O ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI.

AUTORA: DEYSE FONSECA FERREIRA.

COAUTORES: FLAVIO ANTONIO PEDROSA XIMENES, SUZIANE BARRETO DE CASTRO.


RESUMO 

O presente artigo vai demonstrar os diversos tipos de comportamento que levam os jovens a entrar em conflito com a lei.

Entretanto, demonstra-se a responsabilidade por parte do Estado como garantidor dos direitos e garantias fundamentais.

1. INTRODUÇÃO

Buscamos neste trabalho refletir sobre as situações de violência que atingem o adolescente no Brasil, especialmente, no estado do Ceará. Apresentaremos os principais motivos que levam os mesmos a entrar em conflito com a lei.

 Nosso propósito, após estudos realizados, é apontar idéias sobre os aspectos sociais, psicológicos e o procedimento jurídico frente aos atos infracionais cometidos por jovens. Ressaltamos que o problema deve ser orientado por ações de prevenção.

Disporemos neste trabalho, as medidas estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), bem como o dever da família, da sociedade e do Estado em assegurar ao adolescente os direitos previstos constitucionalmente.

Apresentaremos as entidades de atendimento e os programas de proteção destinados ao adolescente e medidas pertinentes aplicáveis aos mesmos e aos pais ou responsáveis.

  

2. DESENVOLVIMENTO

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com fundamento da Doutrina da Proteção Integral, considera o adolescente como pessoa em desenvolvimento, prevendo que assim deve ser compreendida a pessoa que possui entre 12 e 18 anos de idade.

 Art. 2º: Considera-se criança, para os efeitos dessa lei a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. ECA

Segundo estudos psiquiátricos, o cérebro do adolescente está se adaptando às circunstâncias da vida. Há uma busca incessante pelo prazer, conseqüentemente, os jovens realizam condutas mesmo que ilícitas para alcançar este prazer.

Na adolescência o sentimento de identidade provém da coerência e da continuidade do alto conceito elaborado no passado. O perigo dessa etapa é a existência de conflitos interiores quanto à identidade ou mesmo aqueles originados em etapas anteriores e que não foram satisfatoriamente resolvidos. Estes últimos podem ter origens diversas tais como sentimento de rejeição dos pais e dos companheiros ou o insucesso escolar. Problemas não resolvidos podem provocar comportamentos desajustados, porém isso pode ocorrer em qualquer etapa do desenvolvimento. 

Podem-se dividir os fatores de risco para a conduta infracional em fatores de natureza biológica ou de natureza ambiental. Esta divisão é apenas didática, uma vez que um comportamento reúne ambos os fatores (GALLO; WILLIAMS, 2005). Por razões físicas e de desenvolvimento emocional, os adolescentes têm menores recursos cognitivos e menos experiências no confronto com eventos estressantes. O simples testemunhar de um fato violento pode ser suficiente para desencadear, em algumas crianças e adolescentes, traumas que serão interiorizados e influenciarão suas ações durante toda a vida.

Uma das questões que mais contribuem para a entrada dos jovens no mundo do crime é a desestrutura familiar. Os pais, tios, avós são o elo inicial entre a sociedade e a criança. Através daqueles que esta irá ter a capacidade de distinguir o que é certo do que é errado sendo indispensável o amor, carinho e respeito. Infelizmente, muitas crianças não têm a oportunidade de viver em um lar saudável com a presença de pai e mãe. Estudos mostram que a disciplina pouco consciente e ineficiente imposta pelos pais está associada ao comportamento delituoso (AMERICAN PSYCHOLOGICAL SOCIETY, 1997; SILVA, 2000).

Art. 227: É dever da família, da sociedade e dos Estados assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, descriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. CF/88.

Os terapeutas desde muito tempo sabem que trabalhar com os problemas individuais podem não ser suficientes. Freqüentemente, as relações dentro da família precisam ser sanadas. Uma vez que a família é um sistema de partes interdependentes, os problemas de qualquer um dos membros inevitavelmente afetam todos os outros. Uma das formas de solucionar estes problemas é a terapia de família. Muitas famílias iniciam a terapia acreditando que um dos membros seja a causa de todos os problemas. No entanto, os terapeutas de família geralmente descobrem que este ‘’paciente identificado’’ como o responsável é na verdade a vítima. Esse também parece ser o contexto mais favorável para o tratamento de abuso de drogas na adolescência (HUFFMAN, 2003).

