1 SINOPSE DO CASO

A problemática exposta a seguir, acerca do Projeto de Emenda à Constituição n.º 15/2011, teve como idealizador o Ministro Cesar Peluso, então Presidente do Supremo Tribunal Federal e membro do Conselho Nacional de Justiça, o qual afirmou que, devido à grande demanda judicial, no Brasil, acabou por se afastarem às garantias constitucionais como a celeridade processual, devido processo legal e duração razoável do processo.

A proposta diz respeito ao impedimento dos recursos judiciais subirem ao Supremo Tribunal Federal e demais Tribunais Superiores, consequentemente, o trânsito em julgado se daria da decisão da segunda instância e não nos tribunais superiores, ao momento pelo qual os recursos excepcionais (extraordinário e especial) passariam a ter natureza de ação rescisória e não mais recursal[1]. Ademais, se afastaria o efeito suspensivo dos recursos.

Isto tudo em prol da celeridade processual, a fim de que as lides fossem resolvidas mais rapidamente e que as execuções das decisões judiciais fossem mais ágeis[2].

No entanto, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil rejeitou a proposta utilizando com fundamentos restrição do acesso à justiça, quebra de cláusula pétrea (coisa julgada) e abalo na segurança jurídica das decisões judiciais.

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

 

2.1 Descrição das decisões possíveis

 

a)   A inconstitucionalidade da PEC dos recursos por violar garantias constitucionais, como ampla defesa, segurança jurídica, bem como modificar cláusulas pétreas.

b)   A possibilidade da PEC em questão dar ensejo às garantias constitucionais da celeridade processual, devido processo legal e desafogamento do Judiciário frente à grande demanda.

 

2.2 Argumentos para fundamentar cada decisão

 

A proposta de emenda modificaria os artigos 102 e 105 da CF/88, cujas redações, respectivamente, tratam dos Recursos Extraordinário e Especiais, os quais deixariam a natureza de recurso para terem de ação rescisória, deste modo, ficando com a seguinte redação[3]:

 

 

Art. 102.

I –

[...]

s) a ação rescisória extraordinária;

[...]

§ 3º A ação rescisória extraordinária será ajuizada contra decisões que, em única ou última instância, tenham transitado em julgado, sempre que:

I – contrariarem dispositivo desta Constituição;

II – declararem a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;

III – julgarem válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição;

IV – julgarem válida lei local contestada em face de lei federal.

§ 4º Na ação rescisória extraordinária, o autor deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais nela discutidas, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine sua admissibilidade, somente podendo recusá-la, por ausência de repercussão geral, pelo voto de dois terços de seus membros.

 

 

Art. 105.

[...]

I –

[...]

j) a ação rescisória especial;

[...]

§ 2º A ação rescisória especial será ajuizada contra decisões dos Tribunais Regionais Federais ou dos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios que, em única ou última instância, tenham transitado em julgado, sempre que:

I – contrariarem tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

II – julgarem válido ato de governo local contestado em face de lei federal;

III – derem a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

§ 3º A lei estabelecerá os casos de inadmissibilidade da ação rescisória especial.

 

 

Deste modo, estarão revogados o inciso III dos artigos 102 e 105 da CF/88, sendo inserido o art. 105-A. As razões expostas para a PEC n.º 15/2011 implicam em assegurar que o Brasil é um país onde existem quatro instâncias recursais e que a via recursal vem sendo utilizada com fins protelatórios para adiar a execução das decisões.

Com a proposta, afirma o Ministro Cesar Peluzo que as decisões das instâncias inferiores poderiam transitar em julgado sem obstar o questionamento ou o andamento no Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Isto possibilitaria a promoção de execuções já definitivas, tão-logo, a satisfação da tutela jurisdicional pretendida mais rapidamente e o respeito à celeridade processual. Assim, seriam coibidas condutas protelatórias.

Com toda mutação constitucional, esta implica em mudanças práticas, quais sejam: a) a coisa julgada passa surtir efeitos a partir da decisão de segundo grau; b) tem-se a possibilidade de interpor os recursos excepcionais a partir deste trânsito em julgado. Oliveira Junior defende que nesta última mudança se encontram todos os problemas, tendo em vista que a PEC não respeito a coisa julgada, tão-logo as cláusulas pétreas (art. 60, parágrafo 4º, CF/88) e a segurança jurídica[4].

A coisa julgada está prevista no art. 5º, inciso XXXVI, CF/88 e no art. 467, do CPC, a qual pode ser definida como aquela decisão que não mais está sujeita à qualquer recurso, tornando-se imutável e indiscutível, devendo a lei respeitá-la, contudo, isto não significa que a lei determine regras para a quebra da coisa julgada, como ocorre com a ação rescisória[5].

