Melhor amigo
- Pedroooooooooooooooo!
- Ãhan... Fala, menina!
- Pedro, preciso de você, é urgente, to morrendo...
Pedro ouve o soluçar do outro lado, assustado decide levantar e ir até lá.
São duas da manhã, Pedro já estava no sono dos anjos, mas o celular insistia a tocar ao lado da cama. Olhou o visor identificando o número de Cecília, sua melhor amiga e a garota por quem estava apaixonado. De pijama e chinelos, pegou o carro e saiu.
Ao chegar à casa de Ciça, já a avistou espiando na janela como se tivesse certeza de que ele iria sem falta.
Ela correu até à porta, abrindo-a e jogando-se nos braços dele. O coração quase saltou-lhe pela boca de tão forte que bateu. Ele deu-lhe tapinhas nas costas, alisou o cabelo longo e macio, arrumando-lhe as madeixas castanhas. Sentiu-lhe o cheiro tão pessoal e que tanto amava. Aí, aguardou o torvelinho do desabafo.
- Ai, Pedro, eu "PRECISAVA" que você viesse, estou morta, aliás, vou me jogar na frente de um caminhão, me jogar da ponte, nos trilhos do trem...
- Calma... Nada merece que você desperdice sua vidinha desse modo, não seja egoísta, tantas pessoas que sentiriam sua falta...
-Só você, meu amigo, meu ursinho carinhoso.
- Mas diga, o que foi que aconteceu de tão grave?
- Ai, o Guga, aquele ingrato, traidor, Mefistófeles... Tá com a Jéssi, você acredita? Ela é feia, até meio sapatão com aqueles ombros grandes de jogadora de vôlei, aquele cabelo pintado, tem até uma verruga na bochecha...
- Um sinal, Cicinha, um sinal como aquela artista...
- Pedroooo...! Você é meu amigo ou não?
- Sou, é claro, sou...
Desde os dezesseis anos, quando fizeram o cursinho pré-vestibular, Pedro encantou-se com aquela menina. Aos poucos a empatia foi se transformando em algo mais forte sem que nunca tivesse tomado coragem de declarar seu amor. Todavia, acompanhava-a sempre, saíam juntos, estudavam e ele até a aconselhava quando ela trazia seus problemas sentimentais. Guga era o último namorado. Pedro até simpatizava com ele, bom rapaz, estudioso, mas não muito chegado a ser fiel, a namorar uma garota de cada vez, nisso era inconseqüente.
Ciça desfiou um rosário de queixas, entre soluços, culpava-se de "ser feia e chata", ele negava, argumentava e acariciava-lhe os ombros. Sua proximidade era tanta que Pedro precisou colocar uma almofada sobre o colo, disfarçando a emoção.
O dia clareava quando levantou do sofá, anunciando que precisava voltar para casa, tinha trabalho logo cedo da manhã.
- Ah, graças, meu lindo! Obrigada por ficar comigo. Se você não fosse gay eu até casaria com você...
- Como é que é? Quem é gay?
- Ué, você! Tanto tempo que nos conhecemos, você sempre junto, nunca uma namorada, vai às compras, cinema, comigo, sempre disposto a me ouvir... Quem mais faria isso a não ser um amigo que nos entenda, um amigo gay?
Pedro teve um súbito calor, sentiu as faces ruborizarem-se, contou até cem e então, falou:
- Lógico, Ciça, você sempre tem razão...
- Ela encostou-se toda nele, num abraço apertado, beijando-o agradecida.
Pedro a enlaçou, saboreando o momento.
Gay? Bom, se era preciso que pensasse assim para que ele tivesse sempre aquela pessoinha nos braços, estava certo, cumpriria o papel... Beijou-a de leve nos lábios e saiu com o coração leve.