Crônica                               

                               MESMO NO SILÊNCIO DIALOGAMOS

Edevaldo Leal

                            O título eu tomo emprestado de um poema de Carlos Drumond de Andrade, para falar sobre esta tarde quase inteira de conversa no quintal. Sem preocupações com horário. Sem nenhum compromisso com trabalho. O ócio não criativo. Nada de discutir a política econômica do governo, a bolha imobiliária que vem por aí, ou a inflação dos preços nos supermercados. Melhor é sentir a lufada de vento me abanando o rosto e esse silêncio tão único, quebrado apenas pelas vozes e gargalhadas, como se tudo além permanecesse mistério intocável da natureza.

                                                O vai  e vem de passarinhos, as mangas maduras penduradas nos galhos rente ao chão; um ar de primavera, embora estejamos  em época de chuva, os galhos das árvores deste e dos outros quintais trepidando sob o vento forte e o imenso céu azul, tudo isso me faz pensar na importância da vida e no quanto é bom vivê-la plenamente.

                                               Estou em Marapanim, distante 110 quilômetros de Belém, cidade balneária do nordeste paraense e aqui neste quintal, à sombra destas árvores, reina um silêncio raro. Aqui eu esqueço do mundo. Por um instante me desligo de tudo. Por um instante só, por que logo desperto com os causos interessantes, histórias de cada um e gostosas gargalhadas de não acabar mais.

                                              Novamente recolho-me ao útero de minha origem mais remota, como se tivesse me reencontrado com meus ancestrais: sentado no chão de minha pré-história, uso apenas  a palavra falada, cujos sons não ultrapassam os limites do meu interlocutor tribal. E lembro-me de Drumond, no poema “O Constante Diálogo:

Escolhe teu diálogo/e/ tua melhor palavra/ou/ teu melhor  silêncio, / Mesmo no silêncio e com o silêncio /dialogamos”.

                                         Me dou conta de que, de quando em quando, precisamos nos distrair e viver a vida como se não tivéssemos qualquer compromisso com o amanhã. No silêncio do agora, na serena quietude da natureza, é impossível não sentir o quanto o diálogo desinteressado e atencioso nos coloca frente a frente com nossa própria humanidade.

                                           O celular toca e minha sogra atende. Alguém, sabe lá quem e de onde, pergunta se é da casa de Satanás. Um trote, logo no momento em que pensei estar desconectado do mundo. Da próxima vez, desligar os telefones será uma ordem, para fazer de conta que o mundo é pequeno.

                                                                                              Marapanim/Pa, 8 de janeiro de 2013.