TEMPERO DE MULHER

“... Havia dentro da mala várias cabeças, já em decomposição, sendo treze...”.

Izalino era um caminhoneiro que trabalhava com caminhão madeireiro. Ele era um pouco diferente dos outros, era prudente, assim bem precavido, e mais que isso: Izalino era medroso mesmo. Viajar durante a noite? Só se fosse em caravana, ou melhor... Nem em caravana. Preferia esperar o novo dia parado próximo a algum restaurante de beira de estrada. Certa vez os colegas caminhoneiros, decididos a ir ao Çairé em Alter do Chão, combinaram de tocar dia e noite sem parar, fazendo toda a rota da região de Castelo de Sonhos à Itaituba, carregando madeira. Convidaram  Izalino mas ele inventou uma desculpa e acabou não indo.

 Ao amanhecer seguiu viagem tranqüilamente. Percorreu muitos quilômetros e num trecho entre Castelo de Sonhos e Novo Progresso, avistou uma mulher muito bem trajada acenando para ele. Parou imediatamente seu caminhão. Ela pediu uma carona até Itaituba, ele a mandou entrar e seguiram viagem.  A mulher era muito bonita, tinha fortes traços indígenas, cheirosa, de salto alto; trazia com ela uma mala muito elegante. Sorria sem muito nexo, um sorriso misterioso... Izalino perguntou o que a dama fazia ali sozinha, e a mesma respondeu com evasivas nazarênicas, (muito falou e nada disse); confundindo a mente do caminhoneiro, que pensava:

_ Nunca dei carona no meio da estrada, mas algo nela me cegou me enfeitiçou...

 Ele sentia um arrepio percorrer a espinha. Num certo momento a mulher pediu para que Izalino parasse o caminhão, ela precisava descer ir ao matinho.

_ Mas tem uma parada logo na frente. Não fica longe, restaurante, banheiros...

_ Não, não dá para esperar. Não me sinto muito bem. Cólicas, coisas de mulher.

Ela foi andando sem pressa enquanto Izalino a observava e admirava sua formosura. Sua pele de pêssego, seus lábios, seus olhos de jabuticaba, uma verdadeira e deliciosa salada de frutas, (pensava ele). Pensando assim a volúpia tomou conta do seu corpo, mas seus pensamentos foram interrompidos por uma má impressão.

Voltou para a boléia, percebeu que a mala exalava um cheiro forte... Nisso já fazia uns quarenta minutos e nada da mulher voltar do mato.

_ Moça! Moçaaa! Hei mooooça!

E nada da moça responder.

_ Meu Deus o que terá lhe acontecido? Será que ela está me esperando no mato? Mas, parecia um pouco tímida, até mesma recatada.

 Foi até o mato, procurou, chamou. Procurou, chamou novamente e nada...

_ Terá sido cobra, uma onça, um buraco? Por que entrou tão longe mata adentro? O que está acontecendo? Estaria me testando? Talvez desmaiou, morreu? Vão me culpar, serei um criminoso, não tenho álibi.

 Passaram mais de três horas.

_ Não vou mais esperar. Vou á polícia. Conto tudo e entrego a mala. E se a polícia não acreditar em mim? Não, vou jogar fora a mala e esquecer tudo. Não mas todos os motoristas que passaram aqui viram meu caminhão. Para alguns até falei que esperava alguém. Quando encontrarem o corpo, serei eu o assassino. Estou perdido. Tudo bem! Vou à polícia entregar a mala, falar a verdade e pronto!

Voltou para a cabine, disposto a entregar a elegante mala preta à polícia e pensou:

_ O que terá nesta mala, hem? Não está muito pesada. E se for droga? Nunca mais saio da prisão. Vou abrir primeiro.

        Parou o caminhão num lugar calmo, entrou no matagal com a mala, cuidadoso e lentamente abriu-a, sentindo o forte odor que exalava. Ficou pasmo, perplexo com o que viu. Não acreditava vir daquela distinta dama tal absurdo. Ela foi desumana para com ele.

_ Me colocar diante desta situação, eu um homem honesto, trabalhador, cumpridor das leis e temente a Deus. Desgraçada, pilantra, sem coração... Ah que cheiro horrível!

       Havia dentro da mala várias cabeças, já em decomposição. Sendo treze de alho e sete de cebola.                                                                                            Atiana Gomes e Mara Nascimento