Por: Alexandre Santos Silva.

O dia era oito, o mês setembro e o ano 1913, enquanto fatos iam ocorrendo pelo mundo, como a prisão do líder indiano Mahatma Gandhi, por liderar a marcha dos mineiros no sul da África, na Holanda, era inaugurado o Palácio da Paz, em Haia, que tivera a participação de países de todo o mundo na contribuição de sua construção e aqui no Rio de Janeiro, o Clube de Regatas Vasco da Gama acabara de debutar e era um jovem adolescente com 15 anos de existência.

Nesse ínterim, nasce no subúrbio do Rio de Janeiro, mais precisamente, no Cosme Velho, onde a pouco mais de cinco anos atrás, ainda vivia Machado de Assis, o maior poeta e escritor carioca. O local ficara notabilizado como a moradia do "Bruxo do Cosme Velho", nascia assim Thereza Gomes da Silva, filha de pessoas simples do povo, sua mãe chamava-se Alzira e seu pai Ezequiel. Era a quarta filha dos oito, que teve sua mãe.

Aos treze anos precisou sair de casa para trabalhar em casa de família para ajudar sua mãe a criar os irmãos mais novos, visto que seu pai fora embora com outra mulher, deixando assim seus filhos a sorte com sua mãe. Foi babá, costureira e bordadeira, por essa época tinha uma leve simpatia pelo clube das Laranjeiras, pois achava bonito seu uniforme verde e grená.

Aos quatorze anos foi trabalhar na casa de uma família portuguesa, onde tomava conta de seu bebezinho, em conversa com o patrão, o mesmo falou que ela deveria ser vascaína, pois além do clube da colina ser muito bom, era um clube que não discriminava as pessoas, onde todos eram iguais e nele jogavam pobres e negros. Diante dessa declaração e convivendo com essa família portuguesa com certeza, desse dia em diante, passou a ser simpatizante do Clube da colina.

Em 1935, com 22 anos, casa-se com Emygdio Lopes da Silva, também torcedor do Vasco da Gama e que daquele momento em diante lançam bases para o víeis da família que constituiriam. Somente sete anos depois e após algumas tentativas improdutivas, nasce seu filho, que seria o único, apesar de naquela época as famílias serem razoavelmente numerosas, Thereza já havia percorrido alguns bairros do subúrbio carioca, já morara na Abolição, em Pilares e no Méier, na maioria das vezes em vilas residenciais com casas de parede e meia, casa estas que eram divididas por uma simples parede, quando não locais que possuíam banheiro e cozinha coletiva, tendo apenas os quartos independentes.

Por essa época seu marido trabalhava como forneiro em uma padaria e ao transitar de bonde para o trabalho em conversa com um amigo, tomou conhecimento sobre um loteamento que estava se formando em Anchieta e fora convidado por esse amigo para conhecer o mesmo, isso se deu em 1949, gostou do local e trouxe sua família para morar aqui, Thereza por essa época fazia bordados para firmas no Méier e Centro do Rio de Janeiro e gradativamente ajudou seu marido a quitar as promissórias do terreno.

Já em 1950, morando em Anchieta, seu filho único, Milton passa a conviver e a freqüentar "as peladas" do bairro, cria um circulo de amizade, o mesmo tem a convicção do time que torce, o mesmo de seus pais e o tempo passa, seus filho cresce, estudando nas escola da região, estudou na Escola Municipal Paraíba e no Colégio Pereira Mendes. Perto de optar pelo ensino científico, sua mãe, procura um explicador que morava na região e que prepara algumas crianças e adolescentes para o ensino técnico, era chamado de Requinho por sua estatura frazina e diminuta, mas com uma extrema capacidade intelectual, esse explicador tornou-se o Doutor em física nuclear, renomado nacional e internacionalmente Rex Nazaré Alves, também conhecido como o "Pai da bomba atômica Brasileira". Seu filho passa para o Colégio Estadual Visconde de Mauá em Marechal Hermes, mas por opção não fica lá,sai para estudar no Soeiro em Cascadura, por influência de alguns amigos,, pois pretendia seguir carreira militar e servir a aeronáutica.

