MULHER E VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Martinelle dos Santos de Moraes

Especialista em História da África (Simonsen)
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Palavras chave: Violência doméstica, Lei Maria da Penha, mulher, agressão.

Resumo: O presente trabalho analisa a violência contra mulher no Brasil, fato este que vem apresentando crescimento em nossa sociedade, e as formas como tal hostilidade pode ser realizada de formas diferenciadas, além de examinar a Lei Maria da Penha e as consequências da agressão no cotidiano da mulher.


 

I. Introdução

Atualmente notícias sobre agressão a mulher permeia todo nosso país através de jornais, revistas e noticiários que nos revelam um número cada vez mais crescente mediante a tal fato. Sendo importante destacar que a violência doméstica contra a mulher atinge a todas, indiscriminadamente, não importando classe social, raça, cor, etnia, idade, escolaridade ou religião.
A questão da violência contra a mulher começa a repercutir no setor público a partir de 1970, porém, no Brasil só a partir de 1980 os movimentos das feministas saem às ruas em busca dos direitos das mulheres, por uma vida digna sem violência. As lutas feministas além da busca pela igualdade buscam que a mulher assuma seu papel de cidadã com direito a participação econômica, cultural, social e política em igualdade aos homens.

Contudo as mulheres através das décadas vem ocupam seu espaço e conquistando seu território demonstrando suas reais capacidades e pondo fim ao estereótipo de fragilidade tão comumente explorado em nossa sociedade.

 

1. A dominação masculina

Ao longo dos séculos é notória a presença masculina de forma atuante em nossa história, a família de caráter patriarcal, por exemplo, expressa esta assiduidade, segundo o qual o homem saía para caçar em busca de alimento e a mulher permanecia no território cuidando de sua parentela e da agricultura. Desta forma a mulher não apresentava espaço na sociedade para descobrir-se, conhecer suas habilidades e talentos fora do lar, seu ambiente era limitado aos cuidados domésticos. Um espaço que ela não podia escolher com quem compartilhar, pois a vida era traçada pelos homens de sua família. Bourdieu em sua obra, A Dominação Masculina, explica da seguinte forma a dominação masculina:

“Também vi na dominação masculina, e no modo como é imposta e vivenciada, o exemplo por excelência desta submissão paradoxal, resultante daquilo que eu chamo de violência simbólica, violência suave, insensível, invisível a suas próprias vitimas, que se exerce essencialmente pelas vias puramente simbólicas da comunicação e do conhecimento, ou, mais precisamente, do desconhecimento, do reconhecimento ou, em última instância, do sentimento”. (BOURDIEU, 2002, p.03).

A relação de hierarquia existente nesta sociedade permitia que o homem mantivesse a imagem de superioridade e poderio sobre a vida da mulher, surgindo, portanto a violência de gênero. Werba & Strey em seu livro, Longe dos olhos, longe do coração: Ainda a invisibilidade da violência contra a mulher, aborda esta questão.

“Violência de gênero envolve ações ou circunstâncias que submetem unidirecionalmente, física e/ou emocionalmente, visível e /ou invisível as pessoas em função do sexo” (2001, p.72)

Assim sendo a violência de gênero pode ser caracterizada como sendo aquela que é exercida de um sexo sobre o outro, sendo o sujeito passivo uma pessoa do sexo feminino. Podendo ser explicada como uma questão cultural que se situa no incentivo da sociedade para que os homens exerçam sua força de dominação e potência contra as mulheres refletindo suas influências culturais passadas de dominação.

