NATUREZA JURÍDICA DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL VIRTUAL: NATUREZA DO OBJETO VIRTUAL E O CONTEXTO DO DIREITO TRIBUTÁRIO[1]

 

Pedro de Oliveira Dominici[2]

Luana Christian de Araújo Muniz[3]

 

Sumário: Introdução; 1 estabelecimento empresarial; 2 elementos caracterizadores do estabelecimento empresarial; 2.1 identificação; 2.2 extinção; 2.3 transferência do estabelecimento empresarial; 3 Conceito de estabelecimento virtual; 4 estabelecimento empresarial virtual: breves considerações; 5 Classificação de bens digitais ; 6 Regime jurídico aplicado aos bens de caráter digital no Brasil; 7 Aspectos tributários e incidência referentes ao ICMS e ao ISSQN no comércio eletrônico de bens digitais via Internet; Conclusão; REFERENCIAS.

 

PALAVRAS-CHAVE:

Estabelecimento empresarial virtual- Bens materiais e imateriais- ICMS e ISSQN- Trespasse.

RESUMO:

Este trabalho tem como objetivo analisar a problemática tributária que envolve o objeto das atividades do estabelecimento empresarial virtual. Pata tanto, busca-se identificar e classificar estabelecimento empresarial e por fim, o regime jurídico brasileiro aplicável aos bens virtuais.

INTRODUÇÃO:

             O estabelecimento empresarial é um dos elementos mais importantes do empresário, pois este é responsável por uma maior facilidade na venda das mercadorias e da prestação de serviços proveniente da atividade empresarial, mas para isso o empresário deve se comprometer e se dedicar a administração dos bens da empresa e não somente os materiais, ele deve dar uma atenção especial também aos bens industriais que fazem parte da empresa ( desenho industrial, marca registrada, ponto, dentre outros). E caso o empresário queira extinguir ( no caso de desistência ou falência) ou transferir ( por meio do trespasse) ele deve cumprir uma série de aspectos obrigacionais antes de realizar a extinção ou transferência, devendo cumprir os dispositivos legais que versam sobre essa matéria.

             Existe ainda, a possibilidade de o empresário criar um estabelecimento virtual, com o intuito de dinamizar e facilitar as vendas da empresa, e até mesmo, de uma forma menos burocrática, atingir o lucro na empresa por meio da utilização de programas ou website de vendas onde o consumidor poderá efetuar a compra com apenas um click, mas para que isso ocorra, o empresário deve atentar para uma série de fatores obrigacionais que devem ser cumpridos, para que haja sucesso nas vendas e na obtenção de lucro evitando qualquer prejuízo, tudo deve estar de acordo com os trâmites legais no que concerne o registro, a prestação de contas, o pagamento de impostos, pagamentos dos empregados, etc. Mas acima de tudo, força de vontade do empresário para continuar na atividade empresária sempre objetivando o lucro.

       Por fim, tem-se a dificuldade encontrada pela legislação tributaria brasileira relativa ao ICMS e ISSQN. Tal problemática se originou com as inovações trazidas pela internet e, consequentemente, com o comercio eletrônico.

 

  1. 1.      ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL

           Entende-se por estabelecimento empresarial ou comercial, o conjunto de bens pertencentes ao empresário com o intuito de se explorar a atividade econômica e obter lucro, mas para que isso ocorra, o empresário precisa se programar e se comprometer com a atividade empresária, devendo este atentar para todos os aspectos empresariais provenientes de sua atividade empresarial, ou seja, toda uma complexa estrutura que deverá atender aos anseios do empresário com o objetivo de facilitar e aprimorar a produção de bens, a prestação de serviços e a administração do estabelecimento.

                 Conforme dispositivo legal previsto no Art. 1.142 do Código Civil:“ Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária”. Faz-se mister ressaltar ainda, que faz parte da própria caracterização da figura do empresário, que este exerça profissionalmente atividade empresária organizada, ou seja, ele deve organizar os fatores de produção de sua empresa( capital, mão-de-obra, matéria-prima, etc.) para a concretização do objetivo, qual seja de obter lucro para que assim possa investir mais capital e prosseguir evoluindo tanto profissionalmente quando financeiramente na sua atividade empresarial.