Deste modo, só há um instrumento hábil a quebrar a coisa julgada previsto na CF/88 (art. 102, I, ‘’j’’ e art. 105, I, ‘’e’’) que seria a Ação Rescisória, logo, não haveria cabimento em conferir natureza rescisória aos recursos excepcionais se não há previsão na Carta Magna. Ademais, a Constituição tutela a segurança jurídica das decisões, não havendo qualquer exceção, além da prevista, para a relativização da coisa julgada[6].

Além do mais, a natureza rescisória exige a “decisão do órgão rescidente, que reavalia decisão própria (CRFB/88, artigos 102 e 105), o que não aconteceria nos RE e RESP rescisórios, os quais inspecionam julgado de tribunais inferiores’’[7]. Deste modo, mesmo os recursos excepcionais sendo enviados ao Supremo Tribunal Federal, este não mais analisaria ato jurisdicional próprio.

Cabe destacar ainda a pretensão da PEC dos recursos repousa em modificação de texto considerado como cláusula pétrea, constante no inciso IV, §4º, art. 60, da CF/88, vez que trata de direitos de garantias individuais[8]. No mesmo sentido, apresentou argumento o Ministro Marco Aurélio[9].

No que tange ao efeito suspensivo dos recursos, este também é novidade da proposta, facultando ao Ministro pedir preferência no julgamento, quando for o caso[10].

Deixando o caráter de recursos, os Recursos Especial e Extraordinário, haverá a quebra uniformização da jurisprudência visto o papel destes no ordenamento jurídico brasileiro, e, assim, alterar em demasia a reforma do Código de Processo Civil que encontra-se em trâmite de aprovação[11].

No mesmo sentido compartilha o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, defendendo a tese de que se o problema é o abarrotamento de processos no Poder Judiciário, obstar o direito aos recursos não vai resolver o problema, como posicionam-se Zagallo e Souza[12]:

 

 

A realidade é que os problemas do Judiciário são outros. Os gargalos do sistema, em sua maior parte, estão localizados na primeira instância. É lá que proliferam as decisões interlocutórias e escasseiam as sentenças proferidas em um prazo razoável. Por coincidência, é na primeira instância que são realizados os menores investimentos do Poder Judiciário e, por consequência, é ali que se encontra a pior estrutura de suporte à atividade judicial.

 

 

Confronta a CF/88, pois restringe o direito de as partes interporem recursos especiais e extraordinário e não respeita o contraditório e a ampla defesa[13].

A solução para isto seria o debate a fim de que se descubra a resposta mais adequada, devendo haver ponderação de direitos e interesses, tendo em vista que de um lado busca-se a tutela jurisdicional mais célere pelo Estado com possibilidade de trânsito em julgado antes do que ocorre hoje, e, de outro, o sobrestamento de algumas garantias constitucionais e cláusulas pétreas.

REFERÊNCIAS

ITO, Marina. Coisa julgada é cláusula pétrea. Revista Consultor Jurídico 5 de abril de 2011. Disponível em:< http://www.conjur.com.br/2011-abr-05/coisa-julgada-clausula-petrea-lei-nao-mitiga-la-ministro >. Acesso em 28 set 2011.

OAB ACRE. OAB sai em prol do CNJ e repudia PEC dos Recursos. Disponível em:< http://oabac.tempsite.ws/portal/noticias/noticias-nacionais/3843-oab-sai-em-prol-do-cnj-e-repudia-pec-dos-recursos>. Acesso em 28 set 2011.

OAB JUNDIAÍ. OAB rejeita por unanimidade PEC dos Recursos proposta por Peluso. Disponível em:< http://www.oabjundiai.org.br/noticia-oab.asp?id=412 >. Acesso em 28 set 2011.

OLIVEIRA JUNIOR, Zulmar Duarte de. Com PEC recursos são remédios rescisórios. Revista Consultor Jurídico, 21 de abril de 2011. Disponível em:< http://www.conjur.com.br/2011-abr-21/pec-recursos-recursos-sao-remedios-rescisorios >. Acesso em 28 set 2011.

SENADO. PROJETO DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO n.º 15/2011. Disponível em: < http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=99758 >. Acesso em 28 set 2011.

SILVA, José Afonso. Comentário contextual à constituição. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2007.



[1] OAB JUNDIAÍ, 2011.

[2] OAB ACRE, 2011.

[3] SENADO.

[4] OLIVEIRA JUNIOR, 2011.

[5] Silva (2006, p. 35)

[6] OLIVEIRA JUNIOR, 2011.

[7] OLIVEIRA JUNIOR, 2011.

[8] OLIVEIRA JUNIOR, 2011.

[9] ITO, 2011.

[10] ITO, 2011.

[11] OLIVEIRA JUNIOR, 2011.

[12] ZAGALLO E SOUZA, 2011.

[13] ZAGALLO E SOUZA, 2011.