MUDANÇAS DE ESTILO

MENDES, Valerie. DE LA HAYE, Amy. A moda do século XX. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
Ondulações e exotismos: são essas as duas definições que os autores Valerie Mendes e Amy de la Haye usam para definir o primeiro capítulo do livro A moda do século XX. Ao longo do texto, citam as várias formas que os trajes femininos tiveram ao longo do período de 1900 a 1914, sempre contextualizando os trajes dentro do cenário social da época.
Para os apaixonados por moda, este é o livro ideal sobre moda ao longo da história, pois além de descrever os trajes com detalhes, traz um vasto número de ilustrações que tornam-se importantíssimas para o perfeito entendimento do início de século XX.
Os primeiros quatorze anos do século XX, podem ser chamados de “La Belle Epoque” (a era da opulência) ou “Era Eduardiana”. Nesse período, o que a moda ditava era rigidamente seguido. A posição e classe social eram claramente assinalados pela roupa. Para se ter uma idéia, já naquela época se “copiava” estilo, ou seja, era comum as criadas “copiarem” as roupas usadas pelas patroas. Isso, claro, era mal visto por elas, e “decretavam” que as criadas deviam se limitar aos vestidos pretos, toucas e aventais.
Paris continuava a ser o lar incontestável da moda. Os artigos usados nos trajes eram inúmeros: lantejoulas, rendas, bordados, enfim, tudo o que tornasse a roupa muito exuberante.
As mulheres continuaram usando espartilhos. Os mais caros e bonitos eram de cetim, com cores bem brilhantes. Eram usados de forma que deixassem o corpo com a forma de “S”, ou seja, cinturas finíssimas, um busto baixo e ancas arredondadas.
A maquiagem e os perfumes tornaram-se cada vez mais importantes na busca pela beleza. Eram considerados vulgares na época. Dava-se ênfase à pele natural e sadia, e por isso, surgiram vários tratamentos de pele como pílulas purificadoras que os vendedores afirmavam serem capazes de trazer o rubor de saúde aos rostos pálidos. Muitas beliscavam as bochechas e mordiam os lábios afim de conseguir um aspecto “corado”. Já as mais atrevidas, recorriam a pomadas pigmentadas para os lábios.
Ao longo do tempo, as revistas tiveram um papel fundamental em deixar as mulheres sempre bem informadas sobre o estilo vigente. No início tinham ilustrações, e com o desenvolvimento da fotografia, em fins do século XIX, os periódicos substituíram os desenhos de moda pelas fotos.
Nessa época o casamento era quase obrigatório, e existiam manuais de etiqueta que diziam a quantidade e quais as peças uma noiva deveria ter no seu enxoval. A roupa era determinada pela ocasião, pela estação e pela hora do dia. Os chapéus eram itens obrigatórios, e os chapeleiros elaboravam criações cada vez mais decoradas.
A forma da roupa feminina teve muitas transformações. O estilo de vestido chamado de Império, com linhas retas e cintura alta, foi o preferido durante os primeiros anos do século, para serem usados à noite. Em 1910, os vestidos eram levemente levantados pelas damas, pois a saia funil que usavam restringia seus movimentos.
Mas foi em 1911, que Paul Poiret conduziu o distanciamento da silhueta cheia e curvilínea do início da década, para uma linha mais longa e esbelta. Era um mestre de cor, textura e tecido, combinando os mais recentes tecidos de luxo com peças de sua própria coleção de têxteis étnicos. Por volta de 1912, Poiret criou um luxuoso manto de ópera em cores vivas e brilhantes fios de metal. As cores da peça refletem a influência do orientalismo, que tinha grande impacto sobre a moda da época.
Quanto aos homens, não estiveram à mercê de modas passageiras como as mulheres, mas eram obrigados a manter extensos guarda-roupas para se vestirem bem em todas as ocasiões. Não houve nenhuma mudança significativa no vestuário masculino de 1900 à 1913. Apenas as roupas ficaram menos formais, e o conjunto de passeio tornou-se dominante. O corte era impecável, e a marca da elegância masculina era a perfeição no arrumar-se. Os cabelos eram curtos e bem penteados. Os sapatos mais finos eram feitos à mão. Os calçados tinham biqueiras arredondadas e as polainas eram populares.
Nesse período do século houve o declínio das cartolas, que após 1914 ficaram restritas às ocasiões mais formais. As calças foram praticamente sempre estreitas, com ou sem barras italianas.
Não era de bom tom que um homem deixasse transparecer seu interesse por roupas. Por isso, deveria usar somente as palavras “arrumado”, “discreto” e “adequado”.
As roupas para lazer e esporte eram projetadas para enfrentar os rigores específicos de cada atividade. Suéteres esportivos de tricô, de mangas compridas, tornaram-se comuns e estavam destinados a desempenhar um papel importante no futuro.
Aos poucos, à medida que a Primeira Guerra Mundial ia se aproximando, preocupações mais sérias foram surgindo, e aceleraram o fim da “Era Dourada” e de seus estilos de vida e moda ostentosos.
Ao longo desse capítulo do livro, é possível perceber a grande contribuição que os autores dão, na medida em que conseguem relacionar as mudanças de estilo dos trajes, com o contexto social da época.
Cabe também destacar, a relação que a leitura nos proporciona fazer, com a teoria contida no livro “A psicologia da Roupas”, de J. C. Flügel. Trata-se dos três motivos principais pelos quais o homem começou a vestir-se: proteção, pudor e enfeite. Segundo esse autor, a proteção foi o motivo principal apontado pelos historiadores. Ao longo do texto constata-se que o principal motivo foi o enfeite. E lendo um livro como o “A moda do século XX”, entendemos o porquê.
O enfeite é uma das formas de nos exibirmos. Realça certas partes do corpo, e no momento em que essa parte chama a atenção do sexo oposto, o enfeite também passa a garantir a reprodução.
O pudor surgiu com o Cristianismo. Era e é, a vergonha de exibir o corpo nu. Sendo assim, Flügel aponta a dicotomia em que vivemos: temos um corpo, que precisa e quer exiber-se, mas ao mesmo tempo sente pudor ( que muitas vezes é algo imposto pela sociedade, como foi durante décadas ao longo da História da Moda ).
Por isso, é fácil entender o porquê de tantas mudanças do traje feminino, dentro de tão pouco tempo (como foi o caso de 1900 a 1914). É através da mulher que se tem a perpetuação da espécie, e para isso ela precisa estar atraente, mostrar o corpo, insinuar-se para atrair o parceiro; e é nesse momento que a moda cumpre um de seus papéis mais importantes.