                  Waldo Fázzio Júnior entende que:

Realmente, ninguém discute mais a natureza jurídica do estabelecimento empresarial. É uma universalidade de fato, porque conjunto de coisas distintas com individualidade própria, que se fundem num todo, pela vontade de seu. São fatores autônomos que ganham valor patrimonial pelo fato de estarem ligados e organizados, finalisticamente. Em outras palavras, o estabelecimento do empresário transcende à soma dos bens que o compõem, constituindo-se bem móvel incorpóreo, objeto de direitos e suscetível de negociação.(2005,p.96)

 

 

              É importante ressaltar que o estabelecimento virtual precisa ser registrado da mesma forma como ocorre com o estabelecimento tradicional, isto é, o empresário de um estabelecimento virtual deverá dirigir-se à Junta Comercial e inscrever-se no CNPJ para que sua empresa possa começar a atuar configurada como um estabelecimento virtual (BOUSQUET FILHO, 2008). Ainda, o Código Civil brasileiro ao conceitua estabelecimento empresarial (artigo 1.142) não faz nenhuma referência ao espaço físico como essencialidade para a configuração de um estabelecimento, sendo necessário apenas um complexo de bens que também não são determinados enquanto corpóreos ou incorpóreos (BOUSQUET FILHO, 2008).
               Assim, site de vendas de dados eletrônicos, por exemplo, mesmo sem possuir aspecto físico, pode ser caracterizado como um estabelecimento empresarial, pois houve uma organização de bens (incorpóreos) em uma localidade, ainda que virtual.     Logo, constituindo um estabelecimento.

  1. 2.      ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL

             Os elementos que caracterizam o estabelecimento empresarial se dividem em: elementos materiais(indicados por bens corpóreos) e imateriais, ou seja, os bens incorpóreos que integram a propriedade empresarial com por exemplo os bens industriais: registro de desenho industrial, marca registrada, patente, nome empresarial, ponto, dentre outros).

           Vale lembrar que, apesar de alguns bens do estabelecimento empresarial sejam imateriais, estes também possuem proteção jurídica prevista no Código Civil, mais precisamente na Lei nº 9.279 de 1996 que como nos demonstra o Art. 1º: “Esta Lei regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial”, ou seja, os bens imateriais também possuem valor econômico no que concerne o estabelecimento empresarial visto que estes ocupam uma importante função na atividade empresarial.

             Existem ainda as formas do estabelecimento empresarial, que variam de acordo com a finalidade e o objeto da empresa escolhida pelo empresário. Ou seja, a forma do estabelecimento empresarial depende da finalidade da empresa, que por sinal é estabelecida no registro da empresa na Junta Comercial e estas variam entre: a finalidade comercial, agrária, industrial dentre outras que se identificam de acordo com a finalidade escolhida pelo empresário.

 

2.1  IDENTIFICAÇÃO

               Para a identificação do que vem a ser o estabelecimento empresarial, é importante que se considere três premissas fundamentais: o estabelecimento empresarial não é sujeito de direito, o estabelecimento empresarial é considerado uma coisa e que o estabelecimento empresarial integra o patrimônio da sociedade empresária. Desta maneira, não há de se confundir estabelecimento com sociedade empresária (que por sua vez é sujeito de direito) e nem com a própria empresa - possuidora de atividade econômica (COELHO, 2008, p.99).

            De acordo com o dispositivo legal previsto no Art.1.143 do Código Civil: “Pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza”, ou seja, os bens presentes no estabelecimento empresarial funcionam tanto coletivamente quanto isoladamente, portanto os bens integrantes do estabelecimento são independentes e autônomos, pois estes podem ser utilizados conjuntamente quando necessário ou podem ser divididos para uma melhor distribuição e organização nas vendas.

