Por uma lei penal mais consistente.

            O problema da criminalidade agressiva em nosso país não decorre de uma lei penal mais ou menos rigorosa.

            Em termos de previsão e aplicação de penas às condutas delituosas, o atual Código Penal, ainda cumpre bem sua missão.

            O grande problema está muito mais ligado à maneira de pensar e decidir as coisas na nossa cultura e sistema de regras e leis.

            Ver como temos o visto, o Senado ou a Câmara, deliberar e aprovar medidas pontuais de alteração da lei penal, para aumentar o rigor da pena, é muito pouco ou nada.

            Isto quer dizer que não compreendemos bem o que está acontecendo, senão constatando o óbvio de que uma sociedade cheia de conveniências, leniências e outras mazelas, sem coragem de reagir e agir, faz, e faz errado.

            Ao invés de aumentar penas dos crimes já previstos, muito mais importante e eficaz, é tratar os modelos e condutas que temos, distribuí-los ordenadamente, porém, priorizando e destacando o que será tido como ilícito inaceitável.

            No crime de latrocínio, por exemplo, há uma bestialidade sem tamanho. O latrocínio, tecnicamente, é o crime em que o agente investe sobre a vítima para roubar, e visando obter o sucesso pretendido da ação, mata a vítima antes.

            Qual o bem jurídico destruído? Ora, a vida da vítima. Mas o artigo é voltado para a conduta contra o patrimônio da vítima, e dada importância ao fato do roubo, como se fosse mais importante o prejuízo patrimonial.

            O fato morte é subsumido pela conduta principal “roubar”. Isto po0deria ser apenas uma qualificadora do crime matar para roubar, e com certeza, o criminoso por isso se sentiria punido.

            Ele, o homicida, é levado a pensar e até crer que matou de fato, mas o que queria era roubar em mundo que uns tem algum valor outros nada têm. Isso significa que esse tipo de pessoa não irá parar nunca no agir.

            Para isso, a reforma penal deve recair para melhorar a aplicação da lei e a validade efetiva do cumprimento da pena, sobre a parte geral do código.

            É ali que está a dificuldade de se construir um sistema penal mais consistente.

            Algumas das doutrinas ali contidas, estão obsoletas, vencidas, mal avaliadas, servem para demonstrar a ciência histórica da nossa evolução penal, mas, para os dias atuais para pouco serve.

            Devemos ter coragem para impor como crime a conduta ilegal, aquela que contraria a lei, mas punir a conduta ilícita, a antijurídica, não em círculo normativo fechado, mas articulando o fato dentro de uma conduta tipicamente delituosa.

            Há fatos socialmente relevantes, que podem compor artigos na lei, mas que não devem, a não ser quando a censurabilidade social for efetiva.

            Há questões patrimoniais que são mínimas demais para a penalização e podem ser retiradas.

            Há o equívoco no conceito de conduta culposa, onde o desvalor da ação é grandemente desprezado na cominação, mostrando que apesar de punida, a conduta não intimidade, pois é apenas culposa.

            Ademais, nos dias de hoje, enormes variedades de condutas são criminosas, mas estão fora do conceito de crime.

            A máxima penal de que só é crime o que estiver previsto, deveria dar lugar ao conceito de que não é crime quando não for possível prever o delito da conduta.

            Também o artigo 75 do CP, deve ser revisado. Ali a pena máxima é de 30 anos para real cumprimento. De forma que, se o agente praticar três condutas ilegais distintas, e por cada delas receber 20 anos, que somados dariam 60, cumprirá apenas 30.

            Hoje em dia, as pessoas vivem até 75 anos ou mais, logo praticando delito e sendo presa aso 18, cumprindo a pena toda, sairá aos 48, nova e capaz de praticar novos delitos. Aliás, o que fará, pois excetuando-se um caso ou outro, todos voltam a reincidir, pois cumprir pena em um jugo que poucos suportam.

            A discussão para alterar esse artigo é válida e importante. O montante é que será sempre um problema, mas, dentro da perspectiva de que as cadeias e presídios possam segurar o máximo o condenado, passar 60 anos preso daria um bom tempo de sossego e paz.

            O que a Constituição não permite é adoção de pena capital, de morte, desumana, degradante, mas tendo recepcionado  o código, o tanto do máximo pode ser alterado e os crimes violentos, cruéis e de morte, apenados com severidade.

            Nos anos 90, ouvi uma palestra do saudoso jurista FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO, em que ele defendia um sistema penal com gradação de penas : leves, médias, graves e gravíssimas, onde não haveria escape para punir condutas ilegais e ilícitas.

            Hoje creio que teria sido a reforma mais sensata o modelo do nobre jurista, pois todas as condutas estariam inteiramente agraciadas e punidas, ou, pelo menos, puníveis.

            Sofrendo críticas severas do outro jurista, o Damásio Ecangelista, o ilustre Assis Toledo se retirou do encontro irritado. Aliás, de Damásio foi a contribuição daquela lei de crimes hediondos que era flagrantemente inconstitucional em alguns artigos.

            Mas muitas outras leis foram aprovadas pelo Congresso e editadas para aumentar a confusão e o emaranhado legislativo, isto sempre foi ruim, pois como dizia o jornalista e escritor Aparício Brinkerhoff Torelly, conhecido como Barão de Itararé, o número leis comprova a impunidade e a desobediência.

            Portanto, creio que deva haver uma grande discussão entre penalistas, jornalistas, congressistas, políticos, advogados, médicos, enfim, reunidos em debates e fóruns, para apresentar em tempo recorde propostas claras de alteração do conhecimento e conceito de penas, crimes e condutas delituosas, sendo estas recebidas por um grupo de juristas, juízes, desembargadores e advogados, par alterar de vez a parte geral do código, antes disso, fazendo-se a alteração do art. 75 do CP para fixar uma pena máxima real para o nosso sistema.

 

Airton Moreira