É de fundamental importância o papel que a escola exerce sobre a criança, uma vez que todas são capazes de aprender habilidades, mas é relevante considerarmos a necessidade de um ambiente instrucional favorável. Na grande maioria das vezes, os alunos agressivos são expulsos das escolas, o que não é, na realidade, a melhor maneira de solucionar o problema e acaba sendo uma forma de ‘’empurrar’’ o futuro adolescente ao ócio e conseqüentemente à criminalidade.

O comportamento do adolescente, quando revestido de ilicitude, reflete obrigatoriamente no contexto social em que vive. A realidade no Brasil é como na maioria dos países subdesenvolvidos. Nos grandes centros urbanos as dificuldades de sobrevivência junto à ausência do Estado nas áreas de educação, saúde, habitação e assistência social têm grande influência no aumento da criminalidade juvenil.

A doutrina ainda não determinou os possíveis motivos do aumento de jovens em conflito com a lei. O que há são hipóteses muito amplas podendo ser apontadas: a desestruturação familiar, a má distribuição de renda, dependência econômica, o desemprego, a carência da educação, e a miséria de grande parte da população,bem como o uso de drogas, como as causas diretamente relacionadas com a maior e menor incidência dos delitos, o que também não deixa de ser fatores imediatos de desestabilização da família, e que muitas dessas causas poderiam ser desclassificadas caso todas as crianças desde o nascer, tivessem seus direitos atendidos.

De acordo com a pesquisa feita pela Comissão Permanente de Política Criminal (CPPC) do Ministério Público entre os anos de 1997 e 2001, foi traçado o perfil de adolescentes infratores dentre os quais 90% são do sexo masculino, 89% não tiveram a presença de um dos pais ou de ambos, 51% não freqüentavam a escola, 85,6% usavam drogas e 40% exerciam ocupações no mercado informal.

O Estatuto da Criança e do Adolescente utiliza o termo ato infracional para atribuir às ações ilegais praticadas por menores de 18 anos. Para esses jovens não se comina pena, mas se aplicam medidas sócio-educativas.

 O ato infracional é toda conduta humana, comissiva ou omissiva, praticada por criança e adolescente que se amolde a uma figura típica de um crime previsto no Código Penal ou leis extravagantes, ou a uma contravenção penal. A criança quando comete um ato infracional, segundo o que dispõe o ECA(Estatuto da Criança e do Adolescente), é encaminhado para o Conselho Tutelar, que como órgão autônomo e não jurisdicional, deverá aplicar alguma medida protetiva prevista no artigo 101 do ECA. Já o adolescente quando comete o ato infracional, dependendo da gravidade do ato, pode ser apreendido em flagrante e ser internado provisoriamente pelo prazo máximo de 45 dias até o término do procedimento judicial. Na maioria dos casos, principalmente, nos atos infracionais considerados de pequeno e médio potencial ofensivo, a regra é que o adolescente, após ser interrogado na delegacia, seja imediatamente liberado e entregue aos pais ou responsável, ou encaminhado para o Ministério Público (MP), respondendo, de qualquer forma, o processo em liberdade.

No procedimento judicial serão observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, e o adolescente, caso seja condenado, poderá sofrer a imposição de uma medida sócio-educativa que varia de uma mera advertência, passando por uma Reparação de Danos, Liberdade Assistida, Prestação de Serviços à Comunidade, semiliberdade até o internamento, que é medida excepcional, aplicável nos atos infracionais praticados mediante violência e grave ameaça a pessoa, e que pode privar o adolescente por até três anos do convívio social (art. 112 do ECA).

As medidas socioeducativas, embora importem em restrição de direitos e até privação de liberdade do adolescente, tem um conteúdo preponderantemente educativo, voltado para a conscientização e mudança de comportamento do jovem ainda em processo de desenvolvimento, no sentido de que o faça refletir sobre o ato que praticou, propiciando as condições para a introjeção de valores, principalmente, de respeito ao próximo, solidariedade, afeto, trabalho, alteridade e tolerância, que sejam capazes de reorientar os caminhos do jovem. A medida socioeducativa não pode ter caráter exclusivamente punitivo. Ela deve ser capaz de transformar a vida do adolescente, fazendo-o refletir e caminhar seguro em direção à cidadania.

Embora não sejam aplicadas as sanções previstas no Código Penal, o adolescente será responsabilizado ainda que de maneira pedagógica por intermédio das medidas socioeducativas. Entretanto, a imputabilidade não significa que ao adolescente serão aplicadas medidas mais brandas do que aos maiores de dezoito anos, uma vez que existem medidas socioeducativas cuja finalidade ter a mesma correspondência das penas alternativas como a prestação de serviços comunitários.