O tempo passou, seu marido agora trabalha na Rede Ferroviária Federal, sue filho era guarda de trânsito, sua vida simples continua, no início do ano de 1969, seu filho contrai núpcias, com uma mocinha moradora do bairro, chamada Nilza, nascida e criada em uma rua transversal a sua, dessa união nascem um casal de filhos, que logo transformam a alegria da família, Dona Thereza já com seus quase 60 anos,pega seu netinho no colo e vai caminhar pela Mariópolis com o mesmo. Dois anos depois nasce sua neta, a família não é muito grande, aqueles irmãos que no passado foram deixados para viverem a sua sorte, hoje estão dispersos, cada qual constituiu família, alguns já haviam falecido, e não é diferente a luta dessa sobrevivente.

Após muita água passar por baixo da ponte da vida de Thereza, em 1980, fica viúva, perdendo seu companheiro de 45 anos de caminhada. Em 1991, é a vez de seu filho, que era único partir, e mais três anos depois vê também se despedir permanentemente sua neta que possuía seu nome, com pouco mais de vinte um anos de idade. Sua neta inclusive deixa um herdeiro que Thereza tem o prazer de ver crescer juntamente com seus outros três bisnetos, filhos de seu neto Alexandre e sua neta emprestada Luciana.

Conta Alexandre que certa dia, ao chegar da faculdade encontrou sua avó Thereza jogando futebol no quintal com o bisneto Alex.

São várias passagens em sua vida que ficaram e ficarão marcadas para a posteridade, hoje Dona Thereza está com 96 anos de idade, até três meses atrás, ainda fazia toda sua rotina sozinha, ia visitar e almoçar com sua irmã, doze anos mais nova, em Olaria, a única viva e que por ter problemas de locomoção quase não sai de casa e semanalmente ela ia a seu encontro, tomava dois ônibus, fazia baldeação e retornava para sua casa, ao fim do dia.

Em virtude de um AVC, hoje não mais pode fazer essa sua rotina, o que a está consumindo dia após dia, pois sempre foi ativa, o AVC que teve, não a fez perder sua lucidez, entretanto afetou parte de sua mobilidade. No momento está em casa sendo tratada por sua nora e filha emprestada Nilza, viúva de seu filho Milton.

A idade já começa a cobrar seu espaço, e Thereza com esses problemas já dá sinais de cansaço. Agora não mais vai a missa encontrar o Cristo ressuscitado que por longos tempos levou para seus doentes e assistidos como Ministra da Comunhão Eucarística (MECE), hoje tem recebido o mesmo Cristo Salvador em sua casa, até o dia em que Ele quiser vir aqui vê-la.

Dona Thereza, têm deixado órfão de uma palavra de carinho diariamente dezenas, quem sabe centenas de netos, sobrinhos e até mesmo desconhecidos que diariamente passam em sua porta para ir ou voltar do trabalho e a cumprimentam e ela sempre respondia: "Bom dia queridinho(a), bom trabalho" ou simplesmente "Vá com Deus" ou até mesmo "Deus te abençoe", hoje as pessoas passam e perguntam como ela está, se vai bem, pois está sumida. Mas Deus é o Senhor de todas as coisas e de tudo, Ele sabe nosso momento e nosso período aqui, portanto Ele sabe de tudo. E enquanto Ele quiser, teremos a mesma aqui a nosso lado. Existe uma comunidade no Orkut dedicada a ela e intitulada "Eu conheço a Dona Therezinha", algumas pessoas já visitaram a comunidade, outras já a visitaram em casa, principalmente a amigas da igreja e do circulo bíblico que ela participava.

Esse breve relato foi transcrito por seu neto Alexandre, historiador e pesquisador, que tem em mente escrever suas memórias e também está montando sua árvore genealógica e já tentou por algumas vezes, juntar os primos descendentes diretos dos irmãos de sua avó e que muitos ainda não se conhecem.