LIDIANE LOCATELLI

 

RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS NOS CRIMES AMBIENTAIS: UM ENFOQUE ÀS PENAS APLICÁVEIS


Monografia jurídica apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Sorriso, como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Direito, sob a orientação do Prof. Esp. Dyogo Costa Marques.

SORRISO-MT 2011

 

 

 

LOCATELLI, Lidiane. Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas nos Crimes Ambientais: um enfoque às penas aplicáveis. 2011. 59 f. Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – FAIS – Faculdade de Sorriso, 2011.

 

A responsabilidade penal da pessoa jurídica que comete crimes ambientais se faz a cada dia mais necessária, ante a inegável degradação ambiental, e o conseqüente comprometimento a sadia qualidade de vida.

Nesta senda, há que sempre se ponderar o que poderá ser feito em benefício ao meio ambiente, incluindo, se necessário a responsabilização da pessoa jurídica e a conseqüente aplicação da pena, para que a lei nº. 9.605/1998 cumpra seu papel na proteção ao meio ambiente. Penas estas que devem ser aplicadas não apenas atendendo ao dano concernente ao meio ambiente degradado e sim a capacidade econômica do infrator.

 Usando-se do bom senso, certo é, que não se pode usar a lei como único instrumento de proteção ambiental. Importante que se tenha consciência ambiental aliada ao desenvolvimento da atividade empresarial, tendo como primazia a prevenção e a precaução e, em não o sendo, executando-se em ultima ratio o que determina a lei.

 Palavras-chave: Meio Ambiente. Pessoa Jurídica. Direito Ambiental.

 ABSTRACT


LOCATELLI, Lidiane. Criminal Liability of Corporations in Environmental Crimes: an approach to penalties. 2011. 59 f. Completion of course work (undergraduate) - FAIS - Smile School, 2011.

 

Criminal liability of legal entities who commit environmental crimes becomes every day more necessary, given the undeniable environmental degradation, and consequent commitment to a healthy quality of life.

In this vein, we must always consider what can be done to benefit the environment, including, if necessary accountability of the legal entity and the consequent application of the penalty, that the law no. 9.605/1998 fulfill its role in protecting the environment. These penalties should be applied not only given the damage concerning the degraded environment but the economic capacity of the offender.

Using common sense, truth is, you cannot use the law as the sole instrument of environmental protection. Important to make environmental awareness coupled with the development of business activity, with the primacy of prevention and precaution, and failing that running in the ultima ratio that determines the law.

Key words: Environment. Legal Entities. Environmental Law.

INTRODUÇÃO

 

Nos últimos anos no mundo todo, assiste-se uma larga preocupação com a defesa do meio ambiente, e no Brasil, não seria diferente.

Desta forma, o sistema jurídico do país vem enfrentando constantes mudanças ao longo de seus anos, buscando sempre adaptar estas mudanças de acordo com os anseios e a evolução social.

O meio ambiente por sua vez, é um sistema em constante mudança no cenário brasileiro, tanto do ponto de vista da legislação, quanto ao ponto da preocupação com o a sua preservação frente a degradação desenfreada do homem.

Quando nos referimos ao “homem”, não estamos falando apenas da pessoa física, mas também da pessoa jurídica. A realidade da pessoa jurídica criminosa se perfaz em todos os ramos do direito, não apenas ao que se refere aos ilícitos ambientais.

Pode-se dizer que a preocupação com o meio ambiente é uma verdade absoluta. São inúmeras as ações ambientais promovidas tanto pelas sociedades organizadas, como por aquelas atitudes simples que partem de cada cidadão na sua própria casa, rua, bairro e assim sucessivamente.

Desta feita, a legislação não pode assistir de braços cruzados os eventos danosos contra o meio ambiente, deixando apenas para os cidadãos conscientes e de bem para que resolvam a situação.

Sendo assim, a Legislação Pátria, com o advento da Constituição de 1998, consagrou, definitivamente, em seu artigo 225, § 3º a responsabilidade das pessoas jurídicas diante das condutas lesivas ao meio ambiente, sujeitando-se as mesmas as sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos.

Para corroborar o bastante disposto na Carta Magna, no mesmo ano foi sancionada a Lei nº. 9.605/1998, que dispõe unicamente das sanções penais e administrativas lesivas ao meio ambiente.

Pois bem, estando regulamentada por lei a possibilidade de punição da pessoa jurídica que comete danos ambientais, procuraremos expor alguns aspectos que levaram o legislador brasileiro a instituir a responsabilização da pessoa jurídica que comete crime ambiental, levando em consideração as disposições da Carta Magna de 1998, bem como os aspectos da lei nº. 9.605/1998.

Analisaremos a eficácia da lei acima citada, bem como se as penas aplicáveis as pessoas jurídicas estão sendo financeiramente suficientes, de modo que, inibam novos crimes, e não apenas sejam de caráter ínfimo, capazes de incentivar uma nova conduta lesiva.

O tema é importante também para acalorar a conscientização e a educação ambiental da população, que, bem informada acerca das questões ambientais é indubitavelmente uma ferramenta de defesa e proteção de todo o ecossistema.

 

CAPÍTULO 01 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS E ORIGEM DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA


1.1 Meio Ambiente

O meio ambiente constitui-se, amplamente falando, em um patrimônio coletivo da fauna e da flora existentes no planeta, ou seja, é tudo aquilo que nos circunda. A Lei Maior consagra que temos o direito de um meio ambiente saudável, in verbis:

 Art. 255.Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.(BRASIL, 1988, p. 129).

 Desta forma, não é dever apenas do poder público conservar e preservar o meio ambiente, mas sim um dever de toda a coletividade.  Assim há uma extensão de compromisso em relação ao meio ambiente, de forma que, tudo o que se fizer de bom ou de ruim ficará registrado para as gerações futuras.

A preocupação com proteção do meio ambiente, exposta no artigo 225 da Carta Magna, nos remete a ter a consciência de conciliar a exploração ambiental sustentável, em detrimento ao desenvolvimento social. Ambas devem andar lado a lado, pois caso contrário, será difícil, num futuro não muito distante, restabelecer o status quo ante ao meio ambiente.

Para Edis Milaré, a conceituação de meio ambiente não é uníssona, vejamos:

Não há acordo entre os especialistas sobre o que seja o meio ambiente. Trata-se de uma noção “camelão”, que exprime, queiramos ou não, as paixões, as expectativas e as incompreensões daqueles que dela cuidam. Mas o jurista, por mais próximo que esteja de seus sentimentos que o informam como ser humano, necessita precisar as noções que se relacionam com sua tarefa de formular e aplicar normas jurídicas. (MILARÉ, 2000, p. 52).

Um conceito mais formal de meio ambiente, está disposto no Dicionário Jurídico, a saber: “entende-se por meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. (CARVALHO, 1991, p. 241).

Do mesmo conceito acima, compartilha o artigo 3º. I, da Lei nº. 6.938/1981 – Política Nacional do Meio Ambiente. Tal artigo foi recepcionado pela Carta Magna de 1988, que buscou tutelar não só o meio ambiente natural, mas também o artificial, o cultural e o do trabalho.

Depreende-se do conceito acima colacionado, que o meio ambiente é de conceituação ampla, envolvendo não apenas os organismos provindos da natureza em si, mas advindos também da realização e intervenção do próprio homem, como prédios, casa, e edificações em geral.

1.2 Legislação Brasileira

É imperioso, destacar no presente estudo monográfico, o marco inicial da legislação brasileira que disciplina o direito do ambiente, tendo em vista a recente preocupação em defender este meio essencial a qualidade de vida das presentes e futuras gerações.

“A devastação ambiental não é marca exclusiva de nossos dias ou deste século. Apenas a percepção jurídica deste fenômeno – até como consequência de um bem jurídico novo denominado “meio ambiente” – é de explicação recente.” (MILARÉ, 2000, p. 78).

De fato, pode-se observar no meio jurídico, que a consciência e a celeridade na legislação ambiental são, de certa forma, recente.

As primeiras noções de proteção ambiental foram instituídas pelo Código Civil de 1916. No entanto, tais previsões davam proteção apenas aos direitos privados relativos os direitos de vizinhança.

Após 1916, foram surgindo tímidos diplomas para tutelar o meio ambiente. Tímidos, porque ainda não possuíam a força executória que pretendiam. A exemplo, surgiram nesta época o Decreto 23.793/34 – Código Florestal; Código de Águas (Dec. 24.634/34); também advindo em consequência em 1938 o Código da Pesca.

Mais tarde, na década de 60, com o surgimento dos movimentos ecológicos, surgiram as normas mais direcionadas ao controle e prevenção da degradação existente. A exemplo adveio o Estatuto da Terra, o da Mineração, a Lei do Parcelamento do Solo e, também, o Código Florestal como Lei, anteriormente possuía status de Decreto.

Não obstante, essa imensa gama de diplomas versando sobre itens ambientais, podemos afirmar, sem medo de errar, que somente a partir da década de 1980 é que a legislação sobre a matéria passou a desenvolver-se com maior consistência e celeridade. É que o conjunto das leis até então não se preocupava em proteger o meio ambiente de forma específica e global, dele cuidando de maneira diluída, e mesmo casual, e na exata medida de atender sua exploração pelo homem. (MILARÉ, 2000, p. 80).

Neste diapasão, percebe-se o recente cuidado da legislação brasileira em salvaguardar o meio ambiente. O mesmo autor citado acima, elenca em sua opinião, quatro marcos essenciais advindos da nova legislação para dar respostas ao clamor social por uma tutela mais específica e eficaz ao meio ambiente.

Tais marcos são: em primeiro lugar, a edição da lei nº. 6.938/81, que trouxe entre outras coisas o conceito de um ambiente, como objeto de proteção específica; em segundo lugar o advento de outra lei, a de nº. 7.347/85 que disciplinou a ação civil pública para defesa do meio ambiente.

O terceiro marco, onde o autor vê o maior progresso da legislação é o advento da Carta Magna de 1988, que dedicou capítulo específico para o meio ambiente, dispondo também acerca da responsabilidade das pessoas jurídicas diante do meio ambiente. O quarto marco na visão do autor é um significativo avanço da tutela do meio ambiente, qual seja, a edição da lei nº. 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas aplicáveis as condutas lesivas ao meio ambiente.

Como se vê, a tutela ambiental vem ganhando força e fôlego nos últimos 20 e 30 anos. Parece muito tempo, mas em se tratando de meio ambiente ainda é pouco, frente à idade do nosso país e o tamanho da degradação existente, fruto de décadas de descaso e omissão.

 1.3 Princípios Norteadores do Meio Ambiente

Os princípios constituem-se em um alicerce, um fundamento, o ponto de partida para qualquer tipo de ciência, e para o Direito Ambiental não seria diferente. Faremos um estudo dos principais princípios norteadores do meio ambiente, para que se possa entender melhor os preceitos constitucionais pertinentes a responsabilidade da pessoa jurídica.

1.3.1 Princípio do direito à sadia qualidade de vida

Quando falamos em qualidade de vida, não remete-se apenas a ter uma saúde livre de doenças e intempéries. Mas sim, ter o direito de viver em um ambiente sadio, para que, por conseguinte tenha-se de fato uma qualidade de vida de acordo com o que disciplina a lei e a ordem social.

A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, tanto em Estocolmo em 1972, como no Rio de Janeiro em 1992 afirmaram que o homem tem o direito a condições adequadas de vida, em um ambiente propício e saudável, ou seja, dentro dos parâmetros de qualidade.

A saúde dos seres humanos não existe somente numa contraposição a não ter doenças diagnosticadas no presente. Leva-se em conta o estado dos elementos da Natureza – águas, solo, ar, flora, fauna e paisagem – para se aquitar se esses elementos estão em estado de sanidade e de seu uso advenham saúde ou doenças e incômodos para os seres humanos. (MACHADO, 2009, p. 61).

Este princípio, como bem trazido pela doutrina, visa o equilíbrio ambiental e social, de modo que se não conservarmos o meio em que vivemos, estamos segregados a comprometer a sadia qualidade de vida, não apenas para esta geração, mas também as demais que ficarão prejudicadas.