2.2  EXTINÇÃO

               O estabelecimento empresarial é de grande relevância para o sucesso nos lucros da atividade empresária, mas como não é incomum que vejamos sociedades sendo dissolvidas, não é diferente com o estabelecimento empresarial, este também está sujeito aos prejuízos provenientes da falência. E com a ocorrência da falência, o “principal estabelecimento” do devedor, deve ser utilizado para a instauração do juízo falencial (JÚNIOR, 2005,p.115).

            Com base nisso, Carvalho Neto apud Waldo Fázzio Júnior entende que: “o lugar onde o comerciante reúne os elementos contábeis gerais de seus negócios, onde se encontre o arquivo dos seus documentos, de onde ele emite, periodicamente, instruções, avisos e ordens aos demais estabelecimentos, é o do principal estabelecimento” (2005,p.115)

            Waldo Fázzio Júnior sintetiza a questão:

Deve preponderar, insista-se, na definição do estabelecimento principal, o critério quantitativo do ponto de vista econômico, tendo em mira melhor atender aos fins da falência, quais sejam, a liquidação do ativo e a solução do passivo do devedor. Podemos concluir, portanto, que estabelecimento principal, para o efeito de decretação de falência, não é aquele a que os estatutos da sociedade conferem o título de principal, “mas o que forma concretamente o corpo vivo, o centro vital das principais atividades comerciais do devedor, a sede ou núcleo dos negócios, em sua palpitante vivência material.(JÚNIOR,2005,p.116).

 

               Outro tipo de extinção do estabelecimento empresarial, é a da desistência do empresário em continuar exercendo a atividade empresarial, como sabemos esta atividade é muito complexa e para que dê certo, o empresário deve atentar para uma infinidade de aspectos que devem ser cumpridos, mas isso dificilmente ocorre, fazendo assim com que o empresário que tanto investiu naquela atividade, veja seu estabelecimento “indo por água a baixo” em razão das dívidas e dos impostos, não é a toa que vários estabelecimentos são fechados constantemente por falta de comprometimento do empresário com sua função ou em virtude dos altos preços dos aluguéis.

                  Acontecem ainda os casos em que o empresário, antes de falir, desiste da atividade empresarial, e vende todos os bens relacionados aquela atividade, bem como o estabelecimento empresarial, pois das vezes estes empresários vão investir em outro ramo empresarial ou até mesmo irão mudar de cidade e não tem condições de administrar seu patrimônio sob essas circunstâncias, abrindo assim, vaga para que outro empresário venha a ser o dono do “ponto” onde era localizado seu estabelecimento comercial, pois como sabemos, a atividade empresarial é dinâmica, um dia o empresário está obtendo altos lucros e quando ele menos espera, ele está chorando na amargura da pobreza, dando lugar para outros empresários investirem no seu lugar.

 

 

2.3 TRANSFERÊNCIA DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL

               Sobre a alienação do estabelecimento, o empresário pode transferir seu estabelecimento empresarial para outrem se utilizando um contrato de compra e venda denominado trespasse. No trespasse, o estabelecimento empresarial troca de titular, deixando de compor o patrimônio de um empresário (alienante) e transfere para outro. Entretanto, para que essa transferência se concretize, é necessário que se dê atenção para alguns aspectos empresariais, conforme nos demonstra o Art. 1.144 do Código Civil: “O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou o arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado á margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial.”

               Vale ressaltar ainda que, os débitos anteriores ao trespasse, caso contabilizados, são de responsabilidade do adquirente, mas o alienante continua solidariamente obrigado pelo prazo de um ano de acordo com o dispositivo legal previsto no Art. 1.146 do Código Civil: “O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.”

