MOMENTOS ESPECIAIS
Publicado em 20 de agosto de 2009 por Romano Dazzi
MOMENTOS ESPECIAIS
Em todas as tarefas humanas existem dois momentos especiais, que decidem o resultado. São o começo e o fim.
O instante inicial, quando se dá o primeiro ponta-pé da partida, é decisivo.
Cria a atmosfera de vitória ou derrota, que acompanhará todo o desenrolar do jogo.
Eu tinha um bom vizinho, um jovem vendedor de ferramentas, que saia de casa de manhã bem cedo, levando numa das mãos o programa do dia e o dinheiro trocado para o ônibus; na outra, a pasta com o talão de pedidos e o lanchinho embrulhado.
A esposa vinha acompanhá-lo na porta de casa, dava-lhe um beijo que era mais um bom dia do que uma despedida e abria-lhe o sorriso mais bonito da face da terra.
Ele caminhava então até o ponto, orgulhoso e feliz, retendo no rosto aquela expressão de carinho e irradiando-a enquanto caminhava, ou melhor: marchava.
E não lhe importava nada se o ônibus atrasava e se chegava lotadíssimo e se ele perdia uns dois botões do paletó na refrega para conseguir seu espaço.
Aquele sorriso o acompanhava ao longo do dia e era como um anjo da guarda, a vigiá-lo e a orientar-lhe os passos.
Era aquele sorriso, que preparava seu espírito, para fazer dele um vencedor, desde o momento inicial, quando se decide quase sempre o resultado da partida.
À noite, depois de batalhar o dia inteiro, ele voltava cansado, amarfanhado, desfeito, como uma cama na qual alguém se tivesse agitado a noite toda, tentando vencer a insônia com um sono impossível.
Mas logo ao virar a esquina, via a sua Monalisa a acenar timidamente o seu amor na ponta de um lencinho.
E as dobras escuras do rosto dele se alisavam, as curvas da boca subiam lentamente para um sorriso e depois para um beijo apenas acenado.
Aquele era o momento final da partida. Quando o juiz apita o fim de jogo e todo o cansaço do dia desaparece por um instante, pois, qualquer que tenha sido o placar, o jogo valeu cada minuto e a gente pode voltar para os vestiários, o banho quente, os braços mornos e acolhedores da companheira, a comida simples, condimentada com o carinho e a saudade transbordante de um dia inteiro de ausência.
Aquele meu vizinho era um vencedor.
Até um dia em que ele saiu de casa sozinho, batendo a porta, o rosto crispado numa expressão de raiva, os passos incertos, pesados.
À noite, a cama desfeita que se desenhava diariamente em seu rosto não mudou; e esta passou a ser a sua expressão constante.
O que houve entre eles, eu nunca soube.
Ninguém consegue saber o que acontece entre duas pessoas que se amaram e não se amam mais.
São como a plantinha da mesa de minha sala, que de repente murcha; e eu penso que seja falta de água; rego-a, e ela continua murchando; e ponho uma pitada de adubo, e ela não melhora; e mudo-a de lugar, tiro da corrente de ar, ponho-a um pouco no sol. Mas ela murcha ainda e parece ter perdido a vontade de viver; e se encolhe um pouco a cada dia; e finalmente amarela, seca e morre, deixando saudade de suas lindas flores vermelhas, de suas folhas de um verde intenso, da impressão de paz, de saúde e beleza, que ela me dava para beber todas as manhãs, enquanto a regava.
Ora, não deixe que suas plantinhas acabem assim, como a minha; mesmo porque uma plantinha tem um valor relativo; uma pessoa vale muito mais; vale a nossa vida inteira, às vezes.
Então, faça assim: nos dois momentos mais importantes de seu dia, ao iniciá-lo e ao terminá-lo, olhe a sua plantinha, ou melhor, a sua pessoa amada.
Veja se tem folhas secas, se foi bem regada, se está tomando todo o sol de que precisa – e só ele.
Lembre-se de dar-lhe o carinho de que todas as plantinhas precisam; fale com ela, converse, diga-lhe quanto a acha bonita e forte e atraente; pergunte-lhe como foi a sua noite, se dormiu bem, se teve algum pesadelo.
No seu segundo momento importante, no fim do dia, pergunte de novo como foi tudo, e insista – porque as plantinhas raramente têm vontade de falar, quando estão esgotadas, cansadas. E nem imaginam quanta falta lhes faz uma conversa tranqüila, ao pé da lareira, longe de radio, de TV, de música barulhenta, de crianças, de amigos, de sogra, falando e escutando apenas bobagens, livres de pressões e de preocupações. Para elas tem tempo amanhã. O “agora” deve ser dedicado inteiramente a eles dois.
E outra coisa importante: plantinhas fazem milagres; assim como gente. Já vi uma, seca arreganhada, jogada às traças em um canto escuro, em apenas três dedos de terra. Pois a peguei, reguei com carinho, levei-a para um passeio no sol, sempre falando com ela, acalentando-a, mimando-a. Em duas semanas, talvez menos, ela reviveu, floresceu, ficou feliz. Justamente como gente. Pense um pouco nisso, você que deixou passar tantos momentos importantes de inicio e fim de dia. Nunca é tarde, se sua vontade o empurrar.
Eu lhe desejo que os dois momentos mais importantes de seu dia sejam sempre assim, felizes, limpos, preciosos. Que produzam beleza, florescendo e frutificando.
Só com a dedicação constante traremos a nós as plantinhas de que gostamos.
Com momentos assim, você vencerá todas as suas batalhas.