Será que existe alguém que quando menino não sonhou em ser um grande jogador de futebol? Acho que não, dado o fascínio que este esporte nos causa desde a tenra idade. Eu mesmo, quando guri, sonhei em ser o novo Garrincha, jogador que eu achava ser melhor que o Pelé, tudo baseado nas jogadas que eu via naqueles jornais que eram passados antes do filmes que eram apresentados nas matinês de domingo.

 

Logo nas minhas primeiras incursões nos campos de futebol, percebi que este desejo era muita pretensão para minhas possibilidades futebolísticas. Como os mais velhos que escolhiam os times, sempre me colocavam para jogar na defesa por ser dos mais altos, resolvi então que seria o novo Airton do Grêmio Fut-Balll Porto Alegrense, melhor zagueiro que eu vi jogar até hoje, ao vivo inclusive. Este sonho também não deu muito certo. Ao contrário do meu ídolo, eu era um zagueiro muito rústico e acabei recebendo o apelido de Patrolão, já que eu acabava levando por diante tudo o que se achava no meu caminho. Meu sonho ruiu definitivamente quando me inscrevi para jogar no juvenil do Glória, time da cidade em que morava. Acabei virando titular, não do time, mas do banco de reservas, só entrando umas poucas vezes no final do jogo quando tudo já estava resolvido.

 

Afinal, decidi que os campos de futebol não me mereciam (ou seria o contrário?) e acabei me dedicando à música, embalado nos sonhos dos Beatles, Rolling Stones, Roberto e Erasmo Carlos.

 

Mais de trinta anos depois, a história se repetiu com o meu filho Deco e a gurizada da vizinhança. Entre uma pelada de rua e outra, surgiu a idéia que logo teve a adesão entusiasmada de todos: fundar um time na vila. Começaram os projetos, todos davam palpites sobre as cores e a maneira de obterem as camisetas do time. Foram feitas rifas, pedidos aos pais, até que conseguiram o primeiro jogo de uniformes. É claro que, como não poderia deixar de ser, vieram juntos os sonhos de glória. O time iria crescer e talvez, num futuro próximo, poderia vir a jogar em uma das divisões de nosso futebol. Poderia acontecer ainda, a revelação para o mundo de algum grande craque para a nossa seleção.

 

Bem, voltando à realidade, o próximo passo foi a escolha do treinador. Para tão importante cargo, foi escolhido o nosso vizinho apelidado de Roma, colorado fanático que era um dos que mais discutia futebol nas rodas de conversa da esquina. Até hoje eu não sei qual foi o critério utilizado para a sua escolha; se ele entendia realmente do esporte ou se foi porque possuía um carro grande com o qual ele carregava boa parte do time.

 

A seguir, veio o primeiro jogo. Treinos intensos na quadra armada na rua, entre duas goleiras feitas com os chinelos dos jogadores, discussões sobre a posição de cada um, táticas secretas, emoção à flor da pele. No dia do jogo, todo mundo uniformizado, ficaram esperando as palavras finais de incentivo do “professor Roma”. Foi um momento único. Uma preleção que entrou para os anais da história do futebol mundial. Quando todos esperavam um longo e emocionado discurso, ele, após uma pausa de alguns segundos, apenas bradou: “Vamos jogar”. Passado um breve momento de estupefação dos jogadores, já que todos esperavam algo mais longo e elaborado, acabaram entrando em campo e partindo para o jogo.

 

Daí por diante, muitas outras partidas foram realizadas, algumas inclusive, foram filmadas por um vizinho que possuía uma filmadora. De jogo em jogo, o time foi fazendo sua história. Naturalmente, além de meu filho Deco e do Robson, o grande craque do time era o Robinho, menino que desde cedo revelava um talento nato para o futebol.

 

Infelizmente com o passar do tempo, os jogadores foram sendo levados para outros caminhos e o time acabou se extinguindo. Ficaram no entanto, as lembranças daqueles tempos áureos do futebol da Vila Norte de Santa Maria, RS. Até hoje ainda ecoam nas conversas de boteco, relatos incríveis de alguma das grandes jogadas daquele memorável time. Sim, porque aquela jogada que de início era rústica, com o passar do tempo, a cada descrição verbal, ia adquirindo novos toques de genialidade e magia, passando da condição de fato real para a condição de lenda.

 

Pois é. Vocês já ouviram falar do Santos de Zito, Pelé e Coutinho, do Grêmio de Airton, Sergio Lopes e Alcindo ou do Inter de Figueroa, Valdomiro e Falcão? Acrescente-se a esses lendários times, o Nova Esperança F.C. de Deco, Robson e Robinho. Ao menos nos campos de nossa imaginação, foi um time que encantou toda uma geração e permanece vivo nos corações e mentes dos que assistiram suas geniais atuações. Afinal, entre a realidade e a lenda,  eu prefiro a última. Ela torna muito mais leve a alma e coloca cores e magia aonde antes tudo era frio e sem brilho.

 

Minha homenagem ao Nova Esperança F.C. e àqueles que sonham e têm coragem de tentar realizar seus sonhos.

 

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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