O doutrinador Waldo Fázzio Júnior alerta ainda para um aspecto relevante:

O trespasse do estabelecimento pode, eventualmente, caracterizar sinal de insolvência porque, em determinadas circunstâncias, significa a supressão da garantia comum dos credores. Será motivo para decretação da quebra, se encetada sem o assentimento dos credores, restando o devedor com patrimônio insuficiente para fazer frente a seu passivo. Caso contrário, isto é, ficando com bens suficientes, o consentimento dos credores é dispensável. A prova da insuficiência do ativo remanescente incumbe ao autor do pedido de quebra.(2005,p.113).

 

 

                Cumpre salientar que a transferência do estabelecimento comercial acarreta na cessão dos créditos contabilizados no ativo da empresa desde o momento da publicação do ato de arquivamento na Junta Comercial, logo, o adquirente assume o papel de credor, posto anteriormente ocupado pelo cessionário dos créditos (BOUSQUET FILHO, 2008). Ainda, pode ocorrer a chamada cessão de exploração de um estabelecimento comercial, que nada mais é do que um contrato de locação do estabelecimento empresarial como unidade jurídica, pelo qual o titular deste proporciona a determinado terceiro, de forma temporária e mediante certa retribuição, o uso e gozo deste (BOUSQUET FILHO, 2008).

 

 

  1. 3.      CONCEITO DE ESTABELECIMENTO VIRTUAL

 

            No atual cenário da globalização, viu-se necessário uma maior facilidade e praticidade no que concerne as transações comerciais, foi com base nesse anseio generalizado que somado a diminuição de empresas de grande porte e com e aumento significativo de empresas de pequeno porte(em virtude dos incentivos oferecidos), que surgiu o estabelecimento virtual, que nasce no intuito de atender demandas de uma maneira bem mais prática, célere e menos burocrática.

             No que concerne o estabelecimento virtual, Fábio Ulhoa Coelho define que: “é uma nova espécie de estabelecimento, fisicamente inacessível: o consumidor ou adquirente devem manifestar a aceitação por meio da transmissão eletrônica de dados”(2000,p.33).

              Outra questão relevante a ser explanada, é que em relação ao registro, o estabelecimento virtual precisa ser registrado da mesma forma como ocorre com o estabelecimento tradicional, ou seja, o empresário de um estabelecimento virtual deve ir à Junta Comercial registrar o seu estabelecimento e inscrever-se no CNPJ para que sua empresa possa fruir de todos os benefícios que um estabelecimento virtual possa proporcionar.

 

  1. 4.      ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL VIRTUAL: BREVES CONSIDERAÇÕES

             A Internet trouxe diversas transformações, até então nunca vistas, na vida moderna. Dentre elas, a mais importante de todas é intercomunicação universal. Contudo, com a Internet além da mera troca de informações entre pessoas em diferentes lugares, também é possível se realizar a troca de dados de todo tipo, sendo que esta troca de dados e/ou bens propriamente ditos pode ter caráter de compra e venda, ou seja, ter caráter de trocas comerciais.

              Os objetos desse tipo de troca comercial podem ser de duas naturezas distintas: tradicional ou digital. No que diz respeito aos bens de natureza tradicional (bens tradicionais), a Internet funciona como um meio que torna possível a troca comercial entre as pessoas. Ora, bens tradicionais são aqueles produtos corpóreos/ tangíveis comercializados de maneira já conhecida, cuja venda pode ser feita diretamente num estabelecimento empresarial físico ou via estabelecimento virtual, embora a entrega do produto seja a mesma em ambos os casos (WILKENS; FERREIRA, 2008, p.3-6). Assim, esta forma de comércio, em comparação com as formas de comércio já existentes antes da internet, apresenta poucos aspectos em que se diferencia.

            Os bens de natureza digital (bens digitais) são os que provocam mais dúvidas. Estes tipos de bens constituem uma nova categoria, que surgiu com a Internet, e consequentemente, com o comércio eletrônico. Na comercialização de bens digitais, tanto a venda quanto a entrega são feitas mediante internet, isto é, pelo próprio meio eletrônico. São bens incorpóreos que existem apenas na forma virtual, como por exemplo, livros eletrônicos, programas de computador...

