Os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional encontram-se consagrados na Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986, também conhecida como a lei dos “crimes do colarinho branco”. A criação de tal lei demonstrou que o Direito Penal não alcança apenas “pobres e negros”, mas também “ricos, brancos e poderosos”.

           Porém, ao contrário do esperado, a lei dos crimes contra o sistema financeiro não tem tido a efetividade necessária para punir os autores desses delitos. Dessa forma, ao tratar de crimes econômicos, a impunidade passa a ser uma palavra corriqueira, fazendo com que a haja o descrédito do Judiciário em relação à aplicação de punição para as classes mais abastadas.    

            Não raramente jornais estampam escândalos financeiros em suas páginas e o grande questionamento que a população se faz é: haverá punição para os autores dos crimes econômicos?

           No Brasil há uma cultura errônea de que os ricos e bem sucedidos não são punidos, enquanto os pobres formam a grande massa carcerária nacional. Os crimes financeiros geram prejuízos incalculáveis à sociedade, no entanto, possuem uma política de repressão inferior aos delitos comuns contra o patrimônio, que causam perdas apenas a pessoas determinadas.

            Os crimes praticados por pessoas de alto nível econômico, geralmente, não são divulgados, exceto quando protagonizam grandes escândalos na imprensa. “Correspondem às "cifras douradas”, expressão cunhada por Versele para designar a cifra oculta dos crimes praticados pelos agentes que têm o poder político e o exercem impunimente em benefício próprio ou de uma minoria, bem como os agentes que dispõem de poder econômico, utilizando-o em detrimento do conjunto da sociedade”. (CASTILHO, 1998)

            Castilho, ao citar Raúl Cervini, revela que as principais características dos crimes econômicos são: “ (a) abuso de poder econômico, político ou de especialização profissional; (b) elevada danosidade material e social; (c) aparência de legalidade absoluta; (d) mutabilidade dos mecanismos econômicos; (e) caráter múltiplo e indeterminado das vítimas; (f) transnacionalização das condutas; (g) impunidade dos autores” (1998, p. 65).  

           Segundo o Desembargador Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues (2008), a impunidade decorre da demora processual. Isto porque a procrastinação no andamento do feito faz com que ocorra a prescrição punitiva, a morte natural do autor ou mesmo favorece a fuga deste.

           Além disso, acrescenta Rodrigues (2008) que a primariedade formal, bons recursos financeiros e excelentes advogados asseguram aos autores de delitos econômicos a prerrogativa de serem presos apenas após apresentarem todos os recursos possíveis, mormente porque no Estado Democrático de Direito prevalece o princípio constitucional da presunção de inocência. 

             Para Castilho (1998, p. 57) “a impunidade da criminalidade econômica decorre do funcionamento estruturalmente seletivo do sistema penal, que por sua vez guarda relação funcional com a desigualdade socioeconômica. Determinadas classes ou grupos ficam excluídos enquanto outros são incluídos”.

           Assim, entende Castilho (1998, p. 287) que a impunidade nos crimes do colarinho branco existirá enquanto persistir a desigualdade nas relações sociais. Veja:

A demarcação do campo de criminalidade pelas instâncias formais segue o modelo estruturalmente seletivo do sistema penal brasileiro, em que se observa a relação funcional com a profunda desigualdade socioeconômica do país e a exclusão da repressão penal de terminadas classes ou, nestas de grupos de pessoas.

           Rodrigues (2008) entende que a solução para a impunidade nos crimes de colarinho branco encontra-se nas mãos do Poder Legislativo, devendo este dobrar o prazo prescricional e estabelecer preferência de julgamento para esses delitos, nos casos em que envolver altas somas de dinheiro.     

            No que tange às consequências dos crimes do colarinho branco para os autores de tais delitos, Rodrigues (2008) afirma serem ínfimas, pois “o prejuízo, se descoberta a infração — o que nem sempre ocorre —, estaria quase só em termos de susto e má-reputação. Por uns tempos, ressalve-se, porque a riqueza é um ótimo removedor de manchas”.

            Salienta-se que o discurso para evitar impunidade nos crimes financeiros não implica em realizar punições arbitrárias e avessas às garantias processuais, mas sim em dar efetividade a norma. Sobre o tema, Tortima apresenta o seguinte entendimento:

Ou seja: não existe, para usar a expressão em voga, qualquer forma de injustiça politicamente correta, atinja ela ricos ou pobres. Injustiça será sempre injustiça. Seria ingênua, não fosse odiosa, a idéia de tentar corrigir as iniquidades do sistema e cobrar parcela da dívida social da burguesia pela utilização arbitrária e opressiva dos instrumentos de repressão penal contra seus representantes.  Afinal, é o acesso à Justiça e a dignidade no tratamento ao jurisdicionado que merecem ser democratizados, não o arbítrio. (2002, p. 5)

            Dessa forma, constatando a enorme desproporcionalidade entre o número de delitos praticados e as condenações efetivamente impostas aos autores dos crimes econômicos, verifica-se ser necessário democratizar o controle penal para alcançar todas as classes sociais, aplicando-o indistintamente, independentemente do status socioeconômico do acusado.  

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL, Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes contra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências. 2008. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7492.htm>. Acesso em: 25 de maio. 2012.

CASTILHO, Ela Wiecko V. de. O controle penal nos crimes contra o sistema financeiro nacional. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. 352 p.

RODRIGUES, Francisco Cesar Pinheiro. A solução possível para a impunidade do colarinho branco. 2008. Disponível em:< http://jusvi.com/artigos/36308>. Acesso em: 25 maio 2012.

TORTIMA, José Carlos. Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional: (uma contribuição ao estudo da lei nº 7.492/86). 2. ed. rev. e ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. 198p