 

2. Tipos de violência

A violência exercida sobre uma mulher não pode ser caracterizada apenas como a de gênero, existindo diversas modalidades sobre as quais cabe ressaltar. A Organização Mundial de Saúde (Redesaúde, 2001) sistematiza algumas dessas formas que são:

 

a) A violência doméstica: é concebida como todo o tipo de violência que inclui membros do grupo, sem função parental, que convivam no espaço doméstico, incluindo pessoas que convivam esporadicamente neste espaço.

b) A violência intrafamiliar: refere-se a

toda ação ou omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de outro membro da família, incluindo pessoas que passam a assumir função parental, ainda que sem laços de consanguinidade, e em relação de poder à outra.

c) A violência física: ocorre quando uma pessoa, que está em posição de poder em relação a outra pessoa, causa ou tenta causar dano não acidental, por meio do uso da força física ou de algum tipo de arma que possa provocar ou não lesões externas, internas ou ambas. Atualmente, também é considerada violência a aplicação de castigo, repetido não severo.

d) A violência conjugal: tem sido entendida como violência contra a mulher cometida pelo parceiro no contexto de uma relação afetiva e sexual, independentemente de ser relação estável legalizada. A violência conjugal pode ocorrer tanto no espaço doméstico quanto no espaço urbano. A categoria de violência conjugal abarca as formas de violência física, violência sexual e violência emocional ou psicológica. Outros

estudos (Redesaúde, 2001) apontam ainda que 11% das brasileiras com 15 anos de idade ou mais já foram vítimas de espancamento. O levantamento encontrou que uma em cada cinco mulheres foi agredida pelo menos uma vez em suas vidas. A pesquisa mostra que o marido ou companheiro é responsável por 56% dos espancamentos, 53% das ameaças com armas e 70% da destruição dos bens.

 

3. A Lei Maria da Penha

A lei 11.340 de 07 de agosto de 2006, comumente conhecida como Lei Maria

da Penha, foi criada segundo seu Art.1 com o objetivo de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Sua criação ocorreu através da luta de uma mulher chamada Maria da Penha Maia Fernandes, o qual era farmacêutica bioquímica, formada pela Universidade Federal do Ceará. Após anos de agressões sofridas pelo seu marido o professor universitário Marco Antônio Heredia Viveiros, na noite do dia 29 de maio de 1983, seu esposo tentou mata-la com um tiro pelas costas, porém seu objetivo não foi alcançado, a deixou paraplégica. Após o ocorrido o

 universitário não se intimidou e tentou eletrocutar a esposa enquanto a mesma tomava banho.

A partir de então iniciou-se  a luta de Maria da Penha em busca de justiça e para garantir o direito a vida de outras mulheres. Em 1998 Penha denunciou o descaso das leis e do governo brasileiro à comissão interamericana de direitos humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (DEA). O governo brasileiro foi responsabilizado por sua negligência e omissão em relação à violência doméstica e assim surgiu a lei 11.340/2006.

Marco Antônio Heredia Viveiros foi preso em 2002 e permaneceu preso por

dois anos, causando revolta em toda a população, pois ficou claro que segundo

Cunha e Pinto a intenção do marido de Maria da Penha:

“O ato foi marcado pela premeditação. Tanto que seu autor, dias antes, tentou convencer a esposa a celebrar um seguro de vida, do qual ele seria o beneficiário. Ademais, cinco dias antes da agressão, ela assinara, em branco, um recibo de venda de veículo de sua, a pedido do marido”. (CUNHA; PINTO, Revista dos Tribunais, 2008, p.21).

A lei Maria da Penha vem para suprir o erro da lei 9.099/95 tendo em vista que antes só era previsto como pena o pagamento de uma cesta básica, quando muito duas cestas, e, privação da liberdade de três meses a um ano. Sendo este último difícil ocorrer. E esta lei cumpria um papel social em nome da preservação da família e do casamento mais na tentativa da conciliação do que na ideia de punição aos agressores. A Lei Maria da Penha possui como lado positivo a possibilidade da prisão preventiva do agressor, e até o seu afastamento do lar.

Da mesma forma a criação das DEAMs (Delegacias Especializadas de Atendimento a Mulher) em 1986 possuem por finalidade como afirma Cepia em, Violência contra a mulher: Um guia de defesa, orientação e apoio.

“As delegacias especializadas de atendimento à mulher foram criadas com a finalidade específica de dar atendimento e orientação à mulher vítima de violência.” (CEPIA, 2000: p.9).

