Quero paz. E só a encontro junto a natureza com suas árvores caladas, seus pássaros cantores. A natureza tem uma compreensão muda que parece a acolhida materna. Sento perto de uma árvore e no seu silêncio encontro uma existência que não me pergunta se tenho diploma, se sei falar inglês, se sou importante. Não pergunta se sou casado, se tenho filhos. Não olha desconfiada para minhas misérias. Sento e sua aceitação da vida me influencia. Aceito a vida e fico em silêncio. Nenhuma palavra para explicar. As árvores, os animais são os seres mais livres de que tenho consciência. Uma árvore não discrimina outra por não produzir flores iguaizinhas aos dela, não fofocam, não olham desconfiadas umas para as outras. O único objetivo dos seres da flora e da fauna é viver. Aceitam e lutam todos os dias pela vida. Não se desanimam nunca. Não acordam com preguiça de buscar alimento. Não tem depressão. Não sentem solidão. Não sabotam o curso de outra existência por implicância gratuita, por não simpatizar, por inveja. Se uma árvore nasceu para produzir mangas, a que produz abacates não vai se queixar, inventar mentiras para sabotar os sonhos da mangueira. Acaso um cajueiro se avizinhe demais de um ipê não existirá, certamente, olhares desconfiados acerca dessa amizade. Um peixe não se revolta acaso não consiga subir o rio. A natureza é pura aceitação. Neste miserável mundo humano cheio de discursos em prol da vida, liberdade, amor ao próximo, tudo é simplesmente artimanha. Somente os animais são livres, vivem e deixam viver. A diferença mais dolorida entre os homens e os outros seres vivos é que os irracionais já tem trabalho demais ao existir para se preocuparem em atormentar, prejudicar o semelhante por pura diversão ou maldade. Uma leoa faminta ao perder uma presa não colocará seu fracasso sobre os ombros de outrem. A leoa não bradará para os vizinhos que tudo isso está acontecendo devido a seus pecados ou inveja de alguém. No mundo dos animais e plantas ninguém atormenta o outro se utilizando do passado. Só existe o hoje e o agora. Não há passado nem futuro.  Ninguém a engana, se justifica diante da natureza. O homem encontrou na palavra um artifício ridículo para ludibriar a natureza. Por meio dela ele tenta de todas as maneiras driblar a sua própria insignificância, maldades. Mas a natureza é surda a seus apelos mesmo que sejam os mais sólidos argumentos. Na hora fatídica quem fala mais alto é a natureza, nessas horas não adianta ser sábio, ser doutor, ser milionário. Ninguém escapa a velhice e seus males, ninguém acrescenta um dia de vida apelando a racionalidade ou sapiência. Por isso que não quero palavras, não desejo a presença de ninguém ao meu lado. Quero ao meu redor somente a sinceridade dessas árvores, pássaros, insetos. Infelizmente eles me entendem mais do que qualquer pessoa. Fico aqui, sentado, chorando, eles me olham e silenciam. A brisa, a luz, os seus murmúrios aos poucos me consolam e, logo, estou a admirar sua tranquilidade. Então a paz que busco nos homens é encontrada nesse verde, nesses silêncios. Viver entre os homens é tão complexo, tão exaustivo que preciso desses seres que não me pedem nada, que distraem meu olhar perdido, que me dão, sobretudo, consciência que minha existência solitária não é uma trajetória única, mas é a de todo ser vivo. No fundo todos nós, seres vivos, temos uma trajetória solitária a cumprir. Sinto-me unida umbilicalmente a esses seres apaixonados pela vida e a solidão passa. Tal como eles desejo lutar, lutar. Tal como eles me agarro à vida com unhas e dentes. Sou um animal feroz machucado. Lambo minhas feridas e rosno. A exuberância e a beleza desses seres batalhadores me transformam. Sinto-me tomada de força e vitalidade. Volto a querer lutar por meu espaço. Esqueço o passado recente e me preparo para o que vem pela frente. Viva a vida!