CONTRARRAZÕES DO AGRAVO DE INSTRUMENTO Agravo de Instrumento nº. 001166-34.2014.8.17.0000 (Processo Originário nº. ACP 0104704-622013.8.17.0001) Agravante: ESTADO DE PERNAMBUCO Agravado: MINISTÉRIO PÚBLICO DE PERNAMBUCO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, COLENDA 3ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO NOTÁVEL DESEMBARGADOR RELATOR, 1. BREVE RESUMO DOS FATOS: Trata-se de Agravo de Instrumento interposto pelo ESTADO DE PERNAMBUCO, em face de decisão interlocutória proferida pela MM. Juíza de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública que concedeu a tutela antecipada com fundamento nos artigos 461, CPC e Súmula 18 do TJ/PE e, desta feita, determinou que o agravante fornecesse, imediatemente, o medicamento ERITROPOETINA 40.000v-4FA, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais), com vistas ao tratamento de saúde do idoso EDSON DA SILVA MOREIRA. Com vistas a reformar a sentença de fls., o agravante alega: a) exorbitância da multa diária fixada pelo juízo a quo; b) ausência dos pressupostos autorizadores da concessão de liminar; c) 'periculum in mora' inverso. Conforme se demonstrará a seguir, razões não assistem ao recorrente, devendo o Agravo de Instrumento ser conhecido, mas improvido. 2. DA TEMPESTIVIDADE DAS PRESENTES CONTRARRAZÕES: Conforme Termo de Recebimento acostado aos autos, fls. 86, a intimação do parquet efetivou-se realizado em 07 de abril de 2014. Considerando o dispostos no artigo 523, §2º do CPC - Interposto o agravo, e ouvido o agravado no prazo de 10 (dez) dias, o juiz poderá reformar sua decisão – vê-se que tempestivada a apresentação das contrarrazões em epígrafe. 2. PRELIMINARMENTE: 2.1. DA AUSÊNCIA DE REQUISITOS PARA INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO: Conforme preceitua o Código de Processo Civil, artigo 522, in verbis: Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento. Veja-se que a partir da Lei nº. 11.187/2005, por opção legislativa, o agravo retido passou a ser o recurso cabível para decisões interlocutórias, utilizando-se apenas excepcionalmente o agravo de instrumento, que servirá, dentre outras hipóteses, nos casos de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação. No bojo de sua peça recursal, o recorrente afirma categoricamente que “Patente é, pois, o risco de lesão grave e de difícil reparação em desfavor do agravante (...)” e para tanto argumenta que “Enquanto permanecer em vigor a medida liminar deferida, o Estado de Pernambuco ver-se-á forçado a fornecer mensalmente e até o julgamento de merito da ação em foco, medicamento de uso contínuo que sequer consta das listagens oficiais do Ministério da saúde, em detrimentos de todas as outras alternativas terapêuticas disponibilizadas pelo SUS para tratamento da patologia agravada. Não obstante, a sua aquisição implicará, forçosamente, relevante deslocamento e dispêndio de recursos públicos destinados à área de Saúde, em prejuízo da higidez do Sistema Único de Saúde como um todo, minando sua capacidade de atender um número maior de pacientes”. Os ônus processuais não obrigam as partes, mas acarretam prejuízos se não forem observados; sobre essa perpectiva é que fatos alegados e não provados, é o mesmo que não alegados. Conforme se observa, inclusive com leitura atenta e cautelosa, o Estado não se desincumbiu do ônus de demonstrar em que medida a importância de R$ 5.600,00 (cinco mil e quinhentos reais) por mês representam deslocamento e dispêndio de recursos públicos destinados à área de Saúde. Como? Em que proporções? Quais os valores médios gastos com o tratamento sugerido? Qual a desproporção da medida deferida pelo juízo a quo? Nada se prova, logo, não há que se falar em lesão grave e de difícil reparação. Considerando o princípio singularidade recursal – que admite apenas um recurso específico para cada decisão judicial – e o disposto no artigo 522, caput, CPC, observa-se a inadequação a via eleita pelo recorrente, devendo os D. Julgadores realizar em juízo negativo de admissibilidade, não conhecendo o Agravo de Instrumento interposto pelo Estado de Pernambuco, ora contrarrazoado. É o que requer o parquet. 