Entre os atos infracionais mais praticados estão o roubo (29,6%), homicídio (18,6%), furto (14%), tráfico de drogas (8,7%), latrocínio (5,8%), estupro/atentado violento ao pudor(3,7%) e lesão corporal (3%). Esses dados são em relação a Região Nordeste no ano de 2002.[1]

Verifica-se que com o avanço dos anos, o problema da criminalidade juvenil aumenta. Entre os fatores, um dos que mais contribui é o consumo de drogas. Além de aumentarem a agressividade do adolescente, o uso do entorpecente gera a dependência física e psicológica e algumas vezes podem levar até mesmo à morte, o que se chama de overdose.

Os adolescentes estão entre os principais consumidores de drogas. Calcula-se que 13% dos jovens brasileiros entre 16 e 18 anos consomem maconha. Há vários tipos de drogas: depressoras, como a morfina e heroína; estimulantes, como a cocaína e seus derivados; pertubadoras, como maconha e LSD ‘’ácido bisérgico’’(DUTRA, 2005).

O tráfico de drogas é crime previsto no Código Penal e os infratores estão sujeitos a penas que variam de seis meses a 2 (dois) anos. Porém, os adolescentes, como citamos anteriormente, não serão punidos de acordo com o CP e sim com o ECA (Estatuto da Criança e Adolescente).

O uso de drogas também causa outro grande problema social: a transmissão do HIV e do vírus da hepatite B e C. Visto que ao compartilharem seringas para a injeção daquelas há a infecção imediata pela corrente sanguínea.

Diante de todos os problemas acima expostos, vemos a Psicologia Jurídica, como uma grande e importante aliada no auxílio e tratamento dos adolescentes em conflito com a lei.

Entre as importantes funções que a Psicologia Jurídica exerce estão à instrumentalização dos Operadores do Direito, na missão de gerir conflitos e julgar ações, bem como contribuir com o Operador do Direito na sua experiência junto às questões emocionais e psicológicas surgidas no decorrer da aplicação da justiça. O psicólogo atua na compreensão dos processos psíquicos e subjetivos, fazendo orientações e encaminhamentos adequados, através de avaliações psicológicas que tenham objetivos de investigar e coletar dados aos processos judiciais, examinar e apresentar evidências aos mesmos e refletir sobre o melhor modo de proceder na busca dos fatos, visando agilização processual, o estudo sobre sujeito e métodos psicológicos (TRINDADE, 2007).

CONCLUSÃO

 

Sabe-se que os fatores de risco aqui apresentados, isoladamente, dificilmente levariam um adolescente a praticar um ato infracional. São inúmeras as pesquisas que confirmam a relação existente entre os fatores ditos como de risco e o envolvimento dos adolescentes com os atos infracionais. Apesar de termos esse conhecimento, verificamos a falha existente em nosso sistema, pois este visa extinguir o problema através da repressão que, na verdade, não seria a solução eficaz. A alarmante realidade que vivenciamos, infelizmente cresce desenfreadamente. O Estado, enquanto responsável e garantidor dos direito e garantias fundamentais deve, portanto, a partir das conclusões obtidas através de nossa pesquisa, propiciaruma infância saudável para que os futuros adultos não venham a se tornar um risco para a sociedade brasileira.

Por fim, detectamos a necessidade de criação de políticas públicas mais eficientesque revertam a devastante situação vivida pelos jovens na atualidade e,a nosso ver, todas as evidências mostram quea melhor forma de acabar ou, pelos menos, amenizar esta realidade é por meio da prevenção, por exemplo, investindo em educação, esporte, lazer e cultura.

REFERÊNCIAS

 

AMERICAN PSYCHOLOGICAL ASSOCIATION. Advocate: the child, youth, and family services. Reducing violence: a research agenda. APS Observer Report, n.5. Washington, DC: Autores, 1997.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988.

DUTRA, V. M. Renasce Brasil: Segurança e Prevenção da violência. Vitória, 2005.

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA)- LEI FEDERAL Nº 8069 DE 13 DE JULHO DE 1990.

GALLO, A. E.; Willians, L. C. A. Adolescentes em conflito com a lei: uma revisão dos fatores de risco para a conduta infracional. Psicologia: Teoria e prática. São Paulo, 2005.

HUFFMAN, K.; VERNOY, M.; VERNOY, J.; coordenação de tradução YAMAMOTO, M. E. Psicologia. São Paulo: Atlas, 2003.

SILVA, A. T. B. Problemas de comportamento e comportamentos socialmente adequados: sua relação com as habilidades sociais educativas de pais. Dissertação de mestrado. Programa de Pós-Graduação em Educação Especial. Universidade Federal de São Carlos. 2000.

TRINDADE, J. Manual de Psicologia Jurídica para Operadores do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2004.