Tem-se como exemplo mais comum, principalmente em nossa região a proibição de queimadas no tempo da seca, onde as chuvas são mínimas, ou quase não ocorrem. Há uma grande quantidade de poluentes acumulados na atmosfera em decorrência da estiagem, e com as queimadas o ar fica ainda mais poluído, gerando assim problemas respiratórios.

O que este princípio quer expor é justamente uma valoração do meio ambiente natural, evitando ao máximo a interferência danosa do homem com o fim de prejudicar a sadia qualidade de vida que a todos é garantido pela Carta Magna.

1.3.2 Princípio da Precaução

Por este princípio, entende-se a prevenção de males causados ao meio ambiente pelas mãos do homem. Ou seja, pretende-se imobilizar determinadas condutas humanas com o fim especifico de um ambiente saudável e limpo.

No ano de 1992, na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, votou a ECO/92, ou também chamada de “Declaração do Rio de Janeiro”, foram votados 27 (vinte e sete) princípios norteadores do meio ambiente, entre eles o da precaução, elencado como princípio 15, vejamos:

De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com as suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. (MACHADO, 2009, p.70).

 Diante deste princípio, busca-se a cautela, a prudência, uma ação antecipada diante de algum risco ou perigo que possa ocorrer.

Justifica-se este princípio, justamente por muitas vezes não ser possível à reversão do dano, quer seja ele a título de pecúnia ou mesmo de revitalização. O stato quo ante ficaria gravemente prejudicado.

1.3.3 Princípio do Usuário Pagador e Poluidor Pagador

Visa este princípio à punição daquele que de alguma forma causar danos ao meio ambiente. Em suma, “poluiu pagou”.

Em nosso ordenamento jurídico, a lei nº 6.938, de 31.8.1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente visa no seu art. 4º, VII “a imposição, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos” e “a imposição ao poluidor e ao predador”.

Desta forma Paulo Affonso Leme Machado assevera quanto ao usuário pagador:

O uso dos recursos naturais tem apresentado um enriquecimento ilegítimo do usuário, pois a comunidade que não usa do recurso ou que o utiliza em menor escala fica onerada. O poluidor que usa gratuitamente o meio ambiente para nele lançar os poluentes invade a propriedade pessoal de todos os outros que não poluem, confiscando o direito de propriedade alheia. (MACHADO, 2009, p. 66).

A pessoa jurídica ou física que poluir e usar dos recursos advindos do meio ambiente, deve, por este princípio, pagar os custos advindos desta. Este princípio, busca evitar o uso inadequado e descontrolado do meio ambiente. Não pode pura e simplesmente, por exemplo, explorar determinados bens naturais, comuns a toda a população, para seu próprio interesse, sem dar uma contrapartida financeira aos prejuízos que esta causando. É necessário que arque com os custos para a solução da degradação que está ocasionando com a retirada dos recursos ambientais.

No entanto, não se pode pensar que as atividades nocivas ao ambiente são permitidas desde que o poluidor indenize.

Neste sentido, quanto ao princípio do poluidor pagador, Fiorillo entende que existem duas linhas de pensamento a serem levadas em consideração, quais sejam:

(...) a) busca evitar a ocorrência de danos ambientais (caráter preventivo): b) ocorrido o dano, visa a sua reparação (caráter repressivo). Desse modo, num primeiro momento, impõe-se o poluidor o dever de arcar com as despesas de prevenção dos danos ao meio ambiente que sua atividade possa ocasionar. Cabe a ele o ônus de utilizar instrumentos necessários à prevenção dos danos. Numa segunda órbita de alcance, esclarece este princípio que, ocorrendo danos ao meio ambiente em razão da atividade desenvolvida, o poluidor será responsável pela sua reparação. (FIORILLO, 2011, p. 92).

A pessoa jurídica que exercer atividade qualquer, tem que ter em mente inicialmente a prevenção dos danos sobre sua atividade, desenvolvendo as práticas pertinentes.

Se utilizados os métodos de prevenção e mesmo assim houver a poluição do meio ambiente decorrente da atividade desenvolvida pela pessoa jurídica, deve esta arcar com as despesas necessárias à reparação do seu dano.

Desta feita, entende-se que a utilização do meio ambiente como fonte de trabalho ou riqueza, não pode ser realizado ao “bel prazer” do homem, sem qualquer consequência patrimonial para reparar o mal causado a coletividade. Não significa, no entanto que se pode usar e pagar sem maiores problemas, o que esse princípio visa é a compensação dos danos causados a coletividade.

1.3.4 Princípio da Reparação

O objeto do presente princípio é justamente promover a reparação do meio ambiente por quem a ele oferecer danos, quer seja pessoa física, quer seja jurídica, com intuito de restabelecer da forma mais natural possível o status quo ante.

A declaração do Rio de Janeiro/92 estabeleceu em seu Princípio 13 que é obrigação dos Estados desenvolverem uma legislação nacional com vistas a promover a responsabilização e a indenização para as pessoas que por ventura forem vítimas da poluição ou de outros danos ambientais.

A declaração do Rio de Janeiro/92 é tímida em relação ao regime da reparação, pois se limita a preconizar “indenização as vítimas”. O Direito Ambiental Internacional tem que evoluir no sentido da obtenção da “reparação” ao meio ambiente danificado. (MACHADO, 2009, p. 93).

A reparação, como delineada acima pela doutrina, traça muitas vezes questões gerais, ou manda apenas “reparar” o dano, sem apontar em todas as ocasiões os parâmetros para tanto. Principalmente no que concerne a pessoa jurídica, que por seus crimes na maioria das vezes não atinge um ou dois indivíduos, mas sim uma sociedade toda.

Em sendo o meio ambiente um patrimônio da coletividade o degradador tem o dever precípuo de reparar os danos causados, advindos da má exploração do meio ambiente.

1.3.5 Princípio da Informação

É direito dos cidadãos terem acesso a informação em qualquer modalidade do direito, incluindo assim o direito ambiental. A informação faz parte do processo de educação da pessoa enquanto ser social. Estando o indivíduo informado, a tomada de uma atitude protetora ao meio ambiente é indubitavelmente eficaz. Pois, não se pode apenas esperar que as autoridades públicas tomem as devidas providências quanto à conservação e preservação do nosso habitat.

A informação ambiental não tem o fim exclusivo de formar a opinião pública. Valioso formar a consciência ambiental, mas com canais próprios, administrativos e judiciais, para manifestar-se. O grande destinatário da informação - o povo, em todos os seus seguimentos, incluindo o científico não-governamental – tem o que dizer e opinar. (MACHADO, 2010, p. 97).

A função precípua de uma sociedade bem informada é a pilastra de sustentação para a construção de uma sociedade provida de consciência ambiental, de maneira que reduzam os crimes ambientais. É visto que a informação leva qualquer cidadão a cobrar seus direitos, logo, o direito a um ambiente saudável provém do principio da informação.

A própria Declaração do Rio de Janeiro/92, em seu princípio 10 estabeleceu, que cada indivíduo deve ter acesso as informações ao meio ambiente na mesma proporção que as autoridades públicas as possuem, inclusive informando sobre as atividades perigosas ao meio ambiente que são realizadas a aquela comunidade.

Destarte, deve-se ainda, comunicar para a sociedade em geral, as informações reais sobre o impacto que cada ato atentatório ao meio ambiente causa para a comunidade atual e futura, frisando a dificuldade de restabelecer os prejuízos advindos do crime ambiental, como por exemplo a contaminação dos rios, a poluição do ar, do solo. Em suma a informação é o melhor remédio ao combate do crime ambiental.

1.3.6 Princípio da responsabilização penal das pessoas jurídicas em crimes ambientais

Princípio base do presente estudo monográfico, que visa à responsabilidade da pessoa jurídica que comete crime ambiental. Apesar de toda uma discussão e resistência de boa parte da doutrina clássica penal em aceitar tal princípio, a Constituição Federal de 1988 e a Lei dos Crimes Ambientais respectivamente, já rechaçaram a tal impossibilidade, notemos:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações:

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL, 2003, p. 129/130).

Art. 3º. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.(BERNARDO; FAVORETO, 2011, p.214)

O acolhimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes ambientais pela Constituição e posteriormente com a edição da lei dos crimes ambientais, deixa claro o importante papel da pessoa jurídica no mundo hodierno. Os crimes, como por exemplo, de poluição, desmatamento, caça e pesca predatória não estão mais sendo praticados em pequenas escalas, bem como não estão sendo executados apenas por pessoas físicas. “O crime ambiental é principalmente coorporativo.” (MACHADO, 2009, p. 704).

Diante da exímia importância de um meio ambiente equilibrado e saudável, deve-se neutralizar e reparar qualquer atitude nociva que possa causar-lhe prejuízos.  

CAPÍTULO 02 - TUTELA DO MEIO AMBIENTE E A PESSOA JURÍDICA

 

2.1 Pessoa Jurídica

 

O Código Civil Brasileiro, em seu artigo 40, elenca que as pessoas jurídicas podem ser de direito público interno ou externo, ou de direito privado.

Segundo o Vocabulário Jurídico a pessoa jurídica é uma oposição à pessoa física, uma vez que esta se constitui pelo nascimento e aquela somente se constitui após o cumprimento das determinações fixadas em lei.

“Diz-se jurídica porque se mostra uma encarnação da lei. E, quando não seja inteiramente criada por ela, adquire vida ou existência legal somente quando cumpre as determinações fixadas por lei”. (grifos do autor) (SILVA, 1990, p. 368)

Tem-se, deste modo, a existência da pessoa jurídica, via de regra, quando a mesma constitui seus atos no cartório competente (juntas comerciais, entre outros).

Outro conceito relativo à pessoa jurídica, que causa polêmica quando o assunto é a responsabilidade perante seus atos, advém do próprio dicionário jurídico que leciona:

“As pessoas jurídicas são sempre representadas pelas pessoas naturais, a quem se outorgam poderes para representá-las. Esta representação, em regra, é dita de delegação por ser distinta, em sua formação e exercício, do mandato comum”. (grifos do autor). (SILVA, 1990, p. 369)

Partindo do pressuposto acima, é que uma grande leva da doutrina reluta, quando o assunto é a responsabilidade da pessoa jurídica, principalmente no âmbito penal. Pois se ela é representada pela pessoa natural, é de se considerar que serão estas pessoas que praticarão os atos inerentes aos interesses da pessoa jurídica, inexistindo assim à vontade desta e prevalecendo a de seus representantes. Em tese ela não poderia ser responsabilizada.

Como será explicitado no presente estudo monográfico, à luz da Lei 9.605/98, bem com o da Carta Magna, combinado com as jurisprudências dos tribunais brasileiros, a responsabilidade penal da pessoa jurídica é plenamente aceitável, desde que preencha os requisitos legais.

Muito embora, o que causa controvérsias é a questão da pena aplicada a pessoa jurídica, que por muitas vezes é ínfima, diante do crime cometido e do patrimônio pertencente a esta.

Defende-se desde já, a elaboração pelo legislador de um modelo mais severo de punição a pessoa jurídica, até mesmo com a edição de um código processual específico.

2.2 Pessoa jurídica e suas teorias

 

São duas as teorias existentes para explicar a existência da pessoa jurídica, são elas: a teoria da ficção e da realidade.

A primeira teoria tem como paradigma, que a pessoa jurídica não passa de uma mera ficção, não podendo ser agente de crimes. Desta forma, fica condicionado a prática de crimes somente a pessoa física. Desta teoria tem-se como grande defensor Frederich Karl Von Savigny.

Do outro lado, tem-se a teoria da realidade, contrapondo totalmente a teoria da ficção, defendendo que a pessoa jurídica pode sim cometer crimes e ser plenamente responsável por estes.

A teoria da realidade acredita que a pessoa jurídica pode delinqüir e, por conseguinte responder pelos atos praticados. Grande defensor desta teoria é Otto Gierke.