3. DO MÉRITO RECURSAL: 3.1. DA ADEQUAÇÃO DA MULTA DIÁRIA FIXADA PELO MM. JUÍZO A QUO: Alega o agravante haver exorbitância na imposição de multa diária determinada pelo D. Juízo a quo, informando em suas razões que “(...) a multa fixada para o caso de atraso no cumprimento da decisãi ora agravada é totalmente desproporcional à obrigação imposta. Isto porque apenas 01 (um) dia de atraso no cumprimento do preceito irão gerar multa correspondente ao custo total do tratamento do substituído processualmente durante um mês!”. Destaca, ainda, que a referida decisão interlocutória afronta o disposto do §4º, artigo 461, CPC. Impende esclarecer que o artigo 461, CPC trata de ações que tem por objeto obrigações específicas – de fazer e não-fazer – e, considerando a possibilidade de inércia do demandado, o legislador previu a possibilidada de imposição de multas, forma de coerção patrimonial destinada a pressionar a vontade do réu para que cumpra o mandamento jurisdicional, nominadas na doutrina como astreintes; são, em verdade, típico mecanismo de preservação da autoridade do juiz, de molde a constranger o devedor a que satisfaça a obrigação, induzindo-o, por ato próprio, a cumprir a prestação devida a sofrer as consequências do inadimplemento. Sobre o tema, vale transcrever as lições de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, vejamos: “Pena pecuniária (astreintes). Não há limites para a fixação da multa, e sua imposição deve ser em valor elevado, para que iniba o devedor com intenção de descumprir a obrigação. O objetivo precípuo das astreintes é compelir o devedor a cumprir a obrigação e sensibiliza-lo de que vale mais a pena cumprir a obrigação do que pagar a pena pecuniária. A limitação da multa nada tem a ver com enriquecimento ilícito do credor, porque não é contraprestação de obrigação, nem tem caráter reparatório ”. Conforme se observa, as astreintes não correspondem à indenização pela inexecução de comando jurisdicional, logo, prescindível a correlação entre o dano causado e o valor imposto; tal instituto visa compelir o demandado a cumprir a prestação específica e, por isso, deve ser de valor significativo para que o devedor sopese os valores envolvidos e entenda por cumprir a obrigação determinada por decisão do Poder Judiciário. Entender de forma diferente é desvirtuar o instituto, tão caro às obrigações específicas. Por fim, ressalva-se, ainda, que a recorrente indica a exorbitância ao informar que a multa diária corresponde ao custo total de atraso do tratamento do substituído processualmente durante um mês; alegações que não procedem, posto que conforme Receituário Médico às fls. 35, 36, 45, 56, 61 o tratamento indicado para o Sr. EDSON DA SILVA MOREIRA é de 1 (uma) ampola de ERITROPOETINA 4.000v – 4FA por semana, logo, são necessárias 4 (ampolas) da medicação pleiteada. Conforme se infere das alegações acima expostas, as razões do Agravante indicam uma suposta desproproção aritmética na mensuração das astreintes. Vê-se, todavia, que o recorrente não entendeu o pleito o MPPE, que busca proteger o direito à vida e a dignidade da pessoa humana que sempre são albergado com proteção máxima. Diante do exposto, questiona-se: qual o valor da vida? Qual o significado do Estado de Direito que não observa a dignidade da pessoa humana? Em essência, o que os direitos fundamentais protegem? O que deve ser protegido com maior relevância: a vida de um idoso ou valor ínfimo do patrimônio estatal? A partir de que momento o interesse público primário passou a ceder ao interesse público secundário? Ex positis, requer-se a manutenção da decisão de 1º grau, visto que está em conformidade com o objetivo perseguido pela astreintes, de acordo com o CPC – artigo 461, § 4º; bem como em sintonia com a diretiva constitucional, que dentre seus fundamentos desponta a dignidade da pessoa humana. 3.2. DA PRESENÇA DE FUMUS BONI IURIS E DO PERICULUM IN MORA. DA IMPRESCINDIBILIDADE DA MEDICAÇÃO PLEITEDA: Em mais uma tentativa de desconstituir a decisão do juízo a quo, alega o agravante a inexistência de fumus boni iuri e periculum in mora. Pois bem, passemos a análise e à indicação de contrarrazões aos aludidos argumentos. Passemos a análise e à indicação de contrarrazões aos aludidos argumentos. Vejamos. 