Contudo as instalações são restringidas visto que não existem verbas suficientes para realizar um trabalho eficaz em todos os municípios brasileiros.  Ainda há cidades brasileiras sem a presença das DEAMs. Por isso a importância de  expor que através das instalações de DEAMs, programas e planejamentos de assistência será possível contribuir e prevenir situações de violência.

 

4. Consequências da violência doméstica.

A violência acarreta juntamente com seu ato em si, efeitos devastadores sobre a mulher. Após sofrer as violências aqui descritas as mulheres podem apresentar como consequências psicológicas diversos sinais ou sintomas como, por exemplo; estresse pós-traumático, destruição da autoestima, apatia, depressão, ansiedade, distúrbios sexuais, distúrbios do sono, pânico, abuso na ingestão de substâncias, ansiedade generalizada, fobia, comportamento antissocial dentre outras. Os efeitos causados pela agressão podem ser destruidores e devem ser analisados de uma forma abrangente dado que não só as mulheres agredidas sofrem. Deve-se haver uma atenção para com as famílias, os filhos ou sua rede social (trabalho, amigos dentre outros).

Por diversas vezes a mulher agredida usa a passividade como reação no momento da agressão, contudo Zuwick em sua obra, O corpo violado, observa tal atitude.

 “Essa aparente passividade demonstrada por muitas mulheres ao serem violadas, frequentemente, é interpretada como aquiescência. No entanto, a passividade (paralisação) nasce do pânico frente ao agressor e ao medo da morte” (Zuwick, 2001, p.86).

Não obstante algumas vezes o medo de perder a família e ser exposta perante a sociedade igualmente imobilizada a mulher que por diversas vezes opta pelo silêncio a denúncia. Mais uma vez Zuwick alerta sobre tal.

“A vergonha de que deveria ser portador aquele que a agrediu volta-se contra a mulher e a silencia, tornando-a parte da rede que sustenta a dominação” (2001, p. 89).

Todavia ao calar-se a mulher permite que a agressão se perpetue por uma demanda maior de tempo e assim chegue em patamares cada vez mais difíceis de serem controlados.

 

5. Considerações finais

Diante do relatado torna-se indiscutível a proporção tomada pelo uso da violência contra a mulher em nosso país. Tornando-se necessário para o seu combate à articulação de diversos setores como a polícia, a magistratura, ministério público, defensoria pública, hospitais, educação, serviço social etc. A fim de tornar o atendido à mulher agredida o mais ágil e apurado possível.

Através da luta pessoal de Maria da Penha, a sociedade brasileira foi beneficiada pelos avanços nos direitos femininos, embora haja necessidade de melhorias, e apenas através do apoio a mulher agredida se fará com que mais e mais mulheres exerçam o direito de denunciar seu agressor, e tenham o empenho necessário para superar os traumas lhe foram causados e dar prosseguimento a sua vida.

 

6. Referências Bibliográficas

 

BOURDIEU. Pierry. A Dominação Masculina. 2º edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.

 

CEPIA. Violência contra a mulher: Um guia de defesa, orientação e apoio. 3º edição, 2000. Disponível em : http://www.cepia.org.br/Textos_online/cartilha2000.pdf . Acesso em 03 de dezembro de 2013.

 

CUNHA; PINTO, Revista dos Tribunais, 2008.

 

Redesaúde (2001). Saúde da mulher e direitos reprodutivos. São Paulo: Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos

Reprodutivos.

 

 

Werba, G. C. & Strey, M. N. (2001). Longe dos olhos, longe do coração: Ainda a invisibilidade da violência contra a mulher. In P.K. Grossi & G. C. Werba (Orgs.). Violências e gênero: Coisas que a gente não gostaria de saber . Porto Alegre: Edipucrs.

 

Zuwick, A. N. (2001). O corpo violado. Em P. K. Grossi & G. C. Werba (Orgs.). Violências e gênero: Coisas que a gente não gostaria de saber. Porto Alegre: Edipucrs.