MANUEL NÃO QUER PARIR

Manuel acorda cedo no outro dia. Parece estar muito animado. Faz o cafezinho. Vai trabalhar. Trabalha animadamente o dia inteiro. Todos desconfiam de alguma coisa, mas não sabem o que é.

Volta pra casa o Manuel. Vem até cantando um pouco. Entra no bar do Joaquim todo tagarela. Encontra os amigos de sempre. Começam a tomar uma fria. A bebida parece estar saborosa. E vai bebida e papo. Bebuns possuem um estoque enorme de estórias. Quando começam a contar não querem parar mais.

Manuel conta do trabalho, das mágoas e alegrias, dos problemas de casa, do governo e da crise do país. Que paísinho! Hum! Diz o Joaquim. Manuel ta mais pra lá do que pra cá. Dizem que lá em Marte a vida está excelente, diz Joaquim. Pedreiro lá está ganhando 7 mil por mês. Manuel fica empolgado com a conversa do Joaquim. Quer saber tudo deste tal de Marte. Nunca ouvira falar nele. Não sabe que não é na terra, mas pensa que é um bairro. E 7 mil é dinheiro pra ninguém jogar fora. Manuel recebe só mil por mês e com muito sacrifício e dor. Manuel quer ir pra Marte. Ficaria rico o Manuel. Compraria um belo carrão. Interrogou a Joaquim detalhe por detalhe a respeito de Marte. Ele tinha que ir trabalhar lá. Estou indo pra lá Joaquim. Onde é que se pega o ônibus? Joaquim que não estava bêbado e só estava gozando na cara do Manuel, responde com outras perguntas: ônibus? Você quer ir pra Marte de ônibus? Só se pode ir pra lá numa nave espacial. Não importa. Manuel ia assim mesmo. Estava resolvido. Não queria ser pobre. De vez em quando ele voltaria para Santana para visitar a pobreza. Onde é que pegaria essa tal de nave? Teria que ir pros Estados Unidos e de lá subir pra Marte - diz Joaquim. Mas tem uma coisa Manuel. Lá quem pári são os homens. Manuel estremeceu. Que negócio é este? Homens parindo? Estranho, muito estranho. Não é que as mulheres são mais fortes que os homens, nem os homens são muito moles. O negócio era a gravidez. Já pensou o Manuel até no sapatão e de barriguinha. Não. Manuel não tinha queda para mãe. Não. E que diriam os outros quando Manuel chegasse mais tonto que taquara verde com um bebê no colo? Este é seu filhinho? Pára com isto. Fico por aqui mesmo. Sofre-se um pouco, mas agente vive. Só então o Joaquim fala a verdade. Manuel nunca fora à escola e não sabia nada de nada. Não fica zangado com o Joaquim porque ele é um boa praça.

Os bebuns dizem que há um bailinho numa boate ali perto. Ele fica todo animado e resolve ir lá. Está totalmente bêbado. Vai pra casa, toma um banho e volta. Reúne-se com os outros e vão ao tal baile. Lá está muito animado. Comeram e beberam outra vez. Bebem muito. Dançam bastante. Muito bêbado, Manuel fica dançando sozinho no salão. Um bebum, colega deles, começa a dar tiros no salão. E agora? Sai todo mundo espavorido. A polícia chega e leva os bebuns para a delegacia. Ninguém enxerga ninguém. Fazem a ficha na delegacia, mas não tem mais vaga. A delegacia estava lotada. Que fazer com aqueles bebuns arruaceiros? A polícia parte com eles no carro. Chegam a um lugar enorme, todo murado. Abrem a porta e deixam os bebuns lá. Podem se divertir aí, cambada de bêbados. Só então Manuel descobre onde está. Tem muita gente naquele lugar, mas infelizmente estão todos mortos. Manuel se arrepia todo. É meia noite e eles estão em pleno cemitério. E como sair dali agora naquele estado? Sente-se mole, as pernas bambas. Parece estar doente. Passam todos ali, tentando escalar o muro, mas era muito alto. Com a escuridão e todos, ninguém sabe nem para onde ir. Assim passam o resto da noite ali. Só conseguem sair bem cedinho, graças a um morto fresco. O coveiro veio fazer a nova casa do tal morto e abriu o portão do cemitério.

Manuel vai pra casa. A cabeça roda muito. Não vai trabalhar nesse dia. Resolve é beber mais. Passa na casa do Joaquim e enche a cara de novo. Perde o sentido e quando acorda está em sua cama. Não sabe o que aconteceu, nem quer saber de nada.