3.2.1. Quanto ao fumus boni iuris: Em sua peça recursal, o ESTADO DE PERNAMBUCO indicou a ausência de tal requisito alegando que a medicação solicitada para o Sr. EDSON DA SILVA MOREIRA, apesar de disponibilizada pelo SUS, não seria indicada para o tratamento da moléstia que acomete o referido idoso, para tanto, colaciona jurisprudências que informam, em síntese, que “deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente”. Os mesmos julgados consignam que (…) “Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões especificas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz a seu caso”. Consultando os autos, fls. 60, consta NOTA TÉCNICA emitida pela Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco que, analisando a medicação requerida – ERITROPOETINA – e o caso do paciente – SR. EDOSN DA SILVA MOREIRA – conclui que a droga requisitada está contemplada na listagem oficial do SUS, mas não é indicada para o tratamento da patologia diagnosticada, sugerindo outra medicação; todavia, a referida NOTA TÉCNICA deixa clara que a avaliação sobre a medida terapêutica compete ao medico, ao informar que: “Sugiro encaminhar nota técnica ao médico prescritor para que o mesmo avalie as alternativas terapeuticas citadas”. Logo, conforme se vê, o próprio Estado de Pernambuco reconhece a possibilidade de utilizar-se medicações/tratamentos difereintes daqueles listados pelo SUS, considerando as peculiariedades do caso concreto e de acordo com a prescrição medica. A avaliação medica indicada pela Secretaria de Saúde, alhures mencionada, foi realizada e se encontra acostada aos presentes autos, fls. 61. Por meio de RECEITUÁRIO MÉDICO, a médica responsável pelo acompanhamento do Sr. Edson da Silva Moreira informa que a medicação sugerida na Nota Técnica não se aplica ao caso do idoso e assim conclui: “solicito eritropoetina 40.000 u 1X/semana visando estimular a formação de eritrocitos e assim diminiur a necessidade transfusional. O medicamento filgrastrim não se aplica neste caso, ou seja, não está indicado para este fim.” Logo, na hipótese dos presentes autos, não há que se falar em opção do paciente, mas de opção medica! Além disso, a aludida escolha visa minorar o sofrimento suportado pelo paciente e, desta forma, diminuir a necessidade transfusional. Veja-se que o SUS ao adotar os Protocolos Clinicos e Diretrizes Terapeuticas (PCDT) para embasar as ações estatais na promoção, proteção e recuperação da saúde não indicou que eles são vinculantes e impossíveis de serem afastados, ate porque tal determinação seria, no minimo temeraria, visto que circunstancias excepcionais podem justificar medidas excepcionais; além disso, não há como se enquandrar a medicina dentre as ciências exatas, traçando correlações prontas e acabadas para cada patologia, sem quaisquer análises dos fatos. É exatamente em razao da necessidade de analise caso a caso que a opinião medica – expert na matéria – revela-se imprescindivel nos aludiso tratamentos e, por isso, a jurisprudencia se filia à corrente que impoe a analise do caso concreto. Ademais disso, o próprio Estado de Pernambuco, por meio da Nota Técnica expedida pela Secretaria de Saúde, ponderou a possibilidade de analise médica, o que de pronto se conclui que é possível utilizar a droga indicada pelo médico, devendo o recorrente arcar com o onus, com vistas a garantir a saúde, direito constitucionalmente albergado e corolário da dignidade da pessoa humana; entender de outra forma é disvirtuar os fins pretendidos pelo Estado Demecrático de Direito instaurado no ordenamento jurídico brasileiro. Presente a verossimilhança das alegações do recorrido, com as provas dos autos (Receituário Médico), carecem de sustentação os argumentos expostos pelo agravante e a negativa do Estado de Pernambuco constitui opção por ofensas diretas ao direito à saude, à vida, à dignidade da pessoa humana, nestes termos, não merece reparo a sentença. 3.2.2. Quanto ao periculum in mora: Alega o agravada que a decisão de 1º grau foi proferida sem que estivesse presente o requisito do periculum in mora; todavia, o justificado receio de ineficiência do provimento final cristaliza-se no fato de que a demora no provimento pretendido acarretará consequência totalmente irreversível e irreparável ao idoso Urge destacar que a jurisprudência pátria vem dando seu beneplácito à concessão de tutela inaudita altera pars, ao enfrentar situações de extrema relevância como a presente, onde se encontra em jogo o valor saúde, in verbis: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA INAUDITA ALTERA PARS – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES – SITUAÇÃO DE RISCO EXCEPCIONAL – LEI N.