meio de estatísticas, como os Censos de Capitais Estrangeiros, realizados pelo Bacen como mecanismo de avaliação dos impactos dos investimentos no país, bem como adaptação ou criação das políticas monetárias, legislações e regulamentos aplicáveis de modo a fomentar ou reduzir tais impactos.

 

  • Investimentos indiretos

 Os investimentos estrangeiros indiretos, ou investimentos de mercado, são aqueles realizados por investidores que atuam no mercado financeiro e de capitais e realizam negociação com os ativos financeiros típicos desses mercados. Os capitais ingressados no País para realização desse tipo de investimento são, por natureza, mais voláteis, uma vez que não têm associação direta a um determinado negócio, buscando sempre a maior rentabilidade possível para os recursos aplicados.

A Resolução CMN 2.689/2000 permitiu aos não-residentes o acesso às mesmas modalidades disponíveis, no mercado financeiro e de capitais, aos investidores residentes, desde que o não-residente indique um representante legal no país, além de deter o registro na CVM.

 

 

4- O capital estrangeiro e a defesa da soberania nacional

 Segundo o art. 172 da CF/88, cabe à legislação ordinária, com base no interesse nacional, a disciplina do capital estrangeiro, o incentivo dos reinvestimentos e a regulação da remessa de lucros. Há, portanto, uma limitação imposta constitucionalmente ao capital estrangeiro. Isto se dá porque, enquanto de um lado se exige uma abertura da economia, de outro, mostra-se necessário pensar numa forma possível de proteção da economia nacional. Assim, a necessidade de modernização não serve como pretexto para a adoção de medidas que coloquem em risco a soberania nacional, garantida nos artigos 1º, inciso I, e 170, I, da CF/88.

Ao mesmo tempo, não se pode manter um posicionamento contrário ao moderno direcionamento da economia. Neste sentido, a EC 6/95 revogou integralmente o art. 171 da CF/88, que estabelecia distinção entre “empresa brasileira” e “empresa brasileira de capital nacional”. Houve também a alteração do § 1.º do art. 176 da CF/88, de modo a possibilitar o acesso à exploração dos recursos minerais e o aproveitamento dos recursos hídricos, mediante autorização ou concessão da União, a empresas controladas por capital estrangeiro no setor.

 

 

5- Conclusão

 Os investimentos estrangeiros têm cumprido um papel essencial na economia brasileira. O desenvolvimento do país depende, em parte, do capital estrangeiro. Portanto, a adoção de medidas altamente protecionistas para o investidor nacional não é uma atitude vantajosa, sob o prisma econômico.

Por outro lado, a abertura da economia aos investimentos estrangeiros não pode ser feita sem a imposição de certos limites, pois a falta destes pode colocar em risco a soberania nacional, sendo comparado a entregar o mercado nacional ao poder econômico internacional.

Diante disso, é possível concluir que é necessário o equilíbrio de ambas as partes, para que a economia nacional possa se desenvolver de forma responsável e segura, sem prejudicar os investimentos internos e, ao mesmo tempo, respeitando as obrigações do País decorrentes da cooperação econômica internacional.

 

 

BIBLIOGRAFIA

  

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm >. Acesso em: 20 mai. 2012.

 

BRASIL. Lei Nº 4.131. Brasília: 1962. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4131.htm >. Acesso em: 20 mai. 2012.

 

FONSECA, João Bosco Leopoldino da. Direito Econômico. 6. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

 

ROSSI, Matheus Corredato. O tratamento às empresas de capital nacional e o direito ao desenvolvimento. Bocater, Camargo, Costa e Silva Advogados, mai. 2008. Disponível em: <http://www.bocater.com.br/artigos/mcr_trat_emp.pdf> Acesso em: 21 mai. 2012.