            Ora, com o aparecimento do comércio eletrônico e, consequentemente, surgimento dos bens digitais, a legislação brasileira enfrenta atualmente um grande problema referente aos aspectos tributários, uma vez que está voltada essencialmente para a comercialização de bens tradicionais. Dessa maneira, tendo em vista as dificuldades de adaptação no que tange a tributação de bens digitais, surge à necessidade de modificar a legislação existente a fim de adequar a sua aplicabilidade.

 

5. CLASSIFICAÇÃO DOS BENS DIGITAIS

              Bens são tudo que não faz parte do ser humano e que possui valoração econômica, podendo ser comercializados. Os bens podem ser divididos, quanto a sua tangibilidade, em bens corpóreos e incorpóreos. Os bens corpóreos apresentam são materiais ou concretos podem ser tocados por possuírem substância material, enquanto que os bens incorpóreos, não possuem substancia material correspondente para sua significação, são intangíveis, geralmente são patentes, marcas (De Sá, 1995, p. 57). Ora, apesar de não possuírem substancia, são bens que podem efetivamente ser incorporados ao patrimônio de uma empresa, podendo inclusive ser negociados.

           Diante do exposto acima, é possível incluir os bens digitais dentro da categoria dos bens incorpóreos. Ainda, bens digitais podem ser classificados da seguinte forma:

 

Os bens digitais, constituem conjuntos organizados de instruções, na

forma de linguagem de sobre nível (O computador opera com as instruções transmitidas em linguagem de baixo nível, que é a linguagem capaz de ser interpretada pela máquina. As linguagens são de alto ou baixo nível conforme sua maior ou menor proximidade com a linguagem humana), armazenados em forma digital, podendo ser interpretados por computadores e por outros dispositivos assemelhados que produzam funcionalidades predeterminadas. Possuem diferenças específicas tais como sua existência não-tangível de forma direta pelos sentidos humanos e seu trânsito, por ambientes de rede teleinformática, uma vez que não se encontram aderidos a suporte físico. (EMERENCIANO, 2003, p.83)

 

           Cabe ressaltar que se faz necessário enquadramento a fim de proporcionar uma melhor compreensão a cerca da tributação dos bens digitais posteriormente.

6. REGIME JURÍDICO APLICADO AOS BENS DE CARÁTER DIGITAL NO BRASIL

             O comercio eletrônico traz consigo problemas novos, bem como maiores dificuldades na coleta de informações por parte das administrações tributárias: no ambiente de comércio convencional, os contribuintes mantém livros e registros, e prestam informações às autoridades tributárias quando requisitados, enquanto que no ambiente eletrônico, os livros e registros eletrônicos podem ser mais facilmente armazenados ou remetidos a jurisdições estrangeiras (O BRASIL, 2001, p.6).

                 Se a venda ocorre por meio do e-commerce e a entrega é física, os tributos de circulação de mercadoria e outros aplicáveis incidirão da mesma forma que os tributos sobre os produtos que são entregues por uma empresa não-virtual. (O BRASIL, 2001, p.7). Dessa forma o comercio eletrônico é apenas um espaço empresarial para a administração de negócios que funciona como meio para o alcance do mesmo fim a que se propõem as empresas com instalações físicas no País, isto é, a transação de mercadorias e serviços (O BRASIL, 2001, p.7). Assim, o que muda é tão somente o ambiente em que ocorre a troca, já que a natureza jurídica do negócio continua sendo a mesma (O BRASIL, 2001, p.7). Ora, mesmo que a circulação do produto seja física, o fato de a transação ser efetuada por meio da internet torna o controle fiscal mais difícil, visto que os produtos são geralmente remetidos diretamente ao domicílio do consumidor através da rede de correios (O BRASIL, 2001, p.7-8).