º 9.313/96. I - Em relação à concessão da tutela antecipada inaudita altera pars, melhor doutrina e jurisprudência posicionam-se pelo cabimento da mesma em situações excepcionais como a presente; II - O fumus boni iuris e o periculum in mora apresentam-se deforma inconteste no caso em tela. O primeiro configura-se nos documentos acostados aos autos, bem como no fato de o pedido se basear em direito garantido na Constituição Federal de 1988 e em legislação ordinária (Lei n.º 9.313/96). O segundo está caracterizado diante do notório risco de vida que a enfermidade exposta traz ao seu portador, tornando indispensável o fornecimento dos medicamentos pleiteados; III - Agravo de Instrumento desprovido” (TRF 2a Região, AG-87292/RJ, Des. Fed. Valmir Peçanha,4a Turma, Unânime, DJ 07/08/2002) EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A DEFESA DOS INTERESSES INDIVIDUAIS RELATIVOS À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA – INTELIGÊNCIA DO ART. 201, V, DA LEI 8.069/90 – MEDICAMENTO NECESSÁRIO AO TRATAMENTO DE MENOR – RISCO DE DANO IRREPARÁVEL – CONCESSÃO DE LIMINAR SEM A PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DO PODER PÚBLICO – POSSIBILIDADE – DEVER DO ESTADO DE GARANTIR A SAÚDE E A VIDA DOS INDIVÍDUOS – RECURSO NÃO PROVIDO – DECISÂO UNÂNIME. -É possível a concessão de medida liminar inaudita altera parte em face do poder público, nos casos em que houver o risco iminente de grave lesão à saúde. - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são solidariamente responsáveis pela saúde pública, sendo perfeitamente possível exigir-se do Estado do Paraná a concessão de medicamentos aos cidadãos necessitados. - Por se tratar de dever do Estado, o tratamento de paciente carente não caracteriza lesão aos cofres públicos. (TJPR, AI – 143371000, Rel. Dês. Antônio Lopes de Noronha, 2ª Câmara Cível, Unânime, DJ 18/02/2004). Assim, a Lei Fundamental de 1988 reservou, em seu corpo, merecido assento ao direito à saúde, explicitamente atribuindo ao Estado o dever de concretizá-lo. Confira-se: “Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” – Grifo Nosso Em consonância com a diretiva constitucional transcrita e com o art. 197 da CF, a Lei Federal nº 8.080/90 dispôs sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, confirmando a obrigação do Poder Público em fornecer medicamentos à população. O art. 2º do mencionado Diploma Legal, diz: “Art. 2º A Saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.” Mais adiante, o art. 6º dispõe: “Art. 6º Estão incluídos ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde – SUS: (...) I – a execução de ações: (...) d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica.” Ademais, a Carta Magna, em seu art. 198, ao instituir o SUS, infirma as suas diretrizes, tal como a descentralização, com direção única em cada esfera de governo, responsabilizando, desse modo, a União, os Estados-membros e os Municípios pelas ações e serviços de saúde direcionados ao cidadão. Veja-se: “Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;” Ao regulamentar a atuação de cada um desses gestores, na área de fornecimento de medicamentos, o Ministério da Saúde – Gestor Federal, instituiu, através da Portaria nº 3.916, de 30 de outubro de 1998, a Política Nacional de Medicamentos. Dita Política, a teor do que preceitua o art. 1º da Portaria nº 3916/98, ao definir as responsabilidades de cada gestor, atribui, ao Estadual, em seu item 5.3, in verbis: “b) promover a formulação da política estadual de medicamentos; d) coordenar e executar a assistência farmacêutica em seu âmbito; g) assegurar a adequada dispensação dos medicamentos, promovendo o treinamento dos recursos humanos e a aplicação das normas pertinentes; m) definir elenco de medicamentos que serão adquiridos diretamente pelo Estado, inclusive os de dispensação em caráter excepcional, tendo por base critérios técnicos e administrativos referidos no Capítulo 3, “Diretrizes”, tópico 3.3, deste documento, e destinando orçamento adequado à sua aquisição;” O Capítulo 3, “Diretrizes”, tópico 3.3, assim dispõe: “Inicialmente, a definição de produtos a serem adquiridos e distribuídos de forma centralizada deverá considerar três pressupostos básicos, de ordem epidemiológica, a saber: (...) a) doenças consideradas de caráter individual que, a despeito de atingir número reduzido de pessoas, requerem tratamento longo ou até permanente, com o uso de medicamentos