A lei dos crimes ambientais foi publicada no Diário Oficial da União em 13 de fevereiro de 1998, complementando assim o disposto na Carta Magna de 1998, que em seu Capítulo VI dispõe acerca do Meio Ambiente, e mais precisamente no artigo 225, § 3º, que evoca a responsabilidade penal da pessoa jurídica, in verbis:

“As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. (BRASIL, 1998, p. 130).

Anterior ao dispositivo citado acima, a Carta Magna no capítulo que trata dos Princípios Gerais da Atividade Econômica dispôs no artigo 175, § 5º que:

A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.(BRASIL, 2003, p.110).

Denota-se, que a responsabilidade penal da pessoa jurídica está amplamente “legalizada” na Lei Maior que é Constituição Federal, bem como na lei ordinária nº. 9.605/98 que disciplina acerca dos Crimes Ambientais.

Mesmo com expressa disposição legal acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes ambientais, iniciou-se uma celeuma em torno da aplicabilidade da pena a pessoa jurídica.

No entanto antes de adentrarmos ao mérito do que a doutrina assente quanto ao tema, vale trazer ao bojo o respeitável pensamento do doutrinador Clóvis Beviláqua acerca das teorias mais aceitas quando o assunto é a pessoa jurídica, vejamos:

Prefacial ao enfrentamento do problema da responsabilidade penal das pessoas jurídicas é o pertinente à natureza dessas ditas pessoas. Matéria polêmica, com entendimentos diferenciados e contrastantes. Clóvis Beviláqua agrupa em 7 (sete) teorias, as que procuram explicar a natureza da pessoa jurídica. As mais notórias são as da ficção legal que considera as pessoas jurídicas simples criações da lei, ou seja, meras ficções. Neste sentido foi o magistério de Frederich Karl Von Savigny. E as que entendem serem as pessoas jurídicas verdadeiros organismos sociais, assemelhados às pessoas naturais, inclusive com vontade própria. Dentre os teóricos que sustentam esta posição o mais notório é Otto Gierke. (grifo nosso). (LUISI, 2010, p. 27)

A doutrina tem divergido quando o assunto é a realidade fática da pessoa jurídica, quando da prática de atos, bem como no que diz respeito à exteriorização da sua vontade, ou a existência dessa vontade.

Penalistas consagrados e defensores do direito penal clássico, entre eles, Luis Régis Prado afirma que:

Em termos científicos, tem-se como amplamente dominante, desde há muito, no Direito Penal Brasileiro, como nos demais Direitos de filiação romano-germânica, a irresponsabilidade penal da pessoa jurídica, expressa no conhecido apotegma societas delinquere non potest, verdadeira reafirmação dos postulados da culpabilidade e da personalidade das penas. Isso quer dizer que os crimes praticados no âmbito d pessoa jurídica só podem ser imputados criminalmente às pessoas naturais na qualidade de autores ou partícipes.

O fundamento de tal orientação radica, essencialmente, que se encontram ausentes na atividade da própria pessoa jurídica os elementos seguintes: a) capacidade de ação no sentido penal estrito; b) capacidade de culpabilidade (princípio da culpabilidade); c) capacidade de pena (princípio da personalidade da pena), indispensáveis à configuração de uma responsabilidade subjetiva. (grifo do autor). (PRADO, 2010, p. 127).

A doutrina penal, na sua maioria recusa-se em aceitar a responsabilidade penal da pessoa jurídica, por faltar-lhe os requisitos tidos como essenciais por esta doutrina. Ou seja, a pessoa jurídica é desprovida de vontade e inteligência, logo, a conduta da empresa ficaria condicionada a seus dirigentes.

Nesta mesma banda, acredita a doutrina que, se tal penalização fosse aceita, a pena não cumpriria o disposto no art. 5º, XLV, da Constituição, que dispõe que a pena não passará da pessoa do seu condenado. Sendo assim se a conduta do representante legal da empresa, no exercício dos interesses desta, for enquadrada como crime, a pena passaria da pessoa do agente para a própria pessoa jurídica, contrariando assim o disposto na Carta Magna.

Diferentemente do direito penal, o direito ambiental recebe com grande estima a lei nº. 9.605/98, pois além de trazer marcantes inovações, constituiu a responsabilidade da pessoa jurídica que comete crimes contra o meio ambiente.

Neste sentido, quando se fala em pessoas jurídicas, estão inclusas, em tese, tanto as de direito privado quanto às de direito público.

O advento desta responsabilização deve-se principalmente as agressões desenfreadas contra o meio ambiente e a consequente omissão do Estado perante estas ocorrências lesivas e abusivas.

“Conservar-se só a responsabilidade da pessoa física frente aos crimes ambientais é aceitar a imprestabilidade ou a inutilidade do Direito Penal para colaborar na melhoria e recuperação do meio ambiente”. (MACHADO, 2009, p. 705).

Para o meio ambiente, e sua doutrina, é de suma importância o reconhecimento por parte da Constituição Federal e da lei 9.605/98 a possibilidade de punir a pessoa jurídica.

Neste tocante são as palavras de Walter ClaudiusRothenburg:

O Direito Criminal em geral e o conceito de ‘vontade criminosa’ em particular foram construídos em função exclusiva da pessoa física. A própria necessidade de referência a aspectos ‘subjetivos’ (dogma da culpabilidade) traz ínsita um implicação antropormórfica. Então, mister se faz ‘adaptar’ essas noções à realidade dos entes coletivos, para se poder trabalhar a ‘imputabilidade’ da pessoa jurídica com o instrumental teórico sugerido pela Dogmática tradicional. A partir daí – de reformulações -, pode-se chegar a sujeição criminal ativa da pessoa jurídica, sem ter de prescindir da culpa nos moldes de uma responsabilidade objetiva. Tal imputação de condutas faticamente desempenhadas por seres humanos, à conta da pessoa jurídica, é ditada, assim, pela própria ordem jurídica estatal, e pouco importa que haja limitações estatutárias: estas valem apenas internamente, pra o próprio ente coletivo, ao passo que a determinação dos aspectos materiais e subjetivos das incriminações são de caráter público (cogente).(Apud MACHADO, 2009, p. 705).

Como de depreende da doutrina colacionada, o direito penal em sua conceituação do sujeito ativo da conduta criminosa, volta-se unicamente a pessoa física, defendendo que, a pessoa jurídica não pode delinquir, faltando-lhe assim a capacidade de conduta por ausência de vontade.

No entanto, o direito penal comete grave erro ao deixar de lado a penalização da pessoa jurídica. Justamente por isso, que a Constituição de 1998 nos seu art. 255, § 3º erigiu a pessoa jurídica à condição de sujeito ativo da relação processual penal.

Consolidando ainda mais a idéia da responsabilidade penal da pessoa jurídica no âmbito criminal, o art. 3º da Lei 9.605/98 disciplinou que estas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente, quando a infração for cometida por decisão do seu representante legal, e/ou órgão colegiado, sempre que estiverem agindo no interesse ou benefício da entidade que representam.

Do teor do art. 3º da Lei 9.605/98, não se considera, desta forma, que a pessoa jurídica é estranha aos membros que a compõe, pois se há uma ação da pessoa jurídica, por traz dela há o pensamento de seus representantes, seus agentes.

O intento do legislador, como se vê, foi punir o criminoso certo e não apenas o mais humilde – ou o “pé de chinelo” do jargão popular. Sim, porque, via de regra, o verdadeiro delinquente ecológico não é a pessoa física – o quitandeiro da esquina, p. ex. -, mas a pessoa jurídica que, quase sempre, busca o lucro como finalidade precípua, e para a qual pouco interessam os prejuízos a curto e longo prazos causados à coletividade, bem como pouco importa que a saúde da população venha a sofrer com a poluição. É o que ocorre geralmente com os grandes grupos econômicos, os imponentes conglomerados industriais e por vezes – por que não dizer? – com o próprio Estado, tido este como dos maiores poluidores por decorrência de serviços e obras públicas sem controle. (Milaré, 2000, p.355).

A preocupação do legislador ambiental é justamente, a de não deixar impune o meio utilizado para a prática do ato lesivo ao meio ambiente. Seria muito fácil às vistas do direito penal, imputar sanções apenas às pessoas físicas, porquanto a empresa continua livre e desimpedida pra continuar o seu “plano de enriquecimento e degradação”.

A celeuma está longe de chegar ao fim. Até mesmo porque no Direito praticamente não existe unanimidade em relação a um determinado tema. Mesmo com o advento da jurisprudência das altas Cortes do País, mesmo assim haverá contradição referente ao tema aqui exposto.

Para que possamos entender de uma vez por todas toda essa discussão sem um fim preestabelecido, vale colacionar o entendimento de Érika Mendes de Carvalho, a saber:

Duas tendências doutrinárias surgiram, a primeira manifestando-se pelo reconhecimento, no texto constitucional, da responsabilidade penal dos entes coletivos, além da existência de recomendação expressa ao legislador ordinário de editar leis, sobretudo em matéria ambiental, prevendo a cominação de sanções penais especialmente dirigidas às pessoas jurídicas delinquentes; em sentido contrário, parte da doutrina não vislumbra qualquer diretriz dessa natureza, negando ter a Carta Constitucional profligado o princípio, tradicionalmente acolhido pelo ordenamento pátrio, que veda a prática de infrações penais pela pessoa jurídica.

Perfilando a primeira orientação, encontram-se, por exemplo, Paulo José da Costa Jr., Toshio Mukai, Paulo Affonso Leme Machado, Gilberto Passos de Freitas e Vladimir Passos de Freitas, Edis Milaré, Silvia Cappelli, José Henrique Pierangeli, Sérgio Salomão Schecaira, entre outros.                                    

(...)

Posicionam-se contrariamente os autores citados, acolhendo proposta distinta na interpretação do texto constitucional, Luiz Régis Prado, Luiz Luisi, René Ariel Dotti, Luiz Vicente Cernicchiaro, Fernando Fragoso e Sheila Selim de Sales. (Apud SANTOS, 2010, p. 300).

Diante do que foi exposto acima, e, de primeiro convencimento, é de se levar em consideração, que ante a expressa previsão legal constitucional, não se deve entrar na velha e inacabável polêmica acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica, mas sim buscar meios pertinentes para a efetiva aplicação do disposto na Lei Maior.

2.3 Lei nº. 9. 605/1988

As questões jurídicas ambientais têm despontado significativamente em todo o mundo, e não é para menos, afinal são inúmeras as mudanças climáticas; tufões, enchentes, tempestades, todos estes fenômenos da natureza, segundo especialistas no assunto, estes acontecimentos estão ligados diretamente na ação degradante do homem no ambiente, gerando assim um contraponto ao princípio do meio ambiente equilibrado.

Cada país, sem sombra de dúvidas, vem buscando através de seus ordenamentos internos, bem como amparados pelo Direito Internacional através de tratados, acordos, convenções e etc., minimizar a degradação ambiental, que gera o desequilíbrio mundial.

No Brasil, foi editada a Lei dos Crimes Ambientais, nº. 9.605/1998, publicada no Diário Oficial da União em 12 de fevereiro de 1998, no entanto, entrando em vigor somente na data de 30 de março de 1998.

A presente lei ordinária é um divisor de águas na legislação ambiental, pois prevê a punição daquele que comete danos ao meio ambiente, em qualquer esfera, (administrativa e penal), seja na poluição de rios, mares, nos danos contra a fauna e a flora e afins.

É certo que a lei nº. 9.605/1988 tardou a ser elaborada, tendo em vista que possui apenas 23 (vinte e três) anos, sendo que a degradação ambiental, sem dúvida é bem mais antiga que isso. Há tempos que o meio ambiente vem sendo sacrificado em benefício do homem, e indubitavelmente, a médio ou longo prazo a natureza devolverá, a agressão por ela sofrida.

No entanto, com os mecanismos significativos trazidos pela Lei dos Crimes Ambientais, tem-se a possibilidade de criarmos, segundo os preceitos do direito ambiental, um meio ambiente equilibrado, com vistas à sustentabilidade.