           A Constituição Federal Brasileira de 1988 trás como garantia constitucional o art. 5º, inciso XXVII, que dispõe o direito exclusivo de utilização, assegurado aos autores, por publicação ou reprodução de suas obras, tratando ainda de sua transmissibilidade aos herdeiros por tempo determinado em lei. Diante das características inerentes aos bens digitais, as normas jurídicas que regem tais bens estão dispostas na Lei nº. 9.609/98, que trata dos direitos autorais, proteção da propriedade intelectual, bem como sua comercialização, dentre outras matérias. Assim, os bens digitais são reconhecidos e, consequentemente protegidos, como direitos intelectuais. Por conseguinte, a circulação econômica dos bens digitais se dará da mesma forma que a reprodução de obras protegidas pela lei 9.609/98.

           Ora, os bens digitais, apesar de sua intangibilidade, ao serem exteriorizados por seu criador, se transformam em bens intelectuais, logo, seus direitos patrimoniais poderão ser explorados, da mesma forma que a propriedade intelectual (WILKENS; FERREIRA, 2008, p.8-10). Logo, poderão ser objetos de negócios jurídicos variados, conforme o exposto no artigo 49 da lei 9.609/98: Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito, obedecidas algumas limitações.

 

7. ASPECTOS TRIBUTÁRIOS E INCIDÊNCIA REFERENTE AO ICSM E AO ISSQN NO COMÉRCIO ELETRÔNICO DE BENS DIGITAIS VIA INTERNET

                 ICMS significa Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicações. Encontra-se previsto na Constituição Federal brasileira de 1988, em seu artigo 155, inciso II, sendo, portanto, de competência estadual e distrital. Ainda, a Lei Complementar nº. 87, de 1996 que trata da matéria dispõe:

 

Art. 1º Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.

Art. 2° O imposto incide sobre:

I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;

[...]

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

IV - da transmissão de propriedade de mercadoria, ou de título que a represente, quando a mercadoria não tiver transitado pelo estabelecimento transmitente.

 

               Nesse contexto, operação deve ser entendido como negócios jurídicos capazes de provocar a circulação de mercadorias, e esta circulação deve ser entendida como encaminhamento dessa mercadoria em direção ao consumidor. Mercadoria, por sua vez, deve ser entendida como todo e qualquer bem que pode ser visto como objeto da atividade comercial. Ora, a noção de mercadoria, exige a tangibilidade para reconhecer como coisa posta no comércio, pois é fundamental a ocorrência da tradição (EMERENCIANO, 2003, p. 157). Esta, por sua vez, é concretizada com a entrega efetiva do bem ao credor.  Dessa maneira, haja vista o que os bens digitais são intangíveis, a noção de mercadoria nesse contexto exige a materialidade do bem em si, logo, o ICMS não incide sobre a comercialização destes bens.

                Por sua vez, o imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN) de competência municipal e distrital, está disposto no artigo 156, III, da Constituição Federal de 88: Art. 156 Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. Esta Lei Complementar nº. 116, de 2003 define os serviços que serão tributados pelo ISSQN municipal. Tem-se no artigo 1º o seguinte: O imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

          Na expressão “prestar serviços” tem-se a prestação de utilidade (seja ela material ou não) de qualquer natureza, efetuada sob regime de Direito privado, mas não sob regime trabalhista, qualificável juridicamente como execução de obrigação de fazer, decorrente de um contrato bilateral (JUSTEN FILHO,1995, p.59). Assim, aqui se tem o cumprimento de uma obrigação contraída pela pessoa, e não tão somente do serviço em si. Ainda, no artigo 247, §4º da mesma lei, está disposto o seguinte: O imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza tem como fato gerador a prestação de serviços da lista abaixo, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador: [...] § 4º A incidência do imposto independe: da denominação dada ao serviço prestado; da existência de estabelecimento fixo; do cumprimento de quaisquer exigências legais, regulamentares ou administrativas, relativas ao prestador dos serviços; do recebimento do preço ou do resultado econômico da prestação.

              Se o prestador do serviço não possuir estabelecimento empresarial físico, o domicilio, conforme o estabelecido na lei será o local do domicílio do prestador, salvo exceções previstas em lei. Dessa maneira, no Brasil os bens digitais são tributados pelo ISSQN, como se fossem prestações de serviço.