de custos elevados;” - Grifo Nosso Assim, o caso em comento amolda-se na situação suso colacionada. A Carta Magna, por sua vez, estabeleceu, em seu artigo 230, verbis: “Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhe o direito à vida.” O Estatuto do Idoso, nesta mesma esteira, esposou, em seu artigo 3º: “Art. 3º. É obrigação da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.” Não é demais repetir que o caso versado nos presentes autos relaciona-se ao direito à saúde, mas não abstratamente considerado, estar-se-á em jogo a vida de um idoso, com nome, sobrenome, família – o SR. EDSON MOREIRA DA SILVA – que aguarda a disponibilização da medicação para garantir-lhe dignidade em seu tratamento e com vistas a recuperar a saúde já tao debilitada pela demora estatal outrora indicada. Assim, veja-se, enquanto o Estado se nega a cumprir dever constitucionalmente imposto, a saúde do idoso é maculada e depreciada. A alegação estatal de periculum in mora inverso supondo que a disponibilização da medicação pleiteado esta “minando sua capacidade de atender um número maior de pacientes” chega a ser ofensivo ao raciocínio jurídico, mas racionalizando a analise do caso em comento, vê-se autentica colisão de princípios fundamentais. Passemos ao cotejo. O principio da concordância pratica ou da harmonização, idealizado por Hesse, objetiva o principio da unidade constitucional, sendo utilizado para resolver problemas referentes à colisão de direitos fundamentais. De acordo com esse principio, havendo choque entre os direitos fundamentais e os valores constitucionais, estes deverão ser harmonizados, por meio de juízo de ponderação que vise preservar e concretizar ao máximo os direitos e bens constitucionais protegidos. É a otimização entre os direitos e valores em jogo, no estabelecimento de uma concordância prática, que deve resultar numa ordenação proporcional dos direitos fundamentais e/ou valores fundamentais em colisão, ou seja, busca-se o melhor equilíbrio possível entre os principios colidentes, garantindo-se a máxima efetividade da constituição. Vale esclarecer, por fim, que o Estado de Pernambuco sustenta que “periculum in mora inverso” se baseia sobretudo nas seguintes alegações, que transcrevemos: “Enquanto permanecer em vigor a medida liminar deferida, o Estado de Pernambuco ver-se-á forçado a fornecer mensalmente e até o julgamento de mérito da ação em foco, medicamento de uso contínuo que sequer consta das listagens oficiais do Ministério da saúde, em detrimentos de todas as outras alternativas terapêuticas disponibilizadas pelo SUS para tratamento da patologia agravada. Não obstante, a sua aquisição implicará, forçosamente, relevante deslocamento e dispêndio de recursos públicos destinados à área de Saúde, em prejuízo da higidez do Sistema Único de Saúde como um todo, minando sua capacidade de atender um número maior de pacientes”. Fls. 08 Doutos julgadores, a alegação de que medicamento de uso contínuo que sequer consta das listagens oficiais do Ministério da saúde NÃO PROCEDE, na Nota Técnica GAJ/GGAJ/SES Nº. 1368/2013, às fls. 60, a Secretaria de Saúde afirma categoricamente que o medicamento está contemplado nas listagens oficiais do SUS, permita-nos transcrever: “O medicamento está contemplado em listagens oficiais do SUS? Sim.(...)” Pois bem, aplicando o principio da concordância pratica ou da harmonização e tendo em vista o confronto concreto nos presentes autos entre direito à vida do cidadão e direito à propriedade estatal e, considerando ainda, que a CF/88 albergou a dignidade da pessoa humana como valor supremo, o periculum in mora que salta aos olhos é a que a ausência de medicação especifica ao idoso pode inclusive significar sua morte. Logo, não há como sustentar a alegação do recorrente de “periculum in mora inverso”, devendo ser mantida a decisão interlocutória em todos os seus termos. 4. DOS PEDIDOS: a) preliminarmente: que os D. Julgadores, consubstanciados no art. 522, caput, CPC, não conheçam do presente Agravo de Instrumento interposto pelo Estado de Pernambuco, visto que inexistentes os requisitos para interposição do recurso em análise; b) no mérito: caso ultrapassada a preliminar, o que de fato não se acredita - que seja mantida a decisão da Douta Magistrada a quo in totum, Pede deferimento. Recife, 16 de abril de 2014. LUCIANA MACIEL DANTAS FIGUEIREDO Promotora de Justiça