A possibilidade de serem responsabilizadas penalmente as pessoas jurídicas não irá desencadear uma frenética persecução penal contra as empresas criminosas. Tentar-se-á contudo, impor um mínimo de corretivo, para que a nossa descendência possa encontrar um planeta habitável. (MACHADO, 2009, p. 704/705).

Inegável é o benefício desta lei, no entanto, gerou muita polêmica dentro do ordenamento penal, pois, esta, prevê em seu corpo, não só a responsabilidade das pessoas físicas, mas também a responsabilidade das pessoas jurídicas que cometem crimes em desfavor do meio ambiente.

Logo no segundo parágrafo da presente lei, evoca que o responsável pela pessoa jurídica responderá pelos crimes que esta causar ao meio ambiente. Posteriormente no artigo 3º e 4º leciona:

Art. 3º. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício de sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.

Art. 4º. Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.(BERNARDO; FAVORETO, 2001, p. 214).

Como se depreende da leitura dos presentes artigos da lei, é perfeitamente possível a responsabilização da pessoa jurídica, quando esta, por meio de seu representante legal ou contratual comete crime em benefício de sua entidade, podendo, em casos mais extremos, desconsiderar esta quando for obstáculo ao ressarcimento dos danos que causou ao meio ambiente.

O artigo 6º. da lei em estudo prevê, que na aplicação da pena, deverá ser levado em conta a gravidade do fato e suas conseqüências, os antecedentes dos infratores, neste caso pessoas jurídicas, bem como a situação econômica do infrator, como requisito para aplicação da multa.

Com base do direito penal, esta lei tem a premissa de constituir ao infrator, pessoa jurídica as circunstâncias que atenuam e que agravam a pena, previstas tais hipóteses nos artigos 14 e 15 respectivamente.

Outro ponto importante desta lei concerne ao valor pecuniário decorrente da multa aplicada a pessoa jurídica, prevendo que o valor desta poderá ser aumentado em até 03 vezes, quando a vantagem auferida com o crime for economicamente alto, vejamos o artigo 18 da lei nº. 9.605/98.

Art. 18. A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida. (BERNARDO; FAVORETO, 2001, p. 216).

Resta-nos, portanto, em tópico que será abordado posteriormente analisar se mesmo aumentado o número de vezes que determina a lei, este valor é significante a ponto de coibir/impedir a reincidência da pessoa jurídica em crime ambiental.

Continuando a análise da Lei dos Crimes Ambientais, o artigo 21 e seus incisos elenca as penas aplicáveis isolada, cumulada ou alternativamente as pessoas jurídicas, quais sejam, a multa, a restrição de direitos e a prestação de serviços a comunidade.

Adiante, no artigo 22, disciplina quais as penas restritivas de direito as pessoas jurídicas podem cumprir, quais sejam, suspensão parcial ou total de atividades, interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade, e proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações.

Por último o artigo 23 elenca o rol de serviços a comunidade que a pessoa jurídica deverá prestar, consistindo em custeio de projetos ambientais, recuperação de áreas degradadas, e a contribuição com entidades ambientais e culturais de ordem pública.

A lei 9.605/1998, não possui rito específico, no tocante ao processo penal, tanto que nos casos em que esta lei não dispuser, será aplicado o disposto no Código de Processo Penal. O que não se pode perder de vista é que a pessoa jurídica deve ser dada a possibilidade prevista na Carta Magna de 1998 de exercitar a ampla defesa em todas as esferas.

Como disposto nos tópicos acima, a responsabilidade penal da pessoa jurídica é perfeitamente prevista no sistema da legislação brasileira, anteriormente somente à pessoa física era sujeito ativo do crime ambiental.

Mesmo com a expressa previsão legal acerca da matéria, a responsabilidade penal da pessoa jurídica ainda é tímida, ante a resistência dos que são adeptos ao direito penal clássico.

Antes de adentrarmos as penas cabíveis as pessoas jurídicas que cometem crime ambiental, necessário se faz compreender alguns institutos do direito penal que são abraçados pelo direito penal ambiental.

2.3.1 Bem Jurídico Protegido

Quando falamos em meio ambiente, é certo sabermos que este é elevado à categoria de bem jurídico essencial à vida e a saúde, ou seja é indispensável ao ser humano.

Se o Direito Penal é, de fato, ultima ratio, na proteção de bens individuais (vida e patrimônio, p. ex.), com mais razão impõe-se sua presença quando se está diante de valores que dizem respeito a toda a coletividade, já que estreitamente conectados à complexa equação biológica que garante a vida humana no planeta. (grifos no original) (Apud, MILÁRE, 2000, p. 349).

O bem jurídico protegido pelo direito ambiental penal é o próprio meio ambiente, seja ele natural, artificial ou cultural.

2.3.2 Elemento Subjetivo

O elemento subjetivo do crime ambiental é o dolo e a culpa. Sendo o primeiro quanto o agente quer determinado resultado, assumindo assim os riscos advindos da sua atitude. A culpa ocorre em casos em que o agente não tendo a intenção, mas agindo com imprudência, negligência ou imperícia provoca resultado ao qual não esperava.

A lei 9.605/1998 disciplina a respeito da culpa.

Art. 2º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade (...) (BERNARDO; FAVORETO, 2001, p. 214).

Ao fazer referência, a frase “de qualquer forma”, esta envolve tanto a modalidade dolosa quanto a culposa. O dolo quando presente a vontade de se praticar o tipo penal. A culpa, quando, através de uma conduta voluntária atinge-se um resultado previsto, mas não querido. 

Tem-se, portando, que os crimes ambientais serão apurados mediante a culpabilidade de cada um. No entanto a doutrina tem entendido, diante do artigo 3º da Lei 9.605/98 que a responsabilidade da pessoa jurídica é objetiva, extinguindo para elas a modalidade culposa, e direcionado a estas a existência do dolo, vejamos:

 Se o domínio do fato se encontra com as pessoas físicas que detêm capacidade diretiva na empresa, e se não existe tal domínio sem o dolo – aqui entendendo como a vontade livre e consciente de praticar atos que compõem o tipo legal -, as pessoas jurídicas só podem ser responsabilizadas pela prática de crimes dolosos. (MILARÉ, 2007 p. 931).

A pessoa jurídica como posto pela doutrina só poderia ser responsabilizada dolosamente, levando-se em consideração que a pessoa física que possui a capacidade na direção da empresa, de tal modo que já teria vislumbrado a incidência desta no crime ambiental, devendo ser responsabilizada objetivamente.

A lei nº. 6.938/81, em seu artigo 14, § 1º, disciplina a modalidade objetiva para responsabilizar o causador do crime ambiental, in verbis:

Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

(...)

 § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. (...). (BERNARDO; FAVORETO, 2001, p. 109).

Vislumbrando o cuidado ambiental acima de tudo, torna-se desnecessário então, em crime ambiental, a verificação de culpa para a reparação do dano. Basta que o evento danoso tenha relação material com o resultado, pois, aquele que dirige uma empresa, assume o risco da atividade que exerce.

Não se trata, a bem da verdade da responsabilidade objetiva. Se assim fosse seria desnecessário que a pessoa jurídica usa-se do devido processo legal e da ampla defesa junto ao judiciário, as provas falariam por si.

O raciocínio lógico, por mais que se defenda o meio ambiente é de que o juiz, depois de analisar o conjunto probatório, somente poderá condenar a pessoa jurídica se chegar à conclusão de que a sua conduta culminou no crime a ela imputado.

2.3.3 Sujeito ativo e passivo

O sujeito ativo do crime ambiental, como já exaustivamente explanado, pode ser tanto a pessoa jurídica quanto a pessoa física.

O sujeito passivo do crime ambiental é o titular do bem jurídico lesado, sendo, no caso em tela a coletividade, por ser o meio ambiente de uso comum do povo.

2.3.4 Tipicidade

O traçado para definir determinada conduta como crime ambiental, muitas vezes não se configura uma facilidade. Em sendo o tipo penal ambiental muito amplo, a conduta incriminadora, fica condicionada ao chamado “tipo’’ aberto. Pois os tipos penais descritos pela legislação podem ou não serem considerados crimes, ou também, como a doutrina traz os tipos de perigo.

(...) na maioria das infrações penais ambientais o fato é ilícito porque o agente atuou sem autorização legal. Sem licença ou em desacordo com as determinações legais. Vale dizer que o agente é punido não por ter praticado o fato ou exercido tal ou qual atividade considerada danosa ao meio ambiente, mas, sim, por não ter obtido a autorização ou licença para tal ou, ainda, mesmo quando devidamente habilitado, com a autorização ou licença, por não ter observado suas condicionantes e/ou as determinações legais ou regulamentares. (MILARÉ, 2000, p.351).

As situações descritas pela doutrina supra são aquelas, relativas à caça, por exemplo. A caça é um crime tipificado no artigo 29 caput da lei nº. 9.605/1998, com pena de detenção de seis meses a um ano e multa. No entanto não se configura crime se estiver em consonância com a autorização ou licença para a caça da respectiva espécie, concedida pelo órgão competente, sendo considerado crime apenas se violar as condicionantes da autorização.

Com relação aos tipos de perigo, estes são evidenciados antes mesmo da conduta típica do crime, que por ventura possam vir a causar danos ao meio ambiente.

É o caso do artigo 54 da lei dos crimes ambientais, que prevê pena de reclusão e multa para quem causar poluição em níveis suficientes que resultem ou possam resultar em danos a saúde do homem.

Percebe-se bem claro neste artigo o tipo penal de perigo que a doutrina elide. Quando disciplina que a conduta pode vir a resultar em determinados danos. Ou seja, dependendo do nível da conduta pode ou não ser crime.

2.3.5 Concurso necessário

Até pouco tempo, elidia-se somente a pessoa física como sujeito ativo do crime. Com o advento da Constituição de 1998 e da lei 9.605/1998, estas instituíram a responsabilidade da pessoa jurídica que comete crimes ambientais.

A questão do concurso necessário é imprescindível para o cometimento do crime ambiental, eis que a pessoa jurídica age sempre com o comando de uma pessoa física, logo a existência da “vontade casada”, isto fica evidenciado no artigo 3º,§ único da lei 9.605/1998, que dispõe que “A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato”. (BERNARDO; FAVORETO, 2001 p. 214).

A responsabilidade da pessoa jurídica, como posta na legislação acima citada não excluirá as pessoas físicas pelo fato óbvio que a empresa em si, e por si só não comete crimes, sempre haverá um co-autor ou partícipe.

Assinale-se, por oportuno, que o infrator da norma penal ambiental não se adequa ao perfil do criminoso comum. Em verdade, o criminoso ambiental via de regra não age individualmente, mas atua em nome de uma pessoa jurídica. (MILARÉ, 2000, p. 354).

Denota-se, portanto a existência crucial de um concurso necessário para que a pessoa jurídica possa delinqüir, eis que a sua conduta sempre estará direcionada pelos seus dirigentes. A jurisprudência já vem firmando este entendimento, com o julgado do Superior Tribunal de Justiça, nº. 564960/SC, 5ª Turma, Rel.  Ministro  Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005, que será analisado em seus pormenores no item 3.6.1.

2.3.6 Inquérito

As infrações penais previstas na Lei nº. 9.605/1998 estão sujeitas a ação penal pública incondicionada, (Art. 26, lei nº 9.605/1998), promovida pelo Ministério Público, ou seja, independentemente de representação. Aliás, a proteção do meio ambiente é uma das atribuições do Ministério Público, conforme disposição expressa da Constituição.

 Art. 129 - São funções institucionais do Ministério Público:

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. (BRASIL, 1998, p. 83).

 O Ministério Público tem papel de relevante importância para a proteção e defesa do patrimônio público, incluindo-se neste, o meio ambiente. A Constituição concedeu a titularidade para a defesa deste ao Ministério Público, e este cumpre seu papel quando defende o meio ambiente, garantindo assim a sadia qualidade de vida elencada no artigo 225 caput da Carta Magna.

Na medida em que cuidamos de proteção ambiental, torna-se desnecessário tecer longos comentários a respeito da importante medida criada pelo legislador: é pelo inquérito civil que o Ministério Público pode adiantar suas investigações visando inclusive a imediatas providências de índole processual; seja no campo do denominado “processo civil”, seja agora no campo do denominado “processo penal”. (grifos do autor). (FIORILLO, 2011, p. 738).

Nada obsta, no entanto, que o inquérito seja precedido pela autoridade policial, e conseqüentemente encaminhado para o Ministério Publico para o oferecimento da denúncia.

2.3.7 Competência

No que tange a competência para processar e julgar a ação penal advinda do crime ambiental, inicialmente houve divergência se a competência seria da justiça federal ou estadual, ante o disposto no artigo 109, IV da Carta Magna, que preconiza:

Art. 109 - Aos juízes federais compete processar e julgar:

IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; (BRASIL, 1998, p. 83).

Para reforçar o que dispunha a Constituição, a Súmula nº 91/1993, do Superior Tribunal de Justiça (hoje revogada), evocava que os crimes contra a fauna seriam processados e julgados perante a justiça federal.

No entanto, o próprio Superior Tribunal de Justiça revogou a Súmula nº. 91 e firmando o posicionamento da Corte em relação ao assunto, nos autos de nº. 88.013, Conflito de Competência, julgado em 27/02/2008, a saber:

Conflito de competência.  Justiça Federal e Justiça Estadual.  Inquérito policial.  Apuração de suposto crime ambiental ocorrido em área que passou a integrar parque nacional administrado pelo IBAMA.  Alteração da competência em razão da matéria. Inaplicabilidade do instituto da perpetuatio jurisdictionis. Lesão a bens, serviços ou interesses da União caracterizada.  Conflito conhecido, para declarar a competência do juízo federal suscitante.

1. A Terceira Seção desta Corte firmou o entendimento de que, em sendo a proteção do meio ambiente matéria de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e inexistindo dispositivo constitucional ou legal fixando expressamente qual a Justiça competente para o julgamento de Ações Penais por crimes ambientes, tem-se que, em regra, a competência é da Justiça Estadual.  O processamento do Inquérito ou da Ação Penal perante a Justiça Federal impõe seja demonstrada a lesão a bens, serviços ou interesses da União (art. 109, IV da CF/88).[1]

 Percebe-se que a Corte do Superior Tribunal de Justiça em entendimento sábio, bem como nos moldes constitucionais da distribuição de competências entre a União, Estados e Municípios para legislar em matéria ambiental, elegeu a justiça estadual como competente para julgar e processar os crimes ambientais, sendo que a avocação da justiça federal dar-se-á somente se demonstrado a lesão dos bens e serviços de interesse da União, conforme disposto no artigo 109, IV da Constituição Federal.

Ressalta-se que todas as penas previstas para as pessoas jurídicas elencadas no item 2.3, serão explanadas em seus pormenores no capítulo três (3).

2.4 Requisitos para a responsabilização da pessoa jurídica em crimes ambientais

 

O reconhecimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica na Lei nº. 9.605/98 mostra que o papel das empresas no mundo hodierno é mais complexo do que se pode imaginar.

Sendo assim, a lei supracitada, em seu art. 3º prevê que tanto as pessoas físicas como jurídicas se sujeitarão às sanções penais e administrativas, além da obrigação de reparar os danos causados.

“Nas últimas décadas, a poluição, o desmatamento intensivo, a caça e a pesca predatória não são mais praticados só em pequena escala. O crime ambiental é principalmente coorporativo.” (MACHADO, 2009, p. 704).

A teor do artigo mencionado a responsabilidade penal da pessoa jurídica, fica condicionada em dois aspectos, sendo o primeiro, que a infração tenha sido cometida em seu interesse ou benefício, bem como, na segunda hipótese, que a decisão que leva a realização do ilícito seja do representante legal ou contratual, ou do colegiado da empresa.

Desse modo, se o ato praticado, mesmo através da pessoa jurídica, apenas visou a satisfazer os interesses do dirigente, sem qualquer vantagem ou benefício para a pessoa jurídica, essa deixa de ser o agente do tipo penal e passa a ser o meio utilizado para a realização da conduta criminosa. Ao contrário, quando a conduta visa à satisfação dos interesses da sociedade, essa deixa de ser o meio e passa a ser o agente. (MILARÉ, 2000, p. 356).

Partindo destes pressupostos condicionados pelo próprio legislador, deve-se observar o agente do tipo penal, para que se possa saber se a pessoa jurídica é o meio ou o agente da prática do ilícito.

Um dos objetivos primordiais da lei nº. 9.605/98, consiste em reparar o dano causado ao meio ambiente. A Carta Maior, também preconiza no mesmo sentido. No seu art. 225, § 3º leciona que as pessoas físicas e jurídicas, quando praticarem atividades lesivas o meio ambiente, serão responsabilizadas com sanções penais e administrativas, independentemente da reparação dos danos causados.

Quanto às sanções penais a pessoa jurídica, caberá a multa, pena restritiva de direitos e a prestação de serviços à comunidade. Na esfera administrativa, por exemplo, poderão ser apreendidos os produtos e instrumentos para a prática do crime.

Discute-se, no entanto, como já mencionado anteriormente, que a pessoa jurídica não seria sujeito ativo da prática delituosa, logo as penas previstas a elas seriam incabíveis.

 A doutrina que ataca ferozmente a inimputabilidade da pessoa jurídica, inclusive vê a inadmissibilidade do texto constitucional que traz tal previsão, bem como que se reconhecida à responsabilidade penal das pessoas jurídicas, estar-se-ia descumprindo o princípio da individualização das penas.

Neste diapasão Miguel Reale Júnior:

Falta a pessoa jurídica capacidade criminal. Se a ação delituosa se realiza com o agente realizando uma opção valorativa no sentido do descumprimento de um valor cuja positividade a lei penal impõe, se é uma decisão em que existe um querer, e um querer valorativo vê-se que a pessoa jurídica não tem essa capacidade do querer dotado dessa postura axiológica negativa. A Constituição estabelece que a pena não passará da pessoa do condenado (inc. XLV do art. 5º.), e o inciso seguinte diz que a lei individualizará a pena. A individualização da pena é feita com base na culpabilidade que significa o quanto de reprovação, de censurabilidade merece a conduta, sendo absolutamente incongruente com admissão da pessoa jurídica como agente de delitos. Portanto, há uma incapacidade penal da pessoa jurídica, que a análise sistemática do texto constitucional torna evidente. (JÚNIOR, 2010, p. 344).

No entanto, como nada em matéria de direito é unanimidade, em sentido contrário rebate Fernando Capez, in verbis:

Ora, se foi vontade do constituinte e do legislador em proteger bens jurídicos relevantes, tais como o meio ambiente e a ordem econômica, contra agressões praticadas por entidades coletivas, não há como negar tal possibilidade ante argumentos de cunho individualista, que serviram de fundamento para a revolução burguesa de 1789.  A sociedade moderna precisa criar mecanismos de defesa contra agressões diferentes que surgem e se multiplicam dia a dia. Assim, é o finalismo, o funcionalismo e outras teorias do direito penal que devem adaptar-se à superior vontade constitucional, e não ao contrário. Tal mudança na concepção da responsabilidade criminal faz-se necessária, porque a criminalidade, ao longo do tempo, assumiu diferentes formas e modalidades, que não mais se restringem aos clássicos constantes no Código Penal. (CAPEZ, 2008, p. 54/53)

Neste diapasão, no tocante a tamanha polêmica diante do exposto até o momento, resta saber, se o que prevê a Carta Magna de 1998, e a lei nº. 9.605/98 no que concerne às penas previstas nestas leis, às pessoas jurídicas, estão sendo aplicadas de maneira a satisfazer o fim para as quais foram elaboradas.

2.5 Pessoa jurídica de direito público e privado

 

Como explanado no tópico anterior, é perfeitamente aplicável, diante do ordenamento vigente a responsabilidade da pessoa jurídica quando do cometimento dos crimes ambientais. No entanto, a dúvida que emerge no momento é saber se a pessoa jurídica de direito público também pode, através de seus agentes cometer os crimes passíveis de sanção frente ao meio ambiente.

A lei da política nacional do meio ambiente, lei nº 6.938/81, ao conceituar poluidor no seu artigo 3º, IV, afirma a possibilidade da pessoa jurídica de direito público cometer o dano ao meio ambiente, notemos.

Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

(...)

IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental. (BERNARDO; FAVORETO, 2001, p. 105).

A referida lei é do ano de 1981, ou seja, bem antes da entrada em vigor da Constituição de 1988 e da Lei dos Crimes Ambientais, também de 1998. É de se observar que a Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a proteção da dignidade da vida humana, com vistas à qualidade ambiental propícia a vida, de modo a desenvolver uma sociedade econômico sustentável, sendo assim erigiu tanto pessoa jurídica de direito público como privado à qualidade de poluidoras do meio ambiente.

Parte da doutrina, acerca do assunto, tem-se posicionado contrária a responsabilização da pessoa jurídica de direito público, tendo por base argumentativa a impossibilidade desta de cometer crimes, posto que seu objetivo, como disciplina o Direito Administrativo é o bem comum, bem como a pilastra deste ramo é a legalidade e a finalidade, ou seja, a pessoa jurídica de direito público só pode fazer o que a lei lhe permite, logo os crimes ambientais não lhe são permitidos, sendo assim a finalidade da Administração ficaria prejudicada.

 Nesse sentido, assevera Guilherme Figueiredo, Professor de Direito do Ambiente da Escola Superior de Advocacia da OAB\SP, e Solange Teles da Silva, Doutora em Direito Ambiental pela Universidade de Paris, na conclusão da obra Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas de Direito Público na Lei n. 9.605\98, concluem pelo seguinte:

Com base no exposto podemos concluir que;

1 – A responsabilidade penal da pessoa jurídica é possível, está plenamente amparada pela Constituição da República Federativa do Brasil e constitui um avanço inegável na evolução do direito penal.

2 – Admitir a responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público seria, porém, ir contra os princípios basilares do direito administrativo e dos próprios valores do Estado Democrático de Direito, uma vez que:

a)         O cometimento de um crime jamais poderia beneficiar as pessoas jurídicas de direito público;

b)         As penas impostas as pessoas jurídicas de direito público ou seriam inócuas ou, então, se executadas, prejudicariam diretamente a própria comunidade beneficiária do serviço público.

3 – O campo de aplicação da responsabilidade penal da pessoa jurídica não engloba, portanto, a pessoa jurídica de direito público.

4 –Não obstante a impossibilidade de responsabilização penal de pessoa jurídica de direito público, é impositivo que:

a)         Na hipótese de configuração de crime tipificado pela lei 9.605\98, seja feita a identificação e responsabilização dos agentes públicos, pessoas físicas que o cometeram;

b)         Busque-se simultaneamente reparação dos danos na esfera cível, pelas pessoas jurídicas de direito público, com fundamento no disposto no art. 37, § 6, da Constituição da República, bem como a subsequente recomposição do patrimônio público com o ajuizamento de ação regressiva em face dos agentes públicos responsáveis pelos atos lesivos ao meio ambiente. (FIGUEIREDO; SILVA, 1998, p. 57\58).

Pelo posicionamento contrário a responsabilização da pessoa jurídica de direito público, percebe-se que esta não teria benefícios com o crime, uma vez que seu objetivo é o bem comum do povo, por exemplo, que uma pena pecuniária seria apenas remanejada dentro da própria administração.

De outra banda existem aqueles que firmam convencimento contrário, aceitando a responsabilização da pessoa jurídica de direito público, visto que a lei, tanto a Constituição, quanto a Lei nº. 9.605/1998, não fizeram distinção entre as pessoas.

A Administração Pública direta como a Administração indireta podem ser responsabilizadas penalmente. A lei brasileira não colocou nenhuma exceção. Assim, a União, os Estados e os Municípios, como as autarquias, as empresas públicas, as sociedades de economia mista, as agências reguladoras e as fundações de Direito Público, poderão ser incriminados penalmente. (MACHADO, 2009, p. 709).

Ante o silêncio da legislação quanto à diferenciação destas pessoas jurídicas, o mesmo autor acima citado, assente que cabe ao juiz, ante sua perspicácia escolher a pena adequada à pessoa jurídica de direito público, sendo que o dinheiro pago pelo contribuinte terá destinação fixada pelo Poder Judiciário.

Diante do conflito de opiniões, o meio termo apresentado é que, se a pessoa jurídica de direito público cometer crime ambiental tipificado na lei 9.605/98, deve-se fazer a identificação do agente público responsável, que o cometeu, buscando a reparação civil, nos moldes do artigo 37, § 6º da CF.

CAPÍTULO 03 - DAS PENAS APLICÁVEIS AS PESSOAS JURÍDICAS

 

As penas previstas para as pessoas jurídicas acham-se elencadas nos art. 21 a 23 da Lei dos Crimes Ambientais, nº. 9.605/1998. Incomum, será, no entanto a cominação da pena de prisão ao representante legal da empresa infratora, pois o artigo 7º, I da lei em comento, disciplina a substituição das penas restritivas de liberdade pelas restritivas de direito, quando a pena for inferior a quatro anos.

As sanções, que podem ser aplicadas isoladas, cumulativas ou alternativamente as pessoas jurídicas que cometem crimes ambientais serão a multa, restritiva de direitos ou a prestação de serviços à coletividade (social alternativa). Vejamos cada uma delas em separado.

3.1 Pena de multa

 

A pena de multa está elencada no artigo 21, I da Lei 9.605/98, e implica em sanção pecuniária a pessoa jurídica que comete o crime ambiental, sendo também aplicável a pessoa física.

“A pena de multa é sanção de caráter patrimonial, cujo caráter aflitivo reside na diminuição do patrimônio do condenado, e com natureza pecuniária, porque imposta em dinheiro”. (Prado, 2007, p. 614)

Para a aplicação da pena de multa a lei em estudo, elencou o artigo 18 que prevê que, “a multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida”. (BERNARDO: FAVORETO, 2001, p. 216).

O artigo em comento faz referência ao Código Penal. Este por sua vez fixa os parâmetros para imposição da multa nos seguintes termos:

Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

§ 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário. 

§ 2º - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária. (FRANCO; BELLOQUE, 2007, p. 318).

Para que possamos entender se o valor da multa realmente é capaz de inibir novas ações criminosas, passemos ao cálculo segundo os critérios do Código Penal (art. 49), cominado com o artigo 18 da Lei dos Crimes Ambientais, nº. 9.605/1998.

O valor do dia-multa não pode ser inferior a 1/30 (um trigésimo) do maior salário mínimo mensal vigente na época do fato, nem superior a 05 (cinco) vezes este valor, segundo o § 1º do art. 49 do Código Penal.

Levando-se em consideração que o valor do salário mínimo atualmente está na marca de R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais), 1/30 (um trigésimo), deste será concernente a R$ 18,16 (dezoito reais e dezesseis centavos), sendo este o valor mínimo de dias-multa. O valor máximo do dia-multa será de R$ 2.725,00 (dois mil, setecentos e vinte e cinco reais), obtendo tal valor multiplicando o salário mínimo vigente por cinco vezes como preceitua o artigo 49, parágrafo 1º do Código Penal.

Nesta senda, o valor de dia-multa a ser fixado pelo juiz deverá ser no mínimo R$ 18,16 (dezoito reais e dezesseis centavos), e no máximo de R$ 2.725,00 (dois mil setecentos e vinte e cinco reais). Se o mínimo de dias-multa corresponde a 10 (dez) dias e o máximo 360 (trezentos e sessenta), obtém-se o valor total da multa fazendo o seguinte cálculo: X (dias-multa) multiplicado por Y (valor do dia-multa fixado pelo juiz) = Total da pena de dias-multa. 

Hipoteticamente falando se o juiz fixa os dias-multa no teto máximo, ou seja, 360 dias, bem como aplica o valor máximo do dia multa que é cinco vezes, (R$ 2.725,00) ter-se-ia o valor final de dias-multa em R$ 981.000,00 (novecentos e oitenta e um mil reais). Usando-se o disposto no artigo 18 da lei nº 9.605/1998 que prevê o aumento da multa calculada com base no Código Penal em três vezes tendo em vista a vantagem econômica auferida com o crime, se chegaria ao valor de R$ 2.943.000,00 (dois milhões novecentos e quarenta e três mil reais).

Oras, diante da cifra finalizada acima, chegando perto da casa de três milhões de reais em multa por crime ambiental nos parece, a princípio, penalizador o bastante para uma empresa. No entanto tudo depende do tamanho da empresa.

A exemplo hipotético, a empresa multinacional X fabricante de defensivos agrícolas, comete crime ambiental, é multada pela legislação brasileira no teto máximo indicado no parágrafo anterior, tal multa seria ínfima, pois esta mesma empresa no ano de 2010 lucrou 4,557 bilhões de euros, convertendo tal cifra em reais, chegar-se-ia próximo ao patamar de 11 bilhões de reais!!! 

Nesta toada, percebe-se que a pena de multa para empresas de grande porte, entre elas multinacionais, são muitas vezes pequenas, tendo em vista o patrimônio e os lucros empresarias, em desfavor do que será pago pelo dano ambiental cometido.

A própria lei dos Crimes Ambientais traz uma diferença gritante em seu corpo, quanto ao aspecto da multa. No âmbito administrativo a multa poderá chegar a 50 milhões de reais (art. 75 lei n. 9.605/1998), enquanto no âmbito penal não alcançará a cifra de três milhões.  Com vistas ao desembolso financeiro, compensa ser multado na esfera penal, onde o valor é menor ao invés de responder um processo administrativo por crime ambiental.

3.2 Da pena restritiva de direito

 

A pena em estudo, está elencada no artigo 21, I da lei 9.605/98, e logo baixo o artigo 22 em seus incisos I, II, III disciplina uma a uma as hipóteses de restrição de direitos, vejamos cada qual em separado.

3.2.1 Suspensão parcial ou total das atividades

A pena capitulada no art. 22 inciso I dispõe que a (...) “suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente.” (BERNARDO FAVORETTO, p. 217).

As atividades de uma empresa, serão suspensas sempre que o juiz da causa, concluir que o caso demonstrar a devida necessidade, independentemente da situação financeira em que a empresa se encontra.

Neste caso, não é apenas obedecer aos termos da autorização, da licença ou da permissão ambiental, deve ater-se ao meio social em que se encontra, principalmente atenta ao princípio da sadia qualidade de vida e da atividade economicamente sustentável. Vejamos o pensamento convergente do Prof. Paulo Affonso Leme Machado.

A suspensão das atividades de uma entidade revela-se necessária quando a mesma age intensamente contra a saúde humana e contra a incolumidade da vida vegetal e animal. É pena que tem inegável reflexo na vida econômica de uma empresa. Mesmo em época de dificuldades econômicas, e até de desemprego, não pode descartar sua aplicação. Caso contrário, seria permitir aos empresários ignorar totalmente o direito de todos a uma vida sadia e autorizá-los a poluir sem limites. (MACHADO, 2009, p. 711/712).

É inegável que a pena de suspensão parcial ou total das atividades da empresa, age diretamente do lucro que esta aufere em detrimento dos dias de funcionamento. Nestes casos deve-se analisar qual a vantagem econômica que a empresa teve na prática do crime e determinar os dias correspondentes .

3.2.2 Interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade

Prosseguindo o estudo das penas restritivas de direitos, tem-se no artigo 22, inciso II a interdição do estabelecimento, a “interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar.” (BERNARDO, FAVORETO, 200, p. 217)

Para que uma determinada empresa exerça suas atividades, necessário se faz, que esta possua o devido licenciamento ambiental, previsto pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – Conama, na Resolução 237/1997, elencadas  no artigo 8º , incisos I, II, II quais sejam, respectivamente, a licença prévia, de instalação e de operação.   

A suspensão de atividades pode não ser temporária. No caso da interdição essa pena somente é prevista como temporária. Será imposta visando levar a entidade a adaptar-se à legislação ambiental, isto é, a somente começar a obra ou iniciar a atividade com a devida autorização.(MACHADO, 2009, p. 712).

É possível, por exemplo, que o juiz determine que seja interditada uma das filias de uma grande empresa, ou se dentre várias atividades de uma única empresa, uma delas estiver em desacordo com a autorização esta ficará interditada até se adequar às normas ambientais, gerando assim um atraso na cadeia produtiva da empresa.

Na pena em questão, não suspende a atividade da pessoa jurídica, quer parcial ou total, mas sim, interdita o seu estabelecimento, ou a sua obra, até que esta cumpra os moldes da licença concedida, ou caso não a tenha que providencia a fim de regularizar a obra/atividade com as regras do direito ambiental.

3.2.3 Proibição de contratar com o Poder Público

A pena em comento está prevista no artigo 22, III da lei 9.605/98, e traz em seu bojo a seguinte redação: “proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subvenções ou doações.” (BERNARDO; FAVORETTO, 2001, p.217).

A contratação com o Poder Público, através de processo licitatório é de grande valia para a pessoa jurídica, pois na maioria dos casos envolve altas somas de dinheiro, sem contar que a fonte pagadora (ente público), é no mínimo segura, frente que para a contratação sempre deve haver dotação orçamentária para tanto. Vejamos a doutrina acerca do disposto no inciso em explanação.

Este dispositivo tem como conseqüência o impedimento de a empresa condenada apresentar-se às licitações públicas. Ainda que a licitação seja anterior ao contrato com o Poder Público, não teria sentido no prazo da vigência da pena que uma empresa postulasse contrato a que não tem direito. O dinheiro público, isto é, o dinheiro dos contribuintes, só pode ser repassado a quem não age criminosamente, inclusive com relação ao meio ambiente. (MACHADO, 2009, p. 712).

O disposto no inciso III do artigo 22 da lei 9.605/98, não proíbe apenas a contratação mediante processo de licitação, mas também veda que a empresa obtenha do Ente Público subsídios e doações, como nos casos de incentivos fiscais, pois muitas apenas sobrevivem graças ao órgão governamental, de modo que devem respeito e zelo por suas leis, e em não as respeitando, comportam os prejuízos advindos de sua conduta.

 O prazo máximo estipulado pela legislação, é que a pessoa jurídica criminosa permaneça, em casos mais graves, proibida de receber as benesses do Poder Público por até 10 (dez) anos, segundo o artigo 22 parágrafo 3º da lei 9.605/1998. A lei estabelece também, que a proibição de contratar com o Poder Público nos casos de crimes dolosos e culposos é de 5 (cinco) e 3 (três) anos respectivamente, (art. 10 in fine).

3.3 Da pena de prestação de serviços a comunidade

 

A pena de prestação de serviços a comunidade, também chamada de pena social alternativa, está prevista inicialmente no artigo 21, II e posteriormente esmiuçada suas hipóteses no artigo 23 e seus incisos I, II, II e IV da Lei 9.605/98.

A doutrina, não trata cada hipótese em separado, de modo que usaremos por analogia, os comentários de Guilherme de Souza Nucci, feitos a lei dos crimes ambientais, na obra Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, notemos cada inciso do artigo 23 da lei 9.605/98.

O custeio de programas e de projetos ambientais previsto no inciso I do artigo 23, obriga a pessoa jurídica a sustentar atividades ligadas ao meio ambiente, ou de projetos que tem a finalidade cuidar de obras em geral que vinculem e mantenham o meio ambiente saudável.

A execução de obras de recuperação de áreas degradadas, disciplinada no inciso II do artigo 23, prevê que a pessoa jurídica irá executar, materializar obras capazes de recompor as áreas que foram degradadas, chegando mais próximo possível do status quo ante. Nos casos em que não houver tempo hábil para a recuperação total da degradação, eis que a pena da pessoa jurídica findou-se é necessário que o Estado dê a devida continuidade ao plano de recuperação.

A manutenção de espaços públicos, tem previsão expressa no inciso III do artigo 23 e disciplina que a pessoa jurídica deverá sustentar determinado espaço público em que a população se utilize para gozo em geral, como é o caso de parques, praças, jardins. Toda a mão de obra, bem como os insumos necessários a esta manutenção serão suportados integralmente pela pessoa jurídica.

A contribuição a entidades ambientais ou culturais públicas está elencada na hipótese do inciso IV do artigo 23, trazem a obrigação da pessoa jurídica em colaborar com os órgãos públicos que cuidam do meio ambiente, como também aqueles que têm o escopo de promover atividades artísticas voltadas ao meio ambiente.

Para Guilherme de Souza Nucci, a contribuição a entidades públicas não deve ser feita diretamente em dinheiro, pois não é pena pecuniária, ao certo que a contribuição seria mediante fornecimento de mão de obra, materiais e outros elementos capazes de satisfazer os objetivos das entidades beneficiadas.

Os custos advindos da prestação social alternativa devem ser levantados com o propósito de saber se a prestação está sendo feita é capaz de inibir uma nova ação criminosa da pessoa jurídica em desfavor do meio ambiente.

Será oportuno que se levantem os custos dos serviços previstos no art. 23 para que haja a proporcionalidade entre o crime cometido, as vantagens auferidas do mesmo e os recursos econômicos e financeiros da entidade condenada. O justo equilíbrio haverá de conduzir o juiz na fixação da duração da prestação de serviços e do quantum a ser despendido. (MACHADO, 2009, p. 713).

Além de serem penalizadas com multa, ou com a restrição de direitos, a pessoa jurídica, pode ser aplicada alternativamente, a prestação de serviços a comunidade, também chamada de pena social alternativa prevista no artigo 23 da lei 9.605/98, bem como constitucionalmente no art. 5º, XLVI, “d”, tendo em vista a recuperação do ambiente degradado.

3.4 Desconsideração da personalidade da pessoa jurídica 

A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica que comete crime ambiental está tipificada na lei 9.605/98, no artigo 4º que aduz:

“Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados a qualidade do meio ambiente.” (BERNARDO; FAVORETO, 2001, p.214).

Inicialmente, insta salientar que a desconsideração da personalidade jurídica é a exceção, a ultima ratio, tanto que o legislador usou o verbo “poderá” e não “deverá” sendo cabível toda vez que a pessoa jurídica demonstrar empecilho ao ressarcimento aos danos por ela causados.

A desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, no âmbito penal não é unanimidade. Para os que defendem que a desconsideração é inaplicável nos casos de crimes ambientais, defendem o que prevê a Constituição no artigo 5º, XLV, que disciplina que a pena não poderá passar da pessoa do condenado, logo não se poderia desconsiderar a pessoa jurídica, buscando o ressarcimento na pessoa de seus administradores/gestores.

Outra questão levantada pela corrente não favorável à desconsideração é de que, somente poderia ser pensada a desconsideração se as pessoas físicas (dirigentes), fossem condenados como co-autores. A desconsideração segundo esta corrente só poderia ocorrer nos casos de reparação civil e não penal, eis que a Constituição definiu que a pena não passará da pessoa do condenado. Entre defensores deste pensamento tem-se Guilherme de Souza Nucci.

De outra banda, os defensores da desconsideração da pessoa jurídica para ressarcimento do dano causado ao meio ambiente, entre os quais pode-se citar Édis Milaré e Vania Maria Tuglio, acreditam no avanço doutrinário e jurisprudencial para a consolidação do instituto da desconsideração da pessoa jurídica.

Diante do abuso de direito e da fraude no uso da personalidade jurídica, o juiz brasileiro tem o direito de indagar, em seu livre convencimento, se há de consagrar a fraude ou o abuso de direito, ou se deve desprezar a personalidade jurídica, para, penetrando no seu âmago, alcançar as pessoas e bens que dentro dela se escondem para fins ilícitos ou abusivos. (Apud MILARÉ, 2000, p. 358).

 É claro que, a desconsideração não pode ser utilizada de modo banal, e até mesmo desenfreado, deve sim ser usada com bom senso e sempre que a pessoa jurídica demonstrar ser obstáculo ao ressarcimento do dano.

O legislador ao abordar o tema da desconsideração da pessoa jurídica em matéria ambiental, atribuiu ao juiz da causa a análise dos casos postos em sua jurisdição com o fim de detectar a fraude ou o abuso do sócio que se vale da pessoa jurídica como escudo, para agredir o meio ambiente.

No entanto em matéria ambiental, deve-se buscar sempre a melhor alternativa de proteção ao meio ambiente, e se necessário for, deve-se sim aplicar o instituto da desconsideração da pessoa jurídica tendo em vista recuperar o meio ambiente da maneira mais próxima possível ao status quo ante.

3.5 Dosimetria das penas

 

A Lei dos Crimes Ambientais, nº 9.605/1998 definiu os moldes para a aplicação da pena tanto para a pessoa física, quanto para a pessoa jurídica, nos seguintes modelos, de acordo com o artigo 6º e seus incisos.

Art. 6º. Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade competente observará:

I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente;

II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental;

III - a situação econômica do infrator, no caso de multa. (BERNARDO; FAVORETO, 2011, p. 214/215).

Aqui, o legislador, definiu os critérios específicos e próprios para que sejam considerados na hora da individualização das penas, mas, seguindo ao certo o que disciplina o código penal, no artigo 59 que dispõe sobre a fixação da pena. Como disposto no início do estudo monográfico, o direito ambiental não possui rito processual próprio, lhe sendo aplicado no que não for confrontante com a lei 9.605/1998.

A aplicação da pena a pessoa jurídica, segundo os critérios específicos dar-se a da seguinte maneira para as hipóteses previstas no inciso I e II do artigo supra:

Assim, quando for analisar as circunstâncias do crime e suas conseqüências, bem como a motivação do agente, o julgador deve levar em conta, particularmente, a gravidade do fato em relação à saúde pública e ao meio ambiente (inciso I). Ao verificar os antecedentes do criminoso (inciso II), devem ter maior valor os que vincularem à legislação de interesse ambiental. (NUCCI, 2009, p. 883).

Percebe-se que a lei foi bem incisiva no tocante a proteção ambiental, elencando a saúde pública como prioridade na aplicação da pena, bem como que seja aplicado sempre o que estiver no interesse da legislação ambiental.

Para a pena de multa prevista no inciso III do artigo 6º da lei n. 9.605/1998, como exposto no item 3.1, é necessário que esta seja suficientemente danosa para a pessoa jurídica, com o fim especial de coibir que esta pratique outro crime ambiental, sempre tendo em vista a situação econômica do infrator, e o dano causado ao meio ambiente

No entanto, surge, a princípio um embate entre o artigo 6º, inciso III e o artigo 18 in fine, ambos da lei 9.605/1998. Enquanto o primeiro dispõe que deve-se levar em conta a situação econômica do infrator, o segundo prevê que seja observada a vantagem econômica auferida com o crime praticado pela pessoa jurídica.

Parece-nos a priori, que a solução para este possível embate, seja sempre a mais favorável ao meio ambiente. Se, para inibir nova ação danosa ao meio ambiente for necessário levar em consideração a situação econômica da pessoa jurídica, uma multinacional, por exemplo, que se faça. Ou, em se tratando, de uma empresa de porte pequeno/médio, que com o fim de expandir os seus negócios causa danos ao meio ambiente mais gravosos do que o próprio patrimônio constituído, deve-se levar em consideração a vantagem econômica auferida.

Como visto a pena de multa deve ser aplicada como disposto no item 3.1, bem como, nos moldes dos artigos 18 e 6º,III acima demonstrado. No entanto, como saber, nos casos das penas restritivas de direitos e na prestação de serviços a comunidade o tempo em que a empresa, pessoa jurídica ficará atrelada a cumpri-las? A doutrina vem elucidar esta questão, notemos.

Os tipos penais incriminadores possuem, no preceito secundário, a cominação abstrata de pena privativa de liberdade. É óbvio que tal modalidade de pena é incompatível com a pessoa jurídica. A esta, somente cabem as sanções previstas no art. 21 desta Lei (multa, restritiva de direitos e prestação de serviços a comunidade). Porém, para se atingir o montante cabível (restritiva de direitos e prestação de serviços), o juiz deve fazer o cálculo como se fosse aplicar a pena privativa de liberdade para, depois, substituí-la por restritiva de direitos ou prestação de serviços à comunidade. (NUCCI, 2009, p. 883).

Sendo assim, deve-se observar qual crime ambiental a pessoa jurídica cometeu, em seguida verificar-se qual a pena privativa de liberdade caberia a uma pessoa física, e, posteriormente convertê-la nas hipóteses do art. 21, II e III da lei 9.605/1998.

Cumpre salientar também, que na dosagem da pena levar-se-á em consideração as circunstâncias atenuantes e agravantes, previstas respectivamente nos artigos 14 e 15 da Lei dos Crimes Ambientais.

3.6 Orientação jurisprudencial

A jurisprudência brasileira não dispõe de um senso unânime com relação à responsabilização da pessoa jurídica que comete crime ambiental, mesmo com expressa previsão na Lei Maior no artigo 225, § 3º. Passemos a analisar alguns julgados dos tribunais nacionais, entre eles as mais Altas Cortes.

3.6.1 Posições favoráveis

Iniciando os estudos dos posicionamentos favoráveis a responsabilização da pessoa jurídica que comete crimes ambientais, tem-se o Recurso Especial de nº. 564.960, julgado em 02/06/2005, apreciado pelo Excelso Superior Tribunal de Justiça, e, acompanhando o voto do Relator Ministro Gilson Dipp, reconheceram da responsabilidade da empresa que foi denunciada por causar poluição em leito de rio, notemos:

Criminal. Crime ambiental praticado por pessoa jurídica. Responsabilização penal do ente coletivo. Possibilidade. Previsão constitucional regulamentada por lei federal. Opção política do legislador. Forma de prevenção de danos ao meio-ambiente. Capacidade de ação. Existência jurídica. Atuação dos administradores em nome e proveito da pessoa jurídica. Culpabilidade como responsabilidade social. Co-responsabilidade. Penas adaptadas à natureza jurídica do ente coletivo. Recurso provido.[2]

No recurso em questão, a ementa mostra-se bem clara no sentido em que a responsabilidade penal da pessoa jurídica é prevista constitucionalmente, bem como regulamentada por lei (lei nº. 9.605/1998). Neste julgado considerou-se a punição da pessoa jurídica eis que comprovada a participação da pessoa física que atuou em benefício daquela.

Referindo-se ainda sobre o mesmo julgado, este deixou esclarecido que não há o que se falar em ofensa ao princípio constitucional de que nenhuma pena passará da pessoa do condenado, pois cada qual, tanto pessoa física mandatária, quanto a pessoa jurídica receberão as penas respectivas.

Outra decisão favorável ao reconhecimento da responsabilidade penal da pessoa jurídica foi proferida em Recurso de Apelação Criminal nº. 2001.72.04.002225-0, julgado 06/08/2003, tendo como Relator o Desembargador Élcio Pinheiro de Castro, analisado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que decidiu no seguinte sentido:

Penal. Crime contra o meio ambiente. Extração de produto mineral sem autorização. Degradação da flora nativa. Arts. 48 e 55 da lei Nº 9.605/98. Condutas típicas. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Cabimento. Nulidades. Inocorrência. Prova. Materialidade e autoria. Sentença mantida.

1. Segundo entendimento doutrinário e jurisprudencial predominante, a Constituição Federal(art. 225, § 3º) bem como a Lei nº 9.605/98 (art. 3º) inovaram o ordenamento penal pátrio, tornando possível a responsabilização criminal da pessoa jurídica.

2. Nos termos do art. 563 do CPP, nenhum ato será declarado nulo, se dele não resultar prejuízo à defesa (pas de nullité sans grief).

3. Na hipótese em tela, restou evidenciada a prática de extrair minerais sem autorização do DNPM, nem licença ambiental da FATMA, impedindo a regeneração da vegetação nativa do local.

4. Apelo desprovido.[3]

Neste caso, a pessoa jurídica não atuou nos moldes da legislação ambiental, que prevê na Resolução 237/1997 do Conama a concessão do respectivo licenciamento ambiental para que determinado produto seja extraído da natureza com as cautelas necessárias.

A lei 9.605/1998 também foi violada pela pessoa jurídica criminosa, pois não respeitou o artigo 55 da referia lei que dispõe que para a extração de recursos naturais, pertinente se faz a respectiva autorização, permissão, licença ou concessão do órgão responsável.

Outro caso interessante, julgado pelo STJ no Recurso Especial de nº. 889.528, julgado em 17/04/2007, tendo como Relator o Ministro Felix Fischer, reformou o acórdão proferido pelo juízo a quo que exclui do pólo passivo da ação a pessoa física (gerente da empresa), prosseguindo a ação por crime ambiental apenas com relação à pessoa jurídica, que foi condenada em 130 dias-multa.

Processual penal. Recurso especial. Crimes contra o meio ambiente.  Denúncia rejeitada pelo E.  Tribunal a quo. Sistema ou teoria da dupla imputação. Admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua  em  seu  nome  ou  em  seu  benefício,  uma  vez  que  "não  se  pode  compreender  a  responsabilização  do  ente  moral  dissociada  da  atuação  de  uma  pessoa  física,  que  age com  elemento  subjetivo  próprio"  cf.  Resp  nº  564960/SC,  5ª  Turma,  Rel.  Ministro  Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005 (Precedentes). Recurso especial provido.[4]

A Corte do STJ, sabiamente reformou a decisão proferida na segunda instância, dando amparo ao alegado pelo Ministério Público de Santa Catarina, mandando incluir no pólo passivo da demanda a pessoa física que administra a pessoa jurídica criminosa, sob a ótica de que não há como deixar de punir o verdadeiro criminoso que está no comando da pessoa jurídica e dirigindo-a segundo suas intenções.

Conclui-se, portanto, que diante da responsabilidade da pessoa jurídica que comete crime ambiental, sempre com a vontade dirigida de seus membros, sejam eles proprietários, administradores ou gerentes, há que se aplicarem as penas para ambos diante do que dispõe o parágrafo único da lei nº. 9.605/1998.  Ou seja, a responsabilidade da pessoa jurídica não exclui a das pessoas físicas, co-autoras ou partícipes.

3.6.2 Posições contrárias

Aqueles que têm posicionamento contrário a responsabilidade penal da pessoa jurídica, quando do cometimento do de crimes ambientais, tem como premissa o artigo 225, parágrafo 3º da Constituição Federal, atribuindo as sanções penais apenas as pessoas físicas, e as pessoas jurídicas restando apenas às sanções de caráter administrativo.

 A corrente defensora do direito penal clássico, afirma que inexiste imputabilidade penal, e, desta forma, haveria de ter uma pessoa física para ser responsabilizada no lugar da pessoa jurídica, assumindo assim a culpa pelo crime cometido.

Iniciemos o estudo das posições contrárias a responsabilidade da pessoa jurídica, com o, Recurso em Sentido Estrito, de nº. 1457/2001, julgado em 02/05/2001, interposto pelo Ministério Público de Mato Grosso em desfavor de uma madeireira que desenvolvia sua atividade causando poluição ambiental, vejamos a ementa:

Recurso em sentido estrito – Crime ambiental - Pessoa jurídica - Responsabilidade penal - Inadmissibilidade - Rejeição da denúncia - Decisão em consonância com a orientação doutrinária e jurisprudencial dominantes - Recurso improvido. Mostra-se inconstitucional o art. 3º da Lei nº 9.605/98, no que diz respeito à responsabilidade penal da pessoa jurídica. A pessoa jurídica não pode ser sujeito ativo de crime. Inteligência do art. 5º, inciso LXV da CF/88.[5]

O entendimento do Desembargador Relator, Fortunado Donato Ojeda é pautado no princípio penal do “societas deliquere non potest”. No seu entendimento apenas a pessoa física pode praticar a conduta típica descrita na legislação penal, sendo, desta forma inconstitucional a lei ordinária que disciplina a responsabilidade da pessoa jurídica.

O Excelso Tribunal de Justiça, já foi contrário a responsabilidade da pessoa jurídica. Vejamos a decisão que acompanhou o voto do Relator Ministro Felix Fischer, no Recurso Especial de nº. 622.724, julgado em 18/11/2004:

Penal e processual penal.  Recurso especial.  Crimes contra o meio ambiente.  Denúncia.  Inépcia.  Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Responsabilidade objetiva. Na dogmática penal a responsabilidade se fundamenta em ações atribuídas às pessoas físicas. Destarte a prática de uma infração penal pressupõe necessariamente uma conduta humana.  Logo, a imputação penal à  pessoas  jurídicas, frise-se carecedoras  de  capacidade  de  ação,  bem  como  de culpabilidade,  é  inviável  em  razão  da  impossibilidade de  praticarem  um  injusto  penal.  (Precedentes do Pretório Excelso e desta Corte). Recurso desprovido.[6]

Neste julgado o Superior Tribunal de Justiça, entendeu que a pessoa jurídica não dispõe de capacidade de ação, logo, não é passível de cometer crime ambiental, declarando inepta a peça vestibular do Ministério Público que ofereceu denúncia contra a pessoa jurídica e seu representante legal.

Questão interessante e relevante é a divergência de opiniões, aqui o Ministro Relator Felix Fischer não reconheceu a pessoa jurídica como ente capaz de cometer crimes ambientais. No entanto mais tarde proferiu decisão contrária, no Recurso Especial de nº.  889.528, julgado em 17/04/2007, tendo por base decisão proferida pelo próprio STJ no Recurso Especial de nº. 564.960, julgado em 02/06/2005.

Hoje, tem-se que o posicionamento do STJ é favorável a responsabilidade da pessoa jurídica. Ocorre que as questões apreciadas em cada tribunal ainda são divergentes, e pode ocorrer também que o próprio STJ venha a não reconhecer tal atitude antes reconhecida.

O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, no Habeas Corpus de nº. 92921, julgado em 19/08/2008, emitiu a seguinte opinião a respeito do tema em questão:

(...) Responsabilidade penal da pessoa jurídica, para ser aplicada, exige alargamento de alguns conceitos tradicionalmente empregados na seara criminal, a exemplo da culpabilidade, estendendo-se a elas também as medidas assecuratórias, como o habeas corpus. (Apud, DOTTI, p. 191).

Denota-se que o consenso jurisprudencial a respeito da matéria: responsabilidade pena da pessoa jurídica, está longe de acabar. O certo é que em cada caso concreto deve-se apurar o uso desta como meio para o cometimento do crime ambiental e aplicar as sanções previstas da lei nº. 9.605/1998 de modo a coibir novas infrações.

CONCLUSÃO

 

O meio ambiente como exposto no presente estudo monográfico, é essencial para a vida de todas as espécies que habitam este planeta. Para que se tenha um ambiente conservado e sadio para esta geração, bem como para as futuras, é fundamental o zelo e o cuidado com o meio ambiente, protegendo-o com todos os meios possíveis, incluindo nestes o Poder Judiciário.

O uso do meio ambiente deve ser exercido de forma equilibrada e sustentável, até porque este não se constitui um patrimônio cujo dono é único. O meio ambiente é um patrimônio de todos. Como disciplina o Direito Administrativo é um bem comum do povo, e deve ser zelado e cuidado por todos.

No mundo hodierno, já podemos observar que o crime ambiental não está sendo cometido apenas pelas pessoas físicas, tidas como agentes do delito, mas também por pessoas jurídicas agindo pelo comando de vontade daquelas, muitas vezes, acreditando-se impunes diante da corrente doutrinária penal clássica que defende a inimputabilidade da pessoa jurídica por lhe faltar capacidade de conduta por ausência de vontade.

Oras, a vontade da pessoa jurídica está personificada através da pessoa física, a legislação Constitucional e Ordinária foi muito clara quando condicionou a vontade da pessoa jurídica a pessoa física. A primeira só age por vontade da segunda, no chamado concurso necessário. A legislação inclusive previu sanções únicas e exclusivas as pessoas jurídicas, podendo ser aplicadas isoladas, cumuladas ou alternadas, atendendo de maneira satisfatória o meio ambiente.

É mais que evidente, que em termos de proteção ambiental, necessário se faz o uso da razão. Mais do que provado que grandes empresas, ou até pequenas e médias poluem rios, nascentes, o ar, o solo. A legislação ambiental/penal deve evoluir a fim de que possa acompanhar o frenético avanço de capitais, coibindo rigorosamente as condutas criminosas contra o meio ambiente, sob pena de termos em poucos anos um ambiente impróprio para se viver.

Vimos que diante de algumas sábias decisões dos tribunais brasileiros, tem-se punido a pessoa jurídica que comete crimes ambientais, bem como as pessoas físicas na qualidade de co-autoras.

Aos que afirmam a incapacidade da pessoa jurídica não levam em consideração que o avanço social trouxe novas condutas que insistem em esconder-se e esquivar-se da legislação. No entanto em matéria ambiental, a proteção deve ser essencial, e a lei 9.605/1998 veio a atender o anseio e o cuidado que o meio ambiente merece.

Como aduz o Ilustre doutrinador Édis Milaré, não cabe a nós ficarmos discutindo o mérito da velha polêmica acerca a responsabilidade penal da pessoa jurídica.

De nada adianta também discutir-se conceitos enraizados na disciplina penal enquanto o meio ambiente tem a perder com as ações advindas das pessoas jurídicas que visam o lucro a qualquer preço.

O ideal é que se trabalhe na busca dos meios mais adequados e suficientes em cada caso concreto. Devemos discutir sim, o sentido repressivo e social das penas aplicadas as pessoas jurídicas, de modo que as multas e as penalidades alternativas sejam capazes de coibir novas condutas lesivas ao meio ambiente, e faça sentir no bolso o amargo prejuízo da prática danosa ao meio ambiente.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Conflito de Competência n. 88.013. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 27/02/2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/ webstj/Processo/Justica/detalhe.asp?numreg=200701717694&pv=010000000000&tp=51>.Acesso em: 15. Out. 2011.

[2] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 564.960. Relator: Ministro Gilson Dipp. Julgado em 02/06/2005. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/detalhe .asp?numreg =200301073684&pv=010000000000&tp=51>. Acesso em: 25. Out. 2011

[3] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4º Região. Apelação Criminal n. 2001.72.04.002225-0. Relator: Desembargador Élcio Pinheiro de Castro. Julgado em 06/08/2003. Disponível em: <http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/acompanhamento/resultado_pesquisa.php?txtValor=200172040022250&selOrigem=TRF&chkMostrarBaixados=S&todasfases=S&selForma=NU&todaspartes=&hdnRefId=93804cf1a1984c1aa23f9b70abba8d87&txtPalavraGerada=bhsd&PHPSESSID=d195714f13dc0aa0c61bbf71e182e40e>. Acesso em: 25. Out. 2011

[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 889.528. Relator Ministro Felix Fischer. Julgado em: 17/04/2007. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/Justica/ detalhe.asp?numreg=200602003302&pv=010000000000&tp=51>. Acesso em: 25. Out. 2011.

[5] BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. Recurso em Sentido Estrito nº. 1.457.  Relator Desembargador Donato Fortunato Ojeda. Julgado em: 02/05/2001. Disponível em: <http:// www.tjmt.jus.br/servicos/jurisprudencia/ViewAcordao.aspx?key=9f74e0de-2e94-43c4-966a-3d99 beb167a4&render=1>. Acesso em. 25. Out. 2011.

[6] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº. 622.724. Relator ministro Felix Fischer. Julgado em: 02/08/2005. Disponível em: < http://www.stj. jus.br/webstj/Processo /Justica/detalhe. asp? numreg=200400123188&pv=010000000000&tp=51>. Acesso em: 25. Out. 2011.