 

CONCLUSÃO:

            A evolução das tecnologias de transmissão de dados e informações, juntamente com a criação da internet nas últimas décadas, deu inicio ao processo de globalização do comércio e da economia. Nesse contexto, relativamente recente, surge uma grande inovação no mundo econômico, o comércio eletrônico. Este possibilitou a realização de operações/transações comerciais a longas distâncias, e em tempo reduzido.

            Ora, tais transformações econômicas implicam grandes transformações no mundo jurídico, principalmente na área tributária, sendo que a característica mais problemática e interessante no comércio eletrônico, são os bens digitais/virtuais. Estes são uma nova categoria que surgiu com o comércio eletrônico.

            O estabelecimento comercial não é apenas o local físico onde o comerciante exerce sua atividade. Mas é o conjunto, o complexo das várias forças econômicas e dos meios de trabalho que o comerciante dedica ao exercício do comercio, impondo-lhes uma unidade formal, em relação com a unidade do fim, para o qual este as reuniu e organizou. (BORGES, 1991,p.187). Logo, mesmo que os bens digitais sejam incorpóreos, portanto, desprovidos de materialidade, estes acrescidos com aquilo que é essencial para a atividade do empresário constituirão o estabelecimento empresarial virtual.

               Por fim, o regime jurídico aplicável aos digitais no Brasil, é justamente o do Direito Autoral, tendo como pressuposto a Lei nº. 9.609/98 e a Lei nº. 9.610/98. Ainda, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) não é aplicável sobre a comercialização de bens virtuais, uma vez que tais bens são intangíveis, isto é, incorpóreos, e a noção de mercadoria tratada no ICMS estabelece a materialidade do bem em si. Logo, o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) incidirá, sem, todavia, esquecer que é de fundamental importância a adequação ou mesmo criação de normas jurídicas para disciplinar a matéria exposta de maneira adequada, uma vez que o ordenamento jurídico brasileiro é o dinamismo, está em constante processo de (re)construção, devendo se adaptar às novas transformações inerentes as atividade humanas

REFERÊNCIAS:

BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5º ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991.

BOUSQUET FILHO, Sérgio. Estabelecimento empresarial. 2008. Disponivel em: <http://academico.direito-rio.fgv.br/ccmw/index.php?title=Estabelecimento_empresarial&redirect=no> Acesso em: 20/10/2012.

BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de Maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Brasília. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9279.htm > Acesso em: 05/11/2012

BRASIL. Código Civil. 2002. 3º ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2000, v.3.

_________, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, 12º ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v.1.

DE SÁ, A. Lopes. Dicionário de contabilidade. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1995.

EMERENCIANO, Adelmo da Silva. Tributação no comércio eletrônico. São Paulo:

Thomson Iob, 2003.

JÚNIOR, Waldo Fázzio. Manual de Direito Comercial. 5º ed. São Paulo: Atlas S.A, 2005.

JUSTEN FILHO, Marçal. ISS no tempo e no espaço. Revista dialética de direito tributário 2/53-69, São Paulo: Dialética, 1995.

 

Ministério da Fazenda Secretaria da Receita Federal. O Brasil e o comércio eletrônico. Brasília: 2001. Disponível em: <http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/estudotributarios/estatisticas/13BrasilComercioEletronico.pdf> Acesso em: 20/10/2012

 

WILKENS, Érica Elisa Dani; FERREIRA, Luiz Felipe. Aspectos conceituais da tributação de bens digitais. REVISTA CATARINENSE DA CIÊNCIA CONTÁBIL - CRCSC - Florianópolis, v.7, n.21, p.71 - 84, 2008



[1] Paper apresentado a disciplina de Teoria do Direito Empresarial ministrada pelo professor José Humberto Gomes de Oliveira        

[2] Acadêmico do curso de direito da UNDB 3ºperiodo – [email protected]

[3] Acadêmica do curso de direito da UNDB 3